O primeiro compromisso da manhã desta sexta-feira (04/11) do Papa Francisco no Bahrein foi a participação no Encerramento do Fórum “Oriente e Ocidente em prol da Coexistência Humana”. Francisco iniciou seu discurso recordando que a terra vista do alto apresenta-se como um vasto mar azul, que liga margens distintas. “Do céu”, disse o Papa, “parece recordar-nos que somos uma família: não ilhas, mas um único grande arquipélago. É assim que o Altíssimo nos quer, e bem pode simbolizar o seu anseio este país, um arquipélago de mais de trinta ilhas”.
Em seguida recordou que contudo, vivemos tempos em que uma humanidade, interligada como nunca, se apresenta bem mais dividida do que unida. “E o nome do ‘Bahrein’ pode ajudar-nos a ir mais longe na nossa reflexão: os ‘dois mares’, que evoca, referem-se às águas doces das suas nascentes submarinas e às águas salobras do Golfo. De modo semelhante, encontramo-nos hoje perante dois mares de sabor oposto: por um lado, o mar calmo e doce da convivência comum, por outro, o mar amargo da indiferença, afligido por confrontos e agitado por ventos de guerra, com as suas devastadoras ondas sempre mais tumultuosas, com o risco de nos arrastar a todos”. E Francisco lamentou que Oriente e Ocidente assemelham-se cada vez mais a dois mares contrapostos. “Entretanto”, encorajou, “nós estamos aqui juntos, porque pretendemos navegar no mesmo mar, escolhendo a rota do encontro em vez da do confronto, o caminho do diálogo indicado por este Fórum: 'Oriente e Ocidente em prol da coexistência humana'".
Ponderando a questão disse ainda: “Impressiona este paradoxo: enquanto a maior parte da população mundial se encontra unida pelas mesmas dificuldades, atormentada por graves crises alimentares, ecológicas e pandêmicas, bem como por uma injustiça planetária cada vez mais escandalosa, uns poucos poderosos concentram-se decididamente numa luta por interesses de parte, desenterrando linguagens obsoletas, redesenhando áreas de influência e blocos contrapostos”. Alertando em seguida que “veremos multiplicar-se estas amargas consequências, se continuarmos a acentuar as oposições sem redescobrir a compreensão”, “se não deixarmos de distinguir de forma maniqueísta quem é bom e quem é mau, se não nos esforçarmos por compreender e colaborar para o bem de todos”. Concluindo este ponto disse:
“Estas opções estão diante de nós, porque, num mundo globalizado, só se avança remando juntos; ao passo que, navegando sozinho, vai-se à deriva”
Então Francisco convida a considerar o Documento sobre a Fraternidade Humana em prol da Paz Mundial e da Convivência Comum, onde se almeja um encontro fecundo entre Ocidente e Oriente. “Encontramo-nos aqui, crentes em Deus e nos irmãos, para rejeitar ‘o pensamento isolante’, aquele modo de ver a realidade que ignora o mar único da humanidade para se concentrar apenas nas suas próprias correntes”. Ao falar sobre os temas debatidos durante o Fórum o Papa disse que os líderes religiosos “não podem deixar de se comprometer e dar bom exemplo”.
“Assim, continuou Francisco, “queria delinear três desafios, que sobressaem do Documento sobre a Fraternidade Humana e da Declaração do Reino do Bahrein e sobre os quais se refletiu nestes dias. Dizem respeito à oração, à educação e à ação.
“Em primeiro lugar, a oração, que toca o coração do homem. Na realidade, os dramas que sofremos e as perigosas dilacerações que experimentamos, ‘os desequilíbrios de que sofre o mundo atual estão ligados com aquele desequilíbrio fundamental que se radica no coração do homem’” (Gaudium et spes, 10).
“Por isso mesmo a oração, a abertura do coração ao Altíssimo, é fundamental para nos purificar do egoísmo, do isolamento, da autorreferencialidade, das falsidades e da injustiça.
