Cultura

O segundo dia do Papa em Bratislava





Eslováquia, um país que "renasceu" em 1993 depois da queda do comunismo. Praticamente todos os jornais destacam a 34ª viagem apostólica do Papa que, após uma parada em Budapeste, chegou ontem à noite à capital eslovaca.

O segundo dia de Francisco na Eslováquia. Praticamente todos os jornais destacam a 34ª viagem apostólica do Papa que, após uma parada em Budapeste, chegou ontem à noite à capital eslovaca, Bratislava.

As boas-vindas e a programação do dia

O primeiro compromisso dessa segunda-feira foi no Palácio Presidencial com a cerimônia de boas-vindas, após sua visita à Presidente Čaputová. Em seguida foi realizado um encontro com as autoridades políticas e religiosas, a sociedade civil e o corpo diplomático. Uma mensagem capaz de tocar o coração da Europa. A manhã terminou na Catedral de São Martinho onde o Papa se encontrou com os bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas, seminaristas e catequistas. À tarde, a visita ao Lar Centro de Belém, onde as Irmãs da Caridade cuidam dos desabrigados que aqui encontram ajuda e conforto. Seguido pelo esperado encontro com a comunidade judaica eslovaca que sofreu atrocidades e violências durante a Segunda Guerra Mundial. O dia terminará na nunciatura onde ele receberá o Presidente do Parlamento e o Primeiro Ministro.

Eslováquia: um país que renasceu

Depois da queda do comunismo como entidade estatal em 1993 a Eslováquia renasceu - quando se separou da República Tcheca com a qual havia formado a Tchecoslováquia desde 1918 – e faz parte da União Europeia desde 2004 e da Zona Euro desde 2009. Tem uma população de 5,5 milhões de habitantes, 73% são católicos e 4% são greco-católicos, enquanto 13,5% se declaram ateus. Francisco é o segundo papa a visitar o país depois de São João Paulo II, que o visitou em 1990, 1995 e 2003.

"O Papa encontra uma Eslováquia que precisa de força e esperança", afirma Maria Fabyrova Frisova, jornalista da Agência Nacional Eslovaca e ex-editora do programa eslovaco da Rádio Vaticano, "uma nação que está bastante dividida política e socialmente". Explica que para muitos esta viagem é algo surpreendente. "Sabe-se que o Papa escolhe, em certo sentido, as periferias, mas na minha opinião poucas pessoas esperavam que o Papa Francisco visitasse a Eslováquia tão cedo. Infelizmente, toda a Viagem Apostólica acontece em um momento em que o número de casos Covid na Eslováquia está aumentando".

A proximidade com o povo judeu

Após o encontro com as autoridades, os bispos e a Igreja local em Bratislava, o Papa dirigirá um discurso à comunidade judaica do país, na praça Rybné Námestie, simbólica do sofrimento dos judeus eslovacos no século XX - durante o Holocausto foram mortos 105 mil judeus. "O encontro com a Comunidade Judaica - explica Frisova - ocorre alguns dias após 9 de setembro, quando a Eslováquia comemorou o 80º aniversário da adoção do chamado Código Judaico, a medida pela qual os judeus perderam todos os direitos à liberdade. A comemoração do dia foi organizada em várias cidades. "Eu participei da que aconteceu em uma pequena cidade do Leste, onde um sacerdote simbolicamente pediu perdão por todos os erros sofridos durante o Holocausto. Assim, o encontro do Santo Padre com os representantes da Comunidade Judaica será mais um passo em direção a um caminho comum".

Que o anúncio do Evangelho seja libertador: os votos do Papa à Igreja eslovaca

“A Igreja de Cristo não quer dominar as consciências e ocupar os espaços, quer ser uma «fonte» de esperança na vida das pessoas. (..) Que ninguém se sinta oprimido. (...) Que o anúncio do Evangelho seja libertador, nunca opressivo; e a Igreja, sinal de liberdade e acolhimento”, disse o Papa aos membros da Igreja eslovaca.

Onde quer que vá, para o Papa Francisco o encontro com bispos, sacerdotes, religiosos, seminaristas e catequistas é o momento de uma conversa franca e sincera, quando se "sente em casa". E não foi diferente com os eslovacos: “Venho como irmão, um de vocês”, disse ele, na Catedral de São Martinho, em Bratislava.

“Estou aqui para partilhar o seu caminho”, afirmou, e a Igreja se faz em conjunto, percorrendo as estradas da vida com a chama do Evangelho acesa.

