Política

Sufocado pela inflação, Bolsonaro transfere responsabilidade e demite aliados





Na semana passada, o chefe de governo demitiu o ministro Bento Albuquerque na tentativa de se descolar da impopularidade que o cenário econômico pode lhe render

Em ascensão nas pesquisas, mas fustigado pela inflação, o presidente Jair Bolsonaro (PL) tem feito muito barulho para mostrar ao eleitorado que está empenhado contra a carestia. Na semana passada, o chefe de governo demitiu o ministro Bento Albuquerque na tentativa de se descolar da impopularidade que o cenário econômico pode lhe render. E ainda tentou provocar debate paralelo — a privatização da Petrobras — para contornar o desgaste provocado pelos reajustes sucessivos na bomba de combustível. Apesar desses movimentos, especialistas ouvidos pelo Correio avaliam que o presidente não terá como fugir da pressão frente ao tema.

A demissão de Albuquerque foi a terceira mudança promovida por Bolsonaro para conter o preço dos combustíveis. Em 2021, o presidente demitiu Roberto Castello Branco, em razão da política de preços da estatal. Escalou o general Joaquim Silva e Luna, que também foi substituído, em março deste ano, pelo mesmo motivo. O atual comandante da Petrobras é José Mauro Ferreira Coelho.

Na quinta-feira, durante uma live, Bolsonaro sinalizou que pode fazer novas "mudanças de pessoas" na Petrobras. "A gente espera fazer mudanças de pessoas, que a gente possa fazer, que a gente possa buscar minorar, diminuir o preço do combustível no Brasil", emendou.

A culpa é dos outros

O senador Humberto Costa (PT-PE) considera que o presidente prossegue a tática adotada desde o começo do governo: transferir responsabilidades. "O presidente está sempre atribuindo a culpa pelos problemas do país a outra pessoa. Como Bolsonaro não tem coragem nem disposição de modificar a política de preços de combustíveis e derivados no Brasil, tenta justificar e acusar a Petrobras ou o mau desempenho de um ministério qualquer porque é assim que ele tenta tirar fugir das consequências", critica o senador.

Já o deputado federal Capitão Augusto (PL-SP), vice-líder do partido na Câmara, avalia que as ações de Bolsonaro visam a melhoria de vida da população. "O presidente está fazendo de tudo para tentar reduzir o preço dos combustíveis. O novo ministro (Adolfo Sachsida) veio com essa proposta de privatização da Petrobras, à qual sou plenamente favorável. Não adianta ter uma estatal que não colabora com o Brasil", defende.

Assim como Bolsonaro, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) responsabiliza as medidas de restrição adotadas durante a pandemia de covid-19 como um dos fatores do aumento da inflação. "Todos esqueceram que o governo alertou que o 'fique em casa' causaria o cenário de pressão inflacionária que vivemos. Seria pior e teríamos um número de desempregados semelhante ao deixado pelo PT, em 2015 — depois da pandemia de corrupção —, se não fosse o trabalho do governo Bolsonaro de socorrer a população, os estados e municípios", alega.

"Esse trabalho exigiu várias ações e diversos ajustes que vieram sendo realizados ao longo da pandemia e agora no 'pós-pandemia'. A mudança no Ministério de Minas e Energia é mais um desses ajustes", complementa Zambelli.

O analista político do portal Inteligência Política, Melillo Dinis, analisa que as mudanças feitas por Bolsonaro são uma cortina de fumaça para esconder o principal problema, a economia.

"O presidente segue criando factoides desprovidos de qualquer resultado. As mudanças servem como uma cortina de fumaça para explicar os preços e os ataques à Petrobras. Assim, ele imagina que seus eleitores vão se consolidar. Não dará certo. A eleição será decidida pela economia e pela reação à pandemia", observa.

A advogada constitucionalista Vera Chemin, mestre em direito público administrativo pela Fundação Getulio Vargas (FGV), aponta que as sucessivas trocas feitas pelo chefe do Executivo, especialmente, no MMA e na Petrobras evidenciam a preocupação de tentar, a qualquer custo, represar o aumento dos combustíveis.

