Chegamos à semana central do Ano Litúrgico e decisiva para a nossa fé. Se nos dias que precedem o Natal somos distraídos pelas compras e a correria de final de ano, a Semana Santa pode passar despercebida simplesmente porque estamos ocupados com nossos afazeres, no trabalho, na escola, na diversão. Talvez iniciamos a Quaresma com boas intenções, mas os compromissos e as preocupações nos fizeram esquecer os propósitos. Ainda estamos em tempo para não deixar passar, inutilmente, estes dias tão importantes para manter acordada a nossa vida de cristãos. Antes, porém, é necessária uma pequena consideração sobre os tantos gestos que faremos e as muitas palavras que ouviremos nos próximos dias.
A “liturgia” que celebramos é, justamente, feita de “gestos e palavras”, porque quer envolver inteiramente a nossa pessoa. Nós não nos comunicamos somente com palavras, usamos muitos gestos, sinais e até o silêncio transmite alguma mensagem. Não podia ser diferente com a experiência da nossa fé, porque nós acreditamos que o próprio Deus se fez conhecer através de palavras e acontecimentos e, de maneira única e extraordinária, com a vida, os gestos, as palavras, a morte e ressurreição de uma pessoa: Jesus.
O convite, portanto, para esses dias, não é somente aquele costumeiro de participar das celebrações, mas de prestar atenção a tudo aquilo que a Liturgia nos propõe fazer. Perceber o valor dos sinais e interiorizar o sentido dos gestos ajuda a compreender o “mistério” humano e divino que estamos celebrando. Com os olhos e os ouvidos da fé, com o coração aberto e sincero, acompanharemos Jesus no caminho da cruz para chegar a reconhecê-lo vivo e ressuscitado no domingo de Páscoa.
Iniciaremos com a procissão dos Ramos cantando Hosana ao Filho de Davi, mas na leitura mais longa da Paixão do evangelista Marcos ouviremos que “todos o abandonaram e fugiram” e o povo gritando a Pilatos: “Crucifica-o”. Continuamos a ter medo da cruz, medo de perder a nossa vida, a não entender o que significa ser fiéis até o fim. Na Quinta-feira Santa, faremos a memória da última Ceia, da entrega da Eucaristia aos discípulos. Receberemos aquele Pão e aquele Vinho, o Corpo e o Sangue de Jesus, sinais da sua presença viva e memorial do seu amor sem limite e exclusões.
Como não ficar tocados com o gesto do Lava-pés e as palavras-convite a seguir o exemplo do “Mestre e Senhor” que se fez servo e último de todos? Será uma lição viva para avaliar se estamos buscando poder, vantagens, bens, talvez, desprezando e prejudicando os irmãos mais pobres e humildes. Como “servir” e promover vida e dignidade para todos? Na Sexta-feira Santa, seguiremos Jesus no caminho do Calvário até aos pés da cruz juntos com Maria e o discípulo amado. Será um dia de penitência e jejum. Nos perguntaremos: como corresponder a tão grande amor e qual “salvação” nos trouxe o sangue derramado naquele momento extremo? Rezaremos por todos.
Faremos uma grande oração “universal” para que a humanidade encontre o caminho da paz e da fraternidade, muito além das diversidades que nos separam e dividem. Enfim, no Sábado Santo, ao anoitecer, celebraremos a grande Vigília Pascal. Faremos memória também da Páscoa antiga, a grande noite da libertação do povo de Israel da escravidão do Egito, mas, sobretudo, celebraremos a Vida Nova que o Ressuscitado fez desabrochar em cada batizado.
Com a Ressurreição de Jesus, aprendemos que o sofrimento e a morte não são as últimas realidades que nos aguardam. A nossa fé deve ser uma luz que nos orienta na vida já neste mundo. Com efeito, se o medo da morte nos faz viver na defensiva para nos proteger ao ponto de agredimos ou matarmos os outros para resguardar a nossa sobrevivência, a esperança da ressurreição nos torna corajosos defensores da vida de todas as criaturas. Não viveremos mais dias buscando nos salvar sozinhos. Daremos um novo sentido à nossa vida e ela será mais plena e feliz quando nos amarmos uns aos outros, quando unirmos as forças para construir uma nova humanidade sem ódios e inimizades.
Por Dom Pedro José Conti
Fonte: Diocese de Macapá