O primeiro dia de aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2021 digital e impresso teve 26% de abstenção. Do total de 3,1 milhões de candidatos inscritos, cerca de 2,3 milhões compareceram às provas, em mais de 1,7 mil municípios. Os números foram divulgados nesta noite pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
Considerando apenas o Enem impresso, que concentra a maior parte das inscrições, 3.040.907, as faltas chegaram a 25,5%. O estado com a maior porcentagem de faltas foi o Amazonas, com 40,6%. No Enem digital, 46,1% dos 68.893 inscritos não compareceram ao exame.
“Acredito que o Enem foi um sucesso”, avaliou o ministro da Educação, Milton Ribeiro, em coletiva de imprensa. Segundo ele, mesmo com número reduzido de inscritos, menor que edições anteriores, a porcentagem de faltas, ainda em período de pandemia, foi baixa e se equipara aos índices de abstenção observados antes da pandemia. “Isso demonstra que, mesmo em pandemia, tivemos uma boa assiduidade”, complementou o presidente do Inep, Danilo Dupas.
Na edição de 2020, aplicada em janeiro deste ano, o primeiro dia do Enem impresso registrou a abstenção recorde de 51,5%. Já no primeiro dia do Enem digital 2020, 68,1% dos 93 mil candidatos inscritos faltaram às provas.
No primeiro dia do Enem 2021, os estudantes fizeram as provas de redação, linguagens e ciências humanas. O exame segue no próximo domingo (28), quando serão aplicadas as provas de matemática e ciências da natureza.
Segundo o Inep, os dados apresentados são preliminares. Ainda não há um balanço de quantos estudantes tiveram intercorrências de aplicação, como falta de luz. Esses estudantes terão direito a reaplicação da prova, que será nos dias 9 e 16 de janeiro de 2022. O período para pedir a reaplicação é de 29 de novembro a 3 de dezembro.
Os dados da segurança também foram apresentados na pandemia. Segundo a Polícia Federal, foram cumpridos 27 mandados de prisão. Todos de pessoas que já eram procuradas pela polícia por crimes como tráfico de drogas e estupro de vulnerável, e que fizeram inscrição no exame. Não houve intercorrências nas provas.
Na coletiva, Ribeiro voltou a afirmar que não houve interferência no Enem por parte da atual gestão. “Acho que os senhores que tiveram acesso a perguntas que foram feitas, puderam notar que eventualmente segue o mesmo padrão”, disse. E acrescentou: “Se tivesse interferência, poderia ser que algumas perguntas nem estivessem ali”.
O Enem ocorre em meio a uma série de polêmicas envolvendo a atual gestão do Inep. Na última sexta-feira (19), às vésperas do exame, a Associação dos Servidores do Inep (Assinep) coletou, organizou e compilou as principais situações enfrentadas pelos funcionários da autarquia, que segundo a organização indicam assédio institucional. Neste mês, 37 servidores pediram exoneração de seus cargos, entre eles estão pessoas ligadas ao Enem. O documento foi entregue a uma série de órgãos e instituições, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União. O TCU negou o afastamento do presidente da instituição, Danilo Dupas.
O Enem seleciona estudantes para vagas do ensino superior públicas, pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu), para bolsas em instituições privadas, pelo Programa Universidade para Todos (ProUni), e serve de parâmetro para o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Os resultados também podem ser usados para ingressar em instituições de ensino portuguesas que têm convênio com o Inep.
- Ministro diz que se houvesse interferência no Enem perguntas seriam mudadas
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse que se houvesse interferência do governo nas questões do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) algumas delas não estariam ali.
Ele deu a declaração em entrevista a jornalistas no auditório do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), em Brasília. Mais cedo, neste domingo, foi aplicada a 1ª etapa da prova da edição de 2021 do Enem.
Na última semana, o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), disse que a prova começava a ter “a cara do governo”.
A declaração foi entendida por setores da política como um indício de que o governo estaria interferindo no conteúdo do exame.
“Quando o presidente fala que esse Enem começa a ter a cara do governo, eu reafirmo que tem mesmo. Seriedade, transparência, assuntos de cunho acadêmico, sem desvios de recursos, sem vazamento de questões ou provas, essa é a cara do nosso governo”, disse Ribeiro na entrevista.
Setores mais ideológicos do bolsonarismo, influenciados pelo escritor Olavo de Carvalho, dizem que o Enem e a educação de modo é aparelhada pela esquerda.
“Tentaram politizar a prova. Não houve nenhuma interferência”, disse Milton Ribeiro.
“Talvez se tivesse nossa interferência, poderia ser até que algumas perguntas nem estivessem ali”, declarou o ministro.
Ribeiro foi questionado sobre que tipo de questão não estaria no teste e suavizou a fala. “Eu quis apenas salientar que, se dependesse de uma visão, como alguns tem, de que o governo é radical [haveria mudanças]”.
