Mariangela Jaguraba - Vatican News
"A liberdade cristã, fermento universal de libertação" foi o tema da catequese do Papa Francisco na Audiência Geral desta quarta-feira (13/10), na Sala Paulo VI, no Vaticano, onde se reuniram milhares de fiéis.
Dando continuidade ao ciclo de catequeses sobre a Carta aos Gálatas, o Papa sublinhou que "São Paulo considera o âmago da liberdade o fato de que, com a morte e ressurreição de Jesus Cristo, fomos libertados da escravidão do pecado e da morte. Com outras palavras: somos livres porque fomos libertados, libertados pela graça, não por pagamento, libertados pelo amor, que se torna a lei suprema e nova da vida cristã. O amor. Somos livres porque fomos libertados gratuitamente. Este é o ponto-chave".
Segundo Francisco, "esta novidade de vida nos abre para acolher cada povo e cultura e, ao mesmo tempo, abre cada povo e cultura a uma maior liberdade. Na verdade, São Paulo diz que para aqueles que aderem a Cristo, já não importa se são judeus ou pagãos. Conta apenas «a fé que atua pela caridade»". Aos detratores, fundamentalistas, que criticam a novidade evangélica, algo não apenas da nossa época, mas que tem uma longa história, Paulo responde com parrésia, dizendo: «Por acaso é aprovação dos homens que estou procurando, ou é aprovação de Deus? Ou estou procurando agradar aos homens? Se estivesse procurando agradar aos homens, eu já não seria servo de Cristo». "Uma fé que não é fé é mundanidade", acrescentou Francisco.
Mais uma vez, o pensamento de Paulo mostra-se de uma profundidade inspirada. Para ele, aceitar a fé significa renunciar não ao coração das culturas e tradições, mas apenas ao que pode impedir a novidade e a pureza do Evangelho. Porque a liberdade obtida pela morte e ressurreição do Senhor não entra em conflito com as culturas e tradições que recebemos, mas introduz nelas, nas culturas, nas tradições, uma nova liberdade, uma novidade libertadora, a do Evangelho. Com efeito, a libertação obtida através do batismo permite-nos adquirir a plena dignidade de filhos de Deus, de modo que, enquanto permanecemos firmemente enxertados nas nossas raízes culturais, ao mesmo tempo que nos abrimos ao universalismo da fé, que entra em cada cultura, reconhece os seus germes de verdade presentes e desenvolve-os, levando à plenitude o bem neles contido. Aceitar que fomos libertados por Cristo, sua paixão, morte e ressurreição, é aceitar e levar à plenitude verdadeira as diferentes tradições de cada povo. A verdadeira plenitude.
Segundo o Pontífice, "no chamado à liberdade descobrimos o verdadeiro significado da inculturação do Evangelho, ou seja, que o Evangelho pega a cultura na qual vive a comunidade cristã e fala de Cristo com aquela cultura".
“O verdadeiro sentido desta inculturação é ser capaz de proclamar a Boa Nova de Cristo Salvador, respeitando o que é bom e verdadeiro nas culturas.”
"Isto não é fácil! Há muitas tentações de impor o próprio modelo de vida como se fosse o mais evoluído e desejável".
Quantos erros foram cometidos na história da evangelização ao querer impor apenas um modelo cultural, a uniformidade. A uniformidade como regra de vida não é cristã. A unidade sim, mas a uniformidade não. Por vezes, nem sequer renunciaram à violência a fim de fazer prevalecer o próprio ponto de vista. Pensemos nas guerras! Desta forma, a Igreja privou-se da riqueza de tantas expressões locais que têm em si as tradições culturais de povos inteiros. Mas isto é exatamente o oposto da liberdade cristã! Por exemplo, me lembro quando se estabeleceu a maneira de fazer apostolado na China com o pe. Ricci ou na Índia com pe. De Nobili. Isto não é cristão. Sim, é cristão na cultura do povo.
O Papa sublinhou a necessidade de "respeitar a origem cultural de cada pessoa, colocando-a num espaço de liberdade que não seja restringido por qualquer imposição ditada por uma única cultura predominante".
