Cultura

O Papa: que se ponha fim a esta guerra insensata contra a Criação





Em sua mensagem para o Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação, o Papa convida vencer o consumismo voraz, a exploração de recursos e a poluição, apontando quatro caminhos: a conversão do coração, a transformação dos estilos de vida, novas políticas e, por fim, comunhão e sinodalidade.

Foi divulgada, nesta quinta-feira (25/05), a mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação que será celebrado em 1° de setembro próximo.

«Que jorrem a justiça e a paz» é o tema da mensagem do Santo Padre, para o Tempo ecumênico da Criação deste ano, inspirado nas palavras do profeta Amós: «Jorre a equidade como uma fonte, e a justiça como torrente que não seca».

Escutar a palpitação materna da terra

Segundo Francisco, "esta expressiva imagem de Amós nos diz aquilo que Deus deseja. Deus quer que reine a justiça, que é essencial para a nossa vida de filhos, criados à imagem de Deus, como é a água para a nossa sobrevivência física. Deus quer que cada um procure ser justo em todas as situações e sempre se esforce por viver segundo as suas leis, permitindo à vida florescer plenamente".

“Quando buscarmos antes de tudo o Reino dos Céus, mantendo uma justa relação para com Deus, a humanidade e a natureza, então a justiça e a paz poderão jorrar como torrente inexaurível de água pura, vivificando a humanidade e todas as criaturas.”

O Pontífice recorda que em julho de 2022, durante sua viagem apostólica ao Canadá, às margens do Lago de Sant’Ana, província de Alberta, ele convidou a meditar sobre isso. "Aquele lago foi, e é, um local de peregrinação para muitas gerações de indígenas", pois ali eles "encontraram a consolação e a força para continuar".

Segundo o Papa, "imersos na criação, podemos escutar: a palpitação materna da terra. E assim como o batimento dos bebés, ainda no seio materno, está em harmonia com o das mães, assim também para crescer como seres humanos precisamos cadenciar os ritmos da existência com os da criação que nos dá vida".

Efeitos devastadores da guerra ambiental

Francisco convida, neste Tempo da Criação, "a sondar estes batimentos do coração: o nosso, o das nossas mães e das nossas avós, o pulsar do coração da criação e do coração de Deus" e faz um apelo "a permanecer ao lado das vítimas da injustiça ambiental e climática, pondo fim a esta guerra insensata contra a criação".

De acordo com o Pontífice, "o consumismo voraz, alimentado por corações egoístas, está transtornando o ciclo da água do planeta, o uso desenfreado de combustíveis fósseis e a destruição das florestas estão criando um aumento das temperaturas e provocando secas graves, as terríveis carências hídricasestão afligindo cada vez mais as nossas casas, desde as pequenas comunidades rurais até às grandes cidades, as indústrias predatórias estão esgotando e poluindo as nossas fontes de água potável com atividades extremas, como o fraturamento hidráulico para a extração de petróleo e gás, os megaprojetos de extração descontrolada e a engorda acelerada de animais. Apropriam-se da «irmã água» – como lhe chama São Francisco, transformando-a em «mercadoria sujeita às leis do mercado»".

Ação urgente em prol do clima 

Francisco recorda que "o Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC) defende uma ação urgente em prol do clima a fim de nos impedir de desperdiçar a ocasião para criar um mundo mais sustentável e justo. Podemos e devemos evitar que se verifiquem as piores consequências. Devemos nos decidir a transformar os nossos corações, os nossos estilos de vida e as políticas públicas que regem a nossa sociedade".

Transformar os nossos corações

Portanto, em primeiro lugar, devemos transformar "os nossos corações. Isto é essencial, se se quer começar qualquer outra transformação. É a «conversão ecológica» que São João Paulo II nos exortava a realizar: a renovação do nosso relacionamento com a criação, de modo que já não a consideremos como objeto a explorar, mas, ao contrário, guardemo-la como um sacro dom do Criador. Depois, devemos nos conscientizar de que uma abordagem global requer que se pratique o respeito ecológico nas quatro vertentes: para com Deus, para com os nossos semelhantes de hoje e de amanhã, para com toda a natureza e para com nós mesmos".

