(crédito: Nelson Jr./SCO/STF - 17/12/19 )
Em meio à promessa do presidente Jair Bolsonaro de apresentar ao Senado um pedido de impeachment contra os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), e de novos ataques do chefe do Executivo contra integrantes do Judiciário, a Corte pretende manter distância do presidente e reforçou a postura de que não vai aceitar dialogar com agentes políticos que atentem contra a Constituição e a democracia do país.
Depois do presidente do STF, Luiz Fux, que recentemente cancelou um encontro com Bolsonaro e a cúpula do Congresso, por causa do desrespeito do chefe do governo com a Corte, a ministra Cármen Lúcia lamentou o mal-estar do Executivo com o Judiciário e argumentou que “quem prega contra o Estado democrático e as instituições democráticas tem na própria Constituição a tipificação de crime”. Segundo ela, “a desarmonia entre Poderes e agentes públicos não é conveniente, porque descumpre a Constituição”.
Cármem Lúcia garantiu que “hoje, há uma coesão no Supremo para que a gente garanta a democracia” e comentou que existe uma “busca incessante” de Fux por ações que permitam a superação da crise. Contudo, destacou que, se não houver uma contrapartida, não será possível resolver a situação.
“Uma sociedade não pode viver com essa audição permanente de xingamentos, de afrontas, de desatendimento à harmonia, que é exigência constitucional”, alertou a ministra, em entrevista à jornalista Míriam Leitão. “O cidadão espera de todos nós, agentes públicos, prudência republicana e, também, moderação entre os Poderes. A superação da crise terá de ser pelo diálogo necessário, e possível entre os Poderes. Resolve-se o conflito com a convivência harmoniosa. Por isso, o presidente Fux tentou o diálogo, para voltar ao veio natural da Constituição, mas ele se afastou quando não teve a resposta de diálogo que pretendeu.”
Reunião
Apesar da recusa momentânea do STF em conversar com Bolsonaro, o Palácio do Planalto quer tentar aparar arestas com a Corte. Hoje, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, terá uma reunião com Fux e buscará juntar os cacos. O governo entende que o Supremo não vai romper os laços com o Executivo para sempre e aposta na boa articulação política de Ciro para iniciar um processo de reconciliação.
Quando foi escolhido por Bolsonaro para assumir a Casa Civil, o ministro prometeu que trabalharia para ser uma “ponte” do governo com os demais Poderes. Na conversa com o presidente do STF, Ciro buscará garantir ao magistrado que o chefe do Executivo não quer uma ruptura institucional e que pretende respeitar a Constituição.
A missão, no entanto, não será fácil. Fux e mais integrantes da Suprema Corte esperam que o ministro da Casa Civil, além das explicações sobre as críticas de Bolsonaro a determinados magistrados, dê boas justificativas acerca dos recados do presidente sobre a utilização das Forças Armadas como “poder moderador”, diante da crise entre as instituições e das reiteradas acusações infundadas sobre falhas no sistema eleitoral.
O temor no STF é de que o chefe do Executivo não recue nos posicionamentos sobre os dois temas e propicie um clima ainda maior de instabilidade nas eleições do ano que vem. Para ministros do tribunal, Bolsonaro não pode desvirtuar as Forças Armadas nem ameaçar o processo eleitoral, induzindo que os militares poderiam embarcar na sua tese de não permitir o pleito de 2022.
“A Constituição exige moderação de todos nós, agentes públicos. As Forças Armadas ajudam enormemente a Justiça Eleitoral na época das eleições de São Gabriel da Cachoeira a Santo Angelo no Rio Grande do Sul. Mas elas não são um poder à parte, porque a Constituição disse quais são os Poderes da República, no artigo segundo: Legislativo, Executivo e Judiciário. Não temos quarto poder hoje”, ponderou Cármen Lúcia.
Aceno
Na tentativa de deixar os militares mais próximos de como funciona o sistema eleitoral, o ministro Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), conversou por telefone com o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e pediu que o general indicasse um integrante das Forças Armadas para compor uma comissão de transparência das eleições, a ser instituída pelo TSE como forma de garantir mais segurança ao processo eleitoral.