“Este é o significado de nos chamarmos católicos, de falarmos da Igreja católica: não é uma denominação sociológica para nos distinguir dos outros cristãos; católico é um adjetivo que significa universal, catolicidade, universalidade, Igreja universal, ou seja, católica.”
"Significa que a Igreja tem em si, na própria natureza, uma abertura a todos os povos e culturas de todos os tempos, pois Cristo nasceu, morreu e ressuscitou para todos".
Por outro lado, a cultura está, pela sua natureza, em contínua transformação. Pensemos em como somos chamados a proclamar o Evangelho neste momento histórico de grande mudança cultural, onde parece predominar a tecnologia cada vez mais avançada. Se pretendêssemos falar da fé como se fazia nos séculos passados, correríamos o risco de já não sermos compreendidos pelas novas gerações.
"A liberdade da fé cristã, a liberdade cristã", concluiu o Papa, "não indica uma visão estática da vida, uma visão estática da cultura, mas uma visão dinâmica, uma visão dinâmica também da tradição que cresce, mas com a mesma natureza".
- Papa João Paulo I, milagre reconhecido: será proclamado beato
VATICAN NEWS
O Papa Francisco, ao receber o Cardeal Marcello Semeraro em audiência na manhã desta quarta-feira (13), autorizou a Congregação para as Causas dos Santos a promulgar o decreto que reconhece um milagre atribuído à intercessão de João Paulo I. Trata-se da cura de uma menina de onze anos em Buenos Aires no dia 23 de julho de 2011, que sofria de "encefalopatia inflamatória aguda grave, doença epilética refratária maligna, choque séptico" e que estava em fim de vida. O quadro clínico era muito grave, caracterizado por numerosas crises epiléticas diárias e um estado séptico causado por broncopneumonia. A iniciativa de invocar o Papa Luciani foi tomada pelo pároco da paróquia à qual pertencia o hospital, ao qual ele era muito devoto. Assim abre-se o caminho para a beatificação do Papa Albino Luciani e o próximo passo é apenas aguardar a data, que será fixada por Francisco.
Nascido em 17 de outubro de 1912 em Forno di Canale (hoje Canale d'Agordo), na província de Belluno, norte da Itália, e falecido em 28 de setembro de 1978 no Vaticano, Albino Luciani foi Papa apenas por 34 dias, um dos pontificados mais breves da história. Era filho de um aperário socialista que trabalhava há muito tempo como emigrante na Suíça. No bilhete escrito pelo seu pai, dando-lhe o consentimento para entrar no seminário, lê-se: "Espero que quando você for padre, fique ao lado dos pobres, porque Cristo estava ao lado deles". Palavras que Luciani colocaria em prática durante toda sua vida.
Albino foi ordenado sacerdote em 1935 e em 1958, logo após a eleição de João XXIII que o havia conhecido como Patriarca de Veneza, foi nomeado Bispo de Vittorio Veneto. Filho de uma terra pobre caracterizada pela emigração, mas também muito viva do ponto de vista social, e de uma Igreja caracterizada por grandes sacerdotes, Albino Luciani participou de todo o Concílio Ecumênico Vaticano II e aplicou suas diretrizes com entusiasmo. Passou muito tempo no confessionário e foi um pastor próximo ao seu povo. Durante os anos em que se discutia a legalidade da pílula anticoncepcional, ele se pronunciou repetidamente a favor da abertura da Igreja sobre seu uso, tendo escutado muitas famílias jovens. Após a publicação da encíclica Humanae Vitae, na qual Paulo VI declarou a pílula moralmente ilícita em 1968, o bispo de Vittorio Veneto promoveu o documento, aderindo ao magistério do Pontífice. Paulo VI, que teve a oportunidade de apreciá-lo, nomeou-o patriarca de Veneza no final de 1969 e o criou cardeal em março de 1973.