Transformar os nossos estilos de vida

Em segundo lugar, devemos transformar "os nossos estilos de vida. Partindo duma grata admiração do Criador e da criação, arrependamo-nos dos nossos «pecados ecológicos», como adverte o meu irmão Patriarca Ecumênico Bartolomeu. Estes pecados prejudicam o mundo natural e também os nossos irmãos e irmãs. Com a ajuda da graça de Deus, adotemos estilos de vida com menor desperdício e menos consumos inúteis, sobretudo onde os processos de produção são tóxicos e insustentáveis. Procuremos estar o mais possível atentos aos nossos hábitos e opções econômicas, para que todos possam estar melhor: os nossos semelhantes, onde quer que se encontrem, e também os filhos dos nossos filhos. Colaboremos para esta criação contínua de Deus através de opções positivas: fazendo o uso mais moderado possível dos recursos, praticando uma jubilosa sobriedade, separando e reciclando o lixo e recorrendo a produtos e serviços – e há tantos à nossa disposição – que sejam ecológica e socialmente responsáveis".

Transformar as políticas públicas

Por fim, "devemos transformar as políticas públicas que regem as nossas sociedades e moldam a vida dos jovens de hoje e de amanhã. Políticas econômicas, que favorecem riquezas escandalosas para poucos e condições degradantes para muitos, decretam o fim da paz e da justiça". Segundo Francisco, "é evidente que as nações mais ricas acumularam", e cita a encíclica Laudato si’, "uma «dívida ecológica». Os líderes mundiais presentes na Cúpula COP28, programada de 30 de novembro a 12 de dezembro deste ano em Dubai, devem ouvir a ciência e começar uma transição rápida e equitativa para acabar com a era dos combustíveis fósseis".

"À luz dos compromissos do Acordo de Paris tendentes a suspender o risco do aquecimento global, é insensato permitir a exploração e expansão contínua das infraestruturas para os combustíveis fósseis."

“Levantemos a voz para deter esta injustiça para com os pobres e os nossos filhos, que sofrerão os impactos piores das mudanças climáticas.”

"Apelo a todas as pessoas de boa vontade para agirem de acordo com estas orientações acerca da sociedade e da natureza", escreve o Papa

Caminho de diálogo sinodal e conversão

"Numa perspetiva paralela, mais específica do serviço da Igreja Católica, temos a sinodalidade", sublinha Francisco, recordando que "este ano, o encerramento do Tempo da Criação, na festa de São Francisco, em 4 de outubro, coincidirá com a abertura do Sínodo sobre a Sinodalidade". "Como os rios que são alimentados por mil ribeirinhos e torrentes maiores, o processo sinodal, iniciado em outubro de 2021, convida todos os componentes, a nível pessoal e comunitário, a convergirem num majestoso rio de reflexão e renovação. Todo o Povo de Deus está envolvido num abrangente caminho de diálogo sinodal e conversão", ressalta.

Francisco conclui a mensagem, destacando que "à semelhança duma bacia hidrográfica com os seus numerosos afluentes grandes e pequenos, a Igreja é uma comunhão de inumeráveis Igrejas locais, comunidades religiosas e associações que se alimentam da mesma água. Cada fonte acrescenta a sua contribuição única e insubstituível, até confluírem todas no vasto oceano do amor misericordioso de Deus. Como um rio é fonte de vida para o ambiente que o rodeia, assim a nossa Igreja sinodal deve ser fonte de vida para a casa comum e quantos nela habitam. E como um rio dá vida a todo o tipo de espécies animal e vegetal, assim uma Igreja sinodal deve dar vida semeando justiça e paz em todo lugar que alcance".

 

- Francisco às religiosas: o amor nos torna livres e criativos

Por ocasião do XIII Capítulo Geral das Pequenas Irmãs Missionárias da Caridade, fundadas por Dom Orione, o Papa Francisco recebeu representantes da congregação religiosa e lhes indicou três vias fundamentais para encarnar a ação misericordiosa de Deus e da Igreja em um espírito maternal: estar unidas a Jesus, próximas de seus irmãos e irmãs e ativas no serviço.

