Cotidiano

Discrição e pouca transparência geram apreensão sobre saúde de Francisco





Celebração de Ângelus do hospital tenta imprimir normalidade à recuperação do Papa, mas ceticismo em torno de informações do Vaticano faz fiéis reviverem a lenta agonia de João Paulo II.

Sempre envolta em mistério, a saúde dos pontífices costuma abalar os alicerces do Vaticano toda vez que ameaça o reinado de seu inquilino vitalício, em geral idoso e mais vulnerável. É o que acontece com o Papa Francisco, de 84 anos, hospitalizado desde domingo na Policlínica Gemelli, a que João Paulo II, em uma de suas internações, referiu-se como "Vaticano número 3" (ou seja, a terceira casa do pontífice). 

Francisco foi submetido a uma cirurgia para a retirada de parte do cólon, que se revelou depois ser mais grave e extensa do que o previsto. Os fiéis foram surpreendidos, no próprio domingo, com o anúncio repentino de uma operação para tratar a estenose diverticular sintomática do cólon, que já estaria programada (entenda, no vídeo abaixo, como é a cirurgia).  

A apreensão em torno da saúde papal e o ceticismo gerado pelas informações da Santa Sé são justificados e têm antecedentes traumáticos entre o rebanho católico. Basta lembrar a lenta agonia de João Paulo II, que sofria de Mal de Parkinson e ingressou dez vezes na ala do Gemelli reservada aos papas. 

Exímio esportista, ao longo de seus 26 anos no comando da Igreja Católica, o Pontífice foi tornando-se encurvado e com a saúde visivelmente deteriorada. Nos últimos tempos, demonstrava também problemas respiratórios e dificuldades para falar, contrariando o que dizia o Vaticano. Ainda assim, manteve-se à frente da Santa Sé até a morte, em abril de 2005

Neste contexto, de discrição e pouca transparência, é natural que se especule sobre o real estado de Francisco em sua primeira internação no Gemelli. Sem parte de um dos pulmões desde os 21 anos, o Papa tem demonstrado vigor e boa saúde. Ele não esconde sofrer de dor crônica no ciático, que tenta aliviar com fisioterapia, massagens e anti-inflamatórios. 

Grupo de pessoas, incluindo ex-moradores de rua e membros da Comunidade de Santo Egídio, faz vigília com flores e cartazes em apoio ao Papa Francisco, em 9 de julho de 2021, em frente ao hospital Agostino Gemelli, onde o pontífice foi internado para cirurgia no cólon — Foto: Riccardo De Luca/AP

Grupo de pessoas, incluindo ex-moradores de rua e membros da Comunidade de Santo Egídio, faz vigília com flores e cartazes em apoio ao Papa Francisco, em 9 de julho de 2021, em frente ao hospital Agostino Gemelli, onde o pontífice foi internado para cirurgia no cólon — Foto: Riccardo De Luca/AP 

Mas, no regresso de Bagdá a Roma, em março passado, após uma parada de um ano nas viagens, forçada pela pandemia, ele admitiu ter se cansado "muito mais do que nas outras vezes". 

A cirurgia extensa, planejada para coincidir com o período de férias, levanta dúvidas sobre os efeitos que terá na agenda do Papa. A celebração do Ângelus dominical, da sacada do hospital, uma semana após a colectomia, procura dar aos fiéis um indício de aparente normalidade (veja no vídeo abaixo)

Numa entrevista em 2015, Francisco ponderou que a renúncia de Bento XVI não deveria ser considerada uma exceção. Chegou a prever que sua missão como chefe da Igreja Católica seria curta, entre dois e cinco anos. Já dura oito.

Fonte: G1