Política

Javier Milei vence eleição e é o novo presidente da Argentina





Sergio Massa reconheceu a derrota antes mesmo do resultado oficial sair

O economista e deputado Javier Milei (Libertad Avanza) venceu as eleições para presidente da Argentina com 55,8% dos votos válidos. O seu opositor, o candidato peronista Sergio Massa (Unión por la Patria), ficou com 44,2% dos votos até o momento, com 96,7% de apuração.

Milei perdeu o primeiro turno das eleições, virou na segunda etapa de maneira histórica e venceu por uma diferença de quase 12 pontos. Com 98,62% das urnas apuradas, o liberal está com 55,73% dos votos e peronista com 44,26%.

Massa reconheceu a derrota antes mesmo dos resultados oficiais saírem. No comício de seu partido, o ministro da Economia afirmou que conversou com Milei para parabenizá-lo e desejar-lhe boa sorte. “Porque é o presidente que a maioria dos argentinos elegeu para os próximos quatro anos”, disse.

O candidato derrotado pontuou que o mais importante é deixar uma mensagem de diálogo e paz ao povo argentino. “Havia dois caminhos, optamos pelo sistema de segurança nas mãos do Estado, defendemos o caminho da defesa da educação e da saúde pública como valores centrais”, disse.

Massa pontuou, no entanto, que o povo escolheu outro caminho. “A partir de amanhã, a tarefa de dar certezas e transmitir garantias sobre o funcionamento social, político e económico cabe ao presidente eleito. Esperamos que o faça”, disse.

No primeiro turno, a diferença entre eles havia sido apertada e nem as pesquisas eleitorais conseguiam medir quem chegaria na frente, já que algumas davam empate técnico.

Milei, de 53 anos, venceu as primárias e era tido como favorito, mas havia ficado em segundo lugar no primeiro turno. Ele é figura polêmica na Argentina e mundo afora por promessas de cortar relações com países que julga “comunistas”, como China e Brasil, além de romper com o Mercosul e “dinamitar”, ou seja, fechar o Banco Central.

O ultraliberal revelou admiração pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Em troca,Bolsonaro fez postagens de apoio ao candidato e confirmou ida à posse caso Milei ganhasse as eleições.

No Brasil, os partidos de esquerda, incluindo o PT, se manifestaram a favor de Massa. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) evitou citar nomes e pediu por um líder “que goste de democracia, que respeite as instituições, goste do Mercosul, da América do Sul e que pense na criação de um bloco importante”.

A fala de Lula ocorreu após Milei taxar o presidente brasileiro de “corrupto e comunista”, além de alegar que não se encontraria com o petista.

Além de Bolsonaro, Milei recebeu uma carta de apoio assinada por ex-presidentes da Argentina, México, Colômbia, Espanha, Bolívia, Chile e Porto Rico. Também era signatário Mario Vargas Llosa, político e escritor ganhador do Nobel da Literatura.

Patricia Bullrich, que representou a direita no primeiro turno e acabou como terceira colocada, endossou a candidatura de Milei.

 

- Lula parabeniza instituições argentinas pela eleição e deseja sorte ao novo governo, sem citar o nome de Milei

Horas depois do fechamento das urnas, o candidato governista, Sergio Massa, reconheceu a derrota no segundo turno argentino. Milei, candidato de extrema direita e ultraliberal, não era o preferido do Palácio do Planalto.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva parabenizou o povo e as instituições argentinas pela condução do processo eleitoral. Ele desejou sorte e êxito ao novo governo, mas não citou o nome do vencedor, o candidato de extrema direita, Javier Milei. 

Nos bastidores, o governo torcia pelo candidato da situação, o peronista Sergio Massa – aliado do atual presidente argentino Alberto Fernández, parceiro de Lula. Milei se define como ultraliberal e tem um forte discurso antipolítica, posições bem distintas das de Lula (veja mais abaixo). 

"A democracia é a voz do povo, e ela deve ser sempre respeitada. Meus parabéns às instituições argentinas pela condução do processo eleitoral e ao povo argentino que participou da jornada eleitoral de forma ordeira e pacífica", escreveu Lula em suas redes sociais. 

Em seguida, Lula deseja sorte ao novo governo, mas não parabeniza Milei. O presidente afirma que o Brasil está sempre "à disposição" para trabalhar com os "irmãos" argentinos. 

"Desejo boa sorte e êxito ao novo governo. A Argentina é um grande país e merece todo o nosso respeito. O Brasil sempre estará à disposição para trabalhar junto com nossos irmãos argentinos", completou. 

Na terça-feira (14), Lula afirmou que o país vizinho é "muito importante" para o Brasil e que precisava eleger um presidente que "goste de democracia". 

O governo brasileiro, no entanto, não assumiu preferência publicamente, para não derrubar pontes caso Milei fosse eleito. Durante o primeiro turno, Milei chegou a dizer que não teria diálogo com o presidente Lula. 

Para o Palácio do Itamaraty, é essencial manter o canal aberto com a Argentina. 

Uma coisa era eleição, e outra coisa é o governo, avaliam os diplomatas – mesmo sobre as críticas recentes de Milei ao Brasil.  

Possíveis impactos para o governo brasileiro

O resultado na eleição da Argentina é importante para o governo brasileiro por alguns motivos. Entre os principais estão: o comércio bilateral entre os dois países, a entrada da Argentina no Brics e a importância do país vizinho na estrutura do Mercosul. 

