Cultura

Papa Francisco: sejam sacerdotes próximos do povo e não de laboratório teológico





O Papa recebeu no Vaticano os membros do Pio Colégio Romeno que celebra seus 85 anos de fundação. Convidou os estudantes a tomarem "cuidado para não se tornarem clérigos de Estado", "mas padres do povo, com o cheiro do povo, com o cheiro do rebanho", disse ainda Francisco.

O Papa Francisco recebeu em audiência, na Sala do Consistório, no Vaticano, nesta quinta-feira (19/05), a Comunidade do Pontifício Colégio Pio Romeno, por ocasião de seus 85 anos de fundação.

Francisco iniciou o seu discurso, recordando sua viagem apostólica à Romênia, em 2019, em particular a Divina Liturgia celebrada no Campo da Liberdade, em Blaj, onde encorajou a "resistir às novas ideologias que buscam se impor e erradicar os povos, às vezes de forma sutil, de suas tradições religiosas e culturais". "Durante aquela celebração eu proclamei beatos sete bispos mártires, indicando-os como exemplo para todo o povo romeno", frisou o Papa.

Francisco disse que aqui em Roma, "na cidade que preserva o testemunho de Pedro, Paulo e muitos outros mártires", a Comunidade do Pontifício Colégio Pio Romeno "pode redescobrir suas raízes de forma completa, através do estudo e da meditação. É uma oportunidade preciosa para refletir sobre como as raízes foram formadas".

Nutrir as raízes

O Papa recordou as palavras de dom Ioan Ploscaru, bispo de Lugoj, que escapou da morte ao contrário dos outros sete bispos mortos durante a II Guerra Mundial e beatificados pelo Papa dois anos atrás, em Blaj. Dom Ioan ficou preso durante quinze anos. Segundo Francisco, ele foi uma das raízes da Igreja romena da qual hoje os estudantes do Pontifício Colégio Pio Romeno são o "fruto".

Queridos amigos, sem nutrir as raízes toda tradição religiosa perde fecundidade. Na verdade, se verifica um processo perigoso: com o passar do tempo focamos cada vez mais em nós mesmos, na própria pertença, perdendo o dinamismo das origens. Então, se concentra em aspectos institucionais, externos, na defesa do próprio grupo, da própria história e dos próprios privilégios, perdendo, talvez sem perceber, o sabor do dom.

Francisco alertou para não deixar ser afetado pelo vírus da mundanidade espiritual, "que é o pior mal que pode acontecer na Igreja: a mundanidade espiritual".

A atitude de escalar, de ter poder, de ter dinheiro, de ter fama, de se sentir confortável, de fazer carreira: isso é querer crescer sem raízes. É verdade que existem outros que vão às raízes para se esconder lá, porque têm medo de crescer, não? É verdade. Se retorna às raízes para tomar força, tomar o suco e continuar crescendo. Não se pode viver nas raízes e não se pode viver na árvore sem as raízes. A tradição é um pouco a mensagem que nós recebemos das raízes: é o que nos dá força para seguir em frente, hoje, sem repetir as coisas de ontem, mas com a mesma força da primeira inspiração.

Os herdeiros dessas raízes têm a responsabilidade de "atualizá-las", "para que seu ministério não seja uma repetição estéril do passado ou uma manutenção do presente, mas seja fecundo". Segundo o Papa, este "é o segredo da fecundidade" bem conhecido, por exemplo, pelo

cardeal Mureşan, que completará 91 anos de serviço ao sacerdócio, citado como exemplo daquela época de coragem de "pastores pobres de coisas, mas ricos do Evangelho".

