Política

Na ONU, Bolsonaro insiste em erros da pandemia e mente sobre Amazônia





O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou seu discurso na 76ª Assembleia-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em Nova York, hoje, a investidores internacionais e ao público interno bolsonarista.

Em cerca de 12 minutos, ele chamou a imprensa de "mentirosa", passou informações falsas sobre o combate ao desmatamento na Amazônia, enalteceu as manifestações de 7 de Setembro, e insistiu em práticas erradas no combate à pandemia de covid-19, com críticas ao lockdown e apoio ao tratamento precoce.

"Venho aqui mostrar o Brasil diferente daquilo publicado em jornais ou visto em televisões. O Brasil mudou, e muito, depois que assumimos o governo em janeiro de 2019. Estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção", começou o presidente, primeiro chefe de Estado a falar, como manda a tradição.

Logo no início, Bolsonaro voltou seu discurso ao investimento internacional. Além de desconsiderar as denúncias que envolvem casos de corrupção do seu governo durante a pandemia, investigadas na CPI da Covid, ele procurou passar uma imagem positiva da situação financeira do país.

"Até aqui, foram contratados US$ 100 bilhões de novos investimentos e arrecadados US$ 23 bilhões em outorgas. Na área de infraestrutura, leiloamos, para a iniciativa privada, 34 aeroportos e 29 terminais portuários", afirmou o presidente.

Sem apresentar fontes, ele falou de um "novo Brasil", com a "credibilidade recuperada". No entanto, um ranking da própria ONU, divulgado em junho, mostrou que o investimento estrangeiro no Brasil em 2020 despencou para níveis de 20 anos atrás, diante da dificuldade de controlar a pandemia de covid-19 e das incertezas sobre os rumos econômicos e políticos do país, noticiou o colunista do UOL Jamil Chade.

Segundo dados do próprio Banco Central, em junho, o investimento estrangeiro mensal no Brasil caiu para o menor nível em cinco anos, mas houve recuperação no mês seguinte.

Ele reforçou o discurso aos apoiadores internos, que lotavam a caixa de comentários do canal oficial da ONU no YouTube.

"O Brasil tem um presidente que acredita em Deus, respeita a Constituição e seus militares, valoriza a família e deve lealdade a seu povo", disse Bolsonaro, que considera este ponto "uma base sólida" para um país que estava "à beira do socialismo" —embora o Brasil nunca tenha passado por isso.

Erros da pandemia

Bolsonaro insistiu ainda sobre erros no combate à pandemia de coronavírus. A outros chefes de Estado, ele voltou a criticar o lockdown, medida já comprovada como eficaz pela ciência, e a defender o tratamento precoce, uma solução oposta, não recomendada internacionalmente.

Segundo Bolsonaro, "as medidas de isolamento e lockdown deixaram um legado de inflação, em especial, nos gêneros alimentícios no mundo todo". Não há comprovação que isso tenha acontecido.

O que há comprovação é que as medidas de isolamento social funcionaram em todos os lugares que a implementaram corretamente e ajudaram a diminuir o ritmo de casos e aumentar mortes.

"Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina. Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial", declarou Bolsonaro.

O chamado tratamento precoce, adotado no Brasil com cloroquina e ivermectina, foi defendido por Bolsonaro durante toda a pandemia, mas já é consenso internacional que os medicamentos não só não têm eficácia contra a doença, como podem ser prejudiciais aos pacientes.

O uso irrestrito de cloroquina sem o conhecimento dos pacientes tem sido, inclusive, um dos assuntos tratados na CPI.

Mentiras sobre Amazônia

Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior."Presidente Jair Bolsonaro, na ONU

Assim como nos discursos de 2019 e 2020, Bolsonaro defendeu que o governo tem trabalhado pela preservação da Amazônia. Entre outros dados, repetiu que o país usa apenas 8% de seu território para a agricultura, o que é um número enganoso.

No final de 2017, um estudo da Nasa apontou que o país usa, de fato, apenas 7,6% de seu território com lavouras. Mas esse percentual não inclui, por exemplo, o território usado para a pecuária, uma das principais fontes do desmatamento amazônico nas últimas décadas.

