A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou o nome de André Mendonça para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (1º/12). O ex-advogado-geral da União foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro e esperava há quase cinco meses pelo trâmite. Agora, a votação será levada ao plenário da Casa, onde ele precisará da maioria (41) dos votos dos 81 senadores. Na CCJ, foram 18 votos votos a favor de Mendonça e 9 contra.
A sabatina de Mendonça teve início na manhã desta quarta. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) foi a relatora do processo. Ela foi a primeira mulher a relatar uma indicação ao STF. O ex-AGU iniciou o trâmite exaltando sua história no direito e citando sua religião. Pastor presbiteriano licenciado e servidor público federal concursado, ele ficou conhecido como a indicação do “ministro terrivelmente evangélico” de Bolsonaro.
Na sessão da CCJ, Mendonça foi questionado sobre liberdade de imprensa, compromisso com a Constituição, atuação durante o governo Bolsonaro, religião, marco temporal, democracia, casamento homoafetivo, dentre outros. Um dos principais pontos de discussão da sabatina foi a religião do advogado, que é pastor presbiteriano. Ele foi qualificado como “terrivelmente evangélico” por Jair Bolsonaro em uma solenidade na Câmara dos Deputados em 2019, um qualificativo utilizado pelo presidente.
Uma indicação do presidente ao Supremo Tribunal Federal (STF) nunca demorou tanto tempo para ser pautada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O principal responsável pela demora foi o presidente do colegiado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) — que se tornou desafeto do Palácio do Planalto e, segundo os bastidores, deixou o tempo passar para desgastar Mendonça e fazer com que ele fosse derrotado na etapa.
André Mendonça está prestes a ocupar a cadeira do STF deixada pelo ministro Marco Aurélio Mello, aposentado desde 12 de julho. Se aprovado, a previsão é que a cerimônia de posse na Corte seja realizada até 17 de dezembro, último dia das atividades deste ano. Depois disso, haverá recesso e o tribunal funcionará em regime de plantão. O presidente, Luiz Fux, julgará apenas casos urgentes.
- O que esperar de André Mendonça no STF após aprovação no Senado
O ex-ministro da Justiça e da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, foi aprovado no Senado nesta quarta-feira (1º/12) para a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
No plenário da casa, ele teve 47 votos favoráveis e 32 contrários. Mais cedo, o nome de Mendonça havia sido aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado com placar de 18 votos a nove.
A indicação de André Mendonça causou polêmica desde o início do processo tanto por sua proximidade com Bolsonaro quanto pelo fato de o presidente ter dito publicamente que um dos critérios para a sua escolha foi o fato de ele ser evangélico. A indicação foi sucedida também pela demora na realização da sabatina: ela foi adiada por quase quatro meses, enquanto o presidente da CCJ do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não marcava a sessão.
Finalmente, na sabatina ocorrida nesta quarta-feira na CCJ, Mendonça foi questionado sobre temas polêmicos como casamento entre pessoas do mesmo sexo, a defesa do Estado laico e os inquéritos que ele pediu para serem instaurados com base na Lei de Segurança Nacional enquanto era ministro da Justiça.
Contando com amplo apoio de líderes religiosos, Mendonça disse logo no início de sua apresentação que defendia o Estado laico.
"Me comprometo com o Estado laico. Considerando discussões havidas em função de minha condição religiosa, faz-se importante ressaltar a minha defesa do Estado laico […] Assim, ainda que eu seja genuinamente evangélico, entendo não haver espaço para manifestação pública religiosa durante as sessões do Supremo Tribunal Federal. […] Portanto, na Suprema Corte defenderei a laicidade estatal e a liberdade religiosa de todo cidadão, inclusive dos que não professam qualquer crença, logicamente", disse Mendonça.
A pauta de costumes também foi explorada pelos senadores que fizeram perguntas ao ex-ministro. Ao ser questionado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES), Mendonça disse iria defender o direito ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. O parlamentar é casado com outro homem.
"Eu tenho a minha concepção de fé específica, agora, como magistrado da Suprema Corte, eu tenho que me pautar pela Constituição. Eu defenderei o direito constitucional do casamento civil das pessoas do mesmo sexo", afirmou.
André Mendonça tem 48 anos de idade e é formado pela Faculdade de Direito de Bauru, no interior de São Paulo e tem doutorado em Direito na Universidade de Salamanca, na Espanha.
Membro da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça ganhou notoriedade ao se especializar na costura de acordos de leniência, mas sua carreira deslanchou, de fato, no governo do presidente Jair Bolsonaro.
Em 2019, foi nomeado chefe da AGU. No decorrer dos primeiros meses da gestão, se aproximou ainda mais do governo e, com a queda de Sergio Moro, em abril de 2020, foi nomeado como ministro da Justiça.
A partir de então, seu nome começou a ser especulado como um dos favoritos a uma vaga no STF. Sua atuação no Ministério da Justiça foi rápida e marcada por episódios como os pedidos feitos por ele para abertura de inquéritos com base na Lei de Segurança Nacional contra críticos do presidente, como jornalistas e colunistas de veículos de imprensa.
