Bianca Fraccalvieri – Vatican News
Na manhã desta sexta-feira, o Papa Francisco celebrou a primeira missa desta sua 35ª Viagem Apostólica.
No estádio GSP de Nicósia, cerca de 10 mil fiéis se reuniram para participar da celebração.
Em sua homilia, o Pontífice comentou o Evangelho proposto pela liturgia do dia, que narra a cura de Jesus a dois cegos. Deste encontro, o Papa destacou três passos significativos neste caminho de Advento.
O primeiro passo: ir ter com Jesus para ser curado. Os cegos perceberam que Ele, na escuridão da história, é a luz que ilumina as noites do coração e do mundo, derrota as trevas e vence toda a cegueira.
“Como sabemos, também nós trazemos a cegueira no coração. Também nós, como os dois cegos, somos caminhantes muitas vezes imersos nas trevas da vida.”
Mas Jesus é o médico, recordou Francisco: só Ele nos dá em abundância luz, calor, amor. Só Ele liberta o coração do mal.
Já o segundo passo é suportar, juntos, as feridas. Nesta narração evangélica, os cegos são dois. E juntos dizem a Cristo: “tem misericórdia de nós”.
“Eis o sinal eloquente da vida cristã, eis o traço distintivo do espírito eclesial: pensar, falar, agir como um «nós», saindo do individualismo e da pretensão de autossuficiência que fazem adoecer o coração.”
O pecado desvirtua a realidade: faz-nos ver Deus como patrão e os outros como problemas. Mas Francisco convidou a renovar a fraternidade: “A cura verifica-se quando carregamos juntos as feridas, quando enfrentamos juntos os problemas, quando nos ouvimos e conversamos. É a graça de viver em comunidade”.
E eis o terceiro passo: anunciar o Evangelho com alegria. Jesus recomenda aos dois cegos curados que não digam nada a ninguém, mas eles não conseguem conter o entusiasmo.
“E aqui está outro sinal distintivo do cristão: a alegria do Evangelho, que é irreprimível”, afirmou Francisco, que acrescentou: “Não se trata de proselitismo, mas de testemunho; nem dum moralismo que condena, mas de misericórdia que abraça; nem de culto exterior, mas de amor vivido”.
Para o Papa, há necessidade de cristãos iluminados, mas sobretudo luminosos, que toquem com ternura a cegueira dos irmãos: “Cristãos que plantem rebentos de Evangelho nos campos áridos da vida quotidiana, levem carícias às solidões do sofrimento e da pobreza”.
Que neste Advento, concluiu o Pontífice, possamos renovar a confiança Nele, que passa também pelas estradas de Chipre; que possamos invocar: Vem, Senhor Jesus!
- Papa saúda comunidade ortodoxa e pede gestos audazes rumo à comunhão
Bianca Fraccalvieri – Vatican News
"Chipre, que já é uma ponte entre Oriente e Ocidente, seja também uma ponte entre o Céu e a terra."
Foi sob o signo do ecumenismo que o Papa Francisco iniciou seu segundo dia em terras cipriotas, realizando uma visita ao Arcebispado ortodoxo de Nicósia, a convite da Sua Beatitude Chrysostomos II.
De fato, ambas as igrejas têm uma origem apostólica comum: antes de chegar a Roma, Paulo passou por Chipre. Portanto, afirmou o Papa, “descendemos do mesmo ardor apostólico e interliga-nos um único caminho: o do Evangelho”.
Assim como fez em sua chegada a Chipre, diante da comunidade católica, Francisco dedicou seu discurso ao apóstolo cipriota Barnabé, cujo nome significa ao mesmo tempo "filho da consolação" e "filho da exortação".
“Para ser filhos da consolação, antes de dizer algo, é preciso ouvir, deixar-se questionar, descobrir o outro, compartilhar. Pois o Evangelho transmite-se por comunhão”, afirmou o Papa, que fez uso de uma palavra atual na Igreja: sinodalidade.
“É isto que nós, como católicos, desejamos viver nos próximos anos, redescobrindo a dimensão sinodal, constitutiva do ser Igreja.” Neste aspecto, o Pontífice afirmou contar com a experiência dos ortodoxos.
A propósito da vivência que une as duas Igrejas, o Papa citou o trabalho da Comissão Mista Internacional para o Diálogo Teológico. Mas não só: manifestou sua solidariedade diante de todas as alegrias e tristezas que devem enfrentar e encorajou a prosseguir no caminho rumo à unidade com a coragem do despojamento:
“Não nos deixemos paralisar pelo temor de nos abrir e realizar gestos audazes; não apoiemos aquela «incompatibilidade das diferenças» que não está prevista no Evangelho.”
