“Não é fácil: pedir desculpa, começar tudo de novo, reconhecer que erramos, ser generosos, aceitar um sorriso de desprezo, ser perseverantes nas dificuldades, aprender com os erros, perdoar e esquecer as ofensas, refletir e agir corajosamente, usar ao máximo os dons de Deus, aceitar uma repreensão não merecida, dominar um temperamento agressivo, corrigir uma língua maliciosa, colocar-se à disposição da comunidade, defender a vida. Não, não é fácil.”
No 3º Domingo do Tempo Comum, o evangelho de Marcos nos apresenta o início daquela que chamamos de “vida pública” de Jesus. Quase nada sabemos a respeito dos mais ou menos trinta anos anteriores. Agora, depois que João Batista foi preso, Jesus começa a falar e agir. Ele tem um anúncio para dar e uma missão a cumprir. As duas coisas, se assim podemos chamar, aparentemente tão diferentes, de fato acontecem juntas. Jesus anuncia a chegada, o início ou, melhor ainda, a presença do Reino de Deus e lança o convite à conversão, ou seja, à adesão comprometida a este Reino. Esse “anúncio”, como todas as notícias, boas ou não, é feito através de palavras, porém o Reino de Deus é um acontecimento. Com Jesus, no falar e no agir dele, o Reino se torna visível, pode-se encontrar, já está acontecendo. A “boa notícia” de Jesus não é simplesmente uma palavra nova, uma manchete, é uma pessoa – ele mesmo – que começa a fazer acontecer uma presença diferente, inédita, de Deus na história humana. A acolhida do Reino coincide, portanto, com a adesão à mensagem e à pessoa de Jesus. Por isso, ele chama discípulos a segui-lo, não simplesmente a compreender e a gostar dos seus ensinamentos, mas os chama para estar com ele, vivendo assim, no dia a dia, o evento do Reino de Deus. A “conversão” ao Evangelho do Reino pede uma mudança de vida, um deixar “redes e barcos”. Jesus chama aqueles primeiros a uma missão: serão enviados para serem “pescadores de homens” (Mc 1,17), não mais de peixes.
É sempre animador ver a resposta imediata de Simão, André, Tiago e João, os primeiros quatro. Foi fácil? Aparentemente sim, mas, de fato, os evangelhos não escondem as dúvidas, os mal-entendidos, os medos e a covardia dos apóstolos, sobretudo na hora da cruz: “Então, abandonando-o, todos fugiram” (Mc 14,50). Seguir Jesus, aceitar entrar na dinâmica do Reino não é nada fácil. No entanto, não é para desanimar, ao contrário, saber que um caminho é difícil e desafiador deve nos estimular à resistência, à perseverança, à fidelidade. Não estamos sozinhos nessa empreitada, estamos com Jesus, com o Espírito Santo, com a Comunidade dos fiéis, com os santos e as santas, os mártires, todos aqueles que nos precederam no seguimento do Senhor. Precisamos lembrar tudo isso para não desistir e desanimar com as quedas e as derrotas.
Nunca Jesus disse que ser amigo dele seria fácil. Falou de perseguições e cruzes. Além disso, ele nos ensinou, através das parábolas, que o Reino cresce aos poucos e muitas vezes precisa procurar bem para chegar a encontrá-lo. Igualmente Jesus disse que o Reino é oferecido a todos, mas nem todos o acolhem. Por isso, às vezes, temos a impressão de sermos muitos, outras vezes devemos reconhecer que somos bem poucos. Se para seguir Jesus, esperamos que “todos” o façam, não sabemos quando e como isso acontecerá. Perderíamos a chance de decidir com a nossa liberdade, vontade e responsabilidade. E o amor, entra nisso também? Nós cristãos temos medo, como todos os seres humanos, de errar, de ser enganados, de não ser felizes por causa das nossas escolhas. Não é fácil arriscar. “Mestre, trabalhamos a noite inteira e nada apanhamos, mas, por tua palavra, lançarei as redes” (Lc 5,5), disse certa vez Simão Pedro a Jesus e a pesca foi extraordinária. Todo dia, todos nós tomamos decisões, falamos muito, somos fascinados e nos encantamos por coisas e pessoas. Por que tanto medo de nos envolver com Jesus, com o Reino de Deus, a justiça, a verdade, o amor e a paz? Não é fácil escolher o bem. Mas por que tanta desconfiança? Jesus continua a nos chamar. Vamos responder?
Por Dom Pedro José Conti
Fonte: Diocese de Macapá