O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta segunda-feira (17/10), na Sala do Consistório, no Vaticano, os membros da Confederação Espanhola de Associações de Jovens Empresários e da Confederação Empresários da Galícia. "A presença de vocês aqui hoje é um sinal de esperança", disse o Pontífice no início de seu discurso.
A seguir, o Papa disse que "estamos vivendo uma época de evidentes desequilíbrios econômicos e sociais", e recordou as palavras do Concílio Vaticano II na Constituição Pastoral Gaudium et Spes: «Coexistem o luxo e a miséria. Enquanto um pequeno número dispõe dum grande poder de decisão, muitos estão quase inteiramente privados da possibilidade de agir por própria iniciativa e responsabilidade, e vivem e trabalham em condições indignas da pessoa humana».
"Nesse contexto, é urgente propor uma economia adequada para resolver os grandes problemas que vivemos no mundo inteiro", frisou ele. A seguir, Francisco partilhou com eles três ideias que considera oportunas para o caminhar dos empresários.
Em primeiro lugar, a profecia. Na Bíblia, o profeta é aquele que fala em nome de Deus, que transmite sua mensagem, e favorece uma mudança ao seu redor. O Papa recordou Amós, o profeta da "justiça", que denunciava já no século VII a.C. o desejo de luxo e enriquecimento dos poderosos no povo de Israel, que beneficiava apenas o setor rico, enquanto a grande maioria do povo vivia oprimida.
Num contexto tão complexo quanto o atual, marcado pela guerra e pela crise ambiental, cabe a vocês desempenhar seu serviço, como profetas que anunciam e edificam a Casa comum, respeitando todas as formas de vida, se interessando pelo bem de todos e promovendo a paz. Sem profecia, a economia, e em geral toda a ação humana, é cega.
Segundo o Papa, "quando a economia se transforma em finança, tudo se torna líquido ou gasoso". "Um líder econômico-financeiro mundial, um dia conversando comigo, me disse que procurou, ele ocupava uma posição muito elevada, fazer um encontro entre economia, humanismo e religião, e foi muito bom. Tentou fazer o mesmo entre finança, humanismo e religião, e não encontraram saída". "Isso me faz pensar muito ", sublinhou Francisco.
A segunda ideia é o cuidado da relação com Deus. Segundo o Papa, quando temos uma boa relação com o Senhor, começamos a dar frutos bons. «Procurem o Senhor, e vocês viverão. Procurem o bem e não o mal, e assim Deus estará com vocês», disse Francisco, citando o profeta Amós.
O heroísmo que o mundo precisa hoje de vocês só pode ser sustentável se houver raízes fortes. A conversão econômica será possível quando vivermos uma conversão do coração; quando formos capazes de pensar mais nos necessitados; quando aprendermos a colocar o bem comum antes do bem individual; quando entendermos que a falta de amor e justiça em nossas relações são consequências de uma negligência da nossa relação com o Criador, e isso também repercute em nossa Casa comum. Então, e talvez só então, seremos capazes de reverter as ações prejudiciais que estão preparando um futuro triste para as novas gerações. Lembrem-se de que cultivar uma relação com o Senhor torna possível ter raízes fortes que sustentarão os projetos que vocês desejam empreender.
A terceira ideia do Papa tem a ver com o trabalho e a pobreza. A esse propósito, o Pontífice recordou o "importante testemunho de São Francisco de Assis, que realizou não só a restauração da capela de São Damião, mas, sobretudo, contribuiu para restaurar a Igreja de seu tempo". Ele "fez isso com o amor que tinha pelos pobres e com seu modo austero de viver. Com os valores do trabalho e da pobreza, que implicam total confiança em Deus e não nas coisas, pode-se criar uma economia que reconcilie entre si os membros das diversas etapas da produção, sem desprezar uns aos outros, sem criar mais injustiças ou viver uma indiferença fria". A "miséria deve ser combatida", disse ainda o Papa, afirmando que os empresários têm "bons instrumentos" para isso, "como a possibilidade de criar empregos, contribuindo para dignificar seus próximos". De acordo com Francisco, através do trabalho, Deus "ergue da poeira o fraco e tira do lixo o indigente". Portanto, "temos um remédio para combater a doença da miséria: o trabalho e o amor pelos pobres. Sejam criativos no planejamento do trabalho, sejam criativos e isso lhes dará muito mais força", sublinhou.
