Cultura

Papa Francisco em Lesbos: migração, paremos este naufrágio de civilização





Durante o encontro com os refugiados em Lesbos, Francisco disse que, "com amargura, temos de admitir" que a Grécia, "à semelhança de outros, continua sob pressão e que, na Europa, há quem persista em tratar o problema como um assunto que não lhe diz respeito". "Se queremos recomeçar, olhemos sobretudo os rostos das crianças. Tenhamos a coragem de nos envergonhar à vista delas, que são inocentes e constituem o futuro", frisou o Pontífice.

Mariangela Jaguraba - Vatican News

Na manhã deste domingo (05/11), o Papa Francisco visitou os refugiados no “Centro de Recepção e Identificação” de Mitilene, capital da ilha grega de Lesbos.

O Santo Padre retornou pela segunda vez a Lesbos. A primeira, foi em 16 de abril de 2016, quando o Pontífice falou sobre o horror das mortes no mar, sobre as "vítimas de viagens desumanas e sujeitas à opressão de torturadores". Recordou também, naquela ocasião, a generosidade do povo grego, com sua capacidade de responder ao sofrimento dos outros "apesar das graves dificuldades a serem enfrentadas".

Migração, uma crise humanitária que diz respeito a todos

Neste domingo, em Lesbos, Francisco encontrou novamente os refugiados, contemplou os seus rostos, olhou-os nos olhos. "Olhos cheios de medo e ansiedade, olhos que viram violência e pobreza, olhos sulcados por demasiadas lágrimas", disse o Papa, recordando a visita de cinco anos atrás à ilha de Lesbos junto com o Patriarca Ecumênico de Constantinopla, Bartolomeu I, e o Arcebispo Ortodoxo de Atenas e toda a Grécia, Ieronymos. Naquela ocasião, Bartolomeu I recordou "que a migração não é um problema do Oriente Médio e do norte da África, da Europa e da Grécia. É um problema do mundo inteiro".

Sim, é um problema mundial, uma crise humanitária que diz respeito a todos. A pandemia atingiu-nos globalmente, fez com que todos nos sentíssemos no mesmo barco, fez-nos experimentar o que significa ter os mesmos temores. Compreendemos que as grandes questões devem ser enfrentadas em conjunto, porque, no mundo atual, são inadequadas as soluções fragmentadas.

Acordar da indiferença por quem sofre

A seguir, o Papa falou sobre as vacinações que no âmbito planetário estão se efetuando lentamente e que algo parece se mover, "embora por entre inúmeros atrasos e incertezas, na luta contra as mudanças climáticas", mas "tudo parece estar terrivelmente faltando no que diz respeito às migrações. E, no entanto, há pessoas, vidas humanas em jogo".

Está em jogo o futuro de todos, que, só poderá ser sereno, se for integrador. Somente se reconciliado com os mais frágeis é que o futuro será próspero. Pois quando os pobres são repelidos, repele-se a paz. A história nos ensina que fechamentos e nacionalismos levam a consequências desastrosas. A história, repito, nos ensina, mas ainda não aprendemos.

Francisco pede a Deus "que nos acorde da indiferença por quem sofre", e pede ao ser humano para superar "a paralisia do medo, a indiferença que mata, o desinteresse cínico que, com luvas de pelica, condena à morte quem está colocado à margem".

Pouca coisa mudou na questão migratória

"Passaram-se cinco anos desde a visita que aqui fiz com os queridos Irmãos Bartolomeu e Ieronymos. Depois de todo este tempo, constatamos que pouca coisa mudou na questão migratória", ressaltou Francisco. "Muitos, sem dúvida, se empenharam no acolhimento e na integração, e quero agradecer aos numerosos voluntários e a quantos nos vários níveis, institucional, social, caritativo, arcaram com grandes fadigas ocupando-se das pessoas e da questão migratória. Reconheço o esforço realizado para financiar e construir estruturas de acolhimento dignas e de coração agradeço à população local pelo grande bem que fizeram e os inúmeros sacrifícios que suportaram".

Com amargura, porém, temos de admitir que este país, à semelhança de outros, continua sob pressão e que, na Europa, há quem persista em tratar o problema como um assunto que não lhe diz respeito. E quantas condições indignas do homem! Quantos pontos de triagem onde migrantes e refugiados vivem em condições que estão no limite da suportação, sem se vislumbrar no horizonte qualquer solução! Todavia, o respeito pelas pessoas e pelos direitos humanos, especialmente no continente que não deixa de os promover no mundo, deveria ser sempre salvaguardado e a dignidade de cada um deveria ter prioridade sobre tudo.

