O dia 20 de novembro marca a morte de Zumbi, o líder do Quilombo dos Palmares, localizado na Serra da Barriga, hoje estado de Alagoas. Capturado e preso, ele morreu degolado e teve sua cabeça exposta na Praça do Carmo, em 1695. A data é celebrada por movimentos de direitos civis desde os anos 1960, como forma de valorizar a luta e a cultura negra.
No entanto, a data não é feriado nacional. Mudar isso está entre as as prioridades da recém-criada bancada negra do Legislativo. A ideia é incluir na primeira lista de projetos do grupo a proposta do Dia Nacional da Consciência Negra, a ser celebrado em 20 de novembro, em todo o país. A informação é do jornal "Valor Econômico".
Desde 2003, a lei federal 10.639 tornou obrigatório o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas, incluindo assim o Dia da Consciência Negra no calendário escolar. Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff (PT) oficializou o 20 de novembro como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, mas não transformou a data em feriado nacional.
A data marca a morte de Zumbi, o líder do Quilombo dos Palmares, localizado na Serra da Barriga, hoje Estado de Alagoas. Quilombo é o nome que se dá a comunidades — em geral fortificadas — formadas majoritariamente por escravizados fugitivos. Palmares foi o maior quilombo brasileiro, chegando a ter simultaneamente 20 mil habitantes, maior portanto do que a maioria das cidades brasileiras daquela época, quando o país tinha cerca de 300 mil habitantes — excluídos os indígenas. Capturado e preso, Zumbi morreu degolado pelas tropas do bandeirante em 20 de novembro de 1695.
Palmares foi o maior quilombo brasileiro, chegando a ter simultaneamente 20 mil habitantes. Era maior, portanto, que a maioria das cidades brasileiras da época, quando o país tinha cerca de 300 mil habitantes — excluídos os indígenas.
Registros históricos apontam que Zumbi dos Palmares nasceu em 1655, no atual estado de Alagoas, onde foi batizado com o nome de Francisco. Historiadores ainda debatem se o termo 'Zumbi' é um nome adotado posteriormente pelo jovem ou um título dentro dos quilombos.
Aos 15 anos, passou a morar no Quilombo dos Palmares, então governado pelo seu tio, Ganga Zumba. Palmares era o maior quilombo da América Latina, com população estimada em 20 mil negros e negras que fugiram da escravidão, além de pessoas nativas e fugitivos. Curiosamente, esse imenso quilombo não era um único povoado, mas uma junção de pequenos mocambos, o maior dos quais era o mocambo do Macaco.
A principal atividade do quilombo era a agricultura coletivizada, mas há evidências que sugerem a existência de olarias, oficinas de metalurgia, pecuária e artesanato.
Os escravocratas da região temiam o tamanho e prosperidade de Palmares. Além de servir como incentivo para a fuga de escravos, eles achavam que a comunidade poderia ser uma ameaça existencial caso decidisse se organizar contra os engenhos. Por isso, na segunda metade do século XVII, os donos de terra começaram a financiar expedições para atacar e destruir o quilombo. Todas falharam, mas o custo em vidas foi imenso.
Ganga Zumba viajou ao Recife em 1678, para tentar negociar o fim da violência com o governador, D. Pedro de Almeida. A proposta entregue ao líder quilombola foi controversa: os nascidos em Palmares seriam considerados livres, mas todos os 'fugitivos' voltariam à escravidão. Ninguém gostou da ideia. Os habitantes dos mocambos não queriam se entregar e os donos de terra achavam o tratado favorável demais para o quilombo. Enfurecido, Zumbi depôs o tio, que acabou assassinado, provavelmente por envenenamento.
O novo líder lutou por mais de 15 anos contra as forças coloniais, mas, em 1694, o mocambo do Macaco foi atacado e destruído por uma expedição liderada por Domingos Jorge Velho e Vieira de Mello. Zumbi foi ferido no combate e viu-se obrigado a fugir. Ele evadiu captura por um ano, até ser capturado e morto em novembro de 1695.
A data é marcada como feriado em apenas algumas partes do país, como Alagoas, Amazonas, Amapá, Mato Grosso e Rio de Janeiro. Também é feriado municipal em 1.260 cidades brasileiras. Como o Brasil tem 5.568 municípios, o Dia da Consciência Negra é, portanto, feriado em 29% das cidades do país.
Com a chegada de dezembro e do final do ano, começam os planos para 2024. O próximo ano deve frustrar quem aguarda com expectativa os feriadões prolongados. Se em 2023, foram sete, 2024 deve contar com menos da metade disso. Apenas três estão previstos. Veja abaixo como fica o calendário de feriados de 2024.
