Cotidiano

Protestos, caos e violência marcam 1º fim de semana de apagão em Macapá





Centenas de manifestantes se reuniram hoje (domingo), na praça da Bandeira, centro de Macapá (AP), para mostrar indignação e reivindicar uma ação mais efetiva do poder público na condução do apagão que assola o Estado desde a noite da última terça (3) e que começou após uma explosão e incêndio em uma subestação na cidade.

Entre as orientações aos participantes, estavam a utilização de camisa preta, máscaras, distanciamento entre os participantes e a utilização de álcool em gel.

O restabelecimento da energia vem acontecendo aos poucos e, segundo o governo federal, que enviou equipamentos para a região, a previsão para a normalização da energia no estado é de cerca de nove dias.

A mobilização acompanhada pela reportagem do UOL foi marcada nas redes sociais e contou com a presença de moradores de municípios da região metropolitana de Macapá, que engloba os municípios de Santana e Mazagão.

"Esse foi um movimento pacífico e apartidário, promovido por pessoas que buscam por soluções rápidas e eficazes para que a gente possa enfrentar essa situação caótica na qual nos encontramos", disse um dos organizadores da ação, Hélio Castro.

"A pauta de hoje é a energia elétrica, mas há décadas estamos sofrendo. É importante que além de reclamar do problema nos transformadores, que a gente reclame também do fornecimento do serviço, porque pagamos uma das tarifas mais caras do Brasil e temos um serviço de péssima qualidade."

A social media Dani Sanches conta que em Macapá é comum chover e, como consequência, faltar energia. E que, quando isso ocorreu, encarou o episódio com certa naturalidade. Ela lembra, no entanto, que minutos depois começou uma enxurrada de informações desencontradas sobre a explosão de subestação da cidade.

"As horas foram se passando e eu estava tentando manter contato com a concessionará de energia e ninguém respondia. Na quarta, acordamos com a notícia de que o Amapá estava com apagão. Foi quando começou o desespero atrás de alimento e gelo para conservar o que tinha em casa. As coisas começaram a descongelar e começamos a perder alimentos perecíveis."

Falta d´água

Segundo Dani Sanches, a falta de energia ainda desencadeou uma série de outros problemas, como falta de água. "Não temos para beber, cozinhar, e os comércios estão praticando um valor surreal para o produto", conclui.

A advogada Ana Carina Castro também participou do ato. Ela é mãe de dois filhos e disse que o desafio está sendo lidar com as crianças nesse período.

"Na quarta-feira, colocamos as crianças para dormir no carro. Essa foi a alternativa para tentar disfarçar o nosso pânico para eles. Mas isso se tornou inviável porque moramos fora da área urbana de Macapá e com a comunicação precária, não teríamos combustível para se locomover caso acontecesse alguma eventualidade. Desde então colocamos os colchões na sala e dormimos todos juntos."

Outro problema, segundo Ana Carina, é o descaso do restante do Brasil em relação ao problema. "O Amapá foi completamente esquecido. Temos uma medida paliativa para esse caos. O país acha que já está tudo bem. Não está. Continuamos sofrendo com o desabastecimento de água, com oscilação na comunicação e tantos outros serviços."

Prejuízos

Os prejuízos materiais atingiram também empresários, especialmente os do segmento de alimentos e bebidas. Sem energia elétrica, empresas ficaram sem condições de armazenar produtos perecíveis. Esse foi o caso de Fhilipe Smith, dono de uma hamburgueria que atende por delivery em Macapá.

Ele teve um prejuízo de aproximadamente R$ 5.000 com os produtos que estragaram e com as vendas que deixou de fazer nesse período. "Com 48h sem energia, minha preocupação aumentou. Perdi carne, queijo, molho, pão, batata frita congelada e o refrigerante, para não ficar no prejuízo, tivemos que consumir quente."

Solidariedade no apagão
Durante a manifestação, o estudante Filadelfo Júnior, de Mazagão, que fica há 33 km de Macapá, contou à reportagem que os impactos do apagão no município foram menores do que na capital do Estado, já que muitos moradores já possuem geradores de energia em casa.

"Enquanto Macapá estava 100% sem luz, Mazagão tinha luz em alguns horários, mas o município teve problema de falta de combustível no gerador de energia. Muitos perderam alimentos. E a noite era o período mais insuportável por causa do calor. Mas contamos com a colaboração dos moradores, que se mobilizaram e ajudaram doando gelo e cedendo espaço para armazenar alimentos."

 

Violência contra protestos

Além do protesto deste domingo, o primeiro fim de semana de apagão foi marcado por uma série de outros atos em Macapá e Santana, cidade vizinha a 15 km da capital. Muitos deles tiveram repressão do Bope (Batalhão de Operações Especiais), Rotam (Ronda Ostensiva Tática Motorizada) e da Polícia Militar.

A professora Benedita Alves, moradora de um conjunto habitacional localizado na zona sul de Macapá, precisou se deslocar até a casa de uma amiga no bairro Congós para conseguir água.

"À noite recebemos um vizinho, ele falou que estava acontecendo uma manifestação e que os moradores estavam revoltados com essa situação, estavam queimando objetos. Fomos olhar e acabamos ajudando os participantes. Com isso, a Rotam chegou e começou a atirar balas de borracha. Tinha família com criança de colo. Todos correram, e eles continuaram atirando", contou ela.

Um dos tiros disparados pela Rotam atingiu os braços do companheiro de Benedita. "Ele não foi a única pessoa que foi baleada, e, além dessa manifestação, outras pessoas em outros atos também foram reprimidas pela Polícia Militar", completou.

"Estamos sem energia, sem água, com calor, com fome e desgastados psicologicamente e ainda temos que passar por isso. Isso gera uma grande indignação, mas nós não vamos desistir e continuaremos nas ruas e lutando para que tudo se normalize no Amapá".

A Polícia Militar do Amapá foi procurada pela reportagem para comentar a repressão das manifestações. A instituição informou que só vai se pronunciar a respeito dos casos amanhã.

Fonte: UOL