Política

Dez momentos mais tensos da política brasileira em 2021





O ano de 2021 foi intenso para a política nacional. Em apenas 12 meses, o Brasil enfrentou o ápice de uma pandemia ainda não acabada, ameaças de golpe de Estado, desprestígio internacional, crise econômica e um desfile de tanques em frente ao Congresso Nacional enquanto se debatia uma proposta que poderia alterar todo o sistema de votação eleitoral.

Foi também um ano de episódios inéditos na história: pela primeira vez um ministro do Supremo Tribunal Federal teve sua sabatina postergada por mais de três meses. Pela primeira vez, um deputado federal foi preso por ameaçar os ministros da Suprema Corte, e pela primeira vez um presidente da república acumulou 140 pedidos de impeachment.

Para rememorar esses momentos, o Congresso em Foco destacou dez dos episódios mais tensos vivenciados na política brasileira em 2021. Confira a lista a seguir, organizada em ordem cronológica. Ao fim, relembre as falas do presidente Bolsonaro em cada um desses momentos.

 

1- Crise do oxigênio em Manaus

2021 começou com a crise que viria a marcar grande parte do debate político ao longo dos meses seguintes. A segunda onda da pandemia da covid-19 chegou em um momento em que o Brasil não havia ainda se recuperado da primeira e o número de mortes provocadas pela doença já ultrapassava na primeira semana de janeiro a marca dos 200 mil.

Assim como ocorreu na primeira onda, Manaus se tornou o epicentro de um novo pico de contágios. A superlotação de hospitais e a falta de apoio do governo federal resultou desta vez em uma nova tragédia: o oxigênio utilizado para abastecer os respiradores em hospitais se esgotou, levando a óbito os pacientes intubados.

A crise do oxigênio em Manaus marcou a primeira crise de imagem do presidente Jair Bolsonaro em 2021, que passou a ser visto junto com o até então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, como cúmplice do ocorrido. A situação se agravou meses depois, quando a CPI da Covid descobriu que, além da negligência no fornecimento de oxigênio, o governo recusou uma oferta da vizinha Venezuela por questões meramente políticas.

2- Conflito pela vacina em SP

Janeiro de 2021 foi tanto o ápice de contágios da covid-19 no Brasil quanto do atrito entre o governo federal e o governador de São Paulo, João Doria. O chefe do governo paulista procurou promover em seu estado a aplicação da Coronavac, primeira vacina contra a covid-19 aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, produzida em São Paulo pelo Instituto Butantan. As negociações para a compra e distribuição de vacinas foram feitas sem que a União fosse envolvida.

Em resposta, Jair Bolsonaro e Eduardo Pazuello tentaram de toda forma impedir que Doria assumisse o protagonismo da campanha vacinal no Brasil. O interesse dos dois chefes surgiu após um ano de criação de barreiras para a entrada dos imunizantes no país e de discursos tanto contra o uso da vacina quanto contra as medidas de isolamento. A estratégia adotada foi procurar maneiras de pressionar Doria para que distribuísse vacinas para os demais estados.

3- Prisão de Daniel Silveira

Os atritos com o Supremo Tribunal Federal (STF) são ainda uma constante no governo de Jair Bolsonaro. Esse atrito se intensificou desde que aliados do presidente começaram a ser investigados sob a suspeita de realização de campanhas em massa de notícias falsas, não apenas a fim de criar desinformação sobre a pandemia, mas também para atingir inimigos do governo.

Em fevereiro de 2021, esse atrito resultou na primeira prisão de um aliado de Jair Bolsonaro dentro do Congresso Nacional. O deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) foi preso em flagrante por decisão do ministro Alexandre de Moraes, após o parlamentar divulgar um vídeo incitando o espancamento de todos os ministros da Suprema Corte.

4- Crise nas Forças Armadas

A utilização política das Forças Armadas sempre foi elemento presente na gestão de Bolsonaro. Desde o início do seu governo, o presidente deu preferência a militares para assumir funções ministeriais, procurou militarizar escolas, abriu um regime especial para a categoria na reforma da Previdência e reforçou nas Forças Armadas as comemorações do golpe militar de 1964.

Essa politização incomodou tanto os comandantes das três forças quanto o ministro da defesa, Fernando Azevedo e Silva, que aos poucos se afastou do presidente. Em março de 2021, após uma reunião com Bolsonaro, o ministro foi retirado de seu posto, e substituído pelo até então ministro da Casa Civil, general Walter Braga Netto.

A demissão do ministro não foi bem recebida pelos comandantes das forças, que puseram seus cargos à disposição do presidente, indicando que não estavam dispostos a continuar com a crescente politização. Com a crise montada, os três entregaram seus postos.

5- Desfile de tanques na PEC do Voto Impresso

As Forças Armadas voltaram a fazer parte de uma crise do governo, desta vez no mês de agosto. A PEC do Voto Impresso, assunto de forte interesse do presidente Jair Bolsonaro, era votada na Câmara dos Deputados, e a maioria dos parlamentares já havia se manifestado contra a proposta. Paralelamente, a Marinha preparava um exercício militar de fuzileiros navais em Formosa-GO, e Brasília era parte do caminho das unidades que fariam parte da operação.

Em sinal de intimidação ao Congresso, olsonaro solicitou que os fuzileiros desfilassem em frente ao Palácio do Planalto durante a votação. A manobra não funcionou: a Câmara rejeitou a PEC, e os tanques da Marinha apresentaram problemas nos motores durante o desfile, virando motivo de chacota nas redes sociais.

