Cultura

Artigo de Dom Pedro José Conti: Abri vossa porta





Reflexão para o 15º Domingo do Tempo Comum | 10 JULHO 2022 – Ano “C” 

Quando chega a hora da bênção final de um matrimônio, talvez, nem todos prestem atenção às palavras pronunciadas naquele momento por quem preside. Entre as várias opções do Ritual, tem uma que chama a minha atenção e que diz assim: “Sede no mundo um sinal do amor de Deus, abri vossa porta aos pobres e infelizes, que um dia vos receberão, agradecidos, na casa do Pai”. É um convite claro, a não ser uma família fechada em si mesma, a saber reconhecer os irmãos necessitados que não fazem parte dela. É um compromisso praticar a compaixão e a misericórdia não somente sozinhos, mas juntos, como comunidade: casal e família. A “porta” que deve ser aberta é sempre a do nosso coração, sem desculpas, egoísmos, indiferença. Não basta dizer que amamos a Deus sobre todas as coisas. A prova indiscutível deste amor é o quanto estamos dispostos a fazer para os nossos irmãos pobres e sofredores.

Esta é a grande lição da bem conhecida parábola de Jesus que chamamos de “o bom samaritano” por ser ele o único, dos três que passaram perto do homem quase morto, a sentir compaixão e a usar de misericórdia com ele. Encontramos essa parábola no evangelho de Lucas deste 15º Domingo do Tempo Comum. Tudo começou com a pergunta de um mestre da Lei. Ele queria saber de Jesus se havia algum caminho seguro para receber um dia, em herança, a vida eterna. Ele já sabia a resposta: para viver a vida de Deus precisa amá-lo e amar também o próximo: essa é a vida verdadeira que nunca acaba. – E quem é o meu próximo? Perguntou o mestre da Lei. Para ele, o Deus a ser amado é um só, mas de “próximos” podia ter muitos. Com efeito, para os judeus o “próximo” era constituído pelos familiares, os parentes e os da mesma religião. Já era mais do que suficiente. Para os outros, fora desses, não precisava se preocupar, não era obrigação amá-los. É nesse contexto de crenças e de práticas que se entende a novidade da explicação do amor ao próximo que Jesus oferece. Se tivesse dito para amar a todos, teria sido uma proposta sentimental, genérica demais, e como tal correria o perigo de ficar no plano dos bons propósitos que, sabemos, quase nunca se concretizam. Igualmente, Jesus não deu uma lista de quem deve entrar ou deve ficar fora de uma eventual definição de “próximo”. Para ele cabe a cada um de nós perceber a situação do irmão que precisa de ajuda e de agir conforme a nossa capacidade de sentir e praticar a compaixão.

 O “próximo” que devemos amar é qualquer um que encontremos caído nos caminhos da vida e ao qual nós mesmos decidimos nos aproximar para socorrer. Pela parábola sabemos que duas pessoas passaram primeiro, viram a situação do homem ferido, mas seguiram adiante. Jesus não diz se elas eram boas ou más. Simplesmente, por alguma razão, não se deixaram tocar pelo sofrimento alheio, não se fizeram “próximos” daquela vítima dos assaltantes. Finalmente, um samaritano teve compaixão e socorreu o ferido. Fez mais: fez curativos, o levou numa hospedaria, deixou duas moedas de prata para o tratamento e deu a sua palavra que pagaria o quanto precisasse se tivessem outras despesas.

Como cristãos, discípulos do Mestre Jesus que se fez “bom samaritano” da humanidade inteira, machucada e ferida pelo pecado, conhecemos muito bem o exemplo dele e como socorreu ensinando, curando e perdoando a todos aqueles que encontrava. Foi assim que ele fez conhecer o rosto misericordioso do Pai. Não um Deus de parte, mas um Pai compassivo que se privilegia alguns é porque, justamente, eles são abandonados, desfigurados na própria dignidade, invisíveis aos olhos de uma sociedade desumana, fascinada e iludida só por poder e riqueza. É fácil sermos “bons samaritanos”? Sempre temos algumas barreiras para superar: medos, preconceitos, preguiça e comodismo. Se falei do casal e da família é porque não só acredito que serão mesmo os pobres e infelizes a nos acolher na casa do Pai, mas porque certas sensibilidades e atitudes só podemos aprender vendo o exemplo de outros. Sejamos muito agradecidos se os nossos pais nos transmitiram a alegria de quem fica feliz por ajudar a quem precisa. Nos educaram para o amor.  

Por Dom Pedro José Conti

 

Fonte: Diocese de Macapá