O próximo ano vai contar apenas com três feriados prolongados de cunho nacional. O Dia da Confraternização Universal (1 de janeiro) cairá numa segunda-feira, enquanto Paixão de Cristo (29 de março) e Proclamação da República (15 de novembro) serão em duas sextas-feiras, conferindo a possibilidade de emenda com o fim de semana.
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- Minoria no serviço público, negros recebem até R$ 3 mil a menos
Pessoas negras estão sub-representadas no serviço público. Pretos e pardos representavam 56,2% da população brasileira em 2022, segundo o IBGE, enquanto o percentual de servidores era de 36%, conforme dados do Observatório de Pessoal, mantido pelo governo.
Quanto mais alto o cargo, menor a representatividade. Levantamento do República.org, instituto criado para melhorar a gestão de pessoas no serviço público, mostra que apenas 35 dos 240 cargos DAS (Direção e Assessoramento Superior) de nível 6, o mais elevado na hierarquia do Executivo Federal, eram ocupados por pessoas negras. Os dados mais recentes são de 2020, portanto não abrangem o governo Lula.
Distância salarial comprova desigualdade. Homens brancos tinham remuneração líquida média mensal de R$ 8.774,20 em 2020 — R$ 2.502 a mais do que homens negros e R$ 2.958,70 a mais que mulheres negras.
Isso é um reflexo do que acontece de maneira geral, o serviço público não está apartado do que acontece no resto da sociedade. Não é que elas entram ganhando salários mais baixos que homens na mesma posição. O concurso garante que ganhem a mesma coisa na entrada, a questão é como vai ser a trajetória dessa mulher e desse homem. As oportunidades que se apresentam não são tão vantajosas para mulheres, principalmente para mulheres ”negras. none Vanessa Campagnac, gerente de dados e comunicação da República.org
No governo federal, apenas 11,8% das mulheres ocupam cargos de gestão, segundo o levantamento. Os dados foram compilados da PNADc (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) de 2022. Para além do racismo e o machismo estrutural, Vanessa aponta que a segunda jornada de trabalho das mulheres com tarefas domésticas e criação dos filhos contribui para diminuição do tempo para que elas se dediquem a cursos e aperfeiçoamentos profissionais.
A diplomata Paula Cristina Pereira Gomes, 44, chefia a Assessoria Internacional do Ministério da Igualdade Racial. Ela cresceu em Rocha Miranda, região periférica do Rio, se graduou em História pela Universidade Federal Fluminense em 2006 e passou num concurso público para o Banco do Brasil.
Já formada, participou de um programa de ação afirmativa do Instituto Rio Branco. Criado em 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o projeto oferecia uma bolsa mensal para negros interessados na carreira diplomática se prepararem para o concurso, um dos mais exigentes do país. Ela passou em 2009.
Eu só consegui passar porque era bolsista e estava apenas estudando para o concurso. Se ainda estivesse conciliando minha carga de trabalho no BB [Banco do Brasil], eu não teria tempo de estudar. A bolsa foi determinante, os materiais didáticos para esse concurso são supercaros. Hoje em dia, tem dicionários bons de inglês, francês, espanhol... naquela época não tinha, precisava comprar. É uma preparação bem onerosa, não é qualquer pessoa que pode fazer. E no meu caso, uma mulher negra, que vem de um bairro do subúrbio do Rio de Janeiro, filha de um taxista e de uma cabeleireira, sem a bolsa nunca conseguiria ”passar. none Paula Gomes, chefe da Assessoria Internacional do Ministério da Igualdade Racial
A turma de Paula tinha outras duas mulheres negras além dela — em 109 pessoas. Uma delas era Milena Oliveira de Medeiros, morta após contrair malária numa missão diplomática à África, em 2011. O Itamaraty anunciou neste ano um prêmio com o nome dela, que será concedido a aluno cotista negro com melhor desempenho no Curso de Formação de Diplomatas.
Governo tem trabalhado para propor novo projeto de Lei de Cotas no serviço público. A lei que trata do assunto perde a sua vigência no ano que vem — ela prevê a destinação de 20% das vagas para pretos e pardos. As medidas propostas passam pela ampliação para, no mínimo, 30% a reserva de vagas e previsão de subcotas para mulheres negras.
A Lei de Cotas contribuiu para o aumento de pessoas negras no serviço público. No ano 2000, para cada 100 novos servidores do Executivo Federal, 17 eram negros. Em 2020, essa relação pulou para 43 em 100 novos aprovados nos concursos. "Não é uma bala de prata, mas a gente tem que continuar olhando para essa questão para garantir um pouco mais de equidade", pondera Vanessa.
- Entenda o papel do Estado no combate ao racismo no Brasil
O Brasil foi o último país do planeta a abolir a escravidão e, ao invés de reparar os ex-escravizados, criou dificuldades para inclusão do negro na nova economia baseada no trabalho assalariado. A imigração europeia para as áreas econômicas mais prósperas do país e a Lei de Terras, de 1850, que limitou o acesso à terra da população pobre, contribuíram para impedir a ascensão social da população negra.