O Papa incentivou os empresários a transformar "o rosto da economia com criatividade, para que ela possa estar mais atenta aos princípios éticos" e a não se esquecerem "de que sua atividade está a serviço do ser humano, não só de poucos, mas de todos, especialmente dos pobres". "É importante que vocês se conscientizem de que não estão acima da natureza, mas que precisam cuidar dela, pois as gerações futuras dependem disso. A sua empresa deve ter, de alguma forma, um cuidado para não poluir mais a natureza, abrindo caminhos de cura", sublinhou Francisco, dizendo que "ainda está em nossas mãos mudar a tendência de contaminação que está destruindo, está destruindo tudo".
O Papa concluiu, dizendo que "o bom economista, o bom empresário cuida", cuida de sua empresa, de seus funcionários e da Casa comum.
- Papa à FAO: alimentos não são mercadorias, mas um dom de Deus
Uma segunda-feira, esta do dia 17 de outubro, pra se voltar à reflexão de uma conversão econômica tão fortemente exortada pelo Papa Francisco quando encontra públicos capazes de agir para tanto, pensando nos mais pobres e nas injustiças que assolam quem vive em situação de miséria no mundo. Como foi no encontro da manhã com empresários espanhóis no Vaticano, quando o Papa disse da importância de se contribuir no combate "à doença da miséria" com amor, sendo criativo no planejamento do trabalho e dando emprego aos pobres; ou através de uma mensagem enviada durante a tarde para a abertura do II Fórum Mundial da Alimentação da FAO.
O texto do Pontífice, escrito em espanhol, foi dirigido ao diretor-geral da Organização para a Alimentação e a Agricultura da ONU, Qu Dongyu, mas direcionado a todos os participantes do evento e "àqueles que se comprometem e se esforçam todos os dias para erradicar a fome e a pobreza no mundo". Na mensagem, o Papa procurou novamente enfatizar sobre o cuidado com o próximo e com a criação:
“A alimentação é fundamental para a vida humana, de fato, participa da sua sacralidade e não pode ser tratada como qualquer mercadoria. Os alimentos são sinais concretos da bondade do Criador e frutos da terra.”
Como disse em mensagens recentes à FAO, lembrou Francisco, "nossa primeira preocupação deve se concentrar no ser humano como tal, considerado em sua integridade e levando em conta suas necessidades reais, em particular aquelas que carecem do sustento básico para a sobrevivência". Reconhecer e garantir a centralidade da pessoa humana, acrescentou ele no texto, sobretudo neste atual período de crises interligadas, é o desafio proposto pela mensagem de Cristo - inclusive para aqueles que não creem - de não apenas dar de comer a quem precisa, disse o Pontífice, mas de nos entregarmos a serviço dos outros: precisamos "voltar a acreditar na fraternidade e na solidariedade" como inspiração "da relação entre as pessoas e os povos".
O Papa também citou o exemplo dos avós e "do respeito que tinham pelo pão; eles o beijavam quando o levavam para a mesa e não permitiam que nada fosse desperdiçado. O próprio Cristo, na Eucaristia, tornou-se pão, pão vivo para a vida do mundo (cf. Jo 6,51)". Francisco, assim, demonstrou confiança nos frutos do Fórum Mundial da Alimentação "para que as iniciativas e decisões que contribuem para o bem e o futuro de toda a humanidade possam aumentar":
“Respeitar os alimentos e dar-lhes o lugar preeminente que ocupam na vida humana só será possível se, além da preocupação com sua produção, disponibilidade e acesso, bem como com as medidas técnicas do comércio agrícola, tomarmos consciência de que são um dom de Deus do qual somos meros administradores.”
Andressa Collet
Fonte: Vatican News