O Papa Francisco recebeu em audiência na manhã desta sexta-feira (08/10), no Vaticano, o primeiro-ministro da República de Malta, Robert Abela, o qual em seguida se encontrou com o secretário de Estado vaticano, cardeal Pietro Parolin, e o secretário das Relações com os Estados, dom Paul Richard Gallagher.
Segundo informa um comunicado da Sala de Imprensa da Santa Sé, durante os cordiais colóquios na Secretaria de Estado foram ressaltadas as boas relações bilaterais e a frutuosa cooperação entre a Igreja e o Estado. Detiveram-se ainda sobre a contribuição do cristianismo à história, à cultura e para a vida do povo maltês, e sobre o compromisso da Igreja em favor do desenvolvimento humano e social do país, especialmente nos campos educacional e assistencial.
Entre os temas de interesse comum, as migrações - com as quais a Igreja e o Governo estão fortemente comprometidas - e algumas questões éticas. Na prossecução das conversações foi feita referência à situação europeia e internacional, com particular atenção à região do Mediterrâneo, bem como à importância do diálogo ecumênico e inter-religioso na construção da paz e da fraternidade entre os povos.
ANDREA TORNIELLI
"Cada um de nós descobriu uma grande harmonia espiritual e de pensamento em relação às crises que afligem o homem contemporâneo...". Ahmad Muhammad Al-Ṭayyeb, Grão Imame de Al-Azhar, nos dias de sua presença em Roma para participar de alguns eventos importantes ao lado do Papa Francisco e outros líderes religiosos, visitou os estúdios da Rádio Vaticano - Vatican News e respondeu algumas perguntas sobre seu relacionamento com o Pontífice, um ano após a publicação da Encíclica Fratelli tutti.
Primeiramente, o senhor pode nos dizer como nasceu sua amizade com o Papa Francisco? O que esta amizade significa para o senhor?
Al-Ṭayyeb: As origens podem ser encontradas no início da relação do Islã com o Cristianismo, quando o profeta Maomé enviou a Abissinia, onde reinava o rei cristão Negus, seus companheiros e seguidores oprimidos e pobres que haviam sido cruelmente torturados por pagãos na Meca. Este rei acolheu os muçulmanos, dando-lhes abrigo e proteção, e eles retornaram à península árabe somente depois que a sociedade muçulmana ganhou força. Assim, foi difícil, se não impossível, que eles fossem torturados ou abandonassem sua religião. Esta relação entre cristianismo e islamismo continuou por dez séculos, com altos e baixos, mas mesmo nos momentos mais escuros, como guerras e conflitos armados, houve diálogo. A filosofia medieval é rica deste patrimônio. Na época atual, foi criada, em Al-Azhar, uma comissão de diálogo com a Santa Sé, que continuou a se reunir um ano aqui no Vaticano e, no ano seguinte, em Al-Azhar. A atividade desta comissão parou por um período de cerca de seis ou sete anos, para recomeçar após a eleição de nosso querido irmão Papa Francisco. Al-Azhar tomou a iniciativa de congratular-se com ele e recebemos uma bela resposta de Francisco. Uma resposta que nos encorajou a reiniciar um relacionamento. E assim decidi visitar o Papa no Vaticano, em maio de 2016. Durante esta visita, cada um de nós descobriu uma grande sintonia espiritual e de pensamento em relação às crises que afligem o homem contemporâneo, em particular os pobres, os órfãos, os doentes, as viúvas, as vítimas de guerras e os sem-teto. Esta harmonia entre eu e ele pode oferecer muito para aliviar estas crises. A partir daquele momento, não houve hesitação. Eu pessoalmente não hesitei em estender minha mão. Desde o primeiro minuto do nosso encontro, tive a confirmação de que ele é um homem de paz e humanidade por excelência. As coisas prosseguiram bem e em apenas três anos tivemos seis encontros. No quinto deles assinamos o Documento sobre a Fraternidade Humana. Os detalhes sobre este assunto podem ser encontrados no livro "O Imame, o Papa, e o percurso espinhoso", que foi recentemente traduzido para o italiano, escrito por meu aluno e filho, o juiz Mohammad Abdelsalam.
Por que o senhor quis se envolver pessoalmente neste percurso sem precedentes?