Albino Luciani, que escolheu a palavra "humilitas" para seu brasão episcopal, foi um pastor que viveu sobriamente, firme no que é essencial na fé, aberto do ponto de vista social, próximo aos pobres e aos trabalhadores. Era intransigente quando se tratava do uso inescrupuloso do dinheiro em detrimento do povo, como foi demonstrado por sua firmeza durante um escândalo econômico em Vittorio Veneto envolvendo um de seus sacerdotes. Em seu magistério, ele insistiu particularmente no tema da misericórdia.
Um grande comunicador, ele escreveu um livro de sucesso intitulado "Illustrissimi", com cartas escritas e idealmente enviadas aos grandes do passado com julgamentos sobre o presente. Deu particular importância à catequese e à necessidade de clareza para os que transmitem o conteúdo da fé. Após a morte de Paulo VI, foi eleito em 26 de agosto de 1978 em um conclave que durou um dia.
O nome duplo já é um programa: ao unir João e Paulo, ele não só oferece uma homenagem de gratidão aos Papas que o quiseram como bispo e cardeal, mas também marca um caminho de continuidade na aplicação do Concílio, barrando o caminho tanto para os nostálgicos pela volta ao passado como para saltos descontrolados para futuro. Foi o Papa que abandonou o uso do "nós", do plurale maiestatis, e nos primeiros dias recusou o uso da sedes gestatoria (a liteira para carregar os Papas), curvando-se ao pedido de seus colaboradores somente quando percebeu que ao proceder a pé as pessoas que não estavam nas primeiras filas tinham dificuldade em vê-lo.
As audiências das quartas-feiras durante seu breve pontificado foram encontros de catequese: o Papa falava sem um texto escrito, citava poemas de memória, convidou um menino e um acólito a se aproximarem dele e falou com eles. Em um discurso improvisado, ele recordou ter passado fome quando criança e repetiu as palavras corajosas de seu predecessor sobre os "povos da fome" que questionam os "povos da opulência".
Faleceu repentinamente na noite de 28 de setembro de 1978. O Papa foi encontrado sem vida pela irmã que levava café para seu quarto todas as manhãs. Em apenas algumas semanas de seu pontificado, ele entrou no coração de milhões de pessoas, por sua simplicidade, sua humildade, suas palavras em defesa dos pobres e por seu sorriso evangélico. Muitas teorias foram construídas em torno de sua morte súbita e inesperada, com supostas conspirações usadas para vender livros e produzir filmes. Uma pesquisa documentada sobre a morte, que encerra definitivamente o caso, foi assinada pela vice-postuladora do processo de beatificação, Stefania Falasca (Cronaca di una morte, Libreria Editrice Vaticana).
A fama de santidade de Albino Luciani se espalhou muito rapidamente. Muitas pessoas rezaram e rezam por ele. Muitas pessoas simples e até mesmo um episcopado inteiro - o do Brasil - pediram a abertura do processo que agora, após um procedimento ponderado e bem pensado, chegou à sua conclusão.
- João Paulo I será beato: Episcopado brasileiro havia pedido sua beatificação
Raimundo de Lima - Vatican News
A notícia desta quarta-feira (13/10) da autorização dada pelo Papa Francisco à Congregação das Causas dos Santos a promulgar o decreto sobre a cura milagrosa atribuída à intercessão de João Paulo I nos enche de alegria. Com este ato do Santo Padre abre-se o sinal verde para a beatificação de Albino Luciani, “o Papa sorriso”, cujo Pontificado durou apenas 33 dias, um dos mais breves na história da Igreja.
João Paulo I foi eleito Papa em 26 de agosto de 1978, sucedendo Paulo VI, e veio a falecer em 28 de setembro seguinte. Com essa decisão de Francisco, só falta agora aguardar a data da beatificação de Luciani, a ser estabelecida pelo próprio Santo Padre.
Já de há muito se esperava esta notícia. A fama de santidade de Albino Luciani está presente no mundo inteiro, inclusive no Brasil. O fato de todo o episcopado brasileiro ter pedido a abertura de sua causa de beatificação é uma expressão eloquente da fama de santidade deste grande pastor, que havia escolhido a palavra “humilitas” para seu brasão episcopal.
