Política

Putin já redesenha o mapa da Ucrânia enquanto Kiev espera assalto; Kremlin se diz pronto a negociar





Tomada de Kherson estabelece controle sobre o sul e facilita ponte terrestre da Crimeia ao Donbass

Enquanto bombardeios se intensificam em torno de Kiev e Kharkiv, as duas principais cidades da Ucrânia, as forças russas começam a redesenhar o mapa do país vizinho com a tomada de Kherson, ao sul do país.

O anúncio foi feito pelo Ministério da Defesa em Moscou e, até aqui, não foi oficialmente negado por Kiev. Kherson passou cerca de 24 horas sob intenso bombardeio, o que deve ter gerado elevadas baixas civis, dando assim uma medida do cerco que se forma em torno da capital ameaçada.

Trata-se do primeiro centro de porte razoável que Vladimir Putin tomou em sua campanha, iniciada na madrugada do dia 24. Com 300 mil habitantes antes da guerra, é o principal ponto ao norte da península da Crimeia, anexada sem conflito pelo presidente russo em 2014.

Com o controle estendido dos separatistas pró-Rússia, em guerra civil desde aquele ano, às áreas históricas do chamado Donbass, falta apenas a conquista da região de Mariupol para estabelecer uma ponte terrestre ligando a Crimeia ao leste russo da Ucrânia.

Até antes da guerra, o único acesso terrestre da Rússia à área anexada era a gigantesca ponte rodoferroviária da Crimeia, inaugurada por Putin ao volante de um caminhão em 2018. Mas a península sofria dificuldades, com seu acesso a água potável cortado pela Ucrânia —as tropas russas agora explodiram a represa que impedia o fornecimento.

Mariupol fica a noroeste, a 150 km da principal cidade do sul russo, Rostov-do-Don. Ela foi atacada desde o primeiro dia da guerra e é um porto importante no mar de Azov, uma divisão secundária do mar Negro. Quase 90% da produção mundial de gás neon passa por ali, por exemplo.

Folha conseguiu um rápido contato com um morador da cidade nesta manhã de quarta (2), já quase meio-dia por lá. Ele, que não permite ser identificado, afirmou que sua família conseguiu fugir para Rostov-do-Don na sexta (25), quando os bombardeios apenas começavam.

Segundo seu relato, a cidade está com a comunicação intermitente, explosões por todos os lados e moradores escondidos em porões e abrigos. Ninguém sabe o que está acontecendo direito, mas supõe que os russos estão prestes a tomá-la.

Se cair, a região toda vai junto, e a ponte estará formada. Este é o sonho dos nacionalistas mais radicais russos que, em 2014, queriam que Putin anexasse o Donbass e fizesse exatamente o que parece estar fazendo agora, criando uma fantasiosa região chamada Novarrossia, ou Nova Rússia.

À época, o presidente russo se contentou com a anexação da Crimeia, de resto uma região historicamente parte da Rússia, e em fomentar a guerra civil que mantinha a Ucrânia afastada da viabilidade como Estado pleno. Logo, impedida de entrar na Otan, a aliança militar ocidental, e na União Europeia.

Esse são os dois objetivos estratégicos de Putin, pelos quais ele mobilizou quase 200 mil de seus 900 mil soldados em quatro meses em torno do vizinho. Exigiu que os Estados Unidos, como país-líder do Ocidente, se comprometesse a não expandir a Otan, sua obsessão geopolítica desde que Washington traiu as promessas de manter algum equilíbrio na Europa após o fim da União Soviética.

Obviamente isso seria inaceitável, e o Ocidente começou a denunciar a invasão. Praticamente todos os analistas mais ponderados afirmavam não acreditar na possibilidade, dado que seria ilógico a Putin empregar brutalidade contra o povo que diz ser irmão do russo.

"Concluí que a invasão era um blefe criado para a oportunidade de um golpe brando [contra a Ucrânia]. Não ataquei minha própria teoria, fracassei em ver sua fraqueza. Ignorei dados contrários à minha posição. Desculpem-me", escreveu o papa da geopolítica americana, George Friedman, a seus clientes da consultoria Geopolitical Futures.

Ao norte, a noite manteve a rotina de ataques isolados a posições em torno de Kiev e Kharkiv, com um crescente relato de baixas civis. A noção de que um cerco substancioso, não os ataques do tipo "atire e corra" da primeira fase da guerra, está se formando em torno da capital está cristalizada.

Se é para de fato usar todo o poder de fogo à disposição, obliterando Kiev como os nazistas fizeram em 1941, ou para tentar forçar a rendição do governo, essa é a dúvida. O presidente do país, Volodimir Zelenski, voltou a dizer que vai resistir e que espera um ataque brutal nas próximas horas ou dias.

O Pentágono disse a repórteres americanos que a grande coluna blindada que vem da Belarus em direção a Kiev segue parada, mas a essa altura isso parece mais um sinal de preparação do que de problemas logísticos com combustível. O Ministério da Defesa russo afirmou que as linhas nas suas quatro frentes estavam regularizadas.

O que a pasta não respondeu, nem o Kremlin, foi acerca das óbvias baixas russas. Zelenski fala em 6.000 mortos, o que é impossível de aferir, mas Moscou só confirma que há vítimas. Do lado civil ucraniano, os números estão na casa das centenas, mas podem ser mais.

Depois de muito vaivém, o governo em Kiev anunciou que irá conversar nesta quarta-feira com a delegação russa que está na Belarus para discutir a guerra na Ucrânia. O encontro, o segundo entre os dois países, havia sido adiado, mas agora foi reconfirmado —até segunda ordem, ao menos.