Al-Ṭayyeb: Graças à minha formação em Al-Azhar e também graças ao meu crescimento na cidade turística de Luxor, desde a infância tomei consciência, através de descobertas arqueológicas dos faraós, que a religião se mistura com a ciência e a civilização de uma forma surpreendente. Assim, cresci com a convicção, que percorre minhas veias até hoje, da extrema importância da religião na construção de civilizações e no desenvolvimento material e espiritual. E também do papel da religião em proteger essas conquistas da civilização, para que elas não sejam desviadas e se tornem um mal para o homem, e não apenas para o homem, mas também para os animais, as plantas e até mesmo as pedras. Então, a plena consciência da importância da religião cresceu em mim com meus estudos em ciências islâmicas e minha especialização na faculdade de teologia de Al-Azhar. Percebi que a mensagem da religião só pode dar os frutos desejados se for proclamada por fiéis reconciliados primeiro entre si. Deve haver paz, harmonia e colaboração entre aqueles que levam esta mensagem às pessoas. Pois se reina divisão e conflito entre eles, eles não serão capazes de transmitir a mensagem de paz ao povo. Conhecemos o famoso provérbio que diz: Quem não tem algo, não pode dar. É por isso que pensei que Al-Azhar deve tomar a iniciativa de se comunicar com os representantes das religiões a fim de alcançar primeiro a conciliação entre eles e depois dirigir-se ao mundo para anunciar a mensagem de paz. Entendi que as religiões monoteístas que surgiram ao longo da história têm apenas uma fonte, Deus, o Glorioso, o Altíssimo. Temos textos claros no Sagrado Alcorão que dizem que o que foi revelado por Deus a Maomé é o mesmo que foi revelado a Abraão, Moisés e Jesus. Há uma única fonte. Trata-se de tudo o que é útil para a humanidade como valores, ensinamentos e mandamentos, que não são diferentes entre uma religião e outra. Foi isto que me levou a partir e me colocar ao lado de meus irmãos e colegas representantes das religiões, para descobrir estes elementos comuns, e graças a Deus estamos reconciliados com o povo na esperança de que isto ajudará a aliviar as dores do homem de hoje.
Qual é a contribuição da encíclica do Papa Francisco "Fratelli tutti" que o senhor considera significativa? É uma mensagem também de interesse para os muçulmanos?
Al-Ṭayyeb: Esta encíclica é certamente de enorme importância, especialmente neste momento, tanto para os muçulmanos quanto para os não-muçulmanos. Posso dizer que esta encíclica se enquadra na estrutura de nossos encontros e é inspirada por eles. O próprio Papa diz isso, se não me engano, no prefácio. A encíclica vai na mesma direção, a do diálogo e da convivência entre os homens: é, em suma, um apelo a aplicar os princípios morais das religiões para criar uma verdadeira fraternidade onde não há espaço para a discriminação com base nas diferenças de religião, confissão, raça, gênero ou outras formas de intolerância. A encíclica é útil para os muçulmanos e ao mesmo tempo para os outros, porque diz que somos todos irmãos. E o Alcorão diz aos muçulmanos: vocês têm irmãos e são iguais em humanidade. Dizemos que o homem é semelhante ou igual a mim e é meu irmão em humanidade. Ele pode ser um irmão na religião, mas também pode ser um irmão para mim na humanidade. Este é o centro da Encíclica Fratelli tutti.
O que as religiões podem fazer concretamente para difundir a paz, o respeito, a compreensão recíproca e para combater o fundamentalismo que blasfema o nome de Deus através do ódio e do terrorismo?
