Saúde

Número de infectados por Covid-19 em Wuhan pode ser de quase meio milhão





Quase meio milhão de residentes da cidade chinesa onde o coronavírus emergiu pela primeira vez podem ter sido infectados pela Covid-19. O número é quase dez vezes maior à contagem oficial de casos confirmados e foi revelado num estudo do Centro Chinês para Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

Para estimar as taxas de infecção de Covid-19, a pesquisa separou uma amostragem de 34 mil pessoas da população geral em Wuhan, o epicentro original da pandemia, além de outras cidades na província de Hubei. Também foram incluídas Pequim, Xangai e as províncias de Guangdong, Jiangsu, Sichuan e Liaoning.

Os pesquisadores descobriram uma taxa de prevalência de anticorpos de 4,43% para Covid-19 entre os residentes de Wuhan, uma metrópole de 11 milhões de pessoas – o que representa cerca de 487 mil pessoas com anticorpos. Até domingo (27), Wuhan havia relatado um total de apenas 50.354 casos confirmados de Covid-19 oficialmente, de acordo com o Comissão Municipal de Saúde de Wuhan.

O estudo teve como objetivo estimar a escala de infecções anteriores na população testando amostras de sangue para anticorpos contra o novo coronavírus. As descobertas não são consideradas estatísticas finais de quantas pessoas em uma determinada área foram expostas ao vírus.

 

O CDC chinês disse que o estudo foi realizado um mês depois que a China “conteve a primeira onda da epidemia de Covid-19”. De acordo com a pesquisa, a taxa de prevalência fora de Wuhan é significativamente menor. Em outras cidades da província de Hubei, apenas 0,44% dos residentes pesquisados apresentaram anticorpos para o coronavírus. Já fora da província, os anticorpos foram detectados apenas em duas pessoas entre os mais de 12 mil residentes pesquisados.

Os resultados do estudo foram revelados num post nas mídias sociais do CDC chinês na segunda-feira (28). Não se menciona no post se o estudo foi publicado em revistas acadêmicas.

Infecções subnotificadas

Yanzhong Huang, pesquisador sênior de saúde global da organização Council on Foreign Relations, com sede nos EUA, disse que o estudo aponta para um problema de subnotificação de infecções durante o auge do surto em Wuhan, em parte devido ao caos na época e à não inclusão de casos assintomáticos na contagem oficial de casos confirmados.

Em janeiro e fevereiro, pacientes com febre lotaram os hospitais de Wuhan, que careciam de mão de obra, kits de teste e recursos médicos para diagnosticá-los e tratá-los. Muitos pacientes foram orientados a ir para casa e se isolar. Destes, alguns acabaram infectando outros membros da família, enquanto outros morreram em casa sem entrarem nas estatísticas do número de óbitos por Covid-19.

A subnotificação é um problema enfrentado pelas autoridades de saúde em muitos países, muitas vezes devido à falta de capacidade e recursos. Estudos de anticorpos conduzidos por pesquisadores em outras partes do mundo também mostram que o coronavírus era muito mais prevalente do que os números oficiais sugeriam.

Um estudo patrocinado pelo Departamento de Saúde do Estado de Nova York, por exemplo, mostrou que até o final de março, um em cada sete adultos nova-iorquinos teve Covid-19, ou seja, cerca de 10 vezes mais do que a conta oficial. Em agosto, outro estudo encontrou anticorpos contra o coronavírus em mais de 27%  dos 1,5 milhão de residentes da cidade de Nova York testados.

Mas, na China, também há a questão da transparência, já que as autoridades deram ao público dados mais otimistas do que aqueles vistos apenas internamente.

Desde 12 de fevereiro, as autoridades de saúde da província de Hubei começaram a incluir “casos clinicamente diagnosticados” na contagem de infecções confirmadas. Naquela data, cerca de 13 mil “casos diagnosticados clinicamente” anteriormente não divulgados na província foram adicionados às novas infecções confirmadas, resultando em um aumento de nove vezes nos casos diários desde o dia anterior.

Documentos vazados do Centro Provincial de Hubei para Controle e Prevenção de Doenças dados à CNN por uma fonte mostraram que, antes daquele dia, as autoridades relatavam “casos clinicamente diagnosticados” internamente, mas não os revelaram ao povo. As autoridades de Hubei também divulgaram uma contagem mais baixa de casos confirmados e mortes em 10 de fevereiro e 7 de março do que registraram internamente, segundo os dados dos documentos.

Elas também reprimiram jornalistas que relataram a dura realidade dos hospitais lotados de Wuhan. Na segunda-feira (28), Zhang Zhan, uma jornalista e ex-advogada que documentou o surto no auge em Wuhan, foi condenada a quatro anos de prisão por “brigar e provocar problemas”. Dois outros jornalistas independentes, Li Zehua e Fang Bin, também foram detidos após a cobertura do surto.

Contenção efetiva em Wuhan

O estudo revelado agora destaca um grande contraste entre as taxas de prevalência de anticorpos para o coronavírus dentro e fora de Wuhan.

Huang, do Council on Foreign Relations, disse que as taxas significativamente mais baixas em outras cidades chinesas sugerem que “os esforços de contenção chineses foram de fato rápidos e eficazes, especialmente em comparação com cidades como Nova York”.

Em uma tentativa sem precedentes de conter um vírus que se espalha rapidamente, Wuhan foi isolada do mundo exterior em 23 de janeiro, com todos os voos, trens e ônibus cancelados e as entradas das rodovias bloqueadas.

Dentro da cidade, o governo impôs um bloqueio severo. Por mais de dois meses, o transporte público em Wuhan foi suspenso, empresas ficaram fechadas e milhões de residentes foram confinadas em suas casas e comunidades residenciais – eles não podiam sair nem para fazer compras no mercado.

No entanto, o lockdown de 76 dias trouxe um custo enorme para os residentes, principalmente aqueles que precisavam ir ao hospital, pois todo o transporte público estava suspenso e não havia táxis suficientes para os pacientes. 

Para o governo chinês, as medidas duras foram sufucientes para permitir ao país virar a página em sua luta contra o surto, mantendo o surto circunscrito à região de Wuhan. O CDC chinês também saudou a vitória da China em conter o vírus ao divulgar os resultados do estudo de anticorpos na segunda-feira.

“Os resultados do estudo mostram que a população do nosso país tem um baixo índice de infecção. Isso indica que a China conseguiu controlar a epidemia tendo Wuhan como o principal campo de batalha, e efetivamente controlou a propagação da epidemia para outras áreas”, disse a agência.

Fonte: CNN Brasil