Cotidiano

Viradouro volta à 1919 e lembra o Carnaval apoteótico pós gripe espanhola





Campeã do Carnaval de 2020 do Rio de Janeiro, a Viradouro fez um desfile correto na luta pelo bicampeonato no grupo especial relembrando a folia de 1919, pós gripe espanhola.

Fazendo um paralelo com a pandemia de covid-19 que pausou a festa em 2021, a agremiação mexeu com o sentimento da arquibancada e fez um dos melhores desfiles da noite.

O samba-enredo Não Há Tristeza Que Possa Suportar Tanta Alegria é uma carta de amor de um pierrô para uma colombina. O nome faz referência a um trecho de uma canção de baile do pré-carnaval de 1919.

A comissão de frente representava a morte, com várias caveiras e a própria imagem da morte representada. Já o abre-alas chamou atenção por sua suntuosidade, com destaque em balanços e mini piscinas.

Uma das alas trazia integrantes empurrando doentes em cadeiras de rodas que levantam e começam a sambar em meio ao Carnaval. Os integrantes ficavam embaixo de um dos carros e surgiam de tempos e tempos na avenida, como um elemento surpresa.

O ponto alto foi a bateria, com vários integrantes que se levantavam para tocar pratos, instrumento pouco usual.

Entre as musas, destaque para Erika Januza, que bastante emocionada estreou como rainha de bateria no lugar de Raíssa Machado. Lorena Improta também desfilou como destaque de chão apenas sete meses após dar à luz sua primeira filha.

Luxo, sofisticação, beleza e animação marcaram o desfile quase impecável, que teve um pequeno problema apenas com o mestre-sala. Julinho nascimento perdeu o sapato em sua performance com a porta-bandeira Rute Alves. Apesar disso, o casal fez uma apresentação sucinta, leve e com energia.

 

- Homenagem a Paulo Gustavo é ofuscada por problemas da São Clemente no Rio

A São Clemente era muito aguardada na Sapucaí por causa da homenagem a Paulo Gustavo, humorista que morreu no ano passado vítima da covid-19. Mas a escola enfrentou problemas na Marquês de Sapucaí antes mesmo do início do desfile no primeiro dia do Grupo Especial do Rio de Janeiro. A parte de cima do abre-alas bateu em um viaduto e enfeites acabaram quebrando.

Depois, já na avenida, a alegoria da comissão de frente que levava Déa Lúcia, mãe do humorista, também apresentou problemas. Com um gerador quebrado, ela entrou apagada. Além disso, o vestido de uma das integrantes enroscou em uma estrutura e rasgou. O cortinado também desabou. Apesar disso, a presença de Déa Lúcia na comissão de frente arrancou muitos aplausos acalorados do público. Bastante emocionada, ela acenava de volta colocando a mão no coração.

Todos os problemas acabaram atrasando o começo da apresentação e fizeram com que a escola precisasse acelerar o ritmo para não estourar o tempo. Os quesitos evolução e harmonia foram prejudicados por causa disso.

O desfile, no entanto, acabou dentro do tempo limite, com uma hora e nove minutos de duração, apesar da correria no final.

Como foi o desfile da São Clemente

O carro abre-alas, batizado de paraíso da comédia brasileira, levava o pai de Paulo Gustavo, Júlio Márcio, além de Heloísa Perissé, Ingrid Guimarães e outros amigos do ator. Uma estátua o representando Paulo era o grande destaque no alto do carro. No entorno, estátuas representavam outros grandes humoristas como Costinha e Golias. Integrantes vestidos de anjos desciam e interagiam com o público durante o desfile.

Já a fantasia da bateria da São Clemente homenageou a personagem mais famosa do ator, Dona Hermínia, inspirada em Déa Lúcia e que deu origem ao filme "Minha Mãe É Uma Peça", um dos maiores sucessos da história do cinema brasileiro. A personagem ainda apareceu na comissão de frente, em uma das alegorias e em uma escultura no final do desfile.

Thales Breta, viúvo de Paulo Gustavo, veio no terceiro carro e foi ovacionado pelo público. Uma alegoria representando um bolo de casamento trouxe um casal de homens se beijando. O gesto foi muito aplaudido pelas arquibancadas.

