Andressa Collet – Vatican News
Nesta sexta-feira (8), o Papa Francisco recebeu em audiência, no Vaticano, uma delegação italiana com o coração brasileiro: colaboradores da Fundação Marcello Candia que, neste ano, completa 40 anos de atividades especialmente junto aos doentes e mais pobres e marginalizados da região norte do Brasil, onde trabalhou por tantos anos. O Pontífice começou a sua saudação se congratulando pelo aniversário e pedindo a intercessão do Venerável Candia, que fundou a associação em 1982 e faleceu no ano seguinte.
As indicações de Paulo VI a Candia
Um agradecimento do Papa também aos colaboradores por darem seguimento às iniciativas de Marcello Candia (1916-1983), por continuarem servindo como ponte de amizade e apoio da Itália ao Brasil, com o “método e o estilo” do próprio fundador, orientados na época por Paulo VI. Francisco, então, retomou essas indicações, já que “podem ser benéficas para todos aqueles que realizam obras semelhantes”, e aprofundou quatro sugestões de Paulo VI dadas a Marcello Candia:
“‘Se fizer um hospital no Brasil, faça-o brasileiro...’ Ou seja, bem inserido na realidade local, envolvendo a população local... Mesmo que ele possa ter colocado um pouco de estilo milanês! A inculturação, assumir a cultura do lugar onde vamos trabalhar.”
“‘Tenha cuidado’, continuou ele, ‘para evitar qualquer tipo de paternalismo; não imponha as suas ideias aos outros, mesmo com boas intenções’. Candia era um empresário, acostumado a decidir por si mesmo, por isso tinha que aprender a dirigir as coisas de outra maneira.”
“‘Faça o hospital não só para os brasileiros, mas com os brasileiros’. Isso é importante, é uma regra geral da caridade: trabalhar com as pessoas que você está servindo.”
“‘Como objetivo final, se proponha a não ser mais necessário’. Quando perceber que o hospital vai pra frente sozinho, então ‘o senhor terá feito um verdadeiro trabalho de solidariedade humana’. Essa também é uma regra muito sábia: não vincular a si mesmo as pessoas e as obras, não se tornar indispensável, mas, pelo contrário, formar os colaboradores e garantir estabilidade e continuidade, com os colaboradores; nada de paternalismo."
A fundação ativa no Brasil
De fato, a fundação dá o apoio financeiro, mas também uma proximidade discreta, de amizade e em respeito à liberdade das iniciativas locais. Em janeiro, por exemplo, foram retomadas as viagens dos colaboradores ao Brasil, especialmente no norte do país, onde foram criadas estruturas idealizadas e construídas por Candia, como o Centro Social para Leprosos (1967) em Marituba, no Pará, e o Hospital São Camilo e São Luís (1969) em Macapá, capital do Amapá, com o intuito de acolher e servir os mais pobres. As duas cidades são lugares históricos da obra de Marcello Candia, mas não só, porque o trabalho do missionário se estendeu criando outras realidades na região norte em benefício dos mais necessitados.
O Papa Francisco, assim, finalizou a sua saudação se congratulando pelo esforço empreendido, "diariamente e nos bastidores", para continuar a obra do leigo missionário italiano em terras brasileiras. A fundação, de fato, não administra as atividades criadas por Candia no Brasil, recordou o próprio Pontífice, mas “apoia as comunidades locais e os missionários em suas iniciativas com os doentes, leprosos e pessoas em várias situações de necessidade”. E um outro mérito reportado por Francisco, é que “os custos de manutenção da fundação são mínimos, quase tudo vai para as obras no Brasil” - o que é muito importante, afirmou o Papa, porque existem organizações de caridade que, "não exagero, a metade ou 60% vão para pagar os salários" de quem trabalha nas estruturas. Ao encorajar novamente pelo trabalho, Francisco deu a bênção final:
“A bênção que lhes dou, leve-a a todos aqueles que colaboram aqui na Itália e no Brasil.”
- O Papa: a justiça precisa de pureza de propósito e respeito pela dignidade
"O povo pede justiça e a justiça precisa de verdade, de confiança, de lealdade e de pureza de propósitos: um serviço em favor da dignidade da pessoa humana e do bem comum”. Palavras do Papa Francisco por ocasião do encontro com os membros do Conselho Superior da Magistratura italiana na Sala Paulo VI no Vaticano, nesta sexta-feira (08)
Jane Nogara - Vatican News
Na manhã desta sexta-feira (08/04) o Papa Francisco recebeu os membros do Conselho Superior da Magistratura na Sala Paulo VI no Vaticano. Francisco saudou os presentes recordando que foram chamados “para uma missão nobre e delicada”, ou seja, representar “o órgão que garante a autonomia e independência dos magistrados comuns e a tarefa de administrar a jurisdição”.