Não é erguendo barreiras que se resolvem os problemas

Segundo o Papa, "é triste ouvir propor, como solução, o uso de fundos comuns para construir muros. Claro, compreendem-se os medos e inseguranças, as dificuldades e perigos. Fazem-se sentir o cansaço e a frustração, agravados pelas crises econômica e pandêmica, mas não é erguendo barreiras que se resolvem os problemas e melhora a convivência. Antes pelo contrário, é unindo as forças para cuidar dos outros segundo as possibilidades reais de cada um e no respeito da legalidade, colocando sempre em primeiro lugar o valor incancelável da vida de cada homem". A seguir, Francisco acrescentou: 

“É fácil arrastar a opinião pública incutindo o medo do outro; mas por que motivo não se fala, com o mesmo brio, da exploração dos pobres, das guerras esquecidas e muitas vezes lautamente financiadas, dos acordos econômicos feitos na pele do povo, das manobras ocultas para contrabandear armas e fazer proliferar o seu comércio? Há que enfrentar as causas remotas, não as pessoas pobres que pagam as suas consequências, acabando até por ser usadas para propaganda política.”

Francisco destacou que "para remover as causas profundas, não basta apenas resolver as emergências. São necessárias ações concordadas. É preciso abordar as mudanças de época com grandeza de visão, porque não há respostas fáceis para problemas complexos". Segundo o Papa, é preciso "acompanhar os processos a partir do seu interior para superar os guetos e favorecer uma integração lenta e indispensável, para acolher de modo fraterno e responsável as culturas e as tradições alheias".

Olhar os rostos das crianças

"Se queremos recomeçar, olhemos sobretudo os rostos das crianças. Tenhamos a coragem de nos envergonhar à vista delas, que são inocentes e constituem o futuro", frisou o Pontífice. "O Mediterrâneo, que uniu durante milênios povos diferentes e terras distantes, está se tornando um cemitério frio sem lápides. Esta grande bacia hidrográfica, berço de tantas civilizações, agora parece um espelho de morte. Não deixemos que o mare nostrum se transforme num desolador mare mortuum, que este lugar de encontros se transforme no palco de confrontos. Não permitamos que este «mar das memórias» se transforme no «mar do esquecimento». Por favor, paremos este naufrágio de civilização!", pediu o Papa.

Francisco recordou que "nas margens deste mar, Deus se fez homem. Ele nos ama como filhos e nos quer irmãos". Disse ainda que "ofende-se Deus, desprezando o homem criado à sua imagem, deixando-o à mercê das ondas, num vaivém de indiferença, às vezes justificada até em nome de pretensos valores cristãos". "A fé pede compaixão e misericórdia", disse o Papa, "exorta à hospitalidade" que encontrou "em Jesus a sua manifestação definitiva". "Não é ideologia religiosa, são raízes cristãs concretasJesus afirma solenemente que está ali no estrangeiro, no refugiado, no nu e no faminto", sublinhou Francisco, recordando que "o programa cristão é encontrar-se onde Jesus está. Sim, porque «o programa do cristão, escreveu o Papa Bento XVI, é “um coração que vê”».

 

- Quem tem medo de vós, não vos fixou nos olhos

Do Centro de Acolhida e Identificação de Mytilene, na ilha de Lesbos, Francisco chama o mundo à responsabilidade e à solidariedade para com aqueles que buscam uma vida digna

ANDREA TORNIELLI

Cinco anos depois, o Papa quis voltar a esta ilha para visitar os migrantes e refugiados. No início de seu discurso ele citou as palavras ditas aqui mesmo pelo patriarca de Constantinopla Bartolomeu, em 2016:

«Quem tem medo de vós, não vos fixou nos olhos. Quem tem medo de vós, não viu os vossos rostos. Quem tem medo de vós, não vê os vossos filhos. Esquece que a dignidade e a liberdade transcendem o medo e a divisão. Esquece que a migração não é um problema do Médio Oriente e do norte da África, da Europa e da Grécia. É um problema do mundo inteiro»

Essas palavras do patriarca que Francisco quis repetir ajudam-nos a não esquecer, a não desviarmos o olhar. Sempre aprendemos de novo que as pessoas que estão aqui, aquelas que batem nas nossas fronteiras, não são migrantes ou refugiados, não são números, são pessoas.

