Sonho uma Europa, coração do Ocidente, que use o seu engenho para apagar focos de guerra e acender luzes de esperança; uma Europa que saiba reencontrar o seu ânimo jovem, sonhando a grandeza do conjunto e indo além das necessidades imediatas; uma Europa que inclua povos e pessoas, sem correr atrás de teorias e colonizações ideológicas. Foi o desejo expresso pelo Papa em seu primeiro discurso em terras portuguesas, esta quarta-feira, 2 de agosto, no Encontro com as Autoridades, a sociedade civil e o Corpo Diplomático, no âmbito de sua 42ª viagem apostólica internacional, para a JMJ Lisboa 2023.
Já no início de seu discurso Francisco se disse feliz por estar em Lisboa, cidade do encontro que abraça vários povos e culturas e que, nestes dias, se mostra ainda mais universal; torna-se, de certo modo, a capital do mundo. Isto condiz bem, enfatizou o Pontífice, com o seu caráter multiétnico e multicultural e revela os traços cosmopolitas de Portugal, que afunda as suas raízes no desejo de se abrir ao mundo e explorá-lo, navegando rumo a novos e amplos horizontes.
Do oceano, Lisboa conserva o abraço e o perfume. À vista dele, os portugueses são levados a refletir sobre os imensos espaços da alma e sobre o sentido da vida no mundo. Nesta linha, disse Francisco, gostaria também eu de partilhar convosco algumas reflexões, deixando-me levar pela imagem do oceano.
O oceano não liga apenas povos e países, mas também terras e continentes. As grandes questões hoje, como sabemos, são globais e já muitas vezes tivemos de fazer experiência da ineficácia da nossa resposta às mesmas, precisamente porque o mundo, diante de problemas comuns, se mantém dividido ou pelo menos não suficientemente unido, incapaz de enfrentar juntos aquilo que nos põe em crise a todos. Parece que as injustiças planetárias, as guerras, as crises climáticas e migratórias correm mais rapidamente do que a capacidade e, muitas vezes, a vontade de enfrentar em conjunto tais desafios, observou Francisco.
Referindo-se à Jornada Mundial da Juventude, motivo desta sua viagem apostólica a Portugal, o Papa disse esperar que a mesma seja para o «velho continente», um impulso de abertura universal. Na verdade, o mundo tem necessidade da Europa, da Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de pacificadora no Leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente.
No oceano da história, estamos a navegar num momento tempestuoso e sente-se a falta de rotas corajosas de paz. Olhando com grande afeto para a Europa, no espírito de diálogo que a carateriza, apetece perguntar-lhe: Para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo?
E ainda, alargando o campo, prosseguiu Francisco: Que rota segues, Ocidente? A tua tecnologia, que marcou o progresso e globalizou o mundo, sozinha não basta; e muito menos bastam as armas mais sofisticadas, que não representam investimentos para o futuro, mas empobrecimento do verdadeiro capital humano que é a educação, a saúde, o estado social. Fica-se preocupado ao ler que, em muitos lugares, se investem continuamente os recursos em armas e não no futuro dos filhos.
Para onde navegais, Europa e Ocidente, com o descarte dos idosos, os muros de arame farpado, as mortandades no mar e os berços vazios? Para onde ides se, perante o tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte, solução cómoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga que as águas do mar?
Mas Lisboa, abraçada pelo oceano, oferece-nos motivos para esperar, disse o Santo Padre, ressaltando que a Jornada Mundial da Juventude é ocasião para construir juntos.
Reaviva o desejo de criar coisas novas, fazer-se ao largo e navegar juntos rumo ao futuro. Vêm à mente algumas palavras ousadas de Fernando Pessoa: «Navegar é preciso; viver não é preciso (...); o que é necessário é criar» (Navegar é preciso). Trabalhemos, pois, com criatividade para construirmos juntos!
- A rota da Europa e as vias inovadoras para a paz
Se a guerra que estourou no coração da Europa cristã com a agressão russa contra a Ucrânia corre o risco de nos habituar, há alguém que não se cansa de, unindo profecia e realismo, invocar a paz chamando as nações e os povos - e em particular a Europa - às suas responsabilidades. Já no início da sua viagem a Portugal, onde chegou para viver a Jornada Mundial da Juventude, o Papa Francisco falou do papel do Velho Continente, esperando que não se esqueça da própria identidade, mas saiba propor caminhos criativos de paz e soluções diplomáticas, em vez de aceitar a ideia da inevitabilidade da guerra e da corrida pelo rearmamento.
