Contam que, antigamente, um rei estava viajando de carruagem pelo seu reino. Chegou a um castelo, cansado da viagem e das etiquetas do protocolo. Queria descansar um pouco e resolveu dar uma volta sozinho. Vestiu-se de modo simples, para que ninguém o reconhecesse como rei. Chegando à cozinha, encontrou a cozinheira limpando galinhas. Sem rodeios, perguntou-lhe:
– Quanto você ganha por mês?
– Eu ganho quanto o rei – respondeu prontamente a senhora.
– Como assim? Você está comparando o seu serviço e o seu salário com as preocupações e o trabalho de um rei, que tem a missão de governar este imenso país? Não estou entendendo. A serviçal respondeu:
– O serviço pode ser diferente, mas o salário é igual. Eu com o meu trabalho, ganho o céu. O rei, com o trabalho dele, não ganha mais do que o céu. E, além disso, faço o meu trabalho por amor a Deus e, se o rei não fizer o seu trabalho por amor a Deus, pode até não ganhar nada!
O evangelho de Mateus do 11º Domingo do Tempo Comum nos apresenta a escolha que Jesus faz dos doze apóstolos, os nomes e a missão deles. Terão o poder de expulsar os demônios e curar todo tipo de enfermidade (Mt 10,10). Anunciarão a chegada do Reino dos Céus, começando com “as ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt 10,6-7). Estamos no início da missão, depois, no final, Jesus enviará os seus discípulos “a todos os povos” (Mt 28,19). Antes dessas palavras, porém, o evangelista coloca a motivação do envio dos apóstolos: Jesus compadeceu-se das multidões, estavam cansadas e abatidas como ovelhas que não têm pastor (Mt 9,36). Em seguida, ele constata que a messe é grande, mas os trabalhadores são poucos e exorta todos a pedir ao “dono da messe” que envie trabalhadores para a colheita (Mt 9,37-38).
Acompanhando o evangelho, podemos entender que aquelas multidões estavam carentes de força e de alegria, porque lhes faltava a boa notícia do Reino que Jesus estava inaugurando e que, afinal, era ele mesmo presente e atuante. Por isso, ele envia aqueles primeiros apóstolos para que com palavras e sinais, ou seja, com suas próprias vidas, manifestem claramente a chegada do Reino dos Céus. Surge para nós uma pergunta: se o próprio “dono da messe” sabe que precisam trabalhadores, porque ele mesmo não chama mais pessoas para a missão? Por que tem que sermos nós a pedir os operários? Parece escutar a queixa de muitos católicos: faltam padres! É o “dono da messe” que não chama mais a contento ou são os possíveis trabalhadores que não respondem com prontidão e generosidade?
A meu ver as respostas a essas perguntas estão relacionadas entre si. Tenho certeza que o Senhor continua a chamar jovens para os ministérios ordenados na Igreja. Se for assim, somos nós, povo cristão, que não rezamos como deveríamos para que não nos faltem os pastores ou, também, não damos o devido valor a esse “serviço” eclesial. Se a bondade e a fecundidade de uma árvore se medem pelos frutos, seria muito triste ter que reconhecer que as nossas Comunidades estão ficando estéreis. Obviamente as causas dessa situação são muitas e complexas; têm motivações ligadas ao momento atual, mas também raízes históricas herdadas do passado.
Há, porém, ao menos duas razões que quero lembrar. A primeira é, sem dúvida, a excessiva preocupação com o bem-estar particular e individualista. Poucos partilham com Jesus a compaixão pelo rebanho. Parece que gastar a própria vida para anunciar o Reino dos Céus não sirva para dar ânimo e esperança às multidões “cansadas e abatidas” – ou distraídas – de hoje. Melhor cada um cuidar de si mesmo. A segunda razão vai junto e é a busca de alguma vantagem, almejando o maior lucro possível com o menor esforço. Pensando assim, muitos de nós se tornam insensíveis às propostas de doação e gratuidade. Perder a própria vida para ganhá-la (Mt 10,39), como Jesus nos deu o exemplo, está cada vez mais fora de cogitação. Contudo, reis ou cozinheiras, um dia todos “perderemos” esta vida e o maior prêmio merecido será o amor sem limites de Deus. Mas, por ter querido ganhar demais neste mundo, talvez percamos tudo aquilo que virá depois.
Por Dom Pedro José Conti
Fonte: Diocese de Macapá