 

Em sua mensagem às filhas de Dom Orione, recebidas hoje em Audiência, o Papa Francisco recordou que seu fundador, quando formou a primeira comunidade das religiosas, lhes deu como missão "fazer com que as pessoas experimentem a Providência de Deus e a maternidade da Igreja". Ou seja, ele as chamava a encarnar a ação misericordiosa de Deus e da Igreja em um espírito maternal. E indicou três as maneiras fundamentais: estar unidas a Jesus, próximas de seus irmãos e irmãs e ativas no serviço.

"Dom Orione estava ciente dessa realidade quando disse que 'para conquistar Deus e conquistar os outros, devemos primeiro viver uma intensa vida de Deus em nós mesmos', uma fé que arde dentro de nós e brilha ao nosso redor. Portanto, deixem-se sempre conquistar primeiro pelo Senhor, por sua presença viva na Eucaristia, em sua Palavra, em vocês mesmas por meio do Espírito Santo", destacou o Pontífice acerca da união com Jesus.

“Um pedaço de pão compartilhado com um sorriso é melhor do que um prato que pode ser refinado, mas temperado com frieza e insípido de amor”

Falando sobre o segundo modo de encarnar a ação misericordiosa de Deus, a proximidade aos irmãos, o Pontífice sublinhou: "Sabemos que um pedaço de pão compartilhado com um sorriso é melhor do que um prato que pode ser refinado, mas temperado com frieza e insípido de amor". Assim o Papa pediu que as casas e locais de serviço acompanhados pelas irmãs sejam repletos de calor materno.

"Uma mãe nunca desiste diante das necessidades de seus filhos: ela nunca deixa faltar atenção, surpresas, carinho e até mesmo as repreensões necessárias; ela consegue encontrar soluções e remédios inesperados, mesmo diante de situações difíceis ou da incompreensão dos outros: é porque uma mãe ama, e o amor nos torna livres e criativos!"

Por fim, Francisco falou sobre o modo de servir os mais necessitados: "com as "mangas arregaçadas", como boas mães, com compaixão, criatividade e imaginação, na caridade." E concluiu augurando um saber amar com aquela maternidade que faz com que os filhos se sintam em casa. "Peço-lhes que amem dessa forma, como fez São Luís Orione, como mães na caridade", concluiu o Pontífice.

 

O Papa: caminho sinodal, experiência espiritual única de conversão e renovação

Continuai caminhando. Ao tempo em que colheis os primeiros frutos com relação às perguntas e questões que surgiram, sois convidados a não parar. Continuai caminhando, deixando que o Espírito vos guie: disse Francisco aos bispos e delegados do “Caminho sinodal das Igrejas na Itália”, recebidos na manhã desta quinta-feira, 25 de maio, pelo Santo Padre

O Sínodo nos chama a nos tornarmos uma Igreja que caminha com alegria, humildade e criatividade neste nosso tempo, ciente de que somos todos vulneráveis e precisamos uns dos outros. E acrescento: caminhar buscando gerar vida, multiplicar a alegria, não apagar os fogos que o Espírito acende nos corações.

Foi a veemente exortação de Francisco ao receber em audiência na manhã desta quinta-feira (25/05) na Sala Paulo VI, no Vaticano, os bispos e delegados do “Caminho sinodal das Igrejas na Itália”, um expressivo grupo de cerca de mil pessoas.

Este encontro se insere em meio a um processo sinodal que diz respeito a toda a Igreja e, nela, as Igrejas locais, nas quais os Canteiros sinodais se constituíram como uma bela experiência de escuta do Espírito e de discussão entre as diferentes vozes das comunidades cristãs, observou o Papa.

Comunidades eclesiais mais missionárias

Isso gerou um envolvimento de muitos, especialmente em certas questões que reconheceis como cruciais e prioritárias para o presente e o futuro. É uma experiência espiritual única de conversão e renovação que pode tornar vossas comunidades eclesiais mais missionárias e mais bem preparadas para a evangelização no mundo de hoje, prosseguiu.

