Numa região rural, de natureza exuberante, havia um povoado cercado por uma serra muito bonita. Entre as montanhas havia uma, a mais alta, que se chamava Montanha da Paz pela suavidade das cores e formas da sua vegetação. Muitas pessoas subiam até o seu cume para desfrutarem da beleza natural do local. Sentadas lá em cima, elas percebiam as suas dificuldades diminuírem de proporção e quanto mais olhavam para baixo, mais se convenciam de que o seu problema era menor do que imaginavam. De lá de cima, tudo parecia ser pequeno e ter, praticamente o mesmo tamanho. Ao descerem da Montanha da Paz, as pessoas sentiam-se melhor. Tinham a percepção que toda dificuldade era pequena diante da grandeza de um mundo tão maravilhosos.
Com este domingo e sob a proteção de Maria, “Mãe de Deus”, iniciamos o novo ano civil. Também celebramos o 56º Dia Mundial da Paz. É bonito iniciar uma nova temporada com o pensamento e o desejo de paz, mas, olhando ao nosso redor e prestando atenção às notícias que chegam até nós, temos a impressão que ela seja cada vez mais difícil, para não dizer impossível. Sem dúvida alguma, a “paz” no sentido amplo da palavra será sempre algo em construção, um esforço “artesanal” feito de infinitos gestos, grandes e pequenos, capazes de apaziguar as relações entre as pessoas, os países, a humanidade inteira. Entendemos que estão em jogo interesses gigantescos, áreas de influências econômicas e militares das grandes potências, ódios antigos, questões nunca resolvidas, medo de uma guerra nuclear, preconceitos raciais e culturais. Soubemos, poucos dias atrás, que o planeta Terra chegou aos oito bilhões de habitantes.
Para alguns analistas, isso significa que, se não mudarmos certos costumes, estamos perto de não ter mais condições de garantir alimentos e, em tempos breves, água doce para todos. As mudanças climáticas também vão influenciar a vida de povos inteiros com migrações em massa forçadas pela desertificação, pelos desastres naturais e o aumento do nível da água dos mares. Como se tudo isso não bastasse – ou por causa de tudo isso – sabemos que diversas guerras estão em curso, espalhadas pelo planeta, algumas mais publicizadas, outras quase escondidas, mas todas fatais para milhões de pessoas. Quantas crianças pelo mundo vivem na mais absoluta incerteza sobre o seu futuro… Se sobreviverem, qual e como será a “pátria” delas? Nesta altura, vale a pena ainda acreditar na paz, rezar e esperar que um dia ela chegue e faça de nós uma humanidade feliz?
Evidentemente não tenho propostas ou estratégias particulares para resolver questões tão grandes, no entanto não quero desistir de confiar no ser humano por transtornado, confuso, fanático ou sofrido que seja. Como sempre, o que faz notícia é o mal e a violência, mas o que muda a história é o bem construído aos poucos, na maioria das vezes, com “sangue, suor e lágrimas”, ou seja, com o compromisso e a paciente teimosia de tantos heróis pequenos ou grandes, anônimos ou famosos. Junto com as estruturas de injustiça e de morte, que nós mesmos criamos, precisamos sempre lutar para converter os nossos pensamentos e os nossos corações para que sejam de respeito e de diálogo. Igualmente, pequenas e grandes experiências de convivência pacífica e promoção dos mais necessitados fazem amadurecer em nós projetos de partilha, de mútua ajuda e solidariedade. Como discípulos do mestre Jesus, não podemos desistir do ser humano.
A bem-aventurança dos “construtores de paz” (Mt 5,9) nos lembra que eles e elas “serão chamados filhos de Deus”. Mais uma vez, tudo depende de como é o Deus no qual dizemos de acreditar. Se for um Deus de parte, nos conduzirá a conflitos e disputas, mas se for o Deus Pai de todos, como Jesus nos fez conhecer, capaz de doar o seu próprio Filho para ensinar como se ama, temos mais uma missão a cumprir: ser homens e mulheres de reconciliação e de paz. A Montanha da Paz não existe, mas sempre podemos imaginar como Deus-Amor gostaria ver os seus filhos: brigando ou se abraçando?
Por Dom Pedro José Conti
Fonte: Diocese de Macapá