“Tem algumas questões que tocam em alguns temas que numa visão mais conservadora são mais caros ao nosso governo”, declarou.
“Até o próprio tema da redação, que é público, tem um caráter muito mais social”, disse o ministro. O tema foi “Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania do Brasil”.
Ele, porém, não entrou em detalhes. “Só bati os olhos [na prova], não tenho condições de analisar”
- Enem 2021 tem questões sociais e aborda temas políticos de forma indireta
População indígena, racismo, música "Admirável Gado Novo" foram alguns temas que surgiram nas questões do primeiro dia do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) 2021. Na avaliação de professores, questões sociais apareceram, mas de forma indireta na prova.
"A prova trouxe pautas importantes, falou de questões gêneros, da população carcerária, refugiados, população indígena, mas algumas temas ficaram de fora também", diz Claudio Hansem, professor do Descomplica.
Fernando Santo, gerente de Inteligência Educacional e Avaliações do Poliedro, diz que o "pedagógico prevaleceu ao político" neste primeiro dia.
"Os estudantes receberam uma prova como nos anos anteriores, uma boa prova. Se por um lado se destaca a ausência de questões sobre a ditadura, é louvável a presença de itens sobre a questão indígena brasileira. Ao menos seis itens abordaram essa temática", afirma.
Para Ricardo Di Carlo, professor de História do Curso e Colégio Objetivo, a prova foi "analítica, com grande desenvolvimento cultural". "Um foco grande documental em textos, pouco uso de imagem para História e com uma diversificação de temas", detalha.
Reportagem do UOL ontem noticiou, por exemplo, que servidores ouvidos têm colocado os temas "sensíveis" pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido) de forma implícita nas provas. A ditadura militar é um deles.
"Não teve questão que falasse abertamente de ditadura, nenhuma questão de regime totalitário", diz o professor do Descomplica.
Apesar disso, uma questão trazia um trecho da música "Admirável Gado Novo", do cantor Zé Ramalho, e pedia para o participante responder qual "comportamento coletivo" é criticado na letra.
"Essa é uma questão que fala da luta das massas, que fala da resistência, de lutas populares e questionamentos políticos. É uma música do final dos anos 70, portanto é do regime militar brasileiro. Então está sendo vista como uma questão que passou a falar do período de forma indireta, embora nenhuma tenha abordado diretamente", explica Hansem.
Segundo Daniel Perry, diretor do Curso Anglo, a prova manteve o padrão dos últimos anos em relação às competências cobradas, com muitas análises de gêneros textuais em várias áreas do conhecimento.
"Não apresentou polêmicas, mas dialogou com temas da atualidade, como a passividade política, a erotização do corpo feminino, o racismo, a questão indígena", explica Perry.
Para Santo, as provas de inglês e espanhol foram bastante tradicionais e não apresentaram um grau de dificuldade muito elevado.
A prova de ciências humanas, afirma, foi equilibrada em relação aos conteúdos e cobrou os clássicos como Sócrates, Descartes e Nietzsche. "Na parte de geografia, também esteve bem dividido entre geografia física, política, temáticas de industrialização, capitalismo e até ali uma questão da exploração do trabalho pelo WhatsApp", explica.
Perry também citou questões que abordaram o racismo, uma delas sobre a discriminação racial no futebol. A pergunta usou o exemplo de culpabilização do goleiro Barbosa, que era negro, pela derrota do Brasil na Copa de 1950.
"O tema escravidão apareceu algumas vezes. Em uma das questões, abordava a hierarquia existente entre os escravizados. Em outra, se falava a respeito da perseguição aos escravos", afirma.
Marcus Vinicius de Moraes, professor de história do Curso Pré-Vestibular Oficina do Estudante de Campinas (SP), disse que a prova recuperou a "tradição do Enem", abordando temas que contemplam uma sociedade plural.
"Questões sobre revoltas medievais, folclore camponês, indígenas, resistências escravas, África e identidades foram o ponto alto da prova. Além do uso de documentos, escritos e imagens. Merece destaque a questão 82 [considerando o caderno branco] sobre os tigres catadores de lixo. Analiso que a prova teve uma dificuldade mediana", explica.
Segundo José Maurício Mazzucco, professor de Sociologia e Filosofia do Curso e Colégio Objetivo, a prova teve seis questões de filosofia e seis de sociologia. "Uma prova muito diversificada, questões básicas com o problema da exclusão social. Uma prova muito bem elaborada. Ela exige atenção, leitura e uma certa bagagem", afirma.
Os participantes do Enem responderam hoje perguntas das provas de linguagens e ciências humanas, além da redação.
Fonte: Agência Brasil - Poder360 - UOL