Os dois trataram do assunto, ontem, em sessão da 1ª Turma do STF. Barroso atendeu à ligação de Braga Netto, e parte da conversa foi captada pelo microfone do computador do magistrado. “Boa tarde, general. Como vai o senhor? Tudo bem?”, respondeu Barroso, que foi rapidamente alertado pelo ministro Alexandre de Moraes. “Ministro Luís Roberto, o microfone está aberto”, avisou o magistrado. Na sequência, o áudio foi cortado, e Barroso se ausentou da sessão para terminar o diálogo com o titular da Defesa.
Na semana passada, Barroso anunciou uma série de medidas para aumentar a lisura das urnas eletrônicas, entre elas, a criação de uma comissão externa “para monitorar todo o processo do voto eletrônico desde o primeiro momento”. A reação do presidente do TSE aconteceu após as constantes críticas de Bolsonaro ao modelo eleitoral brasileiro.
Integrantes
O grupo terá livre acesso a pessoas e equipamentos da Corte para ajudar no planejamento de medidas de transparência e auditar cada etapa do processo eleitoral. Farão parte da comissão professores da área de computação da Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Campinas (Unicamp) e Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), além de integrantes das entidades Transparência Eleitoral Brasil, Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS) e Open Knowledge Brasil (OKBR). Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério Público Eleitoral (MPE), Congresso Nacional, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Polícia Federal (PF), além das Forças Armadas, também terão representantes.
Pacheco se reunirá com Fux
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), confirmou que vai se reunir, hoje, com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, para discutir “o papel de cada Poder em uma crise que se apresenta”. O encontro está previsto para as 13h, na Corte. Ontem, o senador voltou a defender que o diálogo entre os chefes de Poderes e instituições é fundamental para a democracia e para que haja “um minuto de paz no Brasil”.
crédito: Marcos Correa/PR
O ministro da Defesa, Braga Netto, negou, em audiência na Câmara, que tenha enviado ao presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), por meio de um interlocutor, um aviso de que as eleições de 2022 não ocorreriam sem que o Congresso aprovasse a proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso — o texto foi rejeitado pelos deputados em votação plenária na semana passada. O general atribuiu essa informação à necessidade da imprensa de “vender notícia”.
Braga Netto abordou o assunto ontem, durante audiência conjunta de três comissões da Câmara — Fiscalização Financeira e Controle; Relações Exteriores e Defesa Nacional; Trabalho, Administração e Serviço Público. O ministro foi ouvido como convidado para prestar esclarecimentos sobre fatos, declarações e notas oficiais do Ministério da Defesa, interpretados pelos parlamentares como ataques ao Estado democrático de direito.
Sobre a notícia da suposta ameaça às eleições, o militar fez críticas à imprensa. “É uma série de ilações de interpretações equivocadas que nós vemos, particularmente por parte da mídia. Eu entendo que ela quer vender notícia e ela transforma, às vezes, a notícia ou põe uma meia verdade. E, aí, isso começa a se espalhar”, enfatizou, em referência à reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, de 22 de julho. Segundo o veículo de imprensa, Braga Netto, ao lado dos três comandantes militares, enviou a Arthur Lira, por meio de um interlocutor, a ameaça contra as eleições.
“Reitero que eu não enviei ameaça alguma. Não me comunico com presidentes de Poderes, por intermédio de interlocutores. No mesmo dia, ainda pela manhã, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, confirmou publicamente que não houve esse episódio”, disse Braga Netto. “Considero esse assunto resolvido, esclarecido e encerrado.” Ao contrário dessa afirmação, porém, Lira não negou nem confirmou publicamente a informação divulgada pelo jornal.
O ministro negou, ainda, que o desfile de blindados e tanques na Esplanada dos Ministérios, realizado no último dia 10, tenha sido uma tentativa de intimidar o Congresso, onde, horas depois, a Câmara viria a votar a PEC do voto impresso. Braga Neto afirmou que o desfile militar já estava programado com bastante antecedência, sem qualquer conotação de ameaça ou de intimidação.
Braga Netto respondeu de maneira enigmática quando deputados de oposição perguntaram se está programado um golpe militar para o próximo 7 de setembro, como anunciou o cantor bolsonarista Sérgio Reis, em um áudio vazado no domingo. “Se eu digo para o senhor que nós trabalhamos dentro da Constituição, a pergunta já está respondida. Cabe ao senhor o entendimento”, frisou o general, acrescentando que ele e os comandantes militares têm sido orientados nesse sentido por Bolsonaro.