Um dos braços da ONU, a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), aponta que em 2017 o Brasil usava 235,9 milhões de hectares para a agropecuária, o que significa 28,2% do território nacional.

A pecuária responde por 172,6 milhões de hectares, ou 20,6% do total, enquanto os 7,6% (63,4 milhões de hectares), citados por Bolsonaro, são destinados a lavouras. O próprio presidente havia citado, em seu discurso no ano passado, que o Brasil usa 27% de seu território para agricultura e pecuária.

Entre janeiro e agosto de 2021, o desmatamento foi de 6.026 km², de fato reduzido 32% em relação ao mesmo período no ano anterior. No entanto, o dado foi apresentado sem contexto, já que o valor é quase o dobro do registrado entre janeiro e agosto de 2018, antes do início do governo Bolsonaro, de 3.336 km².

Durante o discurso, Bolsonaro omitiu que entre agosto de 2019 e julho de 2020 a exploração de madeira na Amazônia foi quase três vezes o tamanho da cidade de São Paulo. Ao menos 11% da exploração ocorreu em áreas protegidas.

7 de setembro

Bolsonaro também mentiu ao afirmar que os atos golpistas que liderou no feriado de 7 de setembro foram a "maior manifestação" da história do Brasil. Não há dados consolidados que corroborem tal afirmação, e as informações disponíveis apontam para o contrário.

Em São Paulo, por exemplo, o ato reuniu 125 mil pessoas, segundo o governo paulista. Segundo o Datafolha, o maior ato político registrado na cidade foi o protesto pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, com a presença de cerca de 500 mil pessoas.

Confira a íntegra do discurso do presidente Jair Bolsonaro na Assembleia da ONU

Confira a íntegra do discurso proferido por Bolsonaro na 76ª Assembleia-Geral da ONU.

Nova Iorque/EUA

BRAZIL 09/21/21

Senhor Presidente da Assembleia-Geral, Abdulla Shahid,

Senhor Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres,

Senhores Chefes de Estado e de Governo e demais chefes de delegação,

Senhoras e senhores,

É uma honra abrir novamente a Assembleia-Geral das Nações Unidas.

Venho aqui mostrar o Brasil diferente daquilo publicado em jornais ou visto em televisões.

O Brasil mudou, e muito, depois que assumimos o governo em janeiro de 2019.

Estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção.

O Brasil tem um presidente que acredita em Deus, respeita a Constituição e seus militares, valoriza a família e deve lealdade a seu povo.

Isso é muito, é uma sólida base, se levarmos em conta que estávamos à beira do socialismo.

Nossas estatais davam prejuízos de bilhões de dólares, hoje são lucrativas.

Nosso Banco de Desenvolvimento era usado para financiar obras em países comunistas, sem garantias. Quem honra esses compromissos é o próprio povo brasileiro.

Tudo isso mudou. Apresento agora um novo Brasil com sua credibilidade já recuperada.

O Brasil possui o maior programa de parceria de investimentos com a iniciativa privada de sua história. Programa que já é uma realidade e está em franca execução.

Até aqui, foram contratados US$ 100 bilhões de novos investimentos e arrecadados US$ 23 bilhões em outorgas.

Na área de infraestrutura, leiloamos, para a iniciativa privada, 34 aeroportos e 29 terminais portuários.

Já são mais de US$ 6 bilhões em contratos privados para novas ferrovias. Introduzimos o sistema de autorizações ferroviárias, o que aproxima nosso modelo ao americano. Em poucos dias, recebemos 14 requerimentos de autorizações para novas ferrovias com quase US$ 15 bilhões de investimentos privados.

EM NOSSO GOVERNO PROMOVEMOS O RESSURGIMENTO DO MODAL FERROVIÁRIO.

Como reflexo, menor consumo de combustíveis fósseis e redução do custo Brasil,

em especial no barateamento da produção de alimentos.

