Política

Sem Bolsonaro, Brasil salta 18 lugares em ranking de liberdade de imprensa





O Brasil subiu 18 lugares no ranking de liberdade de imprensa no mundo. O principal motivo: o fim do governo de Jair Bolsonaro.

A conclusão é da entidade Repórteres Sem Fronteira que, anualmente, publica sua avaliação sobre a situação da liberdade da imprensa no mundo. O Brasil continua em uma situação delicada. Mas deixou de desabar na classificação, como vinha ocorrendo nos últimos anos.

"Os ataques do ex-presidente Jair Bolsonaro à mídia continuaram até o último dia de seu mandato, no final de 2022. A chegada do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva restaurou a estabilidade das relações entre a mídia e o governo. Mas a violência estrutural contra jornalistas, a propriedade altamente concentrada da mídia e os efeitos da desinformação ainda representam grandes desafios para a liberdade de imprensa", diz o informe.

No ranking publicado nesta quarta-feira, o Brasil aparece na posição de número 92, entre 180 países avaliados. Em 2022, a classificação mostrava o Brasil na 110a posição.

O informe é publicado na data em que a ONU comemora o dia mundial da liberdade de imprensa. Para o secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, "toda a nossa liberdade depende da liberdade de imprensa".

"A liberdade de imprensa é a base da democracia e da justiça. Ela fornece a todos nós os fatos de que precisamos para formar opiniões e falar a verdade ao poder. E, como o tema deste ano nos lembra, a liberdade de imprensa representa a própria força vital dos direitos humanos", disse. "Mas em todos os cantos do mundo, a liberdade de imprensa está sendo atacada. A verdade é ameaçada pela desinformação e pelo discurso de ódio que procura borrar as linhas entre fato e ficção, entre ciência e conspiração", completou.none

Impacto do bolsonarismo 

Para os autores da classificação, "o governo Bolsonaro de 2019-2022 foi extremamente desafiador para a imprensa brasileira". "O presidente insultou regularmente jornalistas e a mídia e mobilizou exércitos de apoiadores nas mídias sociais como parte de uma estratégia afinada de ataques coordenados que visavam desacreditar a imprensa, que foi rotulada como inimiga do Estado", afirmou.

"Bolsonaro deu continuidade a essa estratégia como ex-presidente, com o objetivo de garantir que seus apoiadores não acreditem nas acusações de corrupção feitas contra ele e sua família, nos resultados das eleições que levaram Lula da Silva ao poder e nas ações do novo governo", disse.

Segundo a RSF, enquanto o Presidente Lula tenta restaurar os princípios democráticos ao lidar com a mídia, ele é "constantemente desafiado pelos apoiadores de Bolsonaro e pelos partidos de extrema direita, que continuam a tentar desestabilizar o governo".

A questão, de acordo com a entidade, é a instalação de um clima de hostilidade contra a imprensa, a partir das ações do bolsonarismo.

"A retórica agressiva em relação aos jornalistas e à imprensa adotada pelo governo Bolsonaro de 2019 a 2022 alimentou uma atitude cada vez mais hostil e desconfiada em relação aos jornalistas na sociedade brasileira", afirmou.

"A ampla disseminação de desinformação continua a envenenar o debate público. O Brasil continua altamente polarizado, e os ataques da mídia social à imprensa abriram caminho para repetidos ataques físicos contra jornalistas, vistos em particular durante as eleições de 2022 e a tentativa de insurreição por apoiadores de Bolsonaro no centro de Brasília em 8 de janeiro de 2023", disse.

Líderes e opressores

De acordo com o levantamento, a Noruega é onde a liberdade de imprensa é mais respeitada no mundo. Oslo lidera o ranking pelo sétimo ano consecutivo. O segundo lugar é da Irlanda, seguida pela Dinamarca. A classificação ainda aponta que os três piores locais para a imprensa estão na Ásia. O governo do Vietnã ocupa a 178a posição, enquanto a China está no lugar de número 179 por ser "a maior prisão do mundo para jornalistas". A lanterna do ranking fica com a Coreia do Norte.

O que mais diz a entidade sobre o Brasil:

Segurança

Durante a última década, pelo menos 30 jornalistas foram mortos no Brasil, o segundo país mais mortal da região para repórteres durante esse período. Os mais vulneráveis são blogueiros, apresentadores de rádio e jornalistas independentes que trabalham em municípios de pequeno e médio porte, cobrindo corrupção e política local. O assédio on-line e os ataques a jornalistas, especialmente mulheres, estão aumentando. Pelo menos três assassinatos foram diretamente ligados ao jornalismo em 2022, incluindo o assassinato do repórter britânico Dom Phillips enquanto ele investigava crimes ambientais contra comunidades indígenas na Amazônia.

Concentração

Apesar do fim dos ataques por parte do governo, a entidade destaca que o cenário da mídia brasileira é marcado por uma "alta concentração de propriedade de mídia do setor privado, caracterizada por uma relação quase incestuosa entre centros de poder e influência política, econômica e religiosa".

"Dez grandes conglomerados corporativos, de propriedade do mesmo número de famílias, dividem o mercado. Os cinco maiores são Globo, Record, SBT, Bandeirantes e Folha. A independência editorial dos meios de comunicação regionais e locais é fortemente comprometida pela publicidade governamental, e a mídia estatal foi submetida a uma grande interferência governamental durante o governo Bolsonaro", diz.

Estrutura legal

"A Constituição Federal de 1988 garante a liberdade de imprensa e, em geral, a estrutura legal brasileira favorece a liberdade jornalística. Entretanto, as leis de transmissão e telecomunicações são antiquadas, permissivas e ineficientes. Os repórteres e a mídia são frequentemente submetidos a processos judiciais abusivos por parte de políticos e interesses comerciais, que usam sua influência para intimidar a imprensa", alerta.

Contexto econômico

"Os principais grupos de mídia estão tentando reinventar seus modelos de negócios diante da crise global da imprensa causada pelo advento das plataformas on-line. Essas corporações investem em vários outros setores de negócios, aumentando a possibilidade de conflitos de interesse e perda de independência editorial. Enquanto isso, a imprensa local está cada vez mais enfraquecida e os meios de comunicação on-line estão enfrentando problemas de viabilidade", completa.

 

Fonte: UOL