Terreno bom da fé

A seguir, o Papa deteve sobre a palavra terreno, convidando a Comunidade do Pontifício Colégio Pio Romeno a não se esquecer do "terreno bom da fé", terreno "trabalhado por seus avós, por seus pais, pelo santo povo de Deus". "O Evangelho não é proclamado com palavras complicadas, mas na linguagem do povo, no dialeto do povo de Deus, aquele que o povo entende, com simplicidade. Por favor, tenham cuidado para não se tornarem clérigos de Estado. Sejam pastores do povo. Proximidade ao povo do qual vocês vêm. Não sejam sacerdotes de laboratório teológico, não. Padres do povo, com o cheiro do povo, com o cheiro do rebanho", disse ainda Francisco.

O terreno bom também é o que faz vocês tocarem a carne de Cristo, presente nos pobres, nos doentes, no sofrimento, nos pequenos e nos simples, naqueles que sofrem e em quem Jesus está presente. Penso, em particular, nos muitos refugiados da vizinha Ucrânia que a Romênia também está acolhendo e ajudando.

Universalidade, bom ar a ser respirado

As palavras finais do Papa foram dirigidas aos estudantes de língua árabe pertencentes ao antigo Colégio Santo Efrém que há dez anos formam uma única comunidade com o Colégio Pio Romeno. "A sua partilha de vida não deve ser sentida como uma diminuição de suas respectivas características distintas, mas como uma promessa fecunda do futuro. Os colégios nacionais, orientais e latinos, não devem ser "enclaves" dentro dos quais voltar após o dia de estudo para viver como se estivesse em pátria, mas laboratórios de comunhão fraterna, onde experimentar a autenticidade da catolicidade, a universalidade da Igreja. Essa universalidade é o bom ar a ser respirado para não ser sugado por particularismos que dificultam a evangelização".

Mariangela Jaguraba - Vatican News

 

Tráfico humano: gratidão do Papa a quem torna visível a misericórdia de Deus

“A Igreja é sempre grata por cada expressão de caridade fraterna e de cuidado para com quem foi escravizado e explorado, porque deste modo a misericórdia de Deus se torna visível e o tecido da sociedade é reforçado e renovado", disse o Papa aos participantes de Conferência promovida pelo "Grupo Santa Marta".

O tráfico humano foi tema de uma audiência esta manhã, no Vaticano. O Papa Francisco recebeu os participantes da Conferência Internacional do chamado “Grupo Santa Marta”. Este Grupo reúne organizações civis e religiosas para compartilhar competências, experiências e prática para prevenir e lutar contra o tráfico de seres humanos e as modernas formas de escravidão.

Ao agradecer o trabalho realizado na tentativa de desarraigar essas atividades criminosas que “violam a dignidade e os direitos de homens, mulheres e crianças, e deixam efeitos duradouros nas vítimas e na sociedade em geral”.

O Grupo promove a colaboração em nível internacional, nacional e local, com a contribuição inclusive das forças de ordem. O Papa então faz votos de que a luta contra esta chaga leve também em consideração o uso responsável da tecnologia e as redes sociais, e de uma renovada visão ética da vida política, econômica e social.

Outro ponto ressaltado pelo Pontífice foi a necessidade de amparar, acompanhar e reintegrar as vítimas do tráfico na comunidade e assisti-las no processo de cura e de recuperação da autoestima.

“A Igreja é sempre grata por cada expressão de caridade fraterna e de cuidado para com quem foi escravizado e explorado, porque deste modo a misericórdia de Deus se torna visível e o tecido da sociedade é reforçado e renovado.”

Francisco concluiu expressando mais uma vez sua gratidão pelo esforço do Grupo Santo Marta “neste setor vital”.

 

- O Papa aos embaixadores: a guerra é contrária ao importante serviço que vocês desempenham

"Somos uma família humana e o grau de indignação expresso, o apoio humanitário oferecido e o senso de fraternidade sentido por aqueles que sofrem não deve ser baseado na geografia ou no interesse pessoal", disse Francisco em seu discurso.

O Santo Padre recebeu na Sala Clementina, no Vaticano, na manhã desta quinta-feira (19/05), os novos embaixadores não residentes da Santa Sé para a apresentação de suas credenciais. Os embaixadores recebidos são do Paquistão, Emirados Árabes Unidos, Burundi e Catar.