As religiões se baseiam no princípio do conhecimento recíproco, da compreensão e da colaboração entre os homens, e de evitar o ódio, os conflitos e as guerras sempre que possível. No Alcorão Sagrado, há uma exortação vinculante, não só para os muçulmanos, mas para todos, porque o versículo começa com "Ó homens": "Ó homens, nós os criamos de um homem e de uma mulher e fizemos de vocês povos e tribos, para que vocês se conhecessem uns aos outros". O objetivo da criação, e a diversidade que está nela é, portanto, conhecer uns aos outros. Esta exortação é um dos pontos comuns entre todas as religiões monoteístas. Imaginemos um mundo que valoriza esta indicação divina e se baseia no princípio da colaboração e do conhecimento mútuo com respeito pela diversidade como a lei divina sobre a qual Deus criou a humanidade. Acredito firmemente que uma sociedade que aplica este princípio nas esferas política, econômica, social e cultural, não pode em momento algum se ver forçada a conflitos ou guerras com outros. Dizer que as religiões reveladas por Deus, o Altíssimo, foram a causa das guerras na história é impreciso, pois o que é conhecido como conflitos em nome da religião são na verdade conflitos políticos que roubaram o nome da religião ao carregando-a de interpretações corruptas para obter conquistas e interesses mundanos que não têm nenhuma conexão com a verdadeira religião. Devo dizer que aqueles que hoje difundem o ódio entre as pessoas e praticam a violência e o derramamento de sangue em nome da religião ou de Deus, são mentirosos e traidores das religiões das quais levantam as bandeiras, sejam quais forem essas religiões ou doutrinas ou confissões em cujo nome falam.
A Declaração de Abu Dhabi sobre a Fraternidade Humana fala sobre a promoção da igualdade entre homem e mulher e a dignidade da mulher. Há sinais preocupantes que mostram o ressurgimento de um fundamentalismo que não respeita esta dignidade. Como isso pode ser combatido?
Al-Ṭayyeb: Quero deixar claro que o que é dito no Documento sobre a Fraternidade Humana é o que é estabelecido pelo Islã com relação ao respeito da mulher e ao pleno respeito de seus direitos. Afirmo também que ninguém pode privar a mulher de um único de seus direitos, que foram estabelecidos pelo Profeta do Islã, Maomé, e que se encontram em sua frase clara e concisa: "As mulheres são iguais aos homens". Ninguém pode fazer isso quando nós muçulmanos, de Marrakesh a Jacarta, sabemos, e de fato os nossos filhos nas escolas sabem, que as mulheres iam rezar com o profeta em sua mesquita, viram o profeta e ele as via, e trocaram perguntas com ele sobre a fé e o mundo. Aisha, a esposa do profeta, a mãe dos fiéis, participou do ensinamento e da política: ela corrigia o que lhe parecia estar errado na compreensão de algumas leis da xaria por parte de alguns sahába, os companheiros do profeta. Estes são fatos documentados, que aprendemos e estamos ensinando aos nossos alunos em Al-Azhar. Quero dizer, diante desta verdade, que nenhum muçulmano fiel a suas crenças pode tirar das mulheres os direitos garantidos pelo Islã. Devemos dizer que tudo o que hoje se levanta neste campo nada mais é do que uma vitória de hábitos e costumes ultrapassados e antigos, que prejudicam a lei do Islã e suas regras. Honestamente, falando sobre este assunto, digo também que é preciso estar atentos e distinguir, na expressão "direitos da mulher", entre direitos moldados pelas civilizações contemporâneas, ignorando a moral religiosa e os sentimentos da natureza humana, e outros direitos formulados nas sociedades onde a religião é uma base sólida na construção da cultura e estilos de vida.
- Glasgow, Cop26: delegação da Santa Sé será conduzida pelo cardeal Parolin
Vatican News
O secretário de Estado vaticano, cardeal Pietro Parolin, conduzirá a delegação da Santa Sé na sessão da Conferência das Partes na Convenção-Quadro da ONU sobre as mudanças climáticas (COP26) na Escócia. Foi o que disse o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni, respondendo às perguntas dos jornalistas.
Caberá, portanto, ao secretário de Estado levar a palavra da Santa Sé à Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas, que será aberta no final deste mês de outubro, no dia 31, em Glasgow, e durará até 12 de novembro. A COP26 reunirá quase 200 líderes mundiais para atualizar os planos de redução de emissões a fim de combater o aquecimento global.
Na segunda-feira passada, 4 de outubro, durante o encontro "Fé e Ciência" no Vaticano, o Papa apelou à COP26, pedindo "respostas eficazes" para uma "crise ecológica sem precedentes". Este tema também foi retomado na declaração que Francisco assinou junto com o patriarca ecumênico Bartolomeu I e o primaz anglicano Justin Welby, na esperança de que a convergência internacional em questões de proteção da criação também inclua a escuta do grito dos pobres.
Fonte: Vatican News