“Quem reza, recebe no coração a paz, não podendo deixar de se fazer sua testemunha e mensageiro, convidando os seus semelhantes para não se tornarem reféns de um paganismo que reduz o ser humano àquilo que vende, compra ou com que se diverte, mas redescobrirem a dignidade infinita que cada um traz impressa”
Porém afirma ainda o Papa “para que isso possa acontecer, há uma premissa indispensável: a liberdade religiosa. A Declaração do Reino do Bahrein explica que ‘Deus nos orientou para o dom divino da liberdade de opção’ e, por conseguinte, ‘qualquer forma de coerção religiosa não pode levar a pessoa a uma relação significativa com Deus’”.
“Toda a coerção é indigna do Omnipotente, pois Ele não entregou o mundo a escravos, mas a criaturas livres, a quem respeita profundamente”
“Se o desafio da oração tem a ver com o coração, o segundo desafio – a educação – diz respeito essencialmente à mente do homem” afirmou o Papa. “A Declaração do Reino do Bahrein afirma que ‘a ignorância é inimiga da paz’. É verdade que, onde faltam oportunidades de instrução, aumentam os extremismos e radicam-se os fundamentalismos”. “De facto, é indigno da mente humana crer que as razões da força prevalecem sobre a força da razão, usar métodos do passado para as questões presentes, aplicar os esquemas da técnica e da conveniência à história e à cultura do homem”. Explicando este ponto Francisco afirma: “Isto requer questionar-se, entrar em crise e saber dialogar com paciência, respeito e espírito de escuta; aprender a história e a cultura alheia. Assim se educa a mente do homem, alimentando a compreensão recíproca. Porque não basta dizer que somos tolerantes, é preciso abrir verdadeiramente espaço ao outro, dar-lhe direitos e oportunidades”.
O Papa descreveu em seguida três urgências educativas: “Em primeiro lugar, o reconhecimento da mulher na esfera pública: reconhecer o seu direito ‘à instrução, ao trabalho, ao exercício dos seus direitos políticos’. Em segundo lugar, “‘a tutela dos direitos fundamentais das crianças’, para que cresçam instruídas, assistidas, acompanhadas, não condenadas a viver nos mordimentos da fome e nos remordimentos da violência”. Por fim em terceiro lugar, “a educação para a cidadania, para viver juntos, no respeito e na legalidade. E, em particular, a importância do ‘conceito de cidadania’, que ‘se baseia na igualdade dos direitos e dos deveres’”.
Por fim falou sobre o último dos três desafios: “aquele que diz respeito à ação – poder-se-ia dizer –, às forças do homem. A Declaração do Reino do Bahrein ensina que, ‘quando se prega ódio, violência e discórdia, profana-se o nome de Deus’”. “Com efeito”, concluiu o Papa, “não basta dizer que uma religião é pacífica, é preciso condenar e isolar os violentos que abusam do seu nome. E não basta sequer distanciar-se da intolerância e do extremismo, é preciso agir em sentido contrário”. E disse com firmeza:
“Por isso, é necessário interromper o apoio aos movimentos terroristas através do fornecimento de dinheiro, de armas, de planos ou justificações e também da cobertura mediática, e considerar tudo isto como crimes internacionais que ameaçam a segurança e a paz mundial. É preciso condenar tal terrorismo em todas as suas formas e manifestações”
Concluindo este ponto disse:
“O homem religioso, o homem de paz, opõe-se também à corrida ao rearmamento, aos negócios da guerra, ao mercado da morte. Não sustenta ‘alianças contra ninguém’, mas caminhos de encontro com todos: sem ceder a relativismos ou sincretismos de qualquer espécie, segue apenas uma estrada, a da fraternidade, do diálogo, da paz. Estes são os seus ‘sins’”. Da Praça Al-Fida' no Palácio Real de Sakhir em Awali, Bahrein, a voz do Papa sobe aos céus ao lançar um novo e sentido apelo 'pelo fim da guerra na Ucrânia e por sérias negociações de paz'".
Fonte: Jane Nogara - Vatican News