Cultura

Artigo de Dom Pedro José Conti: O remédio para todos os males





Reflexão para o 10º Domingo do Tempo Comum | 11 de Junho 2023 – Ano “A” 

Certo dia, uma pessoa perguntou a um sábio médico:
– Existe um remédio para curar todos os males?
– Existe, sim – respondeu o sábio médico. Me escute: Pegue o açúcar da penitência, a flor da caridade fraterna, a folha do amor aos pobres, o fruto da humildade e, com isso, encha bem o pilão da misericórdia. Depois, esmigalhe tudo com o joelho, filtre a mistura no lenço da aflição e tome-a junto com as lágrimas no meio da noite. Eis o remédio para todos os males. Ele cura não somente o nosso homem interior, limpa, purifica e renova também o homem exterior. 

Com o 10º Domingo do Tempo Comum voltamos ao tempo litúrgico, que nos acompanhará até o Advento. Continuamos a leitura do evangelho de Mateus e encontramos o chamado ao seguimento que Jesus faz a um cobrador de imposto de nome, também, “Mateus”. Nunca saberemos com certeza se esse “Mateus” é mesmo o autor do primeiro dos quatro evangelhos. Quem o escreveu pode ter tomado emprestado o nome desse apóstolo. No entanto, é uma página muito bonita e iluminadora sobre o jeito de Jesus escolher os seus primeiros e mais próximos discípulos. Várias coisas chamam a nossa atenção. A primeira é que Mateus é um cobrar de impostos, ou seja, um colaborador comprometido com aqueles que exploravam os pequenos produtores e os trabalhadores em geral. Hoje, diríamos que ele era um corrupto que lucrava amparado pelas autoridades locais e estrangeiras, neste caso, os romanos. A situação profissional de Mateus não impede, porém, o chamado dele. Igualmente impressiona a rapidez da sua resposta: “Ele se levantou e seguiu Jesus” (Mt 9,9). Nenhum vacilo, nenhum questionamento. Parece quase que Mateus estivesse aguardando só uma oportunidade para largar aquela vida desonesta que, talvez, já não o deixava mais feliz. Por fim, mais uma surpresa. O, agora, “ex-cobrador” de impostos está tão contente com a pronta resposta que deu ao Mestre, que organiza um banquete convidando Jesus e os seus discípulos, mas também muitos colegas de abusos e falcatruas. Como era de se esperar, a situação levanta as críticas dos fariseus que não conseguem entender essa aproximação – escandalosa para eles – entre Jesus e aquelas pessoas que, por não respeitarem as normas da Lei, eram apontados publicamente como pecadores. Jesus não se deixa intimidar pelas críticas e responde à altura, lembrando a todos as palavras do profeta Oséias: “Quero a misericórdia e não os sacrifícios” (Os 6,6). Afirmando, pois, que são os doentes que precisam do médico e não os sadios, ele está explicando também o porquê do seu convite especial dirigido aos pecadores.

É nesse sentido que o chamado de Mateus se torna exemplar. A possibilidade de mudar de vida deve ser oferecida a todos e a todas. Acontece, muitas vezes, que as próprias pessoas se acham tão erradas que consideram impossível o perdão de Deus. Essa maneira de pensar, no entanto, pode ser culpa dos que se autodefinem “bons” cristãos – os justos de hoje – que, em lugar de ensinar a misericórdia e o perdão apresentam somente ameaças e castigos, como se falar do demónio e das penas do inferno fosse mais importante que anunciar a alegria e a paz oferecidas a quem deseja mudar de vida apesar das suas fraquezas. Talvez seja esse o grande pecado que os “bons” esquecem de confessar: o do orgulho e, mais ainda, de julgar e condenar a vida dos outros. Quando Jesus perdoava os pecadores, nunca lhes dizia para continuar do mesmo jeito, ao contrário, os exortava a não pecar mais e lhes oferecia, antes de tudo, misericórdia e bondade. 

Poucos ou ninguém se corrige por medo. Todos nós mudamos os rumos das nossas vidas quando reconhecemos que o novo caminho que se abre à nossa frente, também se apertado e fadigoso (Mt 7,14), é o caminho certo que nos enche de esperança e abre horizontes nunca antes imaginados. Foi isso que Mateus, o pecador do evangelho deste domingo, percebeu quando Jesus o chamou: algo muito mais valioso que o dinheiro o estava aguardando, o Reino de Deus. O olhar do Senhor e a sua misericórdia o curaram. Este é o remédio para todos os males.

Por Dom Pedro José Conti

 

Fonte: Diocese de Macapá