Grande avanço vem acontecendo na área do saneamento básico. O maior leilão da história no setor foi realizado em abril, com concessão ao setor privado dos serviços de distribuição de água e esgoto no Rio de Janeiro.

Temos tudo o que investidor procura: um grande mercado consumidor, excelentes ativos, tradição de respeito a contratos e confiança no nosso governo.

Também anuncio que nos próximos dias, realizaremos o leilão para implementação da tecnologia 5G no Brasil.

Nossa moderna e sustentável agricultura de baixo carbono alimenta mais de 1 bilhão de pessoas no mundo e utiliza apenas 8% do território nacional.

Nenhum país do mundo possui uma legislação ambiental tão completa.

Nosso Código Florestal deve servir de exemplo para outros países.

O Brasil é um país com dimensões continentais, com grandes desafios ambientais.

São 8,5 milhões de quilômetros quadrados, dos quais 66% são vegetação nativa, a mesma desde o seu descobrimento, em 1500.

Somente no bioma amazônico, 84% da floresta está intacta, abrigando a maior biodiversidade do planeta. Lembro que a região amazônica equivale à área de toda a Europa Ocidental.

Antecipamos, de 2060 para 2050, o objetivo de alcançar a neutralidade climática. Os recursos humanos e financeiros, destinados ao fortalecimento dos órgãos ambientais, foram dobrados, com vistas a zerar o desmatamento ilegal.

E os resultados desta importante ação já começaram a aparecer!

Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior.

QUAL PAÍS DO MUNDO TEM UMA POLÍTICA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL COMO A NOSSA?

Os senhores estão convidados a visitar a nossa Amazônia!

O Brasil já é um exemplo na geração de energia com 83% advinda de fontes renováveis.

Por ocasião da COP-26, buscaremos consenso sobre as regras do mercado de crédito de carbono global. Esperamos que os países industrializados cumpram efetivamente seus compromissos com o financiamento de clima em volumes relevantes.

O futuro do emprego verde está no Brasil: energia renovável, agricultura sustentável, indústria de baixa emissão, saneamento básico, tratamento de resíduos e turismo.

Ratificamos a Convenção Interamericana contra o Racismo e Formas Correlatas de Intolerância.

Temos a família tradicional como fundamento da civilização. E a liberdade do ser humano só se completa com a liberdade de culto e expressão.

14% do território nacional, ou seja, mais de 110 milhões de hectares, uma área equivalente a Alemanha e França juntas, é destinada às reservas indígenas. Nessas regiões, 600.000 índios vivem em liberdade e cada vez mais desejam utilizar suas terras para a agricultura e outras atividades.

O Brasil sempre participou em Missões de Paz da ONU. De Suez até o Congo, passando pelo Haiti e Líbano.

Nosso país sempre acolheu refugiados. Em nossa fronteira com a vizinha Venezuela, a Operação Acolhida, do Governo Federal, já recebeu 400 mil venezuelanos deslocados devido à grave crise político-econômica gerada pela ditadura bolivariana.

O futuro do Afeganistão também nos causa profunda apreensão. Concederemos visto humanitário para cristãos, mulheres, crianças e jovens afegãos.

Nesses 20 anos dos atentados contra os Estados Unidos da América, em 11 de setembro de 2001, reitero nosso repúdio ao terrorismo em todas suas formas.

Em 2022, voltaremos a ocupar uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU. Agradeço aos 181 países, em um universo de 190, que confiaram no Brasil. Reflexo de uma política externa séria e responsável promovida pelo nosso Ministério de Relações Exteriores.

Apoiamos uma Reforma do Conselho de Segurança ONU, onde buscamos um assento permanente.

A pandemia pegou a todos de surpresa em 2020. Lamentamos todas as mortes ocorridas no Brasil e no mundo.

Sempre defendi combater o vírus e o desemprego de forma simultânea e com a mesma responsabilidade. As medidas de isolamento e lockdown deixaram um legado de inflação, em especial, nos gêneros alimentícios no mundo todo.