No final do desfile, protesto. Na rua "ator Paulo Gustavo", em Niterói, integrantes da São Clemente encenavam uma manifestação político cultural com bandeiras e palavras de ordem que denunciam a falta de vacinas e o descaso público com a vida das pessoas. Nas faixas, "Viva o SUS".

A quantidade de erros técnicos faz com que a São Clemente seja uma aposta para cair no próximo Carnaval. Paulo Gustavo merecia uma homenagem melhor.

"No meu coração a São Clemente é campeã"

Déa Lúcia, mãe do humorista, minimizou os problemas e puxou o grito de "é campeã" no estúdio da Globo após o desfile. "Pelo menos no meu coração a São Clemente é campeã", declarou a musa inspiradora de Paulo Gustavo.

Ela ainda contou que já havia desfilado pela São Clemente com Paulo Gustavo. "Desfilei em um enredo de novelas. Fui de apoio com ele, tomando conta dele. Agora ele está lá em cima tomando conta de mim."

Emocionado, o viúvo Thales Bretas falou da mistura de sentimentos após a conclusão do desfile. "Apesar da dificuldade, tentei focar no amor, alegria, brilho que ele emanava. Foi lindo ver a escola contando a história dele de uma forma leve. Sou muito grato por ter essa família e ter vivido esse sonho."

Amigas de Paulo Gustavo, Mônica Martelli e Samantha Schutz também falaram após o desfile. "Foi um grande brasileiro que merece todas as homenagens. Todo mundo era filho dessa mãe e sentiu essa perda desse familiar", disse Mônica. "Ele estava aqui o tempo inteiro. Com todo mundo cantando", concluiu Samantha.

 

- Com Iza, Imperatriz Leopoldinense abre grupo especial do Rio de Janeiro

Campeã da Série A do Carnaval 2020 e de volta à elite, a Imperatriz Leopoldinense abriu hoje os desfiles do grupo especial do Rio de Janeiro. E retornou apostando em luxo de fantasias e homenagem a sua própria história.

Com a cantora Iza à frente da bateria, a escola conta mais uma vez com a rainha pé quente para, quem sabe, levar o principal título do Carnaval no retorno após dois anos.

 

No início do desfile a Imperatriz Leopoldinense teve um problema com uma integrante da comissão de frente, que perdeu parte da fantasia e ficou de sutiã no primeiro módulo de jurados, o que pode descontar pontos da escola. O terceiro carro, com três elefantes brancos, teve dificuldades de atravessar a avenida e abriu buraco em vários momentos.

A verde e branca homenageou o carnavalesco Arlindo Rodrigues, morto em 1987, que comandou os títulos da escola de Ramos em 1980 e 1981.

O desfile ainda trouxe inspirações de outros títulos dele, como o da Salgueiro em 1971 e da Mocidade em 1979. Foi Arlindo quem profissionalizou a profissão de carnavalesco, profissionais que hoje são bastante reconhecidos e disputados entre as escolas.

No final, uma homenagem a Joãosinho 30 e ao patrono Luizinho Drumond, morto ano passado, deu um tom confuso ao desfecho da apresentação.

O Carnaval de 2022 também marca a volta da carnavalesca Rosa Magalhães, que saiu da escola há 13 anos. Com ela, a escola conquistou cinco títulos, o último há 21 anos, em 2001. Rosa Magalhães, que foi aluna de Arlindo, também desfilou como destaque à frente de um dos carros.

Além de Iza comandando a bateria, Fafá de Belém desfilou pela escola como destaque no carro abre-alas. Outra famosa musa da escola foi Carla Prata, destaque de chão no desfile.

A escola cruzou a avenida em uma hora e sete minutos, totalizando 67 minutos de desfile, e cumprindo a regra. Os desfiles do Grupo Especial do Rio de Janeiro precisam ter no mínimo 60 minutos e, no máximo, 70 minutos.

"É um baile de luxo sem nenhum excesso", declarou Fafá após o desfile, que se disse honrada de ser parte do Carnaval da Imperatriz. Iza destacou a emoção de voltar à Sapucaí.

"Foi muito emocionante. Estou voltando agora aos meus shows e é uma dose dupla de emoção. Eu sou da zona norte, de Ramos, Olaria. É muito especial quando a gente tem uma relação com a comunidade", declarou a rainha de bateria.

