O Papa Francisco fez um apelo neste domingo (25) para "silenciar as armas" na Ucrânia, país afetado por uma "guerra sem sentido", na opinião do sumo pontífice. As declarações foram feitas durante a célebre mensagem de Natal na Praça de São Pedro, momento em que o religioso voltou a mencionar uma "Terceira Guerra Mundial".
"Que nosso olhar seja preenchido com os rostos dos nossos irmãos e irmãs ucranianos, que vivem este Natal no escuro, no frio ou longe de suas casas, por causa das destruições provocadas por dez meses de guerra", declarou o papa argentino diante de 70 mil fiéis reunidos na praça de São Pedro, no Vaticano. Na multidão, muitas pessoas carregavam bandeiras ucranianas.
"Que o Senhor nos prepare para fazer gestos concretos de solidariedade para ajudar aqueles que estão sofrendo e ilumine o espírito daqueles que têm o poder de silenciar as armas e de acabar de maneira imediata com esta guerra sem sentido", acrescentou o sumo pontífice. "Lamentavelmente preferimos escutar outros argumentos, ditados pelas lógicas do mundo", ele afirmou, antes de constatar "com tristeza que [...] os ventos cruéis da guerra continuam a soprar o frio sobre a humanidade".
Antes de pronunciar a bênção "Urbi et Orbi" (à cidade e ao mundo), Francisco destacou os conflitos que abalam o mundo, algo que faz com frequência. O religioso enumerou dez países afetados por conflitos ou tensões, que descreveu como "cenários desta Terceira Guerra Mundial".
O papa destacou o Afeganistão, o conflito israelense-palestino, Iêmen, Síria, Mianmar, mas também o Líbano, país assolado por uma grave crise econômica e social. Ele ainda citou o Haiti, onde mais de 1,4 mil pessoas morreram em atos de violência este ano, de acordo com a ONU.
Pela primeira vez, o religioso mencionou o Irã, cenário de uma onda de protestos sem precedentes desde a Revolução Islâmica de 1979, com mais de 14 mil detenções desde setembro, segundo a ONU, e 469 manifestantes mortos, de acordo com a ONG Iran Human Rights.
O pontífice também pediu que a comida não seja utilizada como "arma", em referência aos conflitos que afetam em particular a região do nordeste africano. "Toda guerra provoca fome e usa comida como arma, impedindo sua distribuição a populações que já estão sofrendo. Neste dia, aprendendo com o Príncipe da Paz, nos comprometamos todos - em primeiro lugar aqueles que têm responsabilidades políticas - para que a comida não seja mais que um instrumento de paz", declarou.
Na noite de sábado (24), cerca de 7 mil pessoas assistiram à célebre missa da noite de Natal realizada pelo papa na Basílica de São Pedro. O santo padre, de 86 anos, que se locomove em cadeira de rodas devido a dores no joelho, rezou pelas "crianças devoradas por guerras, pobreza e injustiça", lamentando que "homens ávidos de poder e dinheiro consumam seus parentes, seus irmãos".
Diante do “consumismo”, Francisco convidou a humanidade a deixar de lado "os prazeres materiais e redescobrir o sentido do Natal”, defendendo uma igreja caridosa a serviço dos pobres.
"É muito inspirador estar aqui com todas essas pessoas, estamos felizes e emocionados em ver o papa, mesmo que estejamos do lado de fora, e sentir essa conexão entre nós", disse a mexicana Victoria Machado, de 19 anos, ao lado da família.
Como ela, cerca de 4 mil pessoas que não conseguiram obter ingressos para a missa e acompanharam a celebração em telões instalados do lado de fora da Basílica de São Pedro.
- Urbi et Orbi, o Papa: não nos esqueçamos de quem bate à nossa porta
Como os pastores de Belém, deixemo-nos envolver pela luz e saimos para ver o sinal que Deus nos deu. Vençamos o torpor do sono espiritual e as falsas imagens da festa que fazem esquecer Quem é o Festejado. Saiamos do tumulto que anestesia o coração induzindo-nos mais a preparar ornamentações e prendas do que a contemplar o Evento: o Filho de Deus nascido para nós. Foi a exortação do Papa na tradicional Mensagem de Natal e Bênção Urbi et Orbi, da Sacada Central da Basílica Vaticana, diante de milhares de fiéis e peregrinos presentes na Praça São Pedro, e acompanhada pelos meios de comunicação em mundovisão.
