Cultura

Na Audiência Geral, a homenagem de Francisco a Bento XVI: mestre de catequese





Na primeira Audiência Geral de 2023, o Papa encerrou o ciclo sobre o discernimento, mas antes de sua catequese falou de Bento XVI: "O seu pensamento perspicaz e gentil não foi autorreferencial, mas eclesial, pois sempre quis acompanhar-nos ao encontro com Jesus".

Uma homenagem ao “grande mestre de catequese”: antes de se dirigir aos fiéis e peregrinos presentes na Sala Paulo VI para a Audiência Geral, o Papa Francisco voltou seu pensamento ao Papa emérito:

“Antes de começar esta catequese, gostaria que nos uníssemos a quantos, aqui ao lado, prestam homenagem a Bento XVI e dirigir o meu pensamento a ele, que foi um grande mestre de catequese. O seu pensamento perspicaz e gentil não foi autorreferencial, mas eclesial, pois sempre quis acompanhar-nos ao encontro com Jesus. Jesus, o Crucificado Ressuscitado, o Vivente e o Senhor, foi a meta para a qual o Papa Bento nos conduziu, levando-nos pela mão. Que ele nos ajude a redescobrir em Cristo a alegria de acreditar e a esperança de viver.”

Na primeira catequese do ano de 2023, Francisco encerrou o ciclo sobre o discernimento completando o discurso sobre as ajudas que podem e devem sustentá-lo. Uma delas é o acompanhamento espiritual, importante sobretudo para o conhecimento de si que é uma condição indispensável para boas escolhas. “Olhar-se no espelho sozinho nem sempre ajuda, porque alguém pode fantasiar a imagem. Ao invés, olhar-se no espelho com a ajuda de outra pessoa, se verdadeira, isto ajuda.”

Em primeiro lugar, é importante dar-se a conhecer, sem ter medo de compartilhar os aspectos mais frágeis. O orientador não deve decidir por nós, mas nos acompanhar no caminho da vida. “A fragilidade é, na realidade, a nossa verdadeira riqueza”, disse Francisco, que devemos aprender a respeitar e a aceitar; é o que nos torna humanos.

Se for dócil ao Espírito Santo, o acompanhamento espiritual ajuda a desmascarar equívocos até graves na consideração de nós mesmos e na relação com o Senhor.

Narrar diante de outra pessoa o que vivemos ou o que procuramos, em primeiro lugar, ajuda a fazer clareza em nós próprios, trazendo à luz os numerosos pensamentos que habitam em nós.

A pessoa que acompanha não se substitui ao Senhor, não faz o trabalho no lugar da pessoa acompanhada, mas caminha ao seu lado, encoraja-a a ler o que se move no seu coração, o lugar por excelência onde o Senhor fala.

Sempre acompanhado, jamais só

O Papa diz preferir o termo “acompanhador espiritual” e não “diretor espiritual” e a propósito de não caminhar só, repetiu um dito africano, que diz “Se quiser chegar depressa, vá sozinho. Se quiser chegar seguro, vá com os outros”.

“Vá acompanhado, com o seu povo. É importante. Na vida espiritual, é melhor fazer-se acompanhar por alguém que conheça nossas coisas e nos ajude. E isto é o acompanhamento espiritual.”

Outro aspecto importante do acompanhamento espiritual é estar inserido numa comunidade, ou seja, o aspecto da filiação e da fraternidade espiritual, pois “não vamos ao encontro do Senhor sozinhos”. “Não estamos sós, somos gente de um povo, de uma nação, de uma cidade que caminha, de uma igreja, de uma paróquia, deste grupo... uma comunidade em caminho.”

Nossa Senhora, mestra de discernimento

Francisco propôs como “mestra de discernimento” a Virgem Maria, que “fala pouco, ouve muito e conserva no coração”. E contou algo “curioso” que ouviu de uma senhora “muito simples”, que não tinha estudado teologia.

Ela perguntou a Francisco se ele conhecia o gesto que faz Nossa Senhora. Ao não entender, ela respondeu apontandoNossa Senhora aponta sempre para Jesus. “Isto é belo: Nossa Senhora não toma nada para si, aponta para Jesus.”