A Igreja não é uma fortaleza, um castelo. “Aqui, em Bratislava, o castelo já existe. E é belo!” Mas a Igreja é a comunidade que deseja atrair para Cristo mediante a alegria do Evangelho. Então é lícito perguntar: O que é que se espera da Igreja? Francisco respondeu com três palavras: liberdade, criatividade e diálogo.

“Sem liberdade não há verdadeira humanidade”, afirmou o Papa. O ser humano foi criado livre para permanecer livre.

“A Igreja de Cristo não quer dominar as consciências e ocupar os espaços, quer ser uma «fonte» de esperança na vida das pessoas. (..) Que ninguém se sinta oprimido. (...) Que o anúncio do Evangelho seja libertador, nunca opressivo; e a Igreja, sinal de liberdade e acolhimento.”

Ao falar da criatividadeo Pontífice chamou em causa as figuras dos Santos Cirilo e Metódio, evangelizadores das terras eslavas. Cirilo e Metódio inventaram um novo alfabeto para a tradução da Bíblia. Então o Papa fez uma provocação: “Por acaso não precisa disto, também hoje, a Eslováquia? Porventura não será esta a tarefa mais urgente da Igreja entre os povos da Europa: encontrar novos «alfabetos» para anunciar a fé?

“À vista da perda do sentido de Deus e da alegria da fé, não adianta lamentar-se, entrincheirar-se num catolicismo defensivo, julgar e acusar o mundo; o que serve é a criatividade do Evangelho.”

Por fim, o diálogo, a necessidade de uma Igreja que sabe dialogar com o mundo, com quem confessa Cristo sem ser «dos nossos», com quem vive a fadiga de uma busca religiosa, e até mesmo com quem não crê. Para Francisco, é preciso responder ao convite de Jesus a romper o círculo vicioso e destruidor da violência, “apresentando a outra face a quem nos bate, para vencer o mal com o bem”.

Como exemplo, citou a história do cardeal jesuíta Korec, perseguido pelo regime, encarcerado, forçado a trabalhar até adoecer. “Quando foi a Roma no Jubileu do ano 2000, deslocou-se às catacumbas e acendeu uma vela pelos seus perseguidores, implorando para eles misericórdia. Isto é Evangelho!”

O Papa concluiu seu discurso fazendo votos de que a Igreja eslovaca continue seu caminho “na liberdade do Evangelho, na criatividade da fé e no diálogo que brota da misericórdia de Deus”.

O futuro da Eslováquia está nas mãos dos jovens, afirma Papa às autoridades

“Vim como peregrino a um país jovem, mas com uma história antiga, a uma terra com raízes profundas situada no coração da Europa”, disse o Papa, citando o nascimento da Eslováquia 28 anos atrás.

O segundo dia de viagem do Papa Francisco começou cedo com a cerimônia de boas-vindas no Palácio Presidencial da Eslováquia, seguida da visita de cortesia à Presidente da República, Zuzana Čaputová. Ali mesmo, no Palácio Presidencial, o Pontífice pronunciou seu discurso às Autoridades, à Sociedade Civil e ao Corpo Diplomático.

“Vim como peregrino a um país jovem, mas com uma história antiga, a uma terra com raízes profundas situada no coração da Europa”, disse o Papa, citando o nascimento da Eslováquia 28 anos atrás. Embora "jovens",  os eslovacos cultivam duas expressões da hospitalidade eslava:  o pão e o sal.

O pão, escolhido por Deus para Se tornar presente entre nós, é essencial. A Escritura convida a não o acumular, mas a partilhá-lo. (...) Que ninguém seja estigmatizado ou discriminado. O olhar cristão não vê nos mais frágeis um peso ou um problema, mas irmãos e irmãs que devem ser acompanhados e defendidos.”

Mas não bastam estruturas organizadas e eficientes, disse ainda o Papa, é preciso sabor, o sabor da solidariedade.

“E como o sal só dá sabor dissolvendo-se, também a sociedade readquire sabor através da generosidade gratuita de quem se gasta pelos outros. É bom que os jovens, em particular, sejam motivados para isto.”

Francisco lamentou o sentimento de cansaço e frustração que acomete muito jovens na Europa, “iludidos por um espírito consumista que torna cinzenta a sua existência”. “O ingrediente que falta é cuidar dos outros: sentir-se responsável por alguém dá sabor à vida.”

