Cultura

Artigo de Dom Pedro José Conti: Estando fechadas as portas





Reflexão para o 2º domingo de Páscoa| 16 de Abril 2023 – Ano “A” 

Os monges mais idosos contavam isto: “Um velho monge vivia trancado em sua cela e ali lutava contra as tentações. Via os demônios face a face e zombava deles. Um demônio, porém,  sentindo-se derrotado fez mais uma tentativa. Apareceu ao velho e lhe disse:
– Eu sou o Cristo. Diante daquilo o monge fechou os olhos. O demônio continuou:
– Está fechando os olhos diante do seu Senhor? Mas o ancião respondeu: – Não é aqui neste mundo que eu quero ver o meu Senhor, mas na outra vida! A essas palavras o demônio desapareceu.”

No Segundo Domingo de Páscoa sempre encontramos a página do evangelho de João que nos apresenta duas aparições de Jesus Ressuscitado. Um “ao anoitecer daquele dia, o primeiro dia da semana”, ou seja, ainda no dia de Páscoa, e a outra “oito dias depois”. O apóstolo Tomé faltou na primeira vez, mas esteve presente na segunda. A forma narrativa dos evangelhos não é um simples relato, é muito mais um anúncio ou várias “boas notícias” ao mesmo tempo. A primeira consideração diz a respeito dos discípulos que se reuniram “de portas fechadas”. Com certeza temiam os judeus que mataram Jesus e, talvez, tinham outro medo, alimentado pelo senso de culpa por ter abandonado o seu Mestre na hora da Paixão. Naquele momento, Pedro e os demais esqueceram a promessa de nunca negar o Senhor (Mt 26,33-35). No entanto, eis a novidade: Jesus vivo e ressuscitado “entrou”, colocou-se no meio deles e lhes ofereceu a paz. Nada de reprovação, nada de cobrança ou ameaças: somente reconciliação e perdão. Essa atitude de paz e misericórdia é a grande novidade pascal, o sinal que ajuda a reconhecer e a acreditar em que consiste a “vida nova”, que Jesus oferece aos que decidem tornar-se seus seguidores. O “pecado” é sempre um fechamento nos nossos interesses e, por isso, afasta-nos do amor de Deus e dos irmãos. Ao contrário, o perdão abre novas possibilidades de relacionamentos, reativa a confiança, estreita laços entre aqueles e aquelas que partilham não só as fragilidades humanas, mas também a alegria de poder recomeçar a amar e a ser amados com aquela gratuidade, que somente a verdadeira misericórdia pode dar. Mais uma vez, é-nos apresentada a grandeza da bondade de Deus através da pessoa de Jesus. Deus é sempre comparável ao pai bondoso da parábola do filho pródigo que volta em busca de comida: corre ao encontro dele, o abraça e faz festa!

A Páscoa do Senhor deve ser a festa do perdão. Com efeito, junto com o dom do Espírito Santo para que os discípulos tenham a força de continuar a missão do Reino, Jesus lhes entrega a possibilidade de perdoar os pecados, não tanto como um poder, mas como o sinal claro e indiscutível da “vida nova” da Páscoa. Mágoas, ressentimentos, desconfianças, vinganças e castigos, são sinais inequivocáveis da vida velha, não são a vontade daquele Deus que Jesus veio nos fazer conhecer. Isso não significa que não temos mais pecados. Na realidade, todos nós continuamos com as nossas fraquezas, mas ser pecadores não pode mais ser uma desculpa para não perdoar aos outros e, sobretudo, para não amar mais e colocar, justamente, mais compaixão e misericórdia lá onde é difícil construir paz e fraternidade. O apóstolo Tomé não ouviu as palavras do Senhor Jesus, duvidou do testemunho dos irmãos.

No ensinamento do evangelista João, o próprio Jesus o convida a colocar os dedos nas suas chagas e a acreditar. Isso porque foi na cruz que Jesus venceu, uma vez por todas, “o pecado do mundo”. Foi obediente ao Pai e, portanto, em total comunhão de amor com ele e, também, amou a todos nós até o fim.

Lemos na carta aos Romanos que “o homem velho foi crucificado com Cristo…e se já morremos com Cristo, cremos que também viveremos com ele, sabendo que Cristo, ressuscitado dos mortos não morre mais”(Rm 6, 6-11). Precisamos aprender a reconhecer o Senhor em todos aqueles que carregam as “chagas” dos sofrimentos e das injustiças, mas também naqueles que sabem amar e servir, sabem perdoar e construir a paz, sem nunca desistir. São nossos irmãos e irmãs em carne e osso. Outras “aparições” de Jesus neste mundo podem ser um engano.

Por Dom Pedro José Conti

 

Fonte: Diocese de Macapá