É conhecida a proximidade de Albino Luciani com o Brasil, a amizade que teve com o cardeal Aloísio Lorscheider. Dom Aloísio acompanhou o futuro Papa João Paulo I quando de sua ida a Santa Maria, no Rio Grande do Sul, em novembro de 1975, ocasião em que recebeu o diploma honoris causa da Universidade Federal gaúcha.
Num artigo publicado na Revista 30Dias em memória do cardeal Lorscheider, falecido em 2007, a vice-postuladora do processo de beatificação de João Paulo I, Stefania Falasca, traz alguns detalhes daquela visita do futuro Papa, contados por dom Aloísio, segundo o qual Albino Luciani se sentiu em casa em Santa Maria, pois tanto ele como o povo falavam vêneto. Vale ressaltar que do Vêneto – região italiana de origem de Luciani – partiram milhares italianos para o Brasil, sobretudo entre os anos 1880 e 1950. Daí, uma forte presença de italianos e descendentes de italianos também no Rio Grande do Sul.
Dom Aloísio lembrou a grande multidão que se reuniu na ocasião para ouvir o então patriarca de Veneza e as muitas pessoas que viu chorar quando Luciani, com simplicidade, dirigiu-se a elas falando em dialeto.
Muitas reconstruções acerca da eleição de Albino Luciani à Cátedra de Pedro apontam o cardeal Aloísio Lorscheider – junto com o cardeal Paulo Evaristo Arns - como articulador da eleição de João Paulo I. Dom Aloísio, então arcebispo de Fortaleza e vice-presidente do Celam (Conselho Episcopal Latino-Americano), era o mais jovem dos cento e onze cardeais que participaram do Conclave de agosto de 1978, tinha 53 anos. Na última votação, dom Aloísio recebeu um voto. Era o de Albino Luciani, como o próprio Luciani revelou: tal era a estima e o apreço de João Paulo I pela densidade humana e pastoral do então arcebispo de Fortaleza. Uma estima recíproca. Luciani e Lorscheider tinham sido padres conciliares. Juntos, como jovens bispos, tinham participado de todas as quatro sessões do Concílio ecumênico Vaticano II.
Dom Aloísio contou que no momento de cumprimentar o novo Papa, depois da eleição, na Capela Sistina, Luciani lhe disse. “Venha me ver, estou esperando”, mas Lorscheider acrescentou: “Não cheguei a poder fazer isso”.
De fato, João Paulo I veio a falecer apenas trinta e três dias após a sua eleição à Cátedra de Pedro. Sua simplicidade, humildade, humanidade e sorriso evangélico ficaram como marca indelével no coração de milhões de pessoas no mundo inteiro. A notícia de sua beatificação, agora próxima, nos traz a alegria por este grande pastor que governou a Barca de Pedro no breve espaço de um sorriso.
- Cardeal Stella: o milagre do Papa João Paulo I, a cura de uma menina argentina
Alessandro Di Bussolo – Vatican News
"Um milagre que devemos à fé dos que rezaram ao redor do leito desta criança doente" com graves problemas neurológicos, "em condições praticamente desesperadas". É assim que o postulador da causa de beatificação de João Paulo I, o Cardeal Beniamino Stella, fala do milagre que logo permitirá que o "Papa do sorriso" seja venerado como beato. Prefeito Emérito da Congregação para o Clero e originário da diocese de Vittorio Veneto, Cardeal Stella teve Albino Luciani como bispo de 1959 a 1969.
Cardeal Beniamino Stella, como vêneto, quais são seus sentimentos sobre esta grande notícia, tão ansiosamente aguardada, e como o senhor acha que será recebida em sua terra natal?
