A semana do Papa Francisco iniciou com a audiência aos membros da Federação dos Organismos Cristãos de Serviço Internacional e Voluntário por ocasião dos 50 anos da sua fundação. Os presentes representavam as 90 organizações que atuam em mais de 80 países e oferecem uma valiosa contribuição para a luta contra todas as formas de pobreza e marginalização, para a proteção da dignidade humana, para a afirmação dos direitos humanos e para a promoção do crescimento das comunidades e instituições locais; e tudo isso sendo realizado em coerência com o Evangelho e a doutrina social da Igreja.
Francisco entregou seu discurso preparado e disse que falaria de improviso, com palavras "do coração". Em seguida falou com os presentes sobre o voluntariado elogiando a presença de voluntários na Itália. Também falou sobre os grupos paroquiais, lugar de encontro para todos e também sobre as associações de ajuda econômica, juntamente com os bancos para conseguir financiamento e ajuda econômica em geral aos mais necessitados.
No discurso entregue aos presentes disse:
“O seu testemunho é uma resposta concreta para aqueles que não acreditam mais em uma possível paz. De fato, com o seu compromisso, vocês demonstram que cada pequena peça do cotidiano pode formar o grande mosaico da fraternidade”
Ao recordar um dos lemas da Federação disse ainda, “queremos um mundo de solidariedade, no qual todos se sintam bem-vindos e não sejam forçados a desistir de seus sonhos. Este não é apenas um simples desejo, mas uma vontade muito precisa, que um de seus lemas expressa da seguinte forma: ‘Um mundo a ser construído em conjunto, com respeito à criação, no qual cada pessoa possa realizar sua plena dignidade!’ É uma mensagem muito oportuna neste momento da história: a sombra de uma terceira guerra mundial paira sobre o destino de nações inteiras, com consequências terríveis para as pessoas”.
Depois de afirmar que se referia às vítimas em particular disse:
“Que futuro estamos construindo para as novas gerações? Esta é uma questão que deve sempre acompanhar as decisões a nível internacional”
E retomando o grito dos muitos sem vozes aos quais suas organizações estão próximas, escreveu que “gostaria de refletir com vocês sobre três objetivos que nos preocupam a todos”.
O primeiro tem a ver com o fato de ser voluntários no mundo. “O que isso significa hoje? Parece-me ser um sinal decisivo e corajoso de abertura, de disponibilidade para com o próximo, seja perto ou longe. Porque olhar além das fronteiras torna-se uma predisposição da mente para encontrar o ‘próximo’, um testemunho de amor pela humanidade”.
O voluntariado é baseado em uma atitude de solidariedade profundamente enraizada, e todos sabemos o quanto a pobreza, a injustiça, a violência estão presentes em todos os continentes. “Bem, continuou Francisco, “a sua Federação demonstra que é possível ser 'irmãos e irmãs' abraçando cada ser humano que o Senhor coloca nos caminhos de nossas vidas”, citando ainda a Fratelli tutti:
“Hoje temos à nossa frente a grande ocasião de expressar o nosso ser irmãos, de ser outros bons samaritanos que tomam sobre si a dor dos fracassos, em vez de fomentar ódios e ressentimentos”
Depois o Papa escreveu sobre o segundo objetivo que diz respeito à paz, afirmando que “a vemos ferida, pisoteada na Ucrânia e em muitos outros lugares do planeta. Quando falta paz, quando prevalecem as ‘razões’ da força, as pessoas sofrem, as famílias são separadas, os mais frágeis são deixados sozinhos”. Em seguida afirmou: "Vocês, voluntários da Federação, são chamados a nutrir a paz em seus corações e a compartilhá-la com todos aqueles que encontram em seu serviço. É o presente mais importante que vocês podem levar consigo para todos os lugares, porque ‘o mundo não precisa de palavras vazias, mas de testemunhas convictas, artesãos da paz abertos ao diálogo sem exclusões ou manipulações".
Por fim Francisco escreveu no discurso entregue sobre o terceiro objetivo, que é o desenvolvimento: “Cada pessoa, cada povo precisa de condições básicas para uma vida digna: junto com a paz, a moradia, a assistência médica, a educação, o trabalho, o diálogo e o respeito mútuo entre culturas e credos”. “A promoção humana”, afirmou, “continua sendo um compromisso ao qual devemos nos dedicar com prontidão, vigor, criatividade e instrumentos adequados”.