O discernimento é uma arte

“Caros irmãos e irmãs, o discernimento é uma arte, uma arte que se pode aprender e que tem as suas próprias regras. Se for bem aprendido, ele permite viver a experiência espiritual de forma cada vez mais bonita e ordenada. O discernimento é sobretudo um dom de Deus, que deve ser sempre pedido, sem jamais presumir ser perito e autossuficiente.”

O Papa conclui com uma exortação repetida várias vezes no Evangelho: Não tenha medo! “Se confiarmos na Sua palavra, desempenharemos bem o jogo da vida, e poderemos ajudar outros.”

Bianca Fraccalvieri 
 
 
Bento XVI: uma onda de afeto e de oração, cerca de 135 mil já prestaram homenagem

No segundo dia do velório do Papa Emérito, outras 70 mil pessoas passaram das 7h às 19h em frente ao caixão exposto na Basílica do Vaticano. Nesta quarta-feira (04) também será possível homenagear o Emérito na Basílica até as 19h, antes do funeral que será presidido por Francisco na quinta-feira de manhã.

Fiéis de todas as nacionalidades continuam, em fila de modo ordenado, a entrar na Basílica de São Pedro. Uma oração, uma saudação ou um simples olhar para Bento XVI. Nesta quarta-feira (04), das 7h às 19h outros fiéis poderão homenageá-lo, é o último dia em que o corpo do Papa Emérito será exposto à devoção dos fiéis. Parte da Praça de São Pedro foi colocada à disposição das emissoras que filmarão o funeral na quinta-feira (5), celebrado pelo Papa Francisco. Espera-se a chegada de autoridades de todo o mundo e cerca de 70 mil participantes.

Os agradecimentos do mundo a Bento XVI

E da penumbra da Basílica Petrina, da mesma forma ordenada, as pessoas saem lentamente, muitos com os olhos brilhantes, em suas mentes talvez as últimas palavras proferidas por Bento XVI, "Senhor, eu te amo", sinal e luz do ministério sacerdotal, pastoral e papal que acompanhou toda a vida de Joseph Ratzinger.

"Obrigado Papa Bento"

A emoção não impede que as pessoas que foram fazer a última homenagem ao Emérito comuniquem seus sentimentos. Nas entrevistas feitas pela Rádio Vaticano – Vatican News, há quem agradeça ao Senhor por nos ter dado Bento XVI, há quem chegou ao Vaticano em espírito de peregrinação: todos em um dia, das cidades italianas e do mundo inteiro, só para dizer obrigado a Joseph Ratzinger. E há também os que querem pedir perdão ao Papa Emérito por não ter compreendido completamente sua mensagem quando ele era Pontífice, uma mensagem posteriormente redescoberta através de seus escritos. Certamente - este é o pensamento comum - que o magistério continuará a ensinar muito, mesmo agora que Bento XVI voltou à casa do Pai.

Giancarlo La Vella 

 

Papa: a teologia de Bento XVI, paixão e riquezas impregnadas de Evangelho

Francisco escreveu o prefácio de um livro da Libreria Editrice Vaticana "Deus é sempre novo", que reúne pensamentos espirituais do Papa Emérito: "A sua argumentação da fé era realizada com a devoção do homem que se entregou inteiramente a Deus"

Fico feliz que o leitor possa ter em mãos este texto de pensamentos espirituais do falecido Papa Bento XVI. O título já expressa um dos aspectos mais característicos do magistério e da própria visão da fé do meu predecessor: sim, Deus é sempre novo porque Ele é fonte e razão da beleza, da graça e da verdade. Deus nunca é repetitivo, Deus nos surpreende, Deus traz novidade. O frescor espiritual que transparece destas páginas o confirma com intensidade.

Bento XVI fazia teologia de joelhos. A sua argumentação da fé era realizada com a devoção do homem que se entregou inteiramente a Deus e que, sob a guia do Espírito Santo, buscava uma compenetração cada vez maior do mistério de Jesus que o fascinara desde sua juventude.

A coletânea de pensamentos espirituais apresentada nestas páginas mostra a capacidade criativa de Bento XVI para investigar os vários aspectos do cristianismo com uma fecundidade de imagens, de linguagem e de perspectiva que se tornam um estímulo contínuo para cultivar o precioso dom de acolher a Deus na própria vida. A forma como Bento XVI foi capaz de fazer interagir coração e razão, pensamento e afetos, racionalidade e emoção é um modelo fecundo sobre como poder contar a todos a força clamorosa do Evangelho.