Conheci o bispo, Dom Albino Luciani, participei da sua ordenação episcopal na minha primeira viagem a Roma em 1958. Ele era um bispo amado pelo povo, amado pelos sacerdotes, e permaneceu praticamente o tempo todo no Vêneto, primeiro como bispo em Vittorio Veneto, cerca de dez anos, depois quase nove como Patriarca de Veneza. Sua formação familiar, a região de Belluno de onde ele veio, sempre fez com que fosse muito querido por nós, também por causa de seu estilo de vida muito simples, muito humano e muito sóbrio, e acima de tudo com uma forte identidade cristã e sacerdotal. Ainda hoje encontro pessoas que me dizem: "ele me crismou, eu o conheci", e todos falam bem deste bispo, porque se lembram dele com um sorriso, com grande humanidade. Este decreto papal é certamente uma esplêndida notícia. Imagino que haverá o badalar dos sinos, mas sobretudo será fonte de alegria no coração de muitos sacerdotes e muitos fiéis no Vêneto, porque ele é um sacerdote, é considerado verdadeiramente um bispo na terra vêneta. É lembrado precisamente por estas características: um trabalhador generoso, dedicado a seu ministério, uma pessoa que era muito apreciada precisamente por causa de sua grande humanidade e de sua vida como padre e bispo.
O senhor pode nos dizer algo sobre o milagre que logo nos permitirá venerar João Paulo I como Beato?
É um milagre que ocorreu na Argentina, em Buenos Aires, há cerca de dez anos. Naquela época uma menina, hoje uma moça de vinte e poucos anos, foi curada em circunstâncias extraordinárias de problemas neurológicos muito graves, em condições praticamente desesperadas. Ainda hoje eu vi vídeos dela andando, falando, e pode-se ver uma moça de vinte e poucos anos praticamente normal. Devemos isto à fé dos que rezaram ao redor desta pessoa quando ela estava doente. É um evento que certamente tem características extraordinárias, porque houve muito trabalho médico, mas sobretudo em uma noite em particular, um longo momento de oração, de intercessão, que é o que em última análise qualifica um evento deste tipo.
Depois de 43 anos do retorno do Papa João Paulo I à casa do Pai, que sugestão o senhor daria aos fiéis que gostariam de saber mais sobre sua vida e seu testemunho? De quais escritos que ele nos deixou pode-se começar?
Há seus famosos escritos de catequese, porque como sacerdote e bispo ele foi um catequista, um comunicador. Ele não era uma pessoa em busca de audiência, mas com o microfone em mãos, nascia seu carisma de bom comunicador, com palavras simples, de grande humanidade. Depois há o famoso livro "Illustrissimi": dezenas de cartas, vamos chamá-las de fictícias, que ele escreveu para grandes figuras da história, autores, poetas, contadores de histórias, romancistas e filósofos. Ele escreveu estas cartas nas quais destacou sua formação literária e histórica. É um livro que foi republicado recentemente e que dá a ideia de como o Papa Luciani era um homem de grande cultura, de grande profundidade literária. E depois eu gostaria de mencionar a positio que foi reescrita para circulação pública, que é a biografia oficial da postulação. Há também um artigo escrito sobre a morte do Papa. Depois há suas homilias, que também podem ser ouvidas, porque muitas delas foram registradas, e o arquivo em suas homilias e discursos como Papa. É um pequeno livreto de 100-130 páginas, e também ali vemos um Papa muito, muito simples, com um considerável conhecimento teológico, que fala ao povo de Deus, se faz entender, se faz amar. Esta é uma forma de conhecê-lo: ele é um Pontífice que pode ser lido e que também será amado pelas leituras que deixou, em forma de escritos, homilias e também áudios e vídeos da época de seu pontificado.
Como postulador ou como pessoa que deve muito ao Papa Luciani, o senhor quis fazer este presente para Canale d'Agordo, a cidade natal, de comprar a casa onde nasceu Albino Luciani?
