Em meio a um embate entre grupos educacionais privados e o Supremo Tribunal Federal (entenda abaixo), o Ministério da Educação (MEC) estabeleceu, por meio de portaria publicada na segunda-feira (4), regras para limitar a ampliação de vagas em cursos de medicina particulares.
Segundo a pasta, é uma tentativa de "assegurar a qualidade da formação médica no Brasil".
Os critérios levam em conta, entre outros aspectos, a estrutura do sistema público de saúde do município (como a disponibilidade de leitos para as aulas práticas e estágios) e as notas que o curso recebeu nas últimas edições do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade). Nenhuma instituição poderá oferecer mais de 240 vagas por ano nem promover uma ampliação de mais de 30% das que já eram ofertadas.
Qual o motivo desse controle do MEC? Com mensalidades altas (que chegam a R$ 12 mil), baixas taxas de evasão dos alunos e uma importância estratégica no setor de educação, as graduações de medicina tornaram-se uma “mina de ouro” para mantenedoras de ensino: no mercado, estima-se que uma única vaga valha R$ 2 milhões.
Tamanha atratividade financeira levou a um "boom" no surgimento de novos cursos no Brasil: em 2002, eram 113; em 2018, o número já havia saltado para 322.
Três desafios surgiram a partir disso:
O que já foi feito para controlar esse aumento desenfreado de cursos e vagas?
Essa "trava" terminou em abril de 2023. Abriu-se, então, um debate: o governo Lula deveria permitir novos cursos de medicina só onde faltam profissionais ou em qualquer lugar?
Veja o resumo, ponto a ponto, das discussões jurídicas que envolvem o tema. São dois capítulos:
Capítulo 1: 'congelamento' e 'descongelamento' de novas faculdades de medicina
Capítulo 2: faculdades privadas vão à Justiça
Enquanto nem o chamamento público para novas faculdades é publicado, nem o STF termina a votação, o MEC publicou a portaria com regras para ampliação de vagas em instituições já existentes.
A seguir, veja as novas regras para o aumento de vagas em faculdades que já estão em funcionamento:
A respeito desse último item, Silvio Pessanha, da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), explica que existe atualmente uma desproporção entre alunos formados e vagas de residência de qualidade(programas de especialização que podem formar, por exemplo, cirurgiões, pediatras ou dermatologistas).
"Muitos estudantes acabam terminando a faculdade e nem querendo [fazer residência], porque sabem que não terão supervisão, não aprenderão nada, atenderão um monte de pacientes e virarão mão de obra barata para hospitais, sem nenhum acolhimento acadêmico", afirma.
Diante disso e "visando a promover a melhor (re)distribuição de cursos e médicos pelo país, em especial para as regiões Norte e Nordeste e municípios do interior", Pessanha classifica a portaria do MEC como "extremamente pertinente e benéfica para o setor e para a sociedade".
Rosylane Rocha, 2ª vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), menciona também como a falta de leitos no SUS, diante do número alto de alunos em determinadas localidades, pode atrapalhar a formação deles nas aulas práticas.
"Imagine você, paciente, deitado em um leito, sem nenhum sossego. São 15, 20 estudantes passando por você. (...) Estamos colocando alunos para se formar em centros que não têm condição de acolher tudo isso de gente."