Política

7/9: Moraes bloqueia contas de acusados de organizar atos antidemocráticos





Na véspera dos atos pró-governo Bolsonaro marcados para o dia 7 de setembro, dia da Independência do Brasil, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes bloqueou contas bancárias ligadas a investigados por organizarem protestos "criminosos e violentos" marcados para o feriado, além de ordenar a prisão preventiva de duas pessoas acusadas de ameaçar integrantes da Corte. Segundo o magistrado, o bloqueio visa "coibir eventual financiamento dos atos antidemocráticos marcados para o próximo dia 7 de setembro".

As decisões foram tomadas entre anteontem (4) e ontem (5), após pedidos da PGR (Procuradoria-Geral da República), dentro do inquérito que "apura a convocação da população, por meio das redes sociais, a praticar atos criminosos e violentos de protesto, às vésperas do feriado de 7/9/2021, durante uma suposta manifestação e greve de 'caminhoneiros'", diz Moraes nas decisões.

O ministro mandou bloquear as chaves PIX e contas bancárias da AprosojaNacional (Associação Brasileira dos Produtores de Soja) e da Aprosoja de Mato Grosso (Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso), entidades investigadas sob suspeita de financiarem a realização de manifestações antidemocráticas no feriado de 7 de setembro. Também foram bloqueados saques de eventuais fundos em que os CNPJs dessas duas entidades tenham participação.

Segundo Moraes, apesar das medidas cautelares adotadas em decisão anterior contra vários investigados — entre eles o cantor Sérgio Reis e o deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ), entre outros — por divulgarem "mensagens, agressões e ameaças contra a Democracia, o Estado de Direito e suas Instituições", a PGR apontou que pessoas jurídicas seriam usadas para receber o dinheiro destinado ao "financiamento dos investigados e de atos antidemocráticos".

"Verifico a pertinência das medidas requeridas pelo Ministério Público, notadamente em razão da ausência de informações acerca do emprego desses recursos. Com fundamento no poder geral de cautela, necessária a adoção de medidas cautelares de cunho patrimonial para coibir eventual financiamento dos atos antidemocráticos marcados para o próximo dia 7 de setembro", disse Moraes na decisão do bloqueio de contas.

Moraes também determinou operação de busca e apreensão em domicílios de Gilmar João Alba, prefeito de Cerro Grande do Sul (RS), que foi flagrado no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com R$ 505 mil em dinheiro na bagagem. O ministro ainda ordenou à PF (Polícia Federal) que colha esclarecimentos do prefeito sobre o valor apreendido. Segundo os agentes, o dinheiro estava armazenado em caixas de papelão dentro da bagagem de mão, que pegava um voo fretado com destino a Brasília.

Os alvos das prisões preventivas são Marcio Giovani Niquelatti, um professor de Santa Catarina que apoia Bolsonaro e é conhecido nas redes sociais como Professor Marcinho; e Cássio Rodrigues de Souza, ex-policial militar de Minas Gerais.

O advogado de Niquelatti, Silvano Antunes, disse que pediu a revogação da prisão preventiva e que não teve acesso ao inquérito até o momento. O próximo passo, segundo ele, será um pedido de habeas corpus.

UOL entrou em contato com a Aprosoja nacional e a Aprosoja de Mato Grosso, e aguarda resposta. A reportagem também busca contato com os outros citados para saber se querem comentar as decisões de Moraes.

Em entrevista à rádio Gaúcha na sexta (3), o prefeito Gilmar João Alba disse que não era "obrigado" a responder sobre a origem do dinheiro, mas negou que a verba seria destinada ao financiamento das manifestações.

Busca e apreensão na Aprosoja

Moraes autorizou busca e apreensão de documentos na sede nacional da Aprosoja, em Brasília, e na sede da associação no Mato Grosso, em Cuiabá.

Na decisão, o ministro recupera informações sobre o inquérito que investiga alguns bolsonaristas por financiamento de atos antidemocráticos no dia 7 de setembro. Antônio Galvan é presidente da Aprosoja nacional e já presidiu a Aprosoja-MT. Ele já foi alvo de busca e apreensão em outras ocasiões.

Moraes argumenta que a estrutura e a receita das associações podem ter sido utilizadas para inflar os atos. Por isso, o ministro bloqueou saques das contas bancárias das associações até a quarta-feira.