O Pontífice advertiu para o risco das colonizações ideológicas: “Até algumas décadas atrás, nestas terras, um pensamento único impedia a liberdade; hoje, outro pensamento único esvazia-a de sentido, reduzindo o progresso ao lucro e os direitos a meras carências individualistas”.

Entretanto, Francisco considera a pandemia a "provação do nosso tempo", que nos ensinou que somos todos frágeis e necessitados dos outros.

“Seja como indivíduo seja como nação, ninguém se pode isolar. Acolhamos esta crise como um apelo a repensar os nossos estilos de vida. (...) Espero que o façais com os olhos voltados para o alto, como quando contemplais os vossos esplêndidos montes Tatra. (...) Cultivai esta beleza, a beleza do conjunto. Isto requer paciência e fadiga, coragem e partilha, zelo e criatividade. Mas é a obra humana que o Céu abençoa.”

O Papa concluiu seu discurso arriscando algumas palavras em eslovaco, pedindo a Deus que abençoe o país (Nech Boh žehná Slovensko [Deus abençoe a Eslováquia!).

Papa: rezo por este país de raízes antigas e com rosto jovem

Na manhã desta segunda-feira o Papa Francisco fez uma visita de cortesia à presidente da República da Eslováquia e deixou uma mensagem escrita no Livro de Honra.

Após a Cerimônia oficial de boas-vindas no Palácio Presidencial em Bratislava, o Papa dirigiu-se ao Salão de Ouro do Palácio para o encontro privado com a presidente da República Zuzana Čaputová.

Ali, Francisco assinou o Livro de Honra onde deixou a seguinte mensagem: “Peregrino em Bratislava, abraço com afeto o povo eslovaco e rezo por este país de raízes antigas e com rosto jovem, para que seja uma mensagem de fraternidade e de paz no coração da Europa”.

Após, no Salão Verde, seguiu-se a troca de presentes e a apresentação da família da mandatária eslovaca ao Pontífice. Ao final, dirigiram-se ao jardim do Palácio para o Encontro com as Autoridades.

A Presidente da República Eslovaca 

A Sra. Zuzana Čaputová nasceu em Bratislava em 1973. Formou-se na Faculdade de Direito da Universidade Comenius, em Bratislava, em 1996. Colaborou com a Associação cívica Via Iuris de 2001 a 2017 - a partir de 2010 como advogada - para promover o eficaz funcionamento do sistema judicial, a transparência na gestão dos bens públicos e um maior controle da autoridade pública. Por mais de dez anos, em Pezinok, participou na linha de frente de uma campanha pública contra a autorização de um novo aterro que violaria as normas ambientais.

Em dezembro 2017 anunciou sua entrada no Partido político Progressive Eslováquia e em janeiro de 2018 foi eleita vice-presidente no primeiro congresso do partido, cargo ao qual renunciou em 2019 para concorrer às eleições presidenciais. Em 30 de março de 2019 foi eleita Presidente da República Eslovaca no segundo turno. A Sra. Čaputová tem 2 filhas.

O Palácio Presidencial

O Palácio Grassalkovich é a residência presidencial da Eslováquia desde 1996. O icônico prédio da capital foi construído em 1760 pelo arquiteto András Mayerhoffer para o conde Antal Grassalkovich, um nobre húngaro, presidente da Câmara Real da Hungria, que mais tarde se tornaria príncipe e conselheiro da imperatriz Maria Teresa da Áustria.

O palácio com seu estilo barroco tardio e rococó e sua localização central, de frente para a Praça Hodžovo námestie, foi testemunha da agitada história da atual República Eslovaca. Suas luxuosas salas e a capela decorada com afrescos do austríaco Joseph von Pichler, testemunharam suas várias transformações: de centro da vida musical de Bratislava, onde Joseph Haydn estreou alguns de seus trabalhos, a Quartel-general alemão durante a Segunda Guerra Mundial e principal casa dos Pioneiros e Juventude de Klement Gottwald durante o comunismo. Só depois da queda da União Soviética, em 1989, foi restaurado e seus jardins transformados em um parque público muito popular.

Ponto de encontro da capital também é a moderna Fonte "Terra - Planeta da Paz" do arquiteto Tibor Bartfay que, em frente à entrada do prédio, representa o globo, adornado com pombas em baixo-relevo como símbolos de paz. Não muito longe está o antigo Palácio arquiepiscopal de verão, a atual sede do Governo eslovaco.

Fonte: Vatican News