A casa, três anos atrás, foi comprada pela Diocese de Vittorio Veneto. Consegui disponibilizar a soma necessária e aceitei que a compra seria anunciada em agosto deste ano, quando fiz 80 anos. Disse que quando se tem 80 anos de idade, também se deve ser leve diante de Deus, então disse que se poderia contar sobre esta transação entre a diocese e os sobrinhos do Papa Luciani. A casa estava à venda e era necessário fazê-lo rapidamente, pois era bastante claro o itinerário rumo aos altares e por isso achei importante que pudéssemos comprar aquela casa. Ajudei à minha diocese, que agora a possui, e também fiz trabalhos de restauração. Agora eu acho que também se está organizando o jardim em frente à casa, precisamente para torná-lo visível e utilizável por ocasião da futura beatificação. Acredito que esta casa será visitada por muitos peregrinos, porque Canale d'Agordo é uma cidadezinha que tem uma forte memória de seu concidadão, e por isso penso que a futura beatificação aumentará o interesse do povo cristão pelas raízes deste Pontífice, João Paulo I.
Aqueles quartos pequenos, mas confortáveis e a casa inteira também dizem muito sobre suas raízes, sobre sua simplicidade, mas também sobre a força da família que ele tinha atrás de si...
Certamente, ele viveu intensamente sua história familiar, com seus pais, depois com seus irmãos, irmãs e sobrinhos. Ele sempre voltou, mesmo quando era bispo, patriarca e cardeal, para ver a casa onde nasceu. Os visitantes ainda encontrarão o quarto onde ele nasceu. Ainda tem a estufa, e muitas outras lembranças e também o quarto onde ele ia às vezes descansar em uma breve estadia como bispo e cardeal. Canale d'Agordo é uma meta turística, mas acima de tudo é um destino de peregrinação que, creio, fará renascer a fé de muitos peregrinos.
- Serão beatos dois missionários que defenderam os indígenas na Argentina
Benedetta Capelli/Mariangela Jaguraba – Vatican News
O Papa Francisco autorizou a Congregação das Causas dos Santos a promulgar decretos relativos a quatro beatos e quatro veneráveis. Foi reconhecido um milagre atribuído à intercessão do Papa Albino Luciani, João Paulo I, que foi Pontífice durante 33 dias. Trata-se da cura de uma menina em Buenos Aires, na Argentina, em 23 de julho de 2011.
Missionários, evangelizadores, prontos para servir a Jesus em todos os lugares do mundo. Esta é a história de fé de dois sacerdotes que viveram em 1600, Pedro Ortiz de Zárate, sacerdote diocesano, e Giovanni Antonio Solinas, sacerdote professo da Companhia de Jesus, ambos mortos por ódio à fé em 27 de outubro de 1683 em Valle del Zenta, na Argentina. Eles estavam na região junto com 18 leigos, dentre os quais alguns índios convertidos, e foram golpeados por indígenas pertencentes às tribos Toba e Mocoví, depois de celebrarem a missa. Os seus corpos apresentavam sinais de violência e tortura. Com relação ao martírio formal ex parte persecutoris, muitas tribos estavam em conflito umas com as outras, e os missionários, que levavam a mensagem evangélica de paz, se encontraram no centro desses conflitos. O ódio pela fé foi o motivo principal da ação dos carnífices.
Pedro Ortiz de Zárate nasceu em 29 de junho de 1626, em San Salvador de Jujuy, na Argentina, numa família de origem basca. Aos 17 anos, casou-se com uma mulher rica e teve dois filhos. Após a morte de sua esposa, ele seguiu a vocação para o sacerdócio e foi ordenado em 1657. A sua vida foi marcada por uma intensa atividade apostólica entre os indígenas, pelo compromisso com a oração, a atenção ao culto divino e à música sagrada, e pela administração dos sacramentos aos pobres e aos doentes.
Giovanni Antonio Solinas nasceu em Oliena, na província de Nuoro, e entrou na Companhia de Jesus em 1663. Depois do noviciado em Cagliari, fez sua profissão religiosa em 16 de junho de 1665. Nos primeiros meses de 1672, manifestou sua vocação missionária aos seus superiores, orientada para os indígenas americanos. O seu primeiro campo de apostolado foi na Reducción de Itapúa (Paraguai), onde se destacou por seu zelo apostólico e caridade para com os nativos. Em 1683, foi enviado para a missão no Chaco, junto com o Servo de Deus Pedro Ortiz de Zárate, com quem compartilhou a morte.