É lindo alçar voos e poder voltar para o lugar de onde você veio Iza, rainha de bateria

É o primeiro ano que a escola desfila sem a tradicional porta-bandeira, Dona Maria Helena, que morreu em março aos 80 anos, e o presidente da escola Luizinho Drummond, que morreu em 2020. "Sentíamos a proteção e a presença deles", declararam o casal mestre-sala e porta-bandeira da escola após o desfile.

 

- Com "50 tons de rosa", Mangueira homenageia Cartola, Jamelão e Delegado

A Mangueira, segunda escola a cruzar a Marquês de Sapucaí nesse primeiro dia de desfiles do grupo especial do Rio de Janeiro, entrou na avenida homenageando três pilares do samba: Cartola, Jamelão e Delegado. Angenor, José e Laurindo, primeiros nomes do poeta, do cantor e do mestre-sala, batizam o samba-enredo da rosa e verde.

Neste ano, o carnavalesco Leandro Vieira apostou com força nas cores da escola —algo que abriu mão nos últimos desfiles— para decorar os carros e também colorir fantasias. São "50 tons de rosa" na avenida, como declarou o carnavalesco à Globo. O conjunto de fantasias, inclusive, foi grande destaque.

O sambista Nelson Sargento, que morreu em maio do ano passado aos 96 anos, também foi homenageado no carro abre-alas. Enquanto integrantes fantasiados de Cartola, Jamelão e Delegado sambavam na alegoria, uma foto de Nelson Sargento surgiu no topo do carro.

Outro destaque do carro foram as rosas que subiam a cada vez que Cartola entoava "As Rosas Não Falam", um de seus maiores sucessos. Alegorias gigantes de baianas vieram à frente da ala das baianas, já que também são baluartes da escola. Porém, os tripés tiveram problemas na locomoção ainda no início do desfile.

Um dos fundadores da escola, Cartola foi quem escolheu os tons verde e rosa como as cores da agremiação, além de ter dado o nome de Mangueira. A ala O Rei da Mangueira trazia componentes com uma roupa colorida clássica do poeta e compositor. Ele e Dona Zica ainda foram homenageados em uma alegoria cenográfica. Um dos carros exalava o perfume de flor de laranjeira, o favorito de sua amada.

As obras e trajetórias de Cartola, Jamelão e Delegado surgiram, respectivamente, em esculturas, fantasias e alegorias. O desfile seguiu uma sequência referências de cada um dos homenageados.

Com total entrosamento, Squel Jorgea e Matheus Olivério —o casal de mestre-sala e porta-bandeira— foram o ponto alto do desfile. Eles desfilaram em uma posição fora do comum, em frente à bateria.

Na última alegoria, que homenageava Delegado, um enorme boneco do mestre-sala girava em cima da alegoria, como uma bailarina em cima de uma caixinha de música. À frente do carro seu filho, Ezio San, e em cima do carro sua irmã, Tia Suluca. Apesar da criatividade e boa execução, as alegorias estavam muito enquadradas em cubos.

A rainha de bateria Evelyn Bastos desfilou com uma lace cor-de-rosa e costeiro verde e rosa, celebrando as cores da escola. Já a cantora Alcione, que desfilou como destaque em um dos carros, foi ovacionada ao descer do carro já na dispersão.

Apesar da bonita homenagem para os baluartes, a Mangueira corre pelo título sem trazer um desfile tão competente como os dos últimos anos.

 

- Salgueiro retrata resistência e traz Viviane Araújo grávida para a avenida

O Salgueiro entrou potente na Marquês de Sapucaí com um enredo sobre resistência. Terceira escola a desfilar no primeiro dia do grupo especial do Rio de Janeiro, a escola ainda chamou a atenção com a rainha de bateria Viviane Araújo, que pela primeira vez desfila grávida no Carnaval. A atriz foi muito assediada já na área de concentração do desfile.

Viviane surgiu vestida como a Cabocla Jurema, entidade de religiões de matriz africana, à frente da Furiosa. Grávida, a atriz privilegiou o desfile do Rio ao de São Paulo, já que neste ano Salgueiro e Mancha Verde desfilaram quase ao mesmo tempo.

"Foi emocionante por vários motivos. Pelo retorno do nosso Carnaval, por esse momento incrível, maravilhoso e lindo que estou vivendo na minha vida, carregando meu filho. Um sonho ele estar nessa avenida vivendo isso", declarou a rainha à Globo logo após o desfile.