“O povo pede justiça - disse o Papa - e a justiça precisa de verdade, de confiança, de lealdade e de pureza de propósitos”. Afirmando ainda “ouvir o grito dos sem voz e dos injustiçados ajuda a transformar o poder recebido da Ordem em um serviço em favor da dignidade da pessoa humana e do bem comum”. Depois de recordar que na tradição, “a justiça é definida como dar a cada um o que lhe é devido” e que no decorrer da história foram estabelecidos vários modos de administrar a justiça, apontou que segundo a tradição bíblica, “o devido é reconhecer a dignidade humana como sagrada e inviolável”.
Administrar a justiça com misericórdia
"Além da clássica representação da mulher de olhos vendados segurando a balança - continuou - expressando alegoricamente a igualdade, proporção justa e imparcialidade exigida no exercício da justiça, segundo a Bíblia, ocorre também administrar com misericórdia”. E o Papa disse que para isso “nenhuma reforma política do sistema judicial pode mudar a vida de quem a administra, a menos que primeiro escolham diante de sua consciência ‘por quem’, ‘como’ e ‘por que’ fazer justiça”. Recordando Santa Catarina de Sena que sustentava que “para reformar é preciso primeiro reformar-se a si mesmo”.
Relação com o rosto do outro
“A questão ‘por quem’ administrar a justiça – afirmou - ilumina sempre uma relação com aquele ‘você’, aquele ‘rosto’, a quem se deve uma resposta: o infrator a ser reabilitado, a vítima com sua dor a ser acompanhada, aqueles que disputam direitos e obrigações, o profissional da justiça a ser responsabilizado e, em geral, todo cidadão a ser educado e sensibilizado”.
“Por esta razão, a cultura da justiça reparatória é o único verdadeiro antídoto à vingança e ao esquecimento, pois procura a recomposição dos laços rompidos e permite a recuperação da terra manchada pelo sangue do irmão”
Miríade de solidões existenciais
Ao explicar este ponto Francisco afirma: “O ato violento e injusto de Caim não é dirigido contra o inimigo ou contra o estranho: ele é realizado contra os do mesmo sangue. Caim não pode suportar o amor de Deus Pai por Abel, o irmão com quem ele compartilha sua própria vida”. E compara com o nosso mundo de hoje ao dizer:
“Como não pensar em nossa era histórica de globalização generalizada, na qual a humanidade se encontra cada vez mais interconectada e, no entanto, cada vez mais fragmentada em uma miríade de solidões existenciais?”
Podar os galhos mortos
Depois comenta que a questão histórica sobre ‘como’ a justiça é administrada passa sempre pelas reformas. “O Evangelho de João, no capítulo 15, nos ensina a podar os galhos mortos sem, no entanto, amputar a árvore da justiça, a fim de contrariar as lutas de poder, o clientelismo, as diversas formas de corrupção, a negligência e as injustas posições de renda”. O ‘porquê’ da administração, por outro lado, nos remete ao significado da virtude da justiça, que para vocês torna-se um traje interior: não um vestido a ser mudado ou um papel a ser conquistado, mas o sentido próprio de sua identidade pessoal e social.
Saber fazer justiça com virtude
Depois de citar o rei Salomão que pede para Deus lhe dar a graça de ‘saber fazer justiça' Francisco recorda que “para a Bíblia ‘saber fazer justiça’ é o objetivo dos que desejam governar sabiamente, enquanto o discernimento é a condição para distinguir o bem do mal”. Concluindo a explicação observa: “O relato bíblico não revela uma ideia abstrata de justiça, mas uma experiência concreta de um homem ‘justo’. O julgamento de Jesus é emblemático: o povo pede para condenar os justos e libertar o malfeitor. Pilatos pergunta: ‘O que este homem fez de errado?’, mas depois lava suas mãos”.
“Quando os grandes poderes se aliam para a autopreservação, os justos pagam por todos”
Por fim o Papa conclui afirmando:
“A credibilidade do testemunho, o amor pela justiça, a autoridade, a independência de outros poderes constituídos e um leal pluralismo de posições são os antídotos para impedir que prevaleçam as influências políticas, as ineficácias e as várias desonestidades”. “Governar o Judiciário de acordo com a virtude significa voltar a ser o guardião e a alta síntese do exercício para o qual vocês são chamados”.
Fonte: Vatican News