"Represar preços de combustíveis é uma política recorrente no Brasil. É uma prática perigosa, pois, apesar de favorecer o consumidor no presente, transporta os custos a médio ou até longo prazo, em que outra geração poderá sofrer as consequências econômicas e sociais", alerta.

Ainda assim, segundo Chemin, existem outras variáveis que serão relevantes para a garantia de sua reeleição, como o crescimento do PIB, a criação de empregos e a continuidade das políticas sociais, além das estratégias de campanha eleitoral que terão que ser convincentes junto às diversas camadas da população.

Para Arthur Wittenberg, professor de Políticas Públicas do Ibmec, o movimento de Bolsonaro é coerente. "Alguns analistas consideram que a troca foi essencialmente eleitoreira. Mas toda mudança ministerial tem algum componente eleitoral, especialmente em ano de eleições", afirma. "Além disso, se fosse esse o caso, Bolsonaro poderia ter indicado um político para a posição, para facilitar aprovação de medidas, por exemplo, de controle de preços", argumenta.

Wittenberg reconhece a complexidade do problema energético e dos combustíveis, mas lembra que o impacto é essencialmente econômico. A principal preocupação dos eleitores é com a inflação. "Desse modo, parece plausível colocar Sachsida como ministro de Minas e Energia. Se ele vai ser capaz de melhorar o preço da gasolina, ainda não é possível saber", conclui.

 

 

- Bolsonaro faz “ofensiva estúpida” contra urnas, diz “Folha”

Diante de “risco de derrota em outubro”, presidente “atiça os ânimos”, afirma jornal ao defender sistema eletrônico de votação

O jornal Folha de S.Paulo publicou na 1º página de sua edição impressa deste domingo um editorial (para assinantes) a favor do sistema eleitoral eletrônico usado no Brasil e fez uma dura crítica ao presidente Jair Bolsonaro (PL).

Depois de o texto listar argumentos a favor da eficácia e segurança das urnas eletrônicas, a conclusão é esta: “Demonstra-se com eloquência que Bolsonaro prega no vazio. Ou, quando muito, atiça os ânimos de alguns poucos dispostos a participar de seus ensaios golpistas, que alternam intimidações e recuos enquanto se mantém elevado o risco de derrota em outubro. Trata-se de uma ofensiva estúpida contra uma valiosa conquista nacional e, ao fim e ao cabo, contra todos os eleitores e eleitos do país”.

O título do editorial da Folha é “À prova de golpes”. Trata-se de uma alusão ao que o jornal acredita ser algo iminente, uma quebra das regras institucionais no país. Ou seja, Bolsonaro está se preparando para dar um golpe de Estado se vier a perder a disputa eleitoral de outubro na qual busca um 2º mandato.

Na sua seção da edição 8 de maio de 2022, o ombudsman da Folha, José Henrique Mariante, escreveu um texto com este título e subtítulo: “Vai ter golpe. Passe a informação. Folha e a imprensa deveriam trocar de vez a presunção pela certeza do fato”.

No editorial deste domingo a Folha dialoga com o que escreveu seu ombudsman há uma semana, ao em editorial considerar como hipótese plausível um golpe de Estado no país.

“Ao longo de mais de duas décadas e 13 anos eleitorais, nada se registrou que pudesse amparar as suspeitas que Jair Bolsonaro (PL) lança, interessada e irresponsavelmente, sobre as urnas. Ele próprio conquistou no período cinco mandatos de deputado federal e um de presidente da República —não sofreu derrota, aponte-se, em votações informatizadas”, escreve a Folha.

Para o jornal paulista, “a alternância de poder tem sido observada em todas as instâncias de governo, o que desmoraliza teses conspiratórias de favorecimento. Os terminais digitais captaram tanto a ascensão do PT nos anos 2000 quanto a onda direitista e antipolítica de 2018”.

Folha terminou o ano de 2021, segundo dados do IVC (Instituto Verificador de Comunicação), com uma média de 66.188 exemplares impressos por dia e 299.899 assinantes de sua versão digital.

 
Fonte: Correio Braziliense - Poder360