A Ucrânia suspeita que os russos só estão ganhando tempo. O seu negociador-chefe, por exemplo, é Vladimir Medinski, um ex-ministro da Cultura sem experiência alguma em diplomacia e conflito.​

No campo econômico, a pressão sobre Moscou só faz crescer. Nesta quarta, o maior banco do país teve de fechar suas atividades da Europa. Na véspera, a empresa formada na Suíça para gerir os contratos do megagasoduto Nord Stream 2, que foi suspenso pela Alemanha como retaliação apesar da dependência germânica de gás natural russo, faliu.

 

- Russos voltam a atacar Kharkiv e dizem terem tomado Kherson

Apesar do avanço das negociações, o 7º dia da guerra na Europa começou com fortes ofensivas russas em território ucraniano. Na manhã desta 4ª feira (2.mar.2022), um dos principais alvos das tropas do presidente Vladimir Putincontinua sendo Kharkiv, 2ª maior cidade da Ucrânia, que sofre com ofensivas pesadas desde o fim de semana.

O exército ucraniano disse, pelo Telegram, que paraquedistas russos pousaram em Kharkiv na madrugada desta 4ª feira (22.mar). Pelo menos 2 prédios pegaram fogo e parte de 1 deles desabou. Assista (57s): 

Oleg Synegubov, comandante das forças ucranianas em Kharkiv, informou que 21 pessoas morreram e 112 ficaram feridas em bombardeios na cidade nas últimas 24 horas. Pouco depois, o Serviço de Emergências ucranianoacrescentou 4 mortes à conta.

Segundo o Exército, 1 centro médico militar e a sede da polícia foram atingidos.

KIEV

As tropas russas também se aproximam da capital Kiev, disse o prefeito Vitali Klitschko em um vídeo publicado no Facebook. Ele afirmou que uma igreja foi atingida e combates foram registrados em cidades próximos. O prefeito falou que as autoridades defenderão a capital e pediu à população ucraniana que “não percam a resistência”.

O Exército ucraniano avisou que tropas russas se preparam para cercar as principais cidades do país, incluindo Kiev. Imagens via satélite mostram a aproximação de um enorme comboio.

Explosões foram reportadas na capital e em cidades próximas pelo jornal local Kyiv Independent. Sirenes de aviso de ataques aéreos soaram em Kiev nesta madrugada.

KHERSON

O Ministério da Defesa da Rússia disse ter tomado o controle da cidade de Kherson, ao sul da Ucrânia, nesta 4ª feira (2.mar). A informação é da agência de notícias russa RIA. Autoridades ucranianas admitem o cerco, mas negam o controle.

As divisões russas das Forças Armadas tomaram o controle total do centro regional de Kherson”, falou o porta-voz do ministério da Defesa, Igor Konashenkov.

Kherson tem mais de 250 mil habitantes e fica ao norte da Crimeia.

USINA NUCLEAR

Moradores de Enerhodar, no sul da Ucrânia, formaram uma barricada, nesta 4ª feira (2.mar), para tentar impedir a entrada de tropas russas. A usina nuclear de Zaporizhzhia, a maior da Europa, fica na cidade. 

A AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) alertou para a chegada do Exército russo na região, mas garantiu a segurança dos reatores.

MARIUPOL

A Câmara legislativa de Mariupol disse que a cidade está sob controle da Ucrânia, mas há intensas batalhas com tropas russas. Segundo as autoridades locais, o Exército da Rússia atacou bairros residenciais, hospitais e dormitórios de pessoas que tiveram que deixar suas casas.

EXERCÍCIOS NUCLEARES

A Frota do Norte da Rússia informou em comunicado, na 3ª feira (1º.mar), que submarinos nucleares russos estão realizando exercícios no Mar de Barents para “treinar manobras em condições de tempestade”.

Segundo a Associated Press, citando o comunicado, na região de Irkutsk, leste da Sibéria, unidades das Forças de Mísseis Estratégicos dispersaram lançadores de mísseis balísticos intercontinentais em florestas.

O Ministério da Defesa não informou se os exercícios estão relacionados com a ordem de Putin, de domingo (27.fev), para colocar o arsenal nuclear do país em estado de alerta.

 

- Rússia x Ucrânia: Maior banco russo anuncia saída do mercado europeu

Saída do mercado europeu se deu diante das sanções ocidentais contra a Rússia Imagem: Christophe Coat/EyeEm/Getty Images

O Sberbank, principal banco da Rússia, anunciou hoje a saída do mercado europeu, diante das duras sanções ocidentais que enfrenta em represália pela invasão da Ucrânia.

"Na situação atual, o Sberbank decidiu se retirar do mercado europeu", afirmou o banco em um comunicado divulgado por agências de notícias russas.

As filiais europeias do banco enfrentam "saídas irregulares de fundos e ameaças à segurança de seus funcionários e agências", acrescentou o comunicado.

O banco está presente em oito países europeus: Alemanha, Áustria, Croácia, República Tcheca, Hungria, Eslovênia, Sérvia e Bósnia e Herzegovina.

"As filiais (europeias) do Sberbank dispõem de um nível elevado de capital e ativos, e os fundos dos clientes estão garantidos, de acordo com as legislações locais", afirmou o banco.

A filial do Sberbank na Suíça não está envolvida, disse em um comunicado Polina Trizonova, diretora de comunicação do banco. "A filial do Sberbank na Suíça não faz parte do grupo Sberbank Europa. O banco na Suíça continua funcionando normalmente", afirmou.

As sanções da União Europeia buscam impedir que os bancos russos tenham acesso aos mercados internacionais de capitais.

Fonte: Folha - Poder360