O magistrado ainda determinou que sejam identificados e informados os valores transferidos a partir das contas bancárias das duas associações para outras entidades ou terceiros desde 10 de agosto, com valor mínimo de R$ 10.000,00. A medida também vale para fundos em que as empresas tenham participação.

Prisões preventivas

No pedido de prisão de Marcio Niquelatti, a PGR cita uma transmissão ao vivo nas redes sociais da qual Niquelatti participou e disse que um empresário estaria oferecendo recompensa "pela cabeça do Alexandre de Moraes. "Vivo ou morto, querem trazer ele [..] Agora no Brasil vai ser assim, vai ter prêmio pela cabeça deles", afirmou.

"O discurso do citado interlocutor, além de ultrapassar todo e qualquer limite que possa vir a ser conferido ao exercício constitucional da liberdade de expressão, possui nítidos contornos criminosos", diz o documento.

Moraes acatou o pedido, e além da prisão, determinou o bloqueio dos perfis nas redes sociais de Niquelatti e dos demais participantes da live.

Já no caso de Cássio Rodrigues Costa Souza, a PGR identificou ameaças de morte feitas por ele a Moraes depois da ordem de prisão contra o bolsonarista Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão e que se apresenta como líder de caminhonheiros — o que é questionado dentro da própria categoria.

"Está absolutamente demonstrada a necessidade de decretação da prisão, notadamente para a garantia da ordem pública", diz Moraes na decisão após descrever as ameaças de morte. O ministro também ordenou o bloqueio dos perfis de Souza nas redes sociais.

Em SP, ameaças acabaram em delegacia

Na madrugada de sexta (3), ameaças e insultos ao ministro Alexandre de Moraes por pessoas supostamente embriagadas que estavam no Clube Pinheiros, em São Paulo, levaram um segurança do magistrado a registrar um boletim de ocorrência por injúria, segundo documento obtido pelo Estadão Conteúdo.

O boletim de ocorrência foi lavrado contra o agente publicitário Alexandre da Nova Forjas, que foi conduzido por policiais militares para a 14º Delegacia de Pinheiros. No local, ele alegou que estava assistindo um jogo de futebol no Clube Pinheiros, afirmando que havia várias mesas insultando o ministro do STF. Forjas disse que não conhecia tais pessoas e, questionado sobre os insultos e ameaças, negou.

O segurança de Moraes afirma que, quando chegou na portaria do Clube Pinheiros, presenciou Forjas xingar o ministro de "careca ladrão", "advogado do PCC", "vamos fechar o STF" e "careca filha da puta". Ainda de acordo com o boletim de ocorrência, uma outra testemunha também presenciou os fatos.

7 de Setembro: Brasil vive ameaça de 'insurreição' antidemocrática, diz carta assinada por políticos de 27 países

Um grupo de 158 políticos e ativistas de 27 países, incluindo parlamentares e ex-presidentes, divulgou uma carta aberta em que alerta para "insurreição" e riscos à democracia brasileira durante os protestos de Sete de Setembro liderados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

"Estamos muito preocupados com a iminente ameaça às instituições democráticas brasileiras, e estaremos vigilantes do 7 de Setembro em diante. Os brasileiros lutaram décadas para garantir a democracia ante o regime militar, e não se pode deixar que Bolsonaro roube isso deles agora."

Para os signatários da carta, divulgada na segunda-feira (6/9), as manifestações convocadas por Bolsonaro e seus aliados, como "grupos racistas, policiais militares e autoridades do governo federal", buscam intimidar instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso e ampliam os temores de golpe de Estado na terceira maior democracia do mundo.

O presidente brasileiro, como cita o documento, tem ampliado suas ameaças autoritárias. Ele já disse publicamente diversas vezes que pode impedir a realização de eleições presidenciais em 2022. Pesquisas de intenção de voto apontam como favorito o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em suas declarações, Bolsonaro tem deixado de lado a defesa do voto impresso (proposta derrotada no Congresso) e passado a acusar ministros do STF de atuar fora da Constituição, o que lhe serviria de pretexto para agir "fora das quatro linhas da Constituição".