Aprendamos a olhá-las nos olhos. São vítimas da guerra, do ódio, das mudanças climáticas, dos traficantes de pessoas, dos políticos que as usam como moeda de troca. Ao invés de darmos as costas ou nos dividirmos instrumentalizando o medo, procuremos todos, juntos, questionar o sistema que causa as desigualdades e alimenta as guerras.

 

- Agradecimento ao Papa: um pai entre seus "filhos migrantes"

Vozes, rostos e histórias: as emoções fortes que circundam a visita de Francisco ao Centro de Recepção e Identificação de Mitilene. Os portões se abrem sobre uma humanidade ferida, mas pronta para confiar-se a Deus a fim de que o futuro seja diferente. Há um trabalho incessante em torno de milhares de pessoas que aqui chegam da África e do Oriente Médio e que reconhecem no Papa uma força inspiradora.

Gabriella Ceraso – Vatican News

As músicas enquadram o momento mais esperado da viagem do Papa, primeiro a Chipre e agora à Grécia. Francisco vem para ver os rostos, olhar nos olhos, tocar a carne ferida de muitos que passaram por enormes dificuldades e agora procuram proteção, conforto, cuidado e esperança em Lesbos. São cerca de duzentos hoje em torno do Pontífice, mas representam milhares e milhares daqueles que atravessam o Mediterrâneo ou o Egeu e que, como em muitas outras partes do mundo, fogem para construir uma vida melhor e mais segura. "I love you" são as palavras das pessoas que o aguardavam, em sua chegada, a este campo simbólico, lotado além das barreiras. Francisco caminhou por elas, acariciou muitas crianças, uma delas faz uma grande volta para receber uma segunda saudação, apertou as mãos e recebeu abraços. Entregam-lhe mensagens e mostram-lhe fotos, talvez de algum ente querido distante ou que não sobreviveu, até chegar ao palco preparado para a ocasião.

"Estamos felizes pelo senhor ter vindo entre nós", "pastor" entre o seu "rebanho", diz o arcebispo de Naxos, Andros, Tinos e Mykonos, dom Josif Printezis ao saudar pela segunda vez o Papa peregrino depois de cinco anos na ilha do mar Egeu diante da costa da Turquia, de onde muitos embarcam. "A Igreja católica aqui é pequena e é impossível acolher a todos. Por isso, estamos aqui para rezar juntos", frisou o prelado. Antes dele, o presidente Sakellaropoulou e o vice-diretor do campo falaram e expressaram o desejo de melhorar as condições dessas pessoas e garantir-lhes segurança enquanto estão sendo construídos novos centros na ilha. "Esperamos que as coisas também melhorem para os milhares de pessoas que chegam continuamente."

O Papa a voz dos sem voz, a voz da paz

"Obrigado": esta é a primeira palavra dirigida a Francisco que também se multiplicou no testemunho de Christian e depois de Len, respectivamente um refugiado da República Democrática do Congo, e um voluntário católico de Lesbos. Obrigado por se tornar "a voz dos sem voz", a "voz da Paz", disse dom Printezis, enfatizando como o interesse do Papa pelos migrantes e refugiados não apenas "sensibiliza as autoridades", mas honra aqueles que na ilha enfrentaram há anos um "fluxo desproporcional" de pessoas, servidas com compromisso contínuo, garantindo acolhimento e proteção ao longo do tempo. "Sua palavra", afirma o arcebispo, "conforta os perseguidos e fortalece os bons samaritanos" como a Caritas Hellas, que se inclina com atenção sobre as necessidades deles e os apóia nos passos presentes e futuros.

A história de um peregrino em busca de um porto seguro

Christian Tango Mukaya, 30 anos, da República Democrática do Congo, está em Lesbos com seus dois filhos, mas separado de sua esposa e do terceiro de seus filhos, dos quais não tem notícias há um ano. A história que ele contou em francês é de uma viagem em meio a "enormes dificuldades" e está entrelaçada de gratidão e fé. Ele falou ao Papa como um "pai" preocupado com seus "filhos de migrantes e refugiados", que Deus queira recompensar. Ele agradeceu ao governo e ao povo grego de quem, apesar das dificuldades, recebeu alojamento, cuidados e "um pouco de paz", especialmente da paróquia católica local que "o amou como uma criança" e lhe deu um lugar para rezar. A fé deste homem jovem é sólida: a perseguição e as ameaças de morte em seu país fizeram dele um peregrino em busca de asilo, mas nos momentos difíceis ele confiou em Deus e graças à força da oração e da intercessão da Virgem Maria ele conseguiu superar as dificuldades. Esta é a sua história, esta é a sua vida, e hoje ele pediu ao Papa para rezar juntos a fim de que todos os companheiros como ele encontrem um lugar seguro na Europa, cuidado, educação e proteção.