A irmã Maria Berenice Duque Hencker nasceu em 14 de agosto de 1898, em Salamina, na Colômbia. Começou sua vida religiosa na Congregação das Irmãs Dominicanas da Apresentação e depois, com a permissão do arcebispo de Medellín, em 14 de maio de 1943, lançou as bases da Congregação das Irmãs da Anunciação, tornando-se superiora. O milagre atribuído à sua intercessão data de 2004, quando um jovem colombiano em estado grave de saúde recebeu no hospital uma medalha de Madre Maria Berenice e uma estampa com a oração.
As virtudes heróicas de duas religiosas e dois sacerdotes foram reconhecidas: eles serão veneráveis. A primeira é a fundadora da Fraternidade das Irmãzinhas de Jesus, Madalena de Jesus, nascida em 26 de abril de 1898, em Paris. A sua história está entrelaçada com a do Beato Charles de Foucauld. Ao ler uma sua biografia, ela ficou impressionada e iniciou um processo de discernimento que foi dificultado por sua saúde frágil. Seguindo o conselho de seus médicos, decidiu transferir-se para um lugar mais adequado à sua condição e escolheu a Argélia. Destacou-se por sua assistência aos pobres, mas a importância da contemplação também se fez presente nela, como sinal da ternura de Deus para com os pobres e excluídos. Em 1947, a Fraternidade das Irmãzinhas de Jesus foi aprovada e irmã Madalena se comprometeu a difundir as pequenas comunidades contemplativas, especialmente no Oriente Médio. O ecumenismo tornou-se uma de suas prioridades. Teve uma profunda amizade com os futuros Papas Paulo VI e João Paulo II. A expressão, muito querida ao Beato de Foucauld, "Jesus é o Mestre do Impossível", retornava nela com frequência, especialmente nos momentos mais difíceis.
A irmã Elisabetta Martinez também tinha uma saúde precária, mas foi encorajada por vários Pontífices a continuar a sua obra caritativa, empreendida com a fundação da Congregação das Filhas de Santa Maria de Leuca. Nascida em 25 de março de 1905 em Galatina, na província de Lecce, fundou numerosas comunidades na Itália, Suíça, Bélgica e Estados Unidos e, em 1946, transferiu a sede da casa geral e do noviciado para Roma. A sua fé era alimentada pela adoração eucarística, a esperança para ela era a capacidade de esperar, sem reclamar e sem desistir, confiando no tempo do Senhor para completar seus projetos. Ela também foi caluniada por algumas de suas irmãs que ela perdoou, acompanhando-as com a oração.
Diego Hernández González, sacerdote diocesano, nasceu em 3 de janeiro de 1915, em Javalí Nuevo, na Espanha. Viveu no período da guerra civil e em meio à perseguição religiosa. Foi preso quando era seminarista porque salvou as hóstias consagradas durante o incêndio doloso à igreja paroquial. Ele foi submetido a trabalhos forçados num campo de trabalho em Orihuela e depois na Andaluzia. Em 9 de junho de 1940, foi ordenado sacerdote em Barcelona e tornou-se diretor da Casa Sacerdotal em Alicante. A virtude da caridade para com Deus moldou toda sua vida em total disponibilidade aos outros, especialmente os doentes, as crianças e os jovens. Para eles criou um cinema na paróquia. Fundou uma escola para meninas que precisavam aprender a ler e escrever.
Atraído pela espiritualidade franciscana, Giuseppe Spoletini nasceu em 16 de agosto de 1870, em Civitella, hoje Bellegra, e foi ordenado sacerdote em 22 de setembro de 1894, em Palestrina. Nos primeiros anos de ministério, dedicou-se incansavelmente ao sacramento da Reconciliação na igreja romana de São Francisco a Ripa, onde retornou em 1944. Homem de piedade e oração, exortava a viver uma vida boa, operosa e caritativa. Especialmente no confessionário, demonstrou misericórdia ao receber as pessoas a qualquer momento, mesmo quando estava cansado e exausto. Durante a Segunda Guerra Mundial, fez de tudo para dar refúgio aos procurados pelos nazistas e fascistas.