A rainha de bateria Viviane Araújo causou verdadeira comoção nas arquibancadas, que gritaram seu nome. Na concentração, ela foi cercada por seguranças para evitar o assédio. Até o momento é a rainha que mais atraiu atenção nas arquibancadas.

Como foi o desfile do Salgueiro

O carnavalesco Alex de Sousa buscou falar do povo preto, da sua cultura, e também falar do Rio de Janeiro, temas recorrentes da agremiação. O desfile trouxe representações de territórios de resistência do povo preto do Rio de Janeiro, como a praça XI, Gamboa e Santo Cristo, a Pequena África, e o próprio Morro do Salgueiro, outro espaço de resistência.

Na comissão de frente, destaque para a Ingrid Silva, que surgiu de surpresa de dentro da alegoria dançando em um pedestal. A bailarina brasileira radicada em Nova York representava Mercedes Batista, primeira bailarina negra do Municipal do Rio de Janeiro. O pedestal que levantou Ingrid tinha formato de punho fechado, símbolo de resistência.

"Consegui guardar essa surpresa, fugi um pouquinho do meu trabalho para viver essa experiência e foi incrível", declarou Ingrid Silva sobre a vinda ao Brasil apenas para participar do desfile do Salgueiro.

Na comissão de frente também vieram integrantes representando a negritude vitoriosa do Brasil, como Machado de Assis, Xica da Silva, Ruth de Souza e Zumbi dos Palmares. No abre-alas a escola mostrou força para conquistar o título desse carnaval com uma comissão de frente impecável, trazendo orixás num tripé.

O Salgueiro tem também como trunfo o casal mestre-sala e porta-bandeira que veio já no início da escola representando a ancestralidade cultural e força negra.

Destaque ainda para um dos carros que veio representando o viaduto Madureira, com integrantes dançando em um baile charme na parte de baixo do carro. Também celebrando o funk e outros ritmos do subúrbio, o carro veio com famosos como DJ Marlboro, Sandra de Sá e a atriz Cacau Protássio. Projetos como o Afroreggae e Voz do Morro, que também são resistência no Rio de Janeiro, vieram representados em alegorias.

Ponto alto do desfile, a última alegoria trouxe uma escultura de um obelisco escrito a palavra racismo entre várias integrantes e componentes negros simulam a derrubada de estátuas ditas preconceituosas. Vários integrantes coreografavam um protesto levando faixas com dizeres anti-racistas e fotos de ícones como Elza Soares, Marielle Franco e Candeia.

O Salgueiro encerrou o desfile com uma hora e dez minutos cravados, ou seja, tempo máximo permitido para o desfile, que são 70 minutos. Houve um pouco de correria, mas a escola cumpriu o tempo determinado.

Há uma máxima do Carnaval carioca que diz que sempre que o Salgueiro vem com enredo afro é forte candidato ao título. O refrão contagiou e fez com que todos pudessem cantar contra o preconceito. Até o momento, foi a escola que mais encantou a Sapucaí.

 

São Paulo

- Tom Maior encanta avenida com 'O Pequeno Príncipe' do Nordeste

A Tom Maior foi a quarta escola a desfilar pelo grupo especial de São Paulo no primeiro dia do Carnaval 2022. A escola abordou a literatura em seu desfile, e adaptou a história do clássico livro "O Pequeno Príncipe", de Antoine de Saint-Exupéry, para o Nordeste brasileiro.

A escola do bairro de Sumaré se inspirou em Josué Limeira e Vladimir Barros, que criaram a obra cordelista "O Pequeno Príncipe em Cordel", em 2015. O livro transpõe o clássico de Saint-Exupéry para o ambiente nordestino, mantendo a fidelidade do enredo original, mas em uma nova roupagem.

O samba-enredo é intitulado "O Pequeno Príncipe no Sertão", e os autores são Jairo Roizen, Morganti, Sukata, Valêncio, Nelson Valentim, Tubino, Jadson Fraga, Luan, Alexandre Gordão, Beto Savanna, Claudinho, Meiners e Victor Alves.

Para o carnavalesco Flávio Campello, o tema prega que a história do sertão é rica e cheia de boas mensagens. Assim como o clássico francês traz uma série de reflexões filosóficas e existenciais importantes, a história do nordeste brasileiro também retrata culturalmente um lugar muito diverso. Por isso, os dois temas são congruentes.