No Brasil, para atender aqueles mais humildes, obrigados a ficar em casa por decisão de governadores e prefeitos e que perderam sua renda, concedemos um auxílio emergencial de US$ 800 para 68 milhões de pessoas em 2020.

Lembro que terminamos 2020, ano da pandemia, com mais empregos formais do que em dezembro de 2019, graças às ações do nosso governo com programas de manutenção de emprego e renda que nos custaram cerca de US$ 40 bilhões.

Somente nos primeiros 7 meses desse ano, criamos aproximadamente 1 milhão e 800 mil novos empregos. Lembro ainda que o nosso crescimento para 2021 está estimado em 5%.

Até o momento, o Governo Federal distribuiu mais de 260 milhões de doses de vacinas e mais de 140 milhões de brasileiros já receberam, pelo menos, a primeira dose, o que representa quase 90% da população adulta. 80% da população indígena também já foi totalmente vacinada. Até novembro, todos que escolheram ser vacinados no Brasil, serão atendidos.

Apoiamos a vacinação, contudo o nosso governo tem se posicionado contrário ao passaporte sanitário ou a qualquer obrigação relacionada a vacina.

Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina.

Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial. Respeitamos a relação médico-paciente na decisão da medicação a ser utilizada e no seu uso off-label.

Não entendemos porque muitos países, juntamente com grande parte da mídia, se colocaram contra o tratamento inicial.

A história e a ciência saberão responsabilizar a todos.

No último 7 de setembro, data de nossa Independência, milhões de brasileiros, de forma pacífica e patriótica, foram às ruas, na maior manifestação de nossa história, mostrar que não abrem mão da democracia, das liberdades individuais e de apoio ao nosso governo.

Como demonstrado, o Brasil vive novos tempos. Na economia, temos um dos melhores desempenhos entre os emergentes.

Meu governo recuperou a credibilidade externa e, hoje, se apresenta como um dos melhores destinos para investimentos.

É aqui, nesta Assembleia Geral, que, vislumbramos um mundo de mais liberdade, democracia, prosperidade e paz.

Deus abençoe a todos.

“Meia dúzia de acéfalos”, diz Bolsonaro sobre protesto em NY

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) publicou na manhã desta 3ª feira (21.set.2021), em suas redes sociais, vídeo de manifestação contra ele realizada em Nova York. Segundo o chefe do Executivo, era “meia dúzia de pessoas” que “só tem porcaria na cabeça”.

Bolsonaro afirmou que o “bando” não sabia o que estava falando. “Devia estar em um país socialista, não aqui nos Estados Unidos”, declarou o presidente.

“Meia dúzia de acéfalos protestam contra Jair Bolsonaro para delírio de parte da imprensa ($)  brasileira”, lê-se no texto que acompanha o vídeo em post do Twitter.

Nas imagens, Bolsonaro diz que “a imprensa vai dizer que é uma mega manifestação contra o presidente”. Em seguida, uma pessoa não identificada conta os presentes enquanto se ouve gritos de “fora, Bolsonaro”. Segundo essa contagem, são “7 se manifestando” e “5 pessoas da imprensa”.

O vídeo mostra um apoiador conversando com Bolsonaro. “É só continuar, você tem o apoio de muita gente”, falou o homem. 

Assessores de Bolsonaro também publicaram vídeos da manifestação nas redes sociais.

“Mais uma manifestação pífia da esquerda contra o presidente Jair Bolsonaro. Vamos rir!”, postou Tercio Arnaud Tomaz ao compartilhar a conversa do chefe do Executivo com o apoiador.

“Esquerdistas que vão morar na Coréia do Norte ou em Cuba para viver o Socialismo: 0%”, escreveu Mosart Aragão.

Essa não foi a única manifestação contra Bolsonaro. Um caminhão circuloupelas ruas de Nova York na 2ª (20.set) com telões exibindo mensagens contra o presidente.

O presidente chegou aos Estados Unidos no domingo (19.set) para participar da 76ª Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas). O discurso terá tom diplomático. Foi elaborado pelo chanceler Carlos França e sua equipe.

Fonte: UOL - Congresso em Foco - Poder360