Artigo de Dom Pedro José Conti: O que você ganha por rezar tanto?
23/10/2022
Reflexão para o 30º Domingo do Tempo Comum | 23 de outubro 2022 – Ano “C”
Certo dia, um amigo disse ao outro:
– Te vejo sempre rezar. Pode me explicar o que você ganha por rezar tanto assim? O outro lhe respondeu:
– Não ganho nada. Porém posso lhe dizer o que já perdi: perdi a raiva, a angústia, a insegurança, os ressentimentos, a depressão, o rancor e até o medo de morrer!
O evangelho de Lucas deste 30º Domingo do Tempo Comum continua o ensinamento sobre a oração. Após ter convidado os seus discípulos a “rezar sempre”, Jesus, através de mais uma parábola, quer nos dizer com qual atitude de ânimo devemos nos apresentar ao Senhor. A oração não pode ser exaltação de nós mesmos, da nossa obediência às normas e, de forma alguma, ocasião para desprezar os outros, porque são diferentes de nós. Dois homens vão ao Templo para rezar. São iguais pela condição humana, mas opostos pela maneira de viver. Por consequência, a oração, ou seja, o relacionamento deles com Deus, também é o mesmo. O primeiro pertence ao grupo religioso dos “fariseus”, pessoas muito devotas e severos cumpridores das normas da Lei e dos demais preceitos exigidos naquele tempo. O segundo é um cobrador de impostos; alguém que vivia extorquindo dinheiro do povo para pagar os tributos aos romanos que ocupavam a Palestina e enriqueciam bastante com tudo isso. Os cobradores de impostos eram desprezados e considerados grandes pecadores por várias razões: roubavam o dinheiro do povo e não respeitavam as normas da pureza ritual, porque compactuavam e tinham contato direto com os romanos que eram pagãos.
Segundo o que era ensinado naquele tempo, Deus devia gostar e premiar aqueles que obedeciam às normas da Lei e, ao contrário, desprezar e nunca atender aos pedidos daqueles que eram reconhecidos publicamente como pecadores. O fariseu, portanto, estava convencido da sua boa conduta e, na sua oração, apresenta a Deus os seus merecimentos. Ele se vangloria de fazer tudo direitinho até além das obrigações. Acredita ser um homem de bem, obediente, correto. Deus deve estar muito satisfeito com ele. Com certeza – e aqui está o seu defeito – ele é muito melhor de tantos outros, “ladrões, desonestos adúlteros”, e, sobretudo, daquele outro homem que está atrás, um pecador sem nenhum temor de Deus. O cobrador de impostos, de fato, estava mais afastado. A sua posição no Templo e a sua cabeça baixa manifestam a consciência de não merecer ser ouvido por Deus. Ele reza com estas palavras: “Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador!” (Lc 18,13). A conclusão de Jesus é surpreendente: Deus gostou mais da oração do cobrador de impostos, que reconheceu o seu pecado, do que a do fariseu cheio de si e que não precisava de misericórdia. Mais uma vez, não devemos entender essa parábola como um elogio aos pecadores, mas como uma correção para aqueles que se acham melhores que os demais e, portanto, com o direito de julgá-los e desprezá-los.
Os dois protagonistas da parábola são ambos pobres homens afastados de Deus, mas por razões contrárias e com entendimentos bem diferentes. Na vida do fariseu não tem lugar para o amor de Deus. Ele não precisa de nada, porque o seu orgulho preenche todo o seu coração. O Deus dele é ele mesmo, a sua perfeição. Para o cobrador de impostos, talvez, o verdadeiro deus a quem serve seja o dinheiro, o lucro. No entanto, ele não está satisfeito, sente falta daquilo que riqueza nenhuma pode comprar: o amor misericordioso de Deus. Não tem nada de bom para apresentar ao Senhor, não pode pedir as bênçãos dele porque sabe que não as merece, mas tem certeza que pode invocar a misericórdia do Pai, porque é pura gratuidade, dom de uma nova vida para o pecador arrependido. A humildade deve ser o estilo da oração cristã. As nossas orações e os nossos louvores “nada acrescentam” a o que Deus é (Prefácio Comum IV). Somos nós que precisamos do amor dele, mas esse amor chega somente se encontra lugar no nosso coração e na nossa vida. Rezamos para sermos libertos do nosso orgulho. Quando a porta do coração está aberta entra o amor de Deus e saem muitas coisas erradas.
Por Dom Pedro José Conti
Fonte: Diocese de Macapá