Os carros destacam as histórias diversas dos povos brasileiros e brincam com a mitologia fantasiosa do planeta B-612, habitado pelo Pequeno Príncipe, mesclando as referências com elementos mistos da cultura do Nordeste brasileiro. Neste sentido, a escola se propôs a contar a história do personagem do livro lançado originalmente em 1943 investigando os estados nordestinos.

Em um dos carros, por exemplo, o Pequeno Príncipe pega carona na "Asa Branca" para desbravar outros planetas. Em outro, ele chega à Terra, e vai investigando elementos do Brasil.

Segundo Campello, a intenção do carro em que o Pequeno Príncipe chega ao nordeste era reproduzir o ambiente de uma lojinha de presentes, que ele conheceria no planeta Tera. A partir do choque quando ele vai descobrindo novos elementos, ele aprenderia a valorizar o que ele tem de mais precioso.

 

- Acidente, buraco e cantoria marcam desfile da Mancha Verde

Com um acidente antes mesmo de entrar no Sambódromo do Anhembi, a Mancha Verde fez um desfile que começou marcado por problemas na primeira noite do grupo especial do Carnaval 2022 em São Paulo. No entanto, a alegria dos componentes da escola e a beleza dos carros alegóricos contagiaram a arquibancada.

Ainda durante a concentração, o braço de uma das alegorias caiu. Tratava-se de uma parte do carro abre-alas, e os membros da agremiação precisaram correr para tentar minimizar o acidente para a Mancha conseguir entrar. Isso gerou sete minutos de atraso até que a Comissão de Frente entrasse na avenida.

Mesmo assim, a escola deixou um buraco na avenida, já que o carro que sofreu o acidente entrou apenas 15 minutos depois. Isso pode acarretar desconto de pontos, e também fez a escola precisar correr para encerrar sua apresentação dentro dos 65 minutos máximos estipulados para o andamento.

Planeta Água

Vice-campeã do Carnaval 2020, a escola originada da torcida organizada do Palmeiras escolheu como tema o samba-enredo "Planeta Água", escrito por Marcio André Filho, Marcelo LepianeLico Monteiro, Rafael Ribeiro, Richard Valença, João Perigo, Solano Mota, Leandro Thomaz, Telmo JBLanza MunizMoraes e Rosali Carvalho.

"O enredo tem duas grandes vertentes", contou o diretor de carnaval da agremiação, Paolo Ricardo de Moraes Bianchi. "Uma delas é a religiosa, como a água se introduz em várias religiões, e também, por outro lado, um tema atual, que é a escassez, mostrar como o homem maltrata a água."

Mesmo com os problemas, a força de vontade e a paixão dos integrantes da escola ficaram evidentes durante o desfile. Os carros alegóricos animaram muito a arquibancada e a torcida compareceu em peso.

Durante alguns momentos do desfile, a bateria fez alguns "apagões", e a comunidade continuou entoando o samba-enredo à capela com bastante fervor. Trata-se de um trabalho de destaque da harmonia, de Marquinhos, Bruno e Danilo.

O samba-enredo reflete sobre a água em suas diversas formas e simbolismos, e menciona a importância do recurso natural não apenas para a economia e para a fertilização da terra, mas também para o ciclo da vida e para a transformação dos ambientes. A letra faz reflexões poéticas e religiosas sobre tempestade, choro e o significado renovador da água. O refrão, por exemplo, destaca Iemanjá:

"Iemanjá! Iê Iemanjá!
Rainha das ondas, senhora do mar!
Iemanjá! Iê Iemanjá!
No azul dos teus mistérios eu também quero morar"

Emocionada, a porta-bandeira Adriana Gomes, que estava vestida com uma fantasia de Nossa Senhora Aparecida, comemorou conseguir terminar o desfile. Ela ficou feliz com a passagem da escola pela avenida:

A gente foi resistente e resiliente, e nada mais abençoado do que estar vestida de Nossa Senhora Aparecida. Estar aqui hoje é vitória da vida, do cuidado, da ciência e de todos nós que tomamos a vacina.