Para Francisco, é preciso deixar de lado teorias abstratas e trabalhar juntos lado a lado, por exemplo, no campo da caridade, da educação e da promoção da dignidade humana:
“Também hoje não faltam falsidades e enganos que o passado coloca diante de nós e que atrapalham o caminho. Séculos de divisão e distanciamento fizeram-nos assimilar, mesmo involuntariamente, não poucos preconceitos hostis a respeito dos outros. (...) Mas tudo isto desvirtua o caminho de Deus, que tende para a concórdia e a unidade.”
Portanto, é preciso deixar-se inspirar por Barnabé, Paulo, Marcos e inumeráveis santos que passaram por esta terra. Eles “impelem a navegar juntos rumo ao porto por que todos suspiramos. Lá de cima, convidam a fazer de Chipre, que já é ponte entre Oriente e Ocidente, uma ponte entre o Céu e a terra”.
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Benedetta Capelli - Cidade do Vaticano
O segundo dia de Francisco na ilha começa com uma visita de cortesia a Sua Beatitude Chrysostomo II, no Palácio do Arcebispado Ortodoxo de Chipre. Um dia, marcado pelo ecumenismo.
Sorrisos e cordialidade marcam o encontro realizado em uma dimensão privada. De fato, após as primeiras imagens com as saudações entre os dois líderes religiosos, as lentes das câmaras deslocam o foco para o lado externo do prédio. Após o colóquio privado, os dois assinam o Livro de Honra, onde Francisco deixa a seguinte mensagem:
“Peregrino em Chipre, pérola de história e de fé, invoco de Deus a humildade e a coragem para caminharmos juntos rumo à plena unidade e dar ao mundo, a exemplo dos Apóstolos, uma mensagem fraterna de consolação e um testemunho vivo de esperança”
“Beatitude, obrigado por ter falado da Igreja Mãe, em meio ao povo. Esta - escreve o Papa no Livro de Honra - é o caminho que nos unge como pastores. Avancemos juntos por este caminho. E muito obrigado por ter falado do diálogo. Devemos seguir sempre pelo caminho do diálogo, um caminho difícil, paciente e seguro, um caminho de coragem. Paresia e paciência”.
Após a assinatura do Livro de Honra, o Papa Francisco dirige-se à Catedral ortodoxa para se encontrar com o Santo Sínodo junto com Sua Beatitude Chrysostomos II (no século Irodotos Dimitriou), arcebispo de Nova Justiniana e de todo o Chipre.
A mais alta autoridade ortodoxa de Chipre nasceu em Tala (Paphos) em 10 de abril de 1941. Ordenado diácono em 3 de novembro de 1963, estudou na Escola Teológica da Universidade de Atenas de 1968 a 1972. Foi ordenado sacerdote em 12 de novembro de 1972 pelo então arcebispo de Chipre Makarios III. De 1972 a 1978 exerceu o ministério de Hegumen do Mosteiro de São Neófitos em Paphos. Em 26 de fevereiro de 1978, foi eleito metropolita de Paphos, função que ocupou até sua eleição como arcebispo de Nuova Justiniana e de todo o Chipre em outubro de 2006.
Ele havia representado o Santo Sínodo da Igreja Ortodoxa de Chipre no funeral de São João Paulo II, em 8 de abril de 2005, e na Missa de início de Pontificado de Bento XVI, no dia 24 de abril seguinte. Em resposta a este gesto fraterno, Bento XVI enviou uma delegação à cerimônia de entronização de Chrysostomos II na Catedral de Lefkosia. Posteriormente, Sua Beatitude se encontrou com Bento XVI em três ocasiões: em 16 de junho de 2007, quando foi recebido em audiência no Vaticano e assinou com o Pontífice uma Declaração conjunta; em 5 de junho de 2010, por ocasião da Viagem Apostólica do Papa a Chipre, que lhe entregou o Instrumentum laboris da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para o Oriente Médio, realizada em outubro daquele ano, e por fim em 28 de março de 2011, novamente no Vaticano.
- O Papa: Chipre, uma pérola de grande valor no coração do Mediterrâneo
Mariangela Jaguraba - Vatican News
O segundo discurso do Papa Francisco em terras cipriotas foi dirigido às Autoridades, à Sociedade Civil e ao Corpo Diplomático no Salão Cerimonial do Palácio Presidencial, em Nicósia, na tarde desta quinta-feira (02/12).