6- Discurso de Sete de Setembro

Com a chegada do Dia da Independência, Bolsonaro percebeu que precisava se aproximar de seus apoiadores, e recuperar sua força política que vinha sendo minada com as sucessivas crises de imagem que acompanharam seu governo e se intensificaram com o avanço da CPI da Covid. A solução foi convocar manifestações de apoiadores pelo país durante a data comemorativa.

Os manifestantes ocuparam parte do gramado da Esplanada dos Ministérios em Brasília, bem como a Avenida Paulista em São Paulo. Os atos reuniram milhares de seguidores radicais do presidente, que gritavam palavras de ordem contra o Supremo e contra o Congresso Nacional, apoiados por líderes políticos da base aliada. Ao fim do dia, Bolsonaro se juntou aos manifestantes em São Paulo e proferiu ataques ao STF, em especial ao ministro Alexandre de Moraes.

No dia seguinte, o presidente do STF Luiz Fux se pronunciou sobre o ato. O ministro considerou a prática de Bolsonaro como um ataque à democracia, e afirmou que pode configurar crime de responsabilidade. O chefe do Executivo recuou, recorrendo ao ex-presidente Michel Temer para a elaboração da Carta à Nação: documento em que Bolsonaro se retrata pelo discurso de Sete de Setembro.

7- Bolsonaro na ONU

Poucos dias após o discurso de Sete de Setembro, Jair Bolsonaro decolou para Nova York para falar na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), tradicionalmente aberta pelo presidente do Brasil. O discurso negacionista recebeu atenção mundial em sua fala de abertura marcada pela oposição à obrigatoriedade das vacinas, pela defesa do tratamento com remédios ineficazes contra a covid-19 e por negar a crise de desmatamentos que seguem acontecendo na Amazônia.

Na data do ocorrido, especialistas procurados pelo Congresso em Focoidentificaram duas principais intenções na fala de abertura de Bolsonaro. A primeira era aproximar-se de sua base de apoiadores, replicando o discurso que o trouxe à presidência. A segunda era demonstrar ao mundo que acredita naquilo que defende e que acredita ter as melhores intenções para governar, buscando diminuir o impacto de uma eventual denúncia ao Tribunal Penal Internacional.

8- Risco de racha na CPI da Covid

Desde o mês de abril que as ações e omissões do governo federal na pandemia foram assunto de investigação e debate na CPI da Covid-19. O colegiado de 11 senadores era coordenado pelo seu grupo majoritário, formado por sete membros, que ficaram conhecidos como G7. O bloco contava com o presidente da CPI Omar Aziz (PSD-AM), bem como o vice-presidente Randolfe Rodrigues(Rede-AP) e o relator Renan Calheiros (MDB-AL).

A atuação do G7 seguiu de forma relativamente harmônica até o mês de outubro, quando o prazo para conclusão do relatório ficou próximo de se esgotar. Restavam dúvidas no grupo entre a tipificação das condutas de Bolsonaro como crime contra a humanidade ou como genocídio. Renan Calheiros se comprometeu a ouvir todos os membros antes de dar a palavra final, até que foi vazada uma minuta de seu relatório em que o presidente era acusado de genocídio.

O vazamento provocou insatisfação em parte dos membros do G7, em especial o presidente Omar Aziz. O descontentamento trouxe o risco de racha dentro do grupo, que precisava concentrar os votos em um único relatório para que pudesse ser aprovado. No fim, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) reuniu os parlamentares para que chegassem a um acordo. O relatório final atribuiu a Bolsonaro o tipo penal de crime contra a humanidade.

9- Primeiro turno da PEC dos Precatórios

Entre as prioridades do governo para o segundo semestre de 2021, estava a implementação do programa Auxílio Brasil: sucessor do Bolsa Família, com o valor aumentado para R$ 400. Para que pudesse ser instaurado, a equipe econômica precisava contornar as limitações impostas pelo Teto de Gastos. A solução foi propor um limite para o pagamento de precatórios (dinheiro devido pela União após perder processos judiciais), e utilizar o espaço no orçamento para o novo programa.

A mudança no pagamento de precatórios veio na forma da PEC dos Precatórios, que precisava ser aprovada no Congresso Nacional. A oposição, porém, viu com preocupação a proposta. Partidos de oposição viram a PEC como uma espécie de calote, montado com o objetivo de atender a um interesse eleitoral de Jair Bolsonaro. Havia também o temor do espaço fiscal ser utilizado não apenas para financiar o Auxílio Brasil, mas também para abastecer o Orçamento Secreto e assim ser utilizado compra de votos em favor do governo no Congresso.

Em novembro de 2021, Arthur Lira (PP-AL) levou a PEC dos Precatórios para votação em primeiro turno ao plenário da Câmara. A votação, porém, enfrentou um novo obstáculo: a falta de quórum. Após horas de espera para que a votação pudesse começar, a solução de Lira foi permitir com que deputados em missão no exterior votassem à distância, garantindo vitória do governo. A manobra regimental gerou revolta na oposição, que levou a questão ao STF. Ainda não se sabe se os votos obtidos com a tática de Arthur Lira foram o fator determinante para aprovação da PEC.

10- Sabatina de Mendonça

Em julho de 2021, o ministro Marco Aurélio se aposentou, ficando vacante a sua cadeira no STF. Bolsonaro ficou encarregado de indicar um substituto, e recorreu ao pastor Silas Malafaia para que este apontasse um nome “terrivelmente evangélico”. O escolhido foi André Mendonça, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública e ex-advogado-geral da União.

A indicação de Mendonça enfrentou dura resistência no Senado, onde o presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) adiou em mais de três meses a sua sabatina. Apenas no mês de dezembro, após intensa pressão da ala governista, André Mendonça foi sabatinado pelo Senado Federal.

Fonte: Congresso em Foco