Política

Auditor confirma adulteração de documento e senadores culpam Bolsonaro por falsificação





Alexandre Figueiredo disse que estudo apresentado pelo presidente estava diferente daquele que foi enviado ao mandatário pelo pai do auditor, com um cabeçalho incluindo o nome do TCU e trechos grifados em amarelo

Após o auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Alexandre Figueiredoconfirmar, nesta terça-feira (17/8), em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19, que o documento apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro a apoiadores não é o mesmo que foi enviado ao mandatário (ou seja, que houve adulteração), senadores de oposição e independentes ao governo que integram a comissão falaram em cometimento de crime de falsificação por parte do mandatário.

Bolsonaro usou, no semestre passado, uma análise feita pelo auditor para dizer a seus apoiadores que havia supernotificação de mortes por covid-19, apontando que os óbitos foram inflados pelos gestores locais. Ao divulgar o documento, o presidente o remeteu ao TCU, que imediatamente negou que a análise tenha