“Voltemo-nos para Belém, onde ressoa o primeiro choro do Príncipe da paz. Sim, porque Ele mesmo – Jesus – é a nossa paz: aquela paz que o mundo não se pode dar a si mesmo e Deus Pai concedeu-a à humanidade enviando o seu Filho ao mundo”, ressaltou o Santo Padre.
Na realidade, é com tristeza que devemos constatar como, enquanto nos é dado o Príncipe da paz, ventos de guerra continuam a soprar, gelados, sobre a humanidade. Se queremos que seja Natal, o Natal de Jesus e da paz, voltemos o olhar para Belém e fixemo-lo no rosto do Menino que nasceu para nós! E, naquele rostinho inocente, reconheçamos o das crianças que, em todas as partes do mundo, anseiam pela paz, continuou o Papa.
O nosso olhar se encha com os rostos dos irmãos e irmãs ucranianos que vivem este Natal na escuridão, ao frio ou longe das suas casas, devido à destruição causada por dez meses de guerra. O Senhor nos torne disponíveis e prontos para gestos concretos de solidariedade a fim de ajudar todos os que sofrem, e ilumine as mentes de quantos têm o poder de fazer calar as armas e pôr termo imediato a esta guerra insensata!
O nosso tempo vive uma grave carestia de paz também noutras regiões, noutros teatros desta terceira guerra mundial.
Pensamos na Síria, ainda martirizada por um conflito que passou para segundo plano, mas não terminou; e pensamos na Terra Santa, onde nos últimos meses aumentaram as violências e os confrontos, com mortos e feridos. Supliquemos ao Senhor para que lá, na terra que O viu nascer, retomem o diálogo e a aposta na confiança mútua entre israelitas e palestinenses.
Jesus Menino ampare as comunidades cristãs que vivem em todo o Médio Oriente, para que se possa viver, em cada um daqueles países, a beleza da convivência fraterna entre pessoas que pertencem a crenças diferentes. De modo particular ajude o Líbano para que possa, finalmente, erguer-se com o apoio da Comunidade Internacional e com a força da fraternidade e da solidariedade.
A luz de Cristo ilumine a região do Sahel, onde a convivência pacífica entre povos e tradições é transtornada por confrontos e violências, continuou Francisco. “Encaminhe para uma trégua duradoura no Iêmen e para a reconciliação no Mianmar e no Irã, para que cesse completamente o derramamento de sangue”.
E, no continente americano, frisou o Pontífice, “inspire as autoridades políticas e todas as pessoas de boa vontade a trabalharem para pacificar as tensões políticas e sociais que afetam vários países; penso de modo particular na população haitiana, que está a sofrer há tanto tempo”.
O Santo Padre lembrou que a guerra na Ucrânia agravou ainda mais a situação, deixando populações inteiras em risco de carestia, especialmente no Afeganistão e nos países do Chifre de África. “Toda a guerra – bem o sabemos – provoca fome e serve-se do próprio alimento como arma, ao impedir a sua distribuição às populações já atribuladas. Neste dia, aprendendo com o Príncipe da paz, empenhemo-nos todos – a começar pelos que têm responsabilidades políticas – para que o alimento seja só instrumento de paz”, exortou ainda Francisco, que concuiu em seguida:
Queridos irmãos e irmãs, hoje como há dois mil anos Jesus, a luz verdadeira, vem a um mundo achacado de indiferença que não O acolhe (cf. Jo 1, 11); antes, rejeita-O como acontece a muitos estrangeiros, ou ignora-O como fazemos nós muitas vezes com os pobres. Hoje não nos esqueçamos dos numerosos deslocados e refugiados que batem à nossa porta à procura de conforto, calor e alimento. Não nos esqueçamos dos marginalizados, das pessoas sós, dos órfãos e dos idosos que correm o risco de acabar descartados, dos presos que olhamos apenas sob o prisma dos seus erros e não como seres humanos.
Raimundo de Lima
Fonte: g1 – Vatican News