 

- Colorado do Brás tem acidente e componente desloca o joelho em desfile

A Colorado do Brás foi a segunda escola de samba de São Paulo a desfilar na primeira noite do grupo especial. Fundada em outubro de 1975, ela passou 25 anos no Grupo de Acesso, antes de voltar ao especial em 2019. Agora, ela faz uma homenagem à escritora Carolina Maria de Jesus.

A escola tem como samba-enredo em 2022 "Carolina, A Cinderela Negra do Canindé", e conta a história de uma das primeiras autoras negras no Brasil, considerada uma das mais importantes do país. O samba é de autoria de Thiago Sukata, Turko, Rafa do Cavaco, Claudio Mattos, Maradona, Valêncio, Luan e Thiago Meiners, interpretado por Chitão Martins.

A escola sofreu problemas técnicos na iluminação do abre-alas. Alguns refletores falharam e não iluminaram os queijos que carregavam destaques.

Uma componente da Colorado do Brás foi retirada da avenida carregada. A equipe médica colocou uma tala no joelho da foliã e a levaram de ambulância da dispersão da avenida. Segundo um dos organizadores da escola, a componente deslocou o joelho enquanto desfilava.

A homenageada

Carolina Maria de Jesus nasceu em Sacramento, em Minas Gerais, e 14 de março de 1914. Ela viveu boa parte de sua vida na favela do Canindé, na zona norte de São Paulo, e sustentou a si mesma e seus três filhos como catadora de papéis. Tal história é destaque no Abre-Alas da escola, todo feito de papelão justamente como uma forma de fazer referência à história de vida de sua homenageada.

Carolina foi descoberta com auxílio do jornalista Audálio Dantas, homenageado no último carro da Colorado do Brás.

Ela ficou mais conhecida pelo livro "Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada", em que conta sua própria história na favela do Canindé e as suas observações da vida paulista contrastante. Publicada em 16 idiomas, ela também é lembrada por obras como "Casa de Alvenaria", "Pedaços de Fome" e "Provérbios", além de poemas, contos e marchas de carnaval.

Muitos de seus escritos foram encontrados, organizados e publicados de forma póstuma, ou seja, após a morte, que ocorreu aos 62 anos, em 13 de fevereiro de 1977. Na ocasião, ela foi vítima de insuficiência respiratória.

Segundo o carnavalesco André Machado, que veio vestido de morador de rua e abriu o desfile ao lado de Vera Eunice, filha da homenageada, a proposta da escola é "convocar a população de rua, mendigos e desabrigados a fazer uma homenagem a Carolina Maria de Jesus, que veio a São Paulo em busca de seu sonho, e conseguiu".

Para Vera, o desfile não deixou a desejar:

Já vivi várias homenagens a Carolina, mas essa foi muito grande. A escola retratou bem a vida da Carolina e não deixou passar nada, da fome e da tristeza que passamos aos altos e baixos. Minha mãe teve tempos de glória e de ostracismo, tivemos tempo de muita forme e muita fartura. Ela morreu na miséria.Vera Eunice, filha de Carolina Maria de Jesus

O desfile da Colorado relata toda a história de superação de Carolina Maria de Jesus, filha ilegítima de um homem casado e que precisou interromper os estudos no segundo ano. Mesmo assim, ela já havia aprendido a ler e a escrever, e o gosto pela literatura nunca a abandonou.

Um dos destaques da escola foi Camila Prins, primeira rainha de bateria trans do Carnaval de São Paulo.

"São 22 anos de carnaval e ainda é um sonho, não acredito que está acontecendo. Fiquei anos presa no armário e agora sou a primeira rainha trans. Eu me sinto muito honrada", destacou a influenciadora em entrevista ao UOL.

A importância é muito grande. Vou representar todas as meninas trans no Brasil e no mundo. Eu me sinto vencedora e sinto que, hoje, todos no meio do samba me respeitam.Camila Prins, rainha de bateria da Colorado do Brás

No quarto carro da Colorado, Carolina de Jesus surge em cima de um grande castelo, que sai de dentro de um livro, para representar a superação da autora e sua vitória através das palavras.

Um dos trechos do samba-enredo destaca justamente tal transformação:

"Lá vou eu pra batalha, não tinha o que comer
Fiz verso e poesia retratando meu viver
Quando cheguei em São Paulo sem rumo, nem renda
Falei de justiça pra que o mundo entenda"

Fonte: UOL