Cotidiano

Exposição na COP-26 volta olhar sobre povos da Amazônia





A partir da próxima segunda-feira (1º) os participantes da Conferência do Clima (COP26) poderão conhecer um pouco mais das faces e cores que compõem a diversidade da Amazônia.  É que durante a conferência, mais precisamente no espaço Brazil Climate Hub  (que vai promover uma série de eventos ligados à pauta da justiça climática, políticas financeiras sustentáveis e à preservação da biodiversidade), estará em cartaz a exposição "Para quem está por vir".

Educação Escolar Indígena
Licenciatura Intercultural Indígena, por Nailana Thiely/ASCOM

Com curadoria de Eduardo Carvalho e Vanessa Gabriel-Robinson, a mostra trará 13 fotografias que mostram a população negra, indígena, urbana e ribeirinha da Amazônia. Os fotógrafos da região  Bruno Kelly, Marcela Bonfim e Nailana Thielly são os responsáveis pelas imagens que são uma forma de ajudar o público a refletir sobre a importância de manter esse ecossistema vivo, minimizar os impactos de sua exploração, mas principalmente sobre a diversidade cultural do local.

“A ideia principal era convidar artistas visuais contemporâneos da região e mostrar um outro olhar sobre a Amazônia. Um olhar jornalístico, local, em que as comunidades fossem protagonistas. Esses profissionais conhecem a realidade social, cultural e econômica de seus estados, e entendem a importância de retratar as comunidades considerando suas diferenças, sua diversidade, a maneira como se relacionam com seu ambiente.”, explica Vanessa, que também é natural da região.

Amazônia humana

“Decidimos evitar mostrar os problemas para mostrar a Amazônia humana”, disse Carvalho. Segundo ele, uma Amazônia urbana, indígena, preta, ribeirinha e feminina, que luta para preservar seus conhecimentos tradicionais, ao mesmo tempo que quer se beneficiar daquilo que a modernidade traz de positivo. “Uma Amazônia que tem voz e que quer ser ouvida. Que deseja transmitir para as futuras gerações – aqueles que ainda virão, como diz o nome da exposição – os segredos, as cosmogonias, as tradições, as relações com a natureza”.

Para Vanessa embora a região figure em diversos debates ninguém realmente se atenta e dá voz aos povos que lá habitam - que ficam alheios a essas discussões ou até mesmo não têm espaço para promover seu trabalho, por exemplo. “Sem escutar essas pessoas, sem dar espaço para a arte produzida na região, a discussão sobre o futuro da Amazônia nunca será completa”, diz.

A couple smiles from their house in the Nazaré community, district of Porto Velho, capital of Rondônia. Marcela Bonfim_2014.jpg

 

Um casal sorri em casa na comunidade de Nazaré - Marcela Bonfim/Direitos reservados

- Cobrança por metas mais ambiciosas e financiamento deve marcar COP26

Chefes de Estado e representantes de mais de 190 países se reúnem entre hoje (31) e 12 de novembro em Glasgow, na Escócia, para discutir os compromissos firmados para reduzir a emissão de gases do efeito estufa e frear o aquecimento global. O encontro é a 26ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26) e ocorre sob o alerta de pesquisadores e ambientalistas de que as metas propostas para enfrentar o problema precisam ser mais ambiciosas para evitar consequências mais extremas das mudanças climáticas.

Para a Organização das Nações Unidas (ONU), as conclusões do último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), divulgado em agosto, devem servir de alerta vermelho sobre o uso de energias fósseis. Elaborado por 234 autores de 66 países, o estudo mostrou que, nos últimos 50 anos, a influência humana levou o planeta à trajetória de aquecimento mais rápida em 2 mil anos e já produziu uma temperatura média que supera o período pré-industrial em mais de 1 grau Celsius (°C). As consequências dessa variação média incluem a maior frequência de eventos extremos como ondas de calor e frio intensos, incêndios, temporais e ciclones.

As mudanças já provocadas no ambiente desafiam o principal compromisso internacional para conter o aquecimento global, o Acordo de Paris, que prevê desde 2015 que o aumento da temperatura até 2100 deve ser limitado a 1,5°C. Integrante da equipe de especialistas responsável pelo IPCC, a vice-diretora do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), Suzana Kahn, explica que, mesmo quando as emissões forem reduzidas, levará décadas para que a temperatura do planeta comece a baixar, o que torna os próximos anos essenciais para atingir a meta em 2100.

“Se a gente está falando desse aumento de temperatura de 1,5 a 2 graus até 2100, 1 grau já foi”, alerta ela. “A mudança da temperatura é um dos indicadores, mas também a mudança do regime de chuvas, a desertificação em algumas áreas, o degelo de geleiras, a elevação do nível do mar, a mudança nas correntes marítimas. São vários problemas que estão acontecendo e que assustam as pessoas. Isso torna a questão mais presente para a população.”

Metas ambiciosas

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), os compromissos anunciados até o momento pelos países para 2030 são insuficientes e apontam para um mundo 2,7 graus mais quente em 2100. Orelatório Lacuna de Emissões 2021, publicado pelo órgão na última semana semana, destacou que seria preciso reduzir as emissões em 55% do que já está previsto nos compromissos nacionais para ajustar a rota em direção ao aquecimento limite de 1,5 grau.

Os pesquisadores mostram que Argentina, Canadá, União Europeia, África do Sul, Reino Unido e Estados Unidos foram os únicos membros do G20 que conseguiram apresentar em 2020 e 2021 promessas mais ambiciosas que os compromissos anteriores, enquanto China, Japão e Coreia do Sul fizeram anúncios na mesma direção, mas não os entregaram formalmente. Já Brasil e México foram os únicos membros do G20 que aumentaram a previsão de emissões em relação ao que prometiam reduzir até 2030, segundo o relatório.