Após nova mudança no governo, ele retornou à chefia da AGU e, em julho deste ano, foi indicado por Bolsonaro para ocupar a vaga aberta pela aposentadoria do ex-ministro Marco Aurélio Mello.
Sua indicação foi alvo de controvérsia, no entanto. Parte dessa polêmica se deu porque o presidente disse ter prometido à bancada evangélica no Congresso Nacional que iria escolher um nome "terrivelmente evangélico" para uma vaga ao Supremo. Ele é pastor da Igreja Presbiteriana.
"Vai ser um terrivelmente evangélico. Tem um cotado aí. Por enquanto é ele. Mas não está batido o martelo. O importante é que ele fale... Eu até falei uma das vezes: imagine no STF, as sessões começarem com oração desse ministro. Deus é essencial em todos os lugares", disse Bolsonaro a apoiadores em maio, antes da oficialização do nome de Mendonça à vaga.
Críticos afirmam que a religião não deveria ser um critério para a nomeação de um ministro do STF, mas lideranças evangélicas, por sua vez, comemoraram a decisão de Bolsonaro.
Como ministro do STF, André Mendonça deverá participar do julgamento de temas polêmicos envolvendo assuntos que vão da descriminalização do porte de drogas para uso pessoal e o direito ao aborto a recursos envolvendo o principal adversário político de Bolsonaro no momento, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A possibilidade de que ele venha julgar um caso envolvendo o direito ao aborto é real, uma vez que tramita no STF uma ação proposta pelo PSOL prevendo a descriminalização do aborto.
Em 2020, Mendonça se manifestou sobre um caso semelhante envolvendo a possibilidade de interrupção da gestação em casos de fetos com microcefalia causada pelo zika vírus. Na ocasião, o então AGU se manifestou contra o pedido.
"Lamentável esse pedido. Um retrocesso à sociedade […] Se trata, no pedido, da constitucionalização de uma segregação das espécies que foi presente no regime nazista", afirmou.
Mendonça também poderá ter que julgar recursos da defesa do ex-presidente Lula, uma vez que, além de integrar o plenário do STF, ele deverá fazer parte da 2ª Turma do tribunal, onde têm sido julgados muitos dos casos da Operação Lava Jato envolvendo o petista.
Ele, aliás, já defendeu a operação no passado. Em agosto, quando ainda era ministro da Justiça, em entrevista ao canal Globo News, ele disse que as "conquistas e as descobertas" feitas pela operação não poderiam ser desqualificadas.
"Temos que avaliar a operação Lava-Jato como uma conquista para o nosso país […]. Se há erros, se equívocos foram cometidos, que sejam corrigidos. Mas não podemos desqualificar as conquistas e as descobertas que foram feitas a partir da operação Lava-Jato", disse o ministro.
Para o advogado e professor de Direito Pierpaolo Bottini, não é possível prever qual será o posicionamento de um ministro do Supremo tomando como base apenas quem o indicou.
Ele diz que, se por um lado, é possível que haja convergência entre posições ideológicas entre Mendonça e Bolsonaro em temas como aborto e a política sobre drogas, por outro, não seria possível afirmar que o futuro ministro possa usar seu cargo no Supremo para prejudicar Lula ou outros adversários políticos de Bolsonaro.
"Nas matérias sobre comportamento, é possível que haja alguma similaridade nas posições, algumas das quais já foram inclusive, expressas por Mendonça. Mas não diria que ele votaria contra um adversário de Bolsonaro em recursos na esfera criminal, por exemplo. São assuntos muito técnicos e não vejo essa possibilidade. Seria desmerecer demais o cargo", afirma.
O professor associado de Direito do Insper Diego Werneck Arguelhes estuda o comportamento de ministros do Supremo e diz que os estudos mais recentes não conseguiram cravar que a escolha presidencial é um fator determinante para o comportamento individual dos magistrados. Ele diz que há dois fatores principais que ajudam a explicar esse fenômeno.
"O primeiro é que o Supremo é um tribunal muito sensível à conjuntura política do país. Isso pode fazer com que um ministro vote contra os interesses de quem o indicou. O segundo é a independência dada aos magistrados. Depois de assumirem, não há grandes riscos para eles em votarem contra quem os indicou", afirma o professor.
Arguelhes segue a mesma linha de Bottini e diz a tendência é de que Mendonça decida temas sensíveis como aborto e drogas com base nas posições mais conservadoras que ele mesmo já expressou anteriormente.
"Não se trata de saber se ele será conservador ou não. A questão é saber quão conservador ele será nesses temas", afirma o professor.
Segundo Arguelhes, a principal dúvida em relação ao que se pode esperar de Mendonça é sobre o chamado "legado" da Operação Lava Jato. O professor argumenta que ele tem uma trajetória profissional muito ligada aos órgãos de controle e ao combate à corrupção. Por outro lado, o governo do presidente Bolsonaro não teria, de acordo com o professor, se notabilizado por fortalecer essa pauta.
"A dúvida é se teremos um Mendonça mais parecido com o início da sua trajetória profissional ou se teremos alguém mais próximo do integrante do governo Bolsonaro", disse.
Fonte: Correio Braziliense - BBC News Brasil