O leitor verá isso confirmado nestas páginas, que representam - também graças à competência do Editor, a quem vai os nossos sinceros agradecimentos - uma espécie de “síntese espiritual” dos escritos de Bento XVI: aqui brilha a sua capacidade de mostrar a profundidade da fé cristã sempre nova. É suficiente um pequeno florilégio. "Deus é um evento de amor", uma expressão que por si só faz plena justiça a uma teologia que é sempre harmoniosa entre razão e afeto. "E que mais nos poderia salvar senão o amor", perguntou aos jovens na vigília de oração em Colônia, em 2005, meditação adequadamente recordada aqui, colocando uma pergunta que evoca Fëdor Dostoevskij. E quando fala da Igreja, sua paixão eclesial o fez pronunciar palavras impregnadas de pertença e afeto: "Não somos um centro de produção, não somos uma empresa voltada para o lucro, somos Igreja". 

A profundidade do pensamento de Joseph Ratzinger, que se fundamentava na Sagrada Escritura e nos Padres da Igreja, ainda hoje nos é útil. Estas páginas abordam uma série de tópicos espirituais e são um incentivo para que permaneçamos abertos ao horizonte da eternidade que o cristianismo tem em seu DNA. O pensamento e o magistério de Bento XVI são e continuarão sendo sempre fecundos ao longo do tempo, porque souberam se concentrar nas referências fundamentais da nossa vida cristã: antes de tudo a pessoa e a palavra de Jesus Cristo, e depois as virtudes teologais, ou seja, a esperança, a fé e a caridade. E por isso, toda a Igreja lhe será sempre grata. Para sempre.

Em Bento XVI, a devoção incessante e o magistério iluminado se uniram em uma aliança harmoniosa. Quantas vezes falou da beleza com palavras comovedoras! Bento sempre considerou a beleza como uma estrada privilegiada para abrir homens e mulheres ao transcendente e assim poder encontrar Deus, que para ele era a mais alta tarefa e a missão mais urgente da Igreja. Em particular, para ele, a música era uma arte próxima com a qual elevar o espírito e a interioridade. Mas isto não desviava sua atenção, como verdadeiro homem de fé, das grandes e espinhosas questões de nosso tempo, observadas e analisadas com um juízo consciente e um corajoso espírito crítico. Da escuta das Escrituras, lidas na tradição sempre viva da Igreja, ele foi capaz, desde jovem, de extrair aquela sabedoria útil e indispensável para estabelecer um diálogo de confronto com a cultura de seu tempo, como estas páginas confirmam. 

Agradecemos a Deus por ter nos dado o Papa Bento XVI: com a sua palavra e o seu testemunho nos ensinou que através da reflexão, do pensamento, do estudo, da escuta, do diálogo e sobretudo da oração é possível servir a Igreja e fazer o bem a toda a humanidade; nos ofereceu instrumentos intelectuais vivos para que cada crente possa dar razão da própria esperança, recorrendo a um modo de pensar e de comunicar que possa ser compreendido por seus contemporâneos. Seu objetivo era constante: dialogar com todos a fim de buscar juntos os caminhos através dos quais encontrar Deus. 

Esta busca do diálogo com a cultura do próprio tempo sempre foi um desejo ardente de Joseph Ratzinger: ele, como teólogo primeiro e como pastor depois, nunca se limitou a uma cultura meramente intelectualista, desencarnada da história dos homens e do mundo. Com o seu exemplo de intelectual rico de amor e de entusiasmo (que etimologicamente significa estar em Deus) mostrou-nos que buscar a verdade é possível, e que se deixar possuir por ela é o que há de mais alto que o espírito humano possa alcançar. Neste caminho todas as dimensões do ser humano, a razão e a fé, a inteligência e a espiritualidade, têm seu próprio papel e especificidade.

A plenitude da nossa existência, nos recordou com a palavra e o exemplo Bento XVI, encontra-se apenas no encontro pessoal com Jesus Cristo, o Vivente, o Logos encarnado, a revelação plena e definitiva de Deus, que n’Ele se manifesta como Amor até o fim.

Este é meu desejo para o leitor: que possa encontrar nestas páginas percorridas pela voz apaixonada e gentil de um mestre de fé e de esperança a graça de um novo e vivificante encontro com Jesus.

 

Fonte: Vatican News