- Igreja em saída: em São Paulo, Pe. Júlio Lancellotti convive com os pobres como Jesus
Mateus Lino, Brasil*
“Nós convivemos com a população que está em situação de rua em São Paulo, que hoje são mais de 30 mil pessoas: aumenta o número de mulheres, aumenta o número de crianças. Então, é uma situação, como chama o Papa Francisco, de descarte. É um grande descarte da população, grande descarte dos pobres que, têm como último lugar, a rua e acabam sobrevivendo pelas ruas da cidade.”
O Padre Júlio Lancellotti é quem faz um raio-x do caos social vivido na maior cidade do Brasil, onde ele se encontra e trabalha no combate à fome. Coordenador da Pastoral do Povo de Rua, aos 72 anos a sua missão é ser uma “Igreja em saída”, assim como o Papa Francisco pede.
De jaleco branco e avental da Santa Dulce dos Pobres - da qual é devoto – Pe. Júlio conta que a missão com os mais pobres entrou na sua vida quando era criança. Na época, acompanhava o trabalho do pai, que colaborava no serviço social de menores. Júlio, assim, brincava com as crianças: “sempre convivi com elas e sempre me chama a atenção a violência das autoridades com os pobres”, afirma o sacerdote.
Todos os dias, em frente à sua paróquia, a de São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca, Pe. Júlio sai com um carrinho cheio de alimentos e de máscaras. As rodas chegam a estar desgastadas e já está difícil levar o carrinho. Mas o padre consegue, pois carrega nas costas um propósito de vida que encontra diariamente no Centro São Martinho, a duas quadras da igreja. No local, 500 pessoas em situação de rua ganham o café da manhã que, para muitos, é a única refeição do dia.
As pessoas que aguardam fazem orações e agradecem ao padre. Muitos são os elogios. A todo instante, ele atende as pessoas que carregam olhares de esperança. Bem alimentadas e com o conforto da oferta, saem do Centro São Martinho para enfrentar mais um dia de rua.
Ao voltar para a paróquia, o Pe. Júlio distribui os últimos pães que sobraram no carrinho. É hora de separar as tantas doações que chegam diariamente e a todo o instante: são alimentos, roupas e produtos de higiene pessoal. A separação dos itens é feita a quatro mãos. Os voluntários trabalham para que, em pouco tempo, tudo fique pronto para ser distribuído por toda São Paulo. Victor Ângelo, voluntário, comenta sobre o papel social do sacerdote na cidade: “eu já vi pessoas conseguindo casa, documentação e saindo dessa situação de rua. O padre faz muito disso, ele corre atrás de assistência social para essas pessoas”.
Segundo o próprio Pe. Júlio, é preciso promover a cultura do encontro, tão incentivada pelo Papa Francisco, ao invés de continuar descartando as pessoas em situação de rua. E é justamente esse o serviço realizado pela Pastoral do Povo de Rua de São Paulo, a pedido do Pontífice na Laudato Si’, que é dar voz aos pobres e vulneráveis.
“Conviver. Conviver com eles, celebrar com eles, construir com eles. Fazer o pão com eles e comer junto o pão.”
Essa foi a mais importante indicação recebida pelo Pontífice, quando o Pe. Júlio foi surpreendido com um telefonema naquele 10 de outubro de 2020. Era o próprio Papa Francisco do outro lado da linha, que entrava em contato direto do Vaticano para apoiar o trabalho junto aos pobres no Brasil.
“Falar com Papa Francisco por telefone foi um momento muito emotivo, muito bom, de muito entusiasmo. E, o que muda talvez é porque dê visibilidade, porque as pessoas ficam sabendo e sabem que sempre o Papa Francisco telefona para quem está passando por um desafio, por uma dificuldade ou quando ele quer passar uma mensagem importante. E a mensagem importante que ele passou é: ‘cuidem dos pobres, estejam junto com eles’. E o que ele me disse: ‘conviva com os pobres como Jesus’.”
Fonte: Vatican News