“Com a imigração massiva, os ex-escravos vão se juntar aos contingentes de trabalhadores nacionais livres que não têm oportunidades de trabalho senão nas regiões economicamente menos dinâmicas, na economia de subsistência das áreas rurais ou em atividades temporárias, fortuitas, nas cidades”, explicou Mário Theodoro, professor do programa de pós-graduação em direitos humanos da Universidade de Brasília (UnB) que estudou a formação do mercado de trabalho no Brasil sob a ótica racial.
A ausência da reparação pelos mais de 350 anos de escravidão no Brasil e as estatísticas que comprovam que a população negra mantém os piores indicadores sociais e econômicos são os argumentos usados para que o Estado assuma seu papel na luta pela igualdade racial.
Para a representante da Coalizão Negra por Direitos Ingrid Farias, o Estado tem papel central no combate ao racismo e à desigualdade. “É o Estado quem regula nossas relações sociais. O Estado está ligado à nossa dinâmica de mobilidade urbana, de saúde, está ligado à dinâmica territorial dentro dos nossos bairros, a economia também é o Estado que regula em parceria com o mercado”, justificou.
A pesquisadora de gênero, raça e participação política na América Latina acrescentou que sem o Estado não é possível influenciar as estruturas da sociedade. “Por exemplo, várias empresas hoje têm políticas afirmativas de contratação de pessoas negras e isso é fruto da reflexão que o Estado vem provocando junto com a sociedade e que a sociedade vem provocando junto ao Estado brasileiro”, observou.
Apesar de algumas iniciativas legislativas e da criação de conselhos locais contra o racismo, foi somente 115 anos após a abolição que o Brasil criou um órgão federal para elaboração e execução de políticas contra o racismo. Em março de 2003, foi inaugurada a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir).
“De fato, mexer com políticas públicas para a questão racial foi com a Seppir. Antes disso não tinha nada. Havia algumas intenções, algumas legislações, mas não existiam órgãos que mexiam com política pública. Tinha alguns conselhos estaduais, como o de São Paulo, mas órgãos e secretarias não existiam”, destacou.
Levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) mostrou que as políticas para igualdade racial foram reduzidas pelo governo de Jair Bolsonaro. O Plano Plurianual (PPA) de 2019 a 2023, que contempla os programas e ações do governo para o período, excluiu a temática da igualdade racial, que teve os programas absorvidos por outras políticas mais amplas de direitos humanos.
Já o orçamento executado para igualdade racial caiu de R$ 18,7 milhões, em 2019, para R$ 6,94 milhões, em 2022. “Enquanto o governo deixou de financiar a política de igualdade racial, o Brasil seguiu com os piores indicadores para a população negra, que, com o passar dos anos, não têm melhorado. A população negra representa 75% no grupo dos 10% mais pobres, sendo que compõe 56% da população total”, afirma o Inesc.
Com a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a questão racial voltou a figurar no primeiro escalão por meio da criação do Ministério da Igualdade Racial (MIR). Enquanto no PPA anterior não existia menção ao público negro e ao racismo, o projeto de PPA para 2024 a 2027 contemplou o tema em 39 programas.
O novo PPA prevê que a igualdade racial seja uma agenda transversal que deve estar presente em todas as políticas públicas. Para 2024, a previsão é que o MIR tenha um orçamento de R$ 110 milhões, segundo projeto enviado pelo governo ao Congresso.
A assessora do Inesc Carmela Zigoni considera que “é um recurso extremamente pequeno considerando o tamanho do problema e também o tamanho do orçamento público. É um recurso insuficiente se considerarmos os trilhões do orçamento”.
Por outro lado, Zigoni ponderou que o MIR é um ministério meio, que tem o papel de articular e fomentar políticas antirracistas com os ministérios que prestam serviço em massa para população, como os da Saúde, Educação e Justiça e Segurança Pública.
“Qualquer política pública precisa pensar nos impactos que ela vai gerar no enfrentamento ao racismo. Todos os ministérios têm que estar preocupados com isso e não só o MIR. É importante o MIR existir para coordenar e fomentar a igualdade racial com as outras pastas”, destacou.
A coordenadora da Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB), Cleusa Silva, defendeu que as políticas contra o racismo devem ter orçamento compatível com o tamanho da população negra do país. Dados recentes do IBGE indicam que cerca de 57% da população se declaram pretos ou pardos no Brasil.
“É preciso agora ter orçamento que, de fato, contemple essa desigualdade crônica e sistêmica existente na população negra brasileira. Você elabora uma política pública, mas ela é mal dimensionada e não tem o orçamento público que garanta sua efetividade”, afirmou.
Fonte: Agência Brasil - UOL - O Globo