O Sucessor de Pedro observou como "as injustiças planetárias, as guerras, as crises climáticas e migratórias correm mais rapidamente do que a capacidade, e muitas vezes a vontade de enfrentar em conjunto tais desafios". Mas acrescentou que "Lisboa pode sugerir uma mudança de ritmo", já que foi aqui, em 2007, que o Tratado de Reforma da União Europeia foi assinado, que afirma que a União "nas suas relações com o resto do mundo contribui para a paz, a segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equitativo, a erradicação da pobreza e a proteção dos direitos humanos".
Francisco afirmou que "da Europa, da Europa verdadeira, o mundo tem necessidade: precisa do seu papel de construtora de pontes e pacificadora no Leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Oriente Médio. Assim poderá a Europa trazer, para o cenário internacional, a sua originalidade específica", que na atual conjuntura histórica está lutando para emergir. É necessário desenvolver "uma diplomacia da paz que extinga os conflitos e acalme as tensões, capaz de captar o mais débil sinal de distensão e de ler por entre as linhas mais tortas". Se se olha para a realidade de hoje sem antolhos ideológicos, é preciso reconhecer que isso não está acontecendo. É por isso que o Papa direge perguntas à Europa: "Para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo? E ainda, alargando o campo: Que rota segues, Ocidente? A tua tecnologia, que marcou o progresso e globalizou o mundo, sozinha não basta; e muito menos bastam as armas mais sofisticadas, que não representam investimentos para o futuro, mas empobrecimento do verdadeiro capital humano que é a educação, a saúde, o estado social. Fica-se preocupado ao ler que, em muitos lugares, se investem continuamente os recursos em armas e não no futuro dos filhos".
O que mais precisa acontecer para que a Europa se movimente e recupere o seu papel?
De acordo com o Departamento do Procurador-Geral da Ucrânia, até 22 de fevereiro de 2023, a invasão custou a vida de 9.655 civis, incluindo 461 crianças; feriu 12.829 civis, entre os quais, 926 crianças; e resultou em mais de 68 mil mortes, mais de 68 mil crimes de guerra, dos quais 2.600 cometidos contra crianças. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) estima que 8,1 milhões de pessoas foram deslocadas na Europa até o final de fevereiro de 2023. Há áreas inteiras da Ucrânia destruídas, poluídas ou minadas. Essa tragédia precisa ter um fim, primeiro com uma trégua e depois com uma paz justa.
Mas Francisco não deixa de olhar para o futuro com esperança: "Sonho uma Europa, coração do Ocidente, que use o seu engenho para apagar focos de guerra e acender luzes de esperança; uma Europa que saiba reencontrar o seu ânimo jovem, sonhando a grandeza do conjunto e indo além das necessidades imediatas; uma Europa que inclua povos e pessoas, sem correr atrás de teorias e colonizações ideológicas". Mereceria ser ouvido, antes que seja tarde demais.
- Papa chega a Lisboa: "Voltarei rejuvenescido", diz a jornalista no voo
O Papa Francisco, de 86 anos, chegou na manhã desta quarta-feira a Lisboa, onde um milhão de jovens peregrinos de todos os continentes o esperam para participar na Jornada Mundial da Juventude (JMJ).
"Voltarei (desta viagem) rejuvenescido", disse aos cerca de 70 jornalistas que o acompanhavam no avião que aterrisou às 9h45 (horário local) na Base Aérea de Figo Maduro, na capital portuguesa. O Pontífice foi recebido pelo presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Duas crianças em vestes tradicionais lhe ofereceram flores. Em cadeira de rodas, o Papa saudou então as delegações presentes e a Guarda de Honra, enquanto se dirigia para a VIP Lounge montada no Hangar da Base Aérea, onde conversou por alguns minutos com o presidente português, antes de se dirigir ao Palácio Nacional de Belém, distante 6,7 km, para a cerimônia de boas-vindas.