Os signatários da carta aberta contra os protestos de 7 de Setembro citam uma mensagem compartilhada por Bolsonaro que fala em "contragolpe" contra o Congresso, o Judiciário e a esquerda, que teriam, sem apresentar provas, perseguido o presidente e esvaziado seu poder.

Bolsonaro, seus filhos e aliados se tornaram alvo de investigações sob suspeita de ligação com atos antidemocráticos, ataques a ministros do Supremo e disseminação de informações falsas, entre outras acusações. Além disso, o STF também garantiu que prefeitos e governadores agissem com autonomia na pandemia de covid-19, o que é visto por Bolsonaro como um ataque a suas prerrogativas.

O documento sobre os riscos dos protestos no Brasil foi assinado por 158 líderes políticos e ativistas, entre eles José Zapatero (ex-primeiro-ministro da Espanha), os ex-presidentes Ernesto Samper (Colômbia), Fernando Lugo (Paraguai), Martín Torrijos (Panamá) e Rafael Correa (Equador), além de parlamentares de países como Reino Unido, EUA, França, Espanha, México, Alemanha, Argentina, Chile, Austrália, Grécia e Nova Zelândia.

Na carta, os signatários comparam os protestos de 7 de Setembro com a invasão do Congresso dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021 por apoiadores incitados pelo então presidente Donald Trump, que não aceitava a derrota nas urnas para Joe Biden.

O ato, que acabou com cinco mortos, foi considerado uma tentativa de golpe de Estado por alguns políticos e especialistas ao tentar impedir a oficialização do resultado das urnas.

Depois da invasão violenta na capital dos EUA, dezenas de manifestantes acabaram identificados pela polícia e condenados à prisão pela participação na insurreição.

Temores de violência em Brasília e SP no 7 de Setembro

Os protestos marcados para 7 de setembro em Brasília e em São Paulo, principalmente, têm despertado temores de violência física e patrimonial.

O STF, por exemplo, estabeleceu planos para "todos os cenários possíveis": de manifestação pacífica a tentativas de depredação e invasão do edifício. O clima entre os ministros da Corte é de preocupação e atenção à adesão de policiais militares aos protestos (algo proibido por lei) e à reação de Bolsonaro caso haja violência ou ataques ao Congresso ou Supremo.

Para tentar mitigar riscos de manifestantes tentarem invadir o Congresso e o Supremo, ou até jogar bombas caseiras nos edifícios, o Governo do DF decidiu restringir os atos à Esplanada dos Ministérios.

Isso significa que os manifestantes não poderão "descer" a avenida em direção à Praça dos Três Poderes, onde ficam Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal.

Em São Paulo, onde Bolsonaro também discursará, está previsto um forte de esquema de segurança para acompanhar a manifestação na avenida Paulista e evitar confrontos violentos com participantes de protestos ligados a grupos de esquerda a poucos quilômetros dali, no vale do Anhangabaú. Atos como o Grito dos Excluídos ocorrem tradicionalmente no 7 de setembro, feriado nacional em homenagem à independência do país.

Eventual participação de militares e policiais militares

Pela legislação brasileira, nenhum militar ou policial militar da ativa pode participar de atos políticos com símbolos que remetam às instituições onde eles atuam. Só podem participar de manifestações se estiverem à paisana, como cidadãos comuns, e desarmados.

Se descumprirem essa regra, podem ser enquadrados no Código Penal Militar pelos crimes de motim ou revolta (quando há dois ou mais envolvidos). E as penas podem chegar a 20 anos de prisão em regime fechado.

Mas há expectativa de que número significativo de policiais da reserva ou de folga no dia compareçam aos protestos.

Especialistas explicam que a lei permite que qualquer cidadão peça mudanças de políticas públicas, desde que seja de maneira democrática. Mas esse não é o caso, segundo eles.

"Não é um pedido de mudança de política pública. Está claro nas entrelinhas que eles querem uma quebra na democracia. É um discurso como se fosse a favor da democracia, mas pedem que não tenha um Congresso que atrapalhe Bolsonaro, sem STF e sem um Poder Judiciário independente", disse Luiz Alexandre Souza da Costa, cientista político, professor da Uerj e major da reserva da Polícia Militar do Rio de Janeiro, em entrevista à BBC News Brasil.

Fonte: UOL