O ministro também voltou a criticar as declarações do presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), sobre o envolvimento “do lado podre das Forças Armadas com falcatrua dentro do governo”. “Não consideramos correto que sejam feitos prejulgamentos se referindo à participação de militares em supostas falcatruas, de forma generalizada e apenas com base em suspeitas e ilações, sem a necessária comprovação material e sem a observância do devido processo legal”, argumentou. “Essa atitude vai de encontro a preceitos do Estado democrático de direito, que tanto prezamos e defendemos.”
O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, se reúne com o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, quarta-feira (18). Um encontro que acontece dois dias depois de ele ter participado de uma reunião com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-PI), e do Senado, Rodrigo Pacheco(DEM-MG). Nos dois momentos, a missão é a mesma: apagar incêndios provocados pelo presidente Jair Bolsonaro que mantém a escalada de ataques contra o judiciário, chegando ao ponto de falar em pedido de impeachmentpara ministros da suprema corte.
Ciro é um dos principais expoentes do Centrão brasileiro, conjunto de partidos que transita entre os diferentes governos, independentemente de posição ideológica ou bandeira partidária, sob uma autodenominação de “independente”. Tal qual o bloco que integra, Ciro Nogueira é conhecido pelo bom-trânsito e bom tratar com os parlamentares das mais diferentes esferas, inclusive, sendo chamado de “amigo”, por muitos deles, numa direção totalmente oposta às bélicas declarações bolsonaristas. Assim, seguindo a linha do Centrão, o ministro tenta construir pontes, se não mais amistosas, ao menos mais calmas entre o Executivo e o Judiciário.
No último final de semana, Bolsonaro anunciou que vai pedir ao Senado Federal a abertura de um processo contra os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. No entanto, conforme apurou o Congresso em Foco, parlamentares próximos afirmam que Pacheco não deve levar os pedidos adiante. Ainda assim, o mal-estar persistiu. Na ocasião, da conversa com Ciro com Lira e Rodrigo Pacheco, o líder do PP insistiu para que eles trabalhem pela união dos poderes, sem dar margens às crises e, assim, ajudem a "acalmar os ânimos".
Os passos de Ciro
Na segunda (16), Ciro se reuniu com o vice-presidente Hamilton Mourão, em outra tentativa de apagar incêndios provocados pelo presidente Bolsonaro. Desde que assumiu a Casa Civil, em agosto, foi o primeiro encontro dos dois. O assunto da reunião não foi divulgado. Em entrevistas, Mourão disse apenas que trataram de "temas da atualidade".
Bolsonaro anda chateado com o vice pelo o encontro que ele teve com o ministro Luís Roberto Barroso, um dos articuladores da derrubada da PEC do voto impresso na Câmara.
Por mais de uma ocasião, o presidente emitiu críticas em tom de ironia contra Mourão. Em uma delas disse: “vice é como cunhado que você aguenta”. A conversa de Ciro com Mourão aconteceu exatamente quando a PEC foi à votação no plenário da Câmara.
Histórico
Ciro Nogueira foi alocado no governo federal na expectativa de ajudar a manter a base do governo unida no Congresso. Nomeado em agosto, a chegada do deputado piauiense levou a uma dança de cadeiras no Executivo com a recriação de uma pasta abandonada, o Ministério do Trabalho, para abrigar Onyx Lorenzoni (DEM), ex-chefe da Secretária-geral da Presidência da República. O lugar de Onyx foi ocupado pelo até então ministro da Casa Civil, o general Luiz Eduardo Ramos.
Atualmente, o Centrão também possui o comando da Secretaria de Governo, com Flávia Arruda (PL-DF), mas a atuação da parlamentar tem sido mais restrita e ela é vista como um nome de Lira.
A Casa Civil é um dos principais canais do Congresso com o Palácio e responde por toda articulação junto aos ministérios. Segundo pelo perfil do senador. Ao nomeado, Ciro foi apontado pelos deputados e senadores, inclusive de oposição, como como um nome-chave no Legislativo.
Fonte: Correio Braziliense - Congresso em Foco