Com 11 pronunciamentos, entre discursos e homilias, e cerca de vinte encontros, o programa desta 42ª Viagem Apostólica promete ser movimentado para o jesuíta argentino, dois meses após a cirurgia a que foi submetido no Hospital Gemelli.
Nos diversos encontros, Francisco tratará de temas como fé, conversão, fraternidade, paz, guerra na Ucrânia, cuidado com a "Casa Comum, justiça social;
No total, os organizadores esperam um milhão de peregrinos de mais de 200 países para esta semana de eventos espirituais, culturais e festivos, aberto na terça-feira com uma Missa no alto de uma colina próxima ao centro da cidade e à foz do Tejo.
Durante o voo, disse aos mais de 70 jornalistas presentes, que “parece que há mais de um milhão de jovens” em Lisboa para a JMJ, “voltarei rejuvenescido”. E agradeceu a eles pela companhia e pelo trabalho, "agora tentarei cumprimentá-los um por um”, disse o Pontífice. “Esta é a quarta Jornada, continuamos a fazer barulho”, disse o Pontífice aos jornalistas, alguns dos quais lhe entregaram presentes.
Aos repórteres poloneses que lhe perguntaram quais serão suas próximas viagens, Francisco respondeu: “Gostaria de voltar”, referindo-se justamente à viagem à Polônia há sete anos. Quanto à investigação lançada pela Santa Sé sobre os casos de abuso no Peru, o Papa Francisco assegurou: “Vamos em frente”.
- Rumo a Lisboa, Papa envia telegrama a chefes de Estado de 3 países
O Papa Francisco se dirigiu nesta quarta-feira (2) para Portugal para participar de um evento instituído por João Paulo II ainda na década de 80, mas que até hoje tem marcado gerações em todo o mundo. A Jornada Mundial da Juventude começou nesta terça (1) em Lisboa, local que tem acolhido jovens de dezenas de países e culturas diferentes num ambiente de fé para pensar o mundo, a paz e o futuro.
O voo papal saiu do Aeroporto Internacional de Fiumicino às 8h do horário italiano, quando o Pontífice enviou o primeiro dos 3 telegramas destinados aos chefes de Estado dos países sobrevoados durante a viagem de pouco mais de 3 horas até a Base Aérea de Figo Maduro, em Lisboa. Assim, Francisco escreveu em língua italiana ao presidente da Itália, Sergio Mattarella:
"No momento em que estou prestes a partir para Portugal por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, animado pela alegria de me encontrar com os jovens provenientes de todo o mundo, espero que, movidos pela fé e ansiosos por 'levantar-se e partir', eles tirem força do encontro com Cristo e sejam encorajados na busca pela verdade e pelo sentido da vida. Certo de compartilhar essa esperança com o senhor, senhor presidente, tenho o prazer de dirigir-lhe a minha cordial saudação, que estendo a todos os italianos, acompanhando-a com o desejo de oração, de paz e de prosperidade."
Por sua vez, o presidente italiano enviou uma mensagem ao Papa com "pensamentos afetudosos juntamente às expressões da mais profunda consideração" pelo Pontífice. Mattarella também agradeceu pelo telegrama recebido no momento em que partia para Portugal e acrescentou:
"A Viagem Apostólica por ocasião da XXXVII Jornada Mundial da Juventude representa uma oportunidade extraordinária de encontro com tantos jovens de todo o mundo, que testemunharão com amizade e fé a confiança no futuro e o desejo de construir um mundo mais inclusivo e solidário."
Durante o trajeto que o levou a Lisboa, o Papa deu seguimento aos telegramas, dirigindo-se sempre em inglês e enviando saudações aos cidadãos dos outros dois países sobrevoados: França e Espanha.
Para o presidente francês, Emmanuel Macron, ao passar pelo espaço aéreo da França a caminho de Portugal, Francisco enviou os melhores votos ao chefe de Estado e a seus cidadãos, ao mesmo tempo em que assegurou "orações pela paz e pelo bem-estar da nação".
No telegrama ao rei da Espanha, Sua Majestada Felipe VI, o Papa saudou a família real e o povo do país e disse lembrar de todos nas orações, invocando sobre o reino "bênçãos de serenidade e alegria de Deus Todo-Poderoso".
Fonte: Vatican News