Nesse cenário, a pesquisadora acredita que o Brasil será cobrado a dar uma resposta mais firme ao crescimento do desmatamento. “A gente ainda tem uma matriz energética favorável e muito limpa, apesar de que a gente já foi melhor e estamos cada vez mais incluindo termelétricas. Nosso maior problema é a questão da floresta, do desmatamento. A gente começou a reverter uma tendência positiva que tínhamos desde 2005 em que começamos a reduzir muito o desmatamento, e, de uns anos para cá, só piora, então vai ser cobrado muito isso.”

Presidente do Instituto Talanoa, Natalie Unterstell participou da construção do relatório Clima e Desenvolvimento: Visões para o Brasil 2030, que une especialistas e lideranças brasileiras que defendem que o país assuma compromissos mais ambiciosos para conter as mudanças climáticas. Para o grupo, a meta brasileira deveria ser de reduzir as emissões em, ao menos, 66%, em vez dos 43% atuais. A necessidade de buscar maiores reduções nas emissões também foi defendida por especialistas que participaram de uma audiência na Câmara dos Deputados nesta semana. Natalie Unterstell avalia que a cobrança por propostas mais contundentes será um dos três grandes eixos da conferência, que terá também as discussões sobre o mercado de carbono e o financiamento do controle de emissões como pontos centrais.

“Todos os países vão ser muito cobrados politicamente, porque a gente ainda tem essa diferença entre o necessário e o proposto, e, para o Brasil, esse é um ponto muito sensível, porque propusemos uma meta que está sendo considerada ruim”, afirma ela.

No início deste mês, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, anunciou que o país vai apresentar na COP26 o objetivo de zerar o desmatamento ilegal até 2030, o que poderá levar a uma redução de 50% das emissões. Em entrevista ao programa A Voz do Brasil na última quarta-feira (27), o ministro adiantou um pouco de qual será o posicionamento do Brasil na conferência global e afirmou crer que o país chegará à economia verde antes de outras nações.
 
“O Brasil vai buscar consenso em temas relevantes, como o financiamento climático. Esse problema tem que ser reconhecido. Encontrada a solução, nada melhor que um crescimento verde, para que a gente faça uma transição para uma economia verde - neutra em emissões até 2050, como é a meta brasileira”, afirmou Joaquim Leite. “Temos uma pressão internacional, mas não é verdade. O Brasil cuida sim das suas florestas, em especial os recursos naturais. Temos a maior biodiversidade, uma das maiores áreas oceânicas do mundo e de florestas nativas. Isso são vantagens competitivas no mercado mundial.”

Financiamento

Natalie Unterstell avalia que, durante a conferência, voltará à mesa de negociações a cobrança aos países ricos pelo não cumprimento das promessas de financiamento das ações em países pobres e vulneráveis, já que as nações desenvolvidas foram as primeiras a se industrializar e emitiram mais gases de efeito estufa ao longo da história.

“Temos uma dívida dos países ricos de US$ 100 bilhões de por ano [para financiar ações em países pobres]. Eles estão chegando na casa dos US$ 80 bilhões, mas estão longe do ideal. Isso também vai ser cobrado lá”, descreve ela, que acrescenta que disponibilizar esses recursos é um desafio interno para esses países. “Quando a gente fala que os países ricos têm que pagar para os países pobres, a gente tem que pensar que são os contribuintes, os pagadores de impostos desses países que têm que chegar ao consenso em seus parlamentos e sociedades de que vão pagar essa conta, e está todo mundo tentando sair da pandemia e endividado. Então, é uma questão complexa.”

Suzana Kahn acredita que será uma grande frustração caso a conferência não consiga avançar na regulamentação do mercado de carbono, que estava previsto no Acordo de Paris e ainda não teve suas regras estabelecidas. No mercado de carbono, um país que superou sua meta de redução de emissões pode vender uma “permissão” equivalente a esse excedente para outro país que não conseguiu atingir o compromisso estabelecido. As regras para que essa transação ocorra, porém, ainda geram discordância na comunidade internacional.

“É complexo e é caro, porque você tem que fazer uma contabilidade e precisa verificar”, explica a professora da UFRJ. “Eu não só tenho que acompanhar e monitorar minhas emissões, como tenho que ter minhas contas totalmente abertas e transparentes, porque elas devem ser verificadas por organismos internacionais”, destaca.

A vice-diretora da Coppe/UFRJ compara que, assim como a pandemia de covid-19, as mudanças climáticas são um desafio global, em que o esforço de um país não basta enquanto não houver um controle do problema em todo o mundo. Nesse sentido, a crise sanitária pode se tornar um elemento a mais para dificultar a redução das emissões. “Há quem diga que, se é para retomar o crescimento, que se retome da melhor maneira possível, de uma maneira mais sustentável. Mas nem sempre é isso que acontece. A crise econômica acaba fazendo que você opte pelo caminho mais fácil para sair da crise.”

Para Natalie Unterstell, as crises geradas pela pandemia vão tornar ainda mais importante a discussão sobre como financiar a transição dos países pobres para uma economia com menos emissões. “Os países pobres estão ainda mais endividados, então, além de terem que lidar com a pandemia, a restauração das economias e as vacinas, precisam lidar com eventos extremos e riscos futuros. É uma conta muito pesada, e a questão do financiamento vai girar em torno disso, de como a gente alivia a barra desses países ultra vulneráveis.”

Fonte: Agência Brasil