“Somente um desenvolvimento integral - da pessoa e do contexto em que ela vive - permite o desenvolvimento de uma boa vida, tanto pessoal quanto social, serena e aberta ao futuro”
Neste ponto o Papa abordou a questão das pessoas, principalmente jovens que são obrigados a deixar suas próprias terras enfrentando situações inumanas para tentar uma vida digna, os migrantes:
“As migrações forçadas são um dos grandes males desta época, que só podemos enfrentar pela raiz, assegurando um desenvolvimento real em cada país. E vocês, os voluntários da Federação, também estão envolvidos nisto”
Encorajando todos finalizou com as seguintes palavras da Fratelli tutti: “avançar, nas estradas do mundo, cuidando de nossos irmãos e irmãs, como fez o Bom Samaritano, consciente de que ‘viver indiferentes à dor não é uma opção possível; não podemos deixar ninguém caído nas margens da vida’”.
Jane Nogara
- Francisco: o grito da terra e o grito dos pobres pedem responsabilidade
O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta segunda-feira (14/11), na Sala Clementina, no Vaticano, os membros da rede italiana de farmacêuticos "Apoteca Natura", um circuito que cuida das pessoas respeitando a fisiologia do organismo e o meio ambiente.
"A sua experiência de buscar na natureza respostas para problemas de saúde me fez pensar na Amazônia. Eu sei que vocês podem entender bem essa associação de ideias. As populações indígenas, na Amazônia e em outras partes do mundo, são guardiãs de ricos patrimônios de terapias naturais, mas estes também, infelizmente, correm o risco de se perderem se as culturas originárias se extinguirem. As culturas originárias têm essa atitude, sempre, com a criação, com o ambiente, do bem viver, que não é a doce vida ou se divertir, não, é a harmonia da vida da pessoa, da família, do povo com a criação", disse o Pontífice no início de seu discurso.
O Papa vê no trabalho da rede de farmacêuticos "Apoteca Natura" "um sinal positivo dos tempos: uma forma criativa de fazer negócios e gerar emprego a partir de uma intuição integralmente ecológica, uma intuição que responde à necessidade prioritária hoje de reencontrar uma nova harmonia entre nós seres humanos e a criação". O Papa disse ainda os farmacêuticos devem ter uma "relação personalizada com as pessoas do território, uma certa capacidade de escutar para poder aconselhar e orientar".
Francisco chamou a atenção a não transcurar a boa qualidade dos serviços de saúde locais privilegiando a “excelência” e excluindo as pessoas idosas, com baixa escolaridade e marginalizadas. "Obviamente, as farmácias não podem suprir o que pertence ao serviço nacional de saúde, mas podem certamente responder a uma necessidade real da população, compensando algumas carências", sublinhou.
A seguir, o Papa se deteve em duas palavras: harmonia e cuidado.
Harmonia é um conceito que está no coração do Papa e possui "um elevado valor teológico e espiritual". "Pode até ser considerado um nome de Deus, porque o próprio Espírito Santo é Harmonia", sublinhou Francisco. "Por isso, a criação como tal, isto é, "criada" por Deus que é harmonia, reflete o desígnio do Criador e, embora intimamente marcada pelo mal que a poluiu, aspira sempre ao bem e à harmonia", disse ainda o Papa, ressaltando que São Paulo fala de "espera com impaciência da criação", como se a esperança de Deus, esperança de salvação e comunhão, se refletisse na sua criação.
A propósito da palavra cuidado disse:
Hoje, num mundo globalizado e interligado, o confronto entre duas culturas é ainda mais evidente: a cultura do consumismo e do descarte, é uma cultura. Caminham juntas. A cultura do consumismo e do descarte que é uma forma de niilismo. Depois, por outro lado, a cultura do cuidado. Devemos escolher. Não existe outra possibilidade de ir adiante. Hoje, não podemos permanecer neutros. É necessária uma escolha, porque o grito da terra e o grito dos pobres pedem responsabilidade. Responder. A cultura do consumismo e do descarte é muito difundida e condiciona muitos dos nossos comportamentos diários, e assim também a cultura do cuidado se expressa em muitas pequenas e grandes escolhas, que cada um é chamado a fazer, dependendo da função que ocupa.
A seguir, o Papa disse que "a Encíclica Laudato si' é destinada a ser, para toda a Igreja e para todos os homens e mulheres de boa vontade, um chamado para assumir a atitude de cuidado com consciência e decisão". "Como os conheço, acho que posso dizer que seu trabalho responde a esta lógica e a este estilo de vida: entrar na cultura do cuidado", frisou ele.
Francisco concluiu, dizendo "que cada um, em sua própria função, pode contribuir para difundir a cultura do cuidado", e agradeceu aos membros da rede de farmacêuticos "Apoteca Natura" pelo que fazem em seu campo de trabalho, "tentando também dar uma contribuição concreta para o crescimento de uma economia diferente, uma economia centrada na pessoa e no bem comum".
Mariangela Jaguraba
Fonte: Vatican News