Em seu discurso aos novos embaixadores, o Papa disse que certamente eles "estão começando sua nova missão num momento particularmente desafiador".

A última vez que eu encontrei seus colegas em janeiro, a família humana estava começando a dar um suspiro de alívio, porque estávamos lentamente, mas sem dúvida nos libertando das garras da pandemia. Parecia que finalmente poderíamos voltar a uma certa normalidade, tendo em mente as lições aprendidas nos últimos dois anos. Então, a nuvem escura da guerra desceu sobre o Leste da Europa, envolvendo direta ou indiretamente o mundo inteiro.

"Depois de viver os efeitos devastadores de duas guerras mundiais e as ameaças nucleares durante a Guerra Fria, junto com um crescente respeito pelo papel do direito internacional e a criação de organizações políticas e econômicas multinacionais focadas na coesão da comunidade global, a maioria das pessoas acreditava que a guerra na Europa fosse uma lembrança distante", disse ainda Francisco.

Como vimos no auge da pandemia, mesmo numa tragédia desta magnitude o melhor da humanidade pode emergir. Talvez mais do que nunca, as formas modernas de comunicação abalaram nossas consciências apresentando em tempo real imagens fortes e, às vezes, horríveis de sofrimento e morte. Essas mesmas imagens também inspiraram um senso de solidariedade e fraternidade, que levou muitos países e indivíduos a prestar assistência humanitária. Penso, em particular, nos países que estão acolhendo os refugiados do conflito, independentemente dos custos. Vimos famílias abrirem suas casas para outros familiares, amigos e até mesmo para desconhecidos.

A seguir, Francisco recordou que "existem vários outros conflitos em andamento no mundo que recebem pouca ou nenhuma atenção, especialmente dos meios de comunicação". "Somos uma família humana e o grau de indignação expresso, o apoio humanitário oferecido e o senso de fraternidade sentido por aqueles que sofrem não deve ser baseado na geografia ou no interesse pessoal", disse ainda o Papa, citando um trecho de sua Encíclica Fratelli tutti: "Se toda pessoa possui uma dignidade inalienável, se todo o ser humano é meu irmão ou minha irmã e se, na realidade, o mundo pertence a todos, não importa se alguém nasceu aqui ou vive fora dos confins do seu próprio país".

Segundo o Pontífice, "isso vale não só para a guerra e os conflitos violentos, mas também para outras situações de injustiça que afligem a família humana: mudanças climáticas, pobreza, fome, falta de água potável, acesso a um trabalho respeitável e educação adequada, apenas para citar algumas".

"A Santa Sé continua trabalhando através de vários canais para promover soluções pacíficas em situações de conflito e para aliviar o sofrimento causado por outros problemas sociais. Faz isso com a convicção de que os problemas que afetam toda a família humana requerem uma resposta unificada por parte da Comunidade internacional, na qual cada membro faz sua parte", sublinhou o Papa.

Queridos embaixadores, vocês têm um papel privilegiado a desempenhar a este respeito. Vocês sabem muito bem que a guerra é sempre uma derrota para a humanidade e é contrária ao importante serviço que vocês desempenham, buscando construir uma cultura do encontro através do diálogo e incentivando a compreensão mútua entre os povos, bem como defendendo os nobres princípios do direito internacional. Não é de forma alguma um serviço fácil, mas talvez as situações de desigualdade e injustiça que estamos testemunhando no mundo de hoje nos ajudem a apreciar ainda mais seu trabalho. Apesar dos desafios e retrocessos, nunca devemos perder a esperança nos esforços para construir um mundo no qual a fraternidade e a compreensão mútua prevaleçam e as divergências sejam resolvidas por meios pacíficos.

Por fim, Francisco disse aos novos embaixadores que os escritórios da Santa Sé estão à sua disposição para abordar questões de interesse comum.

Mariangela Jaguraba 

 

Fonte: Vatican News