O Santo Padre exortou-os a prosseguir com coragem e determinação neste caminho valorizando, em primeiro lugar, o potencial presente nas paróquias e nas várias comunidades cristãs.

Tendo em mente a fase do discernimento eclesial (fase sapiencial) do caminho sinodal, após a fase da escuta, Francisco desenvolveu seu discurso propondo algumas tarefas, incumbências.

Continuai caminhando

Aqui está, então, a primeira incumbência: continuai caminhando. Ao tempo em que colheis os primeiros frutos com relação às perguntas e questões que surgiram, sois convidados a não parar. Continuai caminhando, deixando que o Espírito vos guie.

Uma Igreja sinodal é assim porque tem uma viva consciência de caminhar na história em companhia do Ressuscitado, preocupada não em salvaguardar a si mesma e os próprios interesses, mas em servir o Evangelho em um estilo de gratuidade e de cuidado, cultivando a liberdade e a criatividade próprias de quem dá testemunho da boa nova do amor de Deus, permanecendo enraizada no essencial. Uma Igreja sobrecarregada por estruturas, burocracia e formalismo terá dificuldades para caminhar na história, em sintonia com o Espírito, para encontrar os homens e as mulheres de nosso tempo, prosseguiu o Santo Padre.

Fazer a Igreja juntos

A segunda incumbência é esta: fazer a Igreja juntos. Isso é algo que sentimos ser urgentemente necessário hoje, sessenta anos após a conclusão do Concílio Vaticano II. De fato, a tentação de separar alguns poucos "atores qualificados" que realizam a ação pastoral enquanto o resto do povo fiel permanece "meramente receptivo às suas ações" está sempre à espreita. A Igreja é o Povo santo e fiel de Deus e nele, "em virtude do batismo recebido, cada membro se tornou um discípulo missionário".

Nesse sentido, afirmou Francisco, devemos pedir ao Espírito Santo que nos faça entender e experimentar como ser ministros ordenados e como exercer o ministério neste tempo e nesta Igreja: nunca sem o Outro com "O" maiúsculo, nunca sem os outros com quem compartilhar o caminho. Isso vale para os bispos, cujo ministério não pode prescindir do ministério dos presbíteros e diáconos; e também é verdade para os próprios presbíteros e diáconos, que são chamados a expressar seu serviço dentro de um nós maior, que é o presbitério. Mas isso também se aplica a toda a comunidade dos batizados, na qual cada um caminha com outros irmãos e irmãs na escola do único Evangelho e na luz do Espírito.

Ser uma Igreja aberta

A terceira incumbência: ser uma Igreja aberta. Redescobrir a própria corresponsabilidade na Igreja não significa implementar lógicas mundanas de distribuição de poder, mas significa cultivar o desejo de reconhecer o outro na riqueza de seus carismas e de sua singularidade.

Dessa forma, é possível encontrar um lugar para aqueles que ainda lutam para ver sua presença na Igreja reconhecida, aqueles que não têm voz, aqueles cujas vozes são encobertas, se não silenciadas ou ignoradas, aqueles que se sentem inadequados, talvez por terem trajetórias de vida difíceis ou complexas. Mas lembremo-nos: a Igreja deve deixar transparecer o coração de Deus: um coração aberto a todos e para todos.

O Espírito Santo, protagonista do processo sinodal

Francisco concluiu exortando-os a confiar este caminho sinodal ao Espírito Santo. “Queridos irmãos e irmãs, continuemos juntos este percurso, com grande confiança na obra que o Espírito Santo está realizando. É Ele o protagonista do processo sinodal: é Ele que abre as pessoas e as comunidades à escuta; é Ele que torna o diálogo autêntico e frutuoso; é Ele que ilumina o discernimento; é Ele que guia as escolhas e as decisões. É Ele, acima de tudo, que cria a harmonia e a comunhão na Igreja.

Fonte: Vatican News