Política

STF forma maioria para declarar que não existe direito ao esquecimento no Brasil





Seis ministros já afirmaram que reconhecer a existência do instituto colocaria em risco a liberdade de expressão

Até o momento, os ministros Dias Toffoli, Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski votaram contra o direito ao esquecimento, enquanto o ministro Edson Fachin se posicionou favoravelmente. Luís Roberto Barroso se declarou impedido para analisar o tema e não votará.

O julgamento foi retomado nesta quinta-feira com o voto de Cármen Lúcia, que se alinhou à maioria. A ministra recordou o período do regime militar e disse que a sua geração “lutou pelo direito de lembrar” e que tomar uma decisão no sentido contrário seria inadequado.

“Em um país de curta memória, discutir e julgar o esquecimento como direito fundamental, nesse sentido aqui adotado, ou seja, de alguém poder impor o silência e até o segredo de fato ou ato que poderia ser de interesse público, pareceria, se existisse essa categoria no direito, o que não existe, um desaforo jurídico”, afirmou.

A magistrada sustentou que não faz sentido proibir a veiculação de um fato verídico e obtido licitamente. “É preciso que se ponha luz para que a gente verifique e não se repita”, disse.

O julgamento ocorre em um recurso com repercussão geral, o que significa que o entendimento fixado pela corte deverá ser seguido por todas as instâncias da Justiça.

O caso concreto debatido pelo plenário é um recurso movido por irmãos de Aída Curi, assassinada em 1958 no Rio de Janeiro. O programa Linha Direta, da TV Globo, exibiu, 50 anos depois, um episódio em que reconstituiu o crime.

Os familiares dela, que foi violentada e assassinada e cujo caso foi amplamente divulgado pela imprensa à época, pedem uma indenização ao canal de televisão.

Kassio Nunes Marques foi o único a entender que os parentes dela deveriam, sim, receber uma indenização.

Apesar de ter afirmado que não cabe reconhecer a existência do direito ao esquecimento no país, o ministro votou para remeter o caso novamente ao primeiro grau para que o juiz do caso decida o tamanho do valor a ser pago pela Globo à família a título de danos morais.

Cármen Lúcia, por sua vez, classificou o crime como "triste e doloroso", mas disse que o caso entrou para "os anais da história".

"Como apagá-lo da memória de todos? Como permitir que jovens não saibam? Como não saber que a cada nova morte que não é mostrada de uma mulherr a gente precisa aprender outra vez na tragédia do dia a dia?", argumentou.

Lewandowski foi o responsável por dar o sexto voto, que levou à formação de maioria na corte contra o direito ao esquecimento. “Com a abrangência e generalidade que o recorrente busca ver reconhecido, esse instituto nunca encontrou abrigo no direito brasileiro”, disse.

O ministro ressaltou que o irmão da vítima chegou a publicar dois livros sobre o tema, o que demonstra que não há como esquecê-lo.

Prevalece até aqui o voto do relator, Dias Toffoli. O ministro sustentou que admitir a existência do direito ao esquecimento “seria uma restrição excessiva e peremptória à liberdade de expressão” e ao “direito dos cidadãos de se manterem informados de fatos relevantes da história social”.

Na visão do magistrado, uma decisão no sentido oposto do Supremo seria incompatível com a Constituição e equivaleria a atribuir, “de forma absoluta e em abstrato”, maior peso ao direito à imagem em detrimento da liberdade de expressão.

Único a divergir até o momento, Fachin sustentou que a existência do esquecimento deve ser analisada caso a caso e aplicada apenas em casos excepcionais.

O ministro sustentou que a liberdade de expressão tem “posição de preferência na Constituição”, mas que a Carta também prevê a preservação do “núcleo essencial dos direitos de personalidade”.

“Diante da posição preferencial da liberdade de expressão no sistema constitucional brasileiro, as limitações a sua extensão parecem seguir um modelo em que, sob determinadas condições, o direito ao esquecimento deve funcionar como trunfo”, defendeu.

Fonte: Folha de São Paulo