"Chipre, encruzilhada de civilizações, traz em si a vocação inata ao encontro, favorecida pelo caráter acolhedor dos cipriotas", disse Francisco no início de seu discurso, recordando que de Chipre, "onde se encontram Europa e Oriente, começou a primeira grande inculturação do Evangelho no continente". "Com profunda emoção percorro os passos dos grandes missionários das origens, em particular de São Paulo, São Barnabé e São Marcos", frisou o Papa, recordando que está entre os cipriotas como "peregrino" e que "os primeiros cristãos deram ao mundo, com a força suave do Espírito, uma mensagem de beleza sem precedentes": "A surpreendente novidade da bem-aventurança ao alcance de todos que conquistou os corações e a liberdade de muitos. Este país possui uma herança particular em tal sentido, como mensageiro de beleza entre os continentes".
Segundo Francisco, "Chipre refulge de beleza no seu território, que deve ser protegido e salvaguardado com oportunas políticas ambientais concordadas com os vizinhos". "Uma pérola de grande valor no coração do Mediterrâneo", disse ainda o Papa.
De igual modo a beleza desta terra deriva das culturas que se cruzaram e misturaram ao longo dos séculos. Mesmo hoje a luz de Chipre tem muitas tonalidades: muitos são os povos e as raças que, com cores diferentes, compõem a gama cromática desta população. Penso também na presença de muitos imigrantes, a percentagem mais significativa entre os países da União Europeia.
"Uma pérola gera a sua beleza em circunstâncias difíceis. Nasce na obscuridade, quando a ostra «padece» depois de ter sofrido uma visita inesperada que mina a sua incolumidade, como, por exemplo, um grão de areia que a irrita. Para se proteger, reage assimilando aquilo que a feriu: envolve o que é perigoso e estranho para ela e transforma-o em beleza, numa pérola", disse Francisco, acrescentando:
A pérola de Chipre viu-se obscurecida pela pandemia, que impediu muitos visitantes de entrar e ver a sua beleza, agravando – como noutros lugares – as consequências da crise econômico-financeira. Neste período de retoma, porém, não há de ser a ânsia de recuperar o perdido que pode garantir um desenvolvimento sólido e duradouro, mas o empenho em promover a sanidade da sociedade, particularmente através duma decidida luta à corrupção e às pragas que lesam a dignidade da pessoa; penso, por exemplo, no tráfico de seres humanos.
"Mas a ferida que mais faz sofrer esta terra, é causada pela terrível laceração que padeceu nas últimas décadas", disse ainda o Papa, recordando o "sofrimento interior de quantos não podem voltar para as suas casas e locais de culto".
Rezo pela vossa paz, pela paz de toda a ilha, e almejo-a com todas as forças. O caminho da paz, que sara os conflitos e regenera a beleza da fraternidade, está marcado por uma palavra: diálogo. Devemos ajudar-nos a crer na força paciente e serena do diálogo, haurindo-a das Bem-aventuranças. Sabemos que não é uma estrada fácil; é longa e tortuosa, mas não há alternativa para se chegar à reconciliação. Alimentemos a esperança com a força dos gestos, em vez de esperar em gestos de força.
A propósito de diálogo, o Pontífice manifestou apreço pelo Caminho Religioso do Processo de Paz de Chipre, promovido pela Embaixada da Suécia, a fim de cultivar o diálogo entre os líderes religiosos, e reiterou a não deixar prevalecer o ódio, não desistir de curar as feridas, não esquecer a situação das pessoas desaparecidas.
Segundo o Papa, "quando vier a tentação de desanimar", é melhor pensar "nas gerações futuras, que desejam herdar um mundo pacificado, colaborador, coeso, não habitado por rivalidades perenes e poluído por disputas não resolvidas". "Para isso serve o diálogo", ressaltou Francisco, "sem o qual crescem a suspeita e o ressentimento", e citou como exemplo o "Mediterrâneo, agora lugar infelizmente de conflitos e tragédias humanitárias; na sua beleza profunda, é o mare nostrum, o mar de todos os povos que se banham nele para estar ligados, não divididos. Chipre, encruzilhada geográfica, histórica, cultural e religiosa, tem esta posição para implementar uma ação de paz. Seja um estaleiro aberto de paz no Mediterrâneo".
O Papa concluiu o seu discurso, ressaltando que "o continente europeu precisa de reconciliação e unidade", e convidando a olhar para a história de Chipre e ver que "o encontro e o acolhimento deram frutos benéficos a longo prazo: não só no que se refere à história do cristianismo, para a qual Chipre foi «a rampa de lançamento» no continente, mas também para a construção duma sociedade que encontrou a sua riqueza na integração. Este espírito de alargamento, esta capacidade de olhar para além das próprias fronteiras rejuvenesce, permite reencontrar o brilho perdido".
Fonte: Vatican News