De janeiro a outubro deste ano, as exportações brasileiras para a Argentina somaram US$ 14,9 bilhões. Isso corresponde a 5,3% do valor total exportado pelo Brasil no período. 

Para comparação, esse valor é superior às exportações brasileiras no período para o Oriente Médio (US$ 12,2 bilhões) e para a África (US$ 10,8 bilhões). 

Além disso, a Argentina responde por 40% das exportações brasileiras para a América do Sul (US$ 37 bilhões) e quase 73% das remessas para o bloco do Mercosul (US$ 20,5 bilhões). 

Principais produtos exportados para os argentinos entre janeiro e outubro: 

“O Brasil tem interesse permanente em uma Argentina próspera e Argentina em um Brasil forte. Os dois têm interesse porque a vantagem é recíproca. Quando o Brasil enriquece, compra mais, viaja mais, nós temos uma relação virtuosa", explicou. 

No caso das importações, a Argentina fica em quarto lugar no ranking de países que mais vendem para o Brasil. 

Entre janeiro e outubro, o Brasil importou US$ 10,2 bilhões da Argentina - 5% do valor total importado pelo Brasil no período. 

Entre os itens mais importados do país vizinho, estão: 

Lula defende o fortalecimento do Mercosul, grupo que reúne Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai. Em sua concepção original, o Mercosul previa uma progressiva derrubada de barreiras para circulação de produtos, dinheiro e pessoas, em prol da integração e do desenvolvimento regional. O grupo, no entanto, vem enfrentando dificuldades nos últimos anos, em razão de crises econômicas e divergências de seus membros. 

No entendimento do governo brasileiro, o avanço do Mercosul ainda é uma alternativa valiosa para o crescimento das economias do continente. 

Não é o que pensa Milei. Após as primárias de agosto, o candidato afirmou que o Mercosul "deve ser eliminado" e que vai priorizar relações com Estados Unidos e Israel. 

Fontes da diplomacia brasileira afirmam que o governo quer ver concluído, no início de dezembro, o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. As negociações se arrastam há anos. Para o governo, o ideal seria anunciar o acordo na cúpula do Mercosul, que ocorrerá nos dias 6 e 7 de dezembro. A posse do novo presidente da Argentina vai ser no dia 10. 

A pressa tem a ver com uma eventual vitória de Milei. Diplomatas temem que, nesse caso, o acordo fique estagnado. 

A Argentina é um dos países que passarão a integrar o grupo dos Brics a partir de janeiro de 2024. 

O grupo foi fundado em 2006, com Brasil, China, Rússia e Índia, consideradas algumas das principais economias emergentes do mundo. O presidente Lula estava então em seu primeiro mandato e participou ativamente da criação do grupo. 

Depois, em 2011, o Brics passou a contar com a África do Sul. Em agosto de 2023, foram convidados outros 5 países, além da Argentina, que entrarão no Brics no ano que vem 

Para Lula, que busca investir em estreitar laços com as economias em desenvolvimento, e não só com os países mais ricos do mundo, é importante que os integrantes dos Brics tenham pensamento parecido com relação aos objetivos do grupo. Se Milei passar a fazer parte dos líderes dos Brics, o bloco pode perder força. 

 

O que esperar de um governo Milei

 

A motosserra que Milei leva aos comícios representa uma de suas principais propostas eleitorais: a redução do tamanho do Estado argentino. Ele afirma que pode alcançar uma diminuição equivalente a 15% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. 

Isso incluiria a redução do número de ministérios de 18 para 8, eliminando pastas como Cultura, Ciência e também Meio Ambiente - Milei é defensor da ideia de que o aquecimento global não é causado pela atividade humana. 

Além disso, Milei expressou a intenção de retirar financiamento da Conicet, uma agência que financia pesquisas científicas na Argentina. 

O economista também afirma que vai dolarizar a economia, mas isso não consta em seu programa de governo. 

O candidato promete reformas no setor elétrico, uma abertura comercial radical e a privatização de empresas estatais como a YPF e a Aerolíneas Argentinas. Como católico praticante, Milei também é contrário à lei que descriminalizou o aborto no país e manifestou a intenção de tentar revertê-la. Ele quer, ainda, revogar algumas das leis sobre educação sexual no país. 

Segundo Maria Esperanza Casullo, professora da Universidad Nacional de Río Negro, Milei fala da dolarização com uma ambiguidade estratégica, porque ele nunca se expressa claramente, e os assessores já deram sinais contrários ao plano. 

"Ele nunca diz como essa dolarização aconteceria, qual seria o valor de referência ou os prazos da mudança, e esses sinais confusos permitem que a dolarização seja uma promessa, mas, ao mesmo tempo, se não ocorrer em um eventual governo dele, ele possa negar que tenha se comprometido com a dolarização", diz ela. 

O economista ainda quer criar um sistema de vouchers para a educação. Funcionaria assim: as escolas deixam de receber financiamento direto do Ministério da Educação. As famílias passam a receber um voucher para gastar na escola que escolherem. 

Ele ainda quer reduzir a idade penal, liberar a venda de armas de fogo no país e proibir dificultar a entrada de estrangeiros.

Fonte: Metropoles - g1