Uma mão estendida vale mais do que alimentos e roupas

Da pequena, mas muito ativa paróquia católica de Lesbos vem o testemunho de Len Meachim, um voluntário ao lado de "nossos irmãos e irmãs refugiados e migrantes". O `seu "obrigado" é por um Pontífice que "inspira" e dá força às pessoas "de todos os credos ou de nenhum" que compartilham sua posição. Ao Papa ele falou sobre a "proximidade" que faz parte de sua vida de voluntário e que vale mais do que qualquer outra coisa. Um dia um homem lhe disse: "A mão da amizade estendida como sinal de boas-vindas significou mais do que comida e roupas secas". Assim, cresceu o trabalho de acolhida, primeiro para aqueles que chegam da Turquia, depois da África Ocidental, uma presença abençoada.

Não números, mas riqueza e alegria

"Fomos abençoados por sua presença. Os nossos irmãos e irmãs trouxeram nova vida à nossa comunidade, e não apenas em termos de números. A força de sua fé e esperança", explicou Len, "apesar dos sofrimentos do passado e do presente, apesar de sua ansiosa incerteza sobre o futuro, tem sido um exemplo para nós. Eles têm enriquecido nossa fé com sua alegria, seu entusiasmo, sua vitalidade juvenil e sua participação ativa". Para cada um deles, a comunidade católica ofereceu apoio, sem distinção e sobretudo graças à ajuda, inclusive financeira, que chegou de várias partes: os agradecimentos vão aos apoiadores, mas também para estes homens e mulheres "excepcionais", que "fugiram de seu países com ou sem crenças religiosas, mas todos unidos por uma profunda compaixão por seus irmãos e irmãs, pessoas capazes, responsáveis, com dons e qualidades; eles nos ofereceram uma ajuda inestimável, uma ajuda sem expectativa de recompensa pessoal".

Um apelo ao mundo

As palavras de Len no final de seu testemunho tornam-se um apelo que se reforçou diante do Papa: "Que uma mão de amizade lhes seja estendida e os apoie quando chegarem ao seu destino final, a 'terra prometida'". A experiência de vida de Len amadureceu nele uma firme convicção: estas pessoas obrigadas a fugir "têm tanto para nos oferecer quanto nós temos para lhes oferecer" e a esperança de uma vida nova deve se tornar realidade para elas, porque toda vida é digna de ser vivida.

O carinho pelas crianças

O encontro com o Papa foi encerrado com um gesto: duas crianças do Congo que levam ao Papa um presente, um caderno colorido com os seus deveres de casa. Um objeto que contém a esperança para o futuro. Elas se aproximam com seus casacos pequenos e toucas coloridas de onde saem seus cabelos: algumas palavras sussurradas, saudações, uma carícia e depois... uma após a outra, todas as crianças se aproximam. Assim, terminou este momento de extrema ternura, com a doçura de Francisco que os acolheu e os saudou como a um pai.

 

- Voz do Papa nos convida a refletir sobre a questão migratória

O Papa visitou a ilha Lesbos, onde organizações internacionais relatam um número impressionante de suicídios de crianças. «O apelo que Francisco lança a partir do centro do Mediterrâneo é que todos assumam sua responsabilidade de tornar possível a estas pessoas um caminho para um futuro de felicidade», diz Donatella Parisi.

Antonella Palermo - Cidade do Vaticano

A voz do Papa Francisco é um aguilhão, um formidável veículo de mensagens de acolhida e integração que já se tornaram uma das prioridades de seu Pontificado. Quem o diz, é Donatella Parisi, responsável de comunicações do Centro Astalli, braço italiano do Jesuit Refugee Service (“Serviço Jesuíta para Refugiados”) que acolhe e acompanha refugiados e requerentes de asilo há 40 anos. Suas palavras são uma referência à Oração Ecumênica com os Migrantes em Chipre e sobre a visita do Papa Francisco a ilha de Lesbos neste domingo, 5.

Não perigo, mas vítimas

“A referência à escravidão que o Papa citou é especialmente impressionante se considerarmos que em 2 de dezembro celebramos o Dia Mundial da Abolição da Escravatura - recorda Parisi. Algo que a nós parece um conceito já arquivado, do passado, mas ao invés disso é um conceito vivo e que vive precisamente na carne dos migrantes. Os migrantes são apontados como o perigo do qual devemos nos defender, enquanto são eles as vítimas a serem salvas e protegidas”. Parisi retoma as palavras de Francisco quando repete que o amor nos liberta e nos convida a reconhecer no outro um irmão, pessoa com quem estabelecer uma relação fraterna.

 

Em busca de uma linguagem para contar a si mesmo e ser compreendido

“Fiquei muito impressionada com os testemunhos em Chipre: são pessoas relativamente jovens, pessoas que têm sonhos”, observa ela. A experiência de muitos refugiados acolhidos e ouvidos no Centro Astalli é a mesma e todos têm o mesmo desejo: a possibilidade de comunicar, de contar sua história, de dar a sua própria contribuição para o crescimento da sociedade em que vivem. “Só que este contributo raramente é levado em consideração por quem dirige as políticas sociais, de ingresso e de integração. Não reconhecer seus direitos é um prejuízo para eles, mas é também um prejuízo para as nossas comunidades”, explica ainda, acrescentando: “os refugiados são uma dádiva e nós somos testemunhas disso”.

"Aquela citação do presidente cipriota que nos honra" 

Parisi recorda com admiração o que sentiu ao ouvir as palavras do presidente do Chipre que, diante do Papa, citou a mensagem de Francisco por ocasião do 40º aniversário de sua fundação. “Ficamos muito tocados ao ouvi-lo. São palavras que voltam, as do Papa, para compreender que é necessário mudar de rumo. Os acordos de externalização que a Europa faz com muitos países terceiros inseguros, dizem-nos que tentar repelir os migrantes não pode ser uma solução plausível. A Europa foi fundada para se abrir aos povos e às culturas e o Papa Francisco nunca perde a oportunidade de recordar isso e, sobretudo, dirige-se à consciência de cada cidadão”.

Significativo o retorno a Lesbos

“Não podemos sequer perceber os danos sofridos por uma pessoa forçada a fugir. Muitas vezes são vítimas de tortura. As mulheres que nos procuram trazem feridas que nos perguntamos se algum dia poderão ser curadas. Devemos - como faz o Papa - chamá-las pelo nome: é uma comprovação de seu reconhecimento como ser humano”, afirma com veemência Parisi.

As pessoas migrantes são muitas vezes uma alavanca para o abuso - como recordava a Irmã Perpétua, a freira que compareceu ao encontro do Papa com as religiosas de Chipre - e os médicos que trabalham no Centro Astalli relatam isso. Uma em cada três é vítima de tortura, não apenas nos países de origem, mas também nos de trânsito.

O Papa foi a Lesbos, “onde organizações internacionais denunciam um número impressionante de suicídios de crianças. Este seu retorno tem um grande significado. Tornar o caminho para um futuro de felicidade é o apelo que Francisco lança desde o centro do Mediterrâneo”, enfatiza.

 

Elogio à iniciativa de transferência de migrantes de Chipre para a Itália

Quem chega à Europa é privilegiado. Há aqueles que não conseguem nem mesmo partir, como recordou o Papa. “Hoje não há caminho seguro para entrar na Europa. Os canais humanitários são o sinal de uma sociedade civil capaz de demonstrar aos Estados e às instituições que é possível acolher de forma legal, ordenada e segura. E isto implica vantagens indiscutíveis também na gestão do fluxo migratório. Deixar a chegada para os traficantes significa deixar a questão na ilegalidade e na insegurança”, afirma Parisi, comentando a iniciativa da Santa Sé para a transferência de um grupo de migrantes de Chipre para a Itália.

Sair de uma narrativa de emergência

O apelo feito diariamente pelo Centro Astalli - recentemente às voltas com a crise no Afeganistão - é para sair de uma narrativa emergencial sobre os migrantes. “Trata-se de assumir a responsabilidades por parte de todos os Estados europeus. Que essas pessoas possam ser redistribuídas de forma proporcional em todos os Estados. Chipre, como Lampedusa, são terras de chegada. Foi precisamente em Lampedusa, na sua primeira viagem, que Francisco perguntou: “Europa, onde estás?' Agora faz a mesma pergunta, com uma contundência ainda mais forte”.

 

Fonte: Vatican News