Essas são as últimas palavras de Akash Bashir, um jovem paquistanês de 20 anos, mártir de Cristo, a caminho da beatificação. Por causa dos inúmeros atentados contra as igrejas na cidade de Lahore, no Paquistão, alguns voluntários deviam formar uma barreira a certa distância e controlar os fiéis que chegavam aos poucos. Akash, porém, naquele 15 de março de 2015, quis ficar bem na porta do templo onde já estavam de 1.200 a 1.500 pessoas. Percebeu que um homem com jeito ameaçador se aproximava. Era um kamikaze com um cinto de explosivos ao redor do corpo. Poucas palavras nervosas para tentar fazê-lo desistir. Inutilmente. Então Akash abraça o homem. Um abraço para parar a loucura do ódio, mas que lhe pode custar a vida. O terrorista se explode e Akash morre com ele. No atentado morreram 17 pessoas e 70 ficaram feridas. Sem o sacrifício de Akash, muito maior teria sido o número das vítimas. Um dia, quando a mãe dele lhe manifestou o seu medo de que algo ruim lhe pudesse acontecer, Akash respondeu: “Se Deus me desse essa oportunidade talvez eu salvaria muitas pessoas oferecendo a minha vida. A senhora não seria feliz?”.
O evangelho de Mateus, deste 22º Domingo do Tempo Comum, é a continuidade do trecho que encontramos domingo passado. Após de ter ouvido as palavras de Pedro “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”, Jesus começa a falar abertamente da sua ida para Jerusalém onde terá que sofrer muito, encontrará a morte e, no terceiro dia, ressuscitará. Palavras ainda enigmáticas para os discípulos, mas suficientes para desencadear a reação imediata de Pedro. O apóstolo não consegue imaginar um “messias” perdedor, rejeitado pelos sacerdotes e os mestres da Lei. É verdade que o profeta Isaías já tinha falado do “Servo sofredor”, mas a memória das promessas de Deus se confundia com os anseios de grandeza, de poder e de vitória daquele povo que experimentava, mais uma vez, a opressão de algum império poderoso. A resposta de Jesus a Pedro é contundente. Ele ordena que se afaste. A “pedra” da Igreja pode ser uma pedra de tropeço no caminho que o aguarda. A motivação é clara: “Tu não pensas as coisas de Deus, mas sim as coisas dos homens”. Que “coisas” são essas? Para nós humanos, são aquelas que escolhemos para preencher e dar um sentido à nossa vida. Algumas podem ser, de fato, bem materiais, como as riquezas, o sucesso e o prestígio. Outras só alimentam o nosso orgulho, quando nos achamos melhores que os outros, os julgamos e até desprezamos. Sem falar da inveja, do ciúme, da vingança que ocupam tanto espaço em nosso coração. No entanto, nem tudo é negativo. Temos ambições boas que nos fazem crescer em bondade, temos desejos de ajudar, de sermos mais compassivos e solidários, lutamos pelos direitos, pela paz, pela justiça, deixamo-nos tocar pelo sofrimento dos pequenos e desamparados.
Sabemos também ser bons, mas tudo tem limite, parece que temos medo de ser generosos demais. Assim, por querer salvar ao menos um pouco da nossa vida, corremos o risco de segurar mais do que o necessário, de querer o bem dos outros, mas sempre muito depois do nosso. Afinal, pouco tempo sobra para nos doarmos de verdade, pouco do nosso coração fica livre e feliz para amar sem reservas. Jesus não nos pede para sermos heróis, mas para aprendermos a amar o nosso próximo “como” a nós mesmos (Mt 19,19). Não mais, mas também, nem menos: “como”. E as “coisas” de Deus, quais são? É uma só, bem sabemos, é o amor, porque “Deus é amor” (1Jo 4,8). Ele não fica mais pobre porque ama, não fica triste porque se doa, não se arrepende porque perdoa, nunca fica indiferente porque é rico em misericórdia e compaixão. A “cruz” de Jesus sempre será um mistério de amor grande demais para nós fracos e interesseiros, no entanto, se quisermos seguir a Jesus precisamos aprender aos poucos as “coisas” de Deus. Nunca saberemos quantas vezes Akash tinha imaginado a possibilidade de morrer para salvar a vida de outros irmãos e irmãs. Na hora certa, porém, estava preparado. Por amor, perdeu ou ganhou a vida?
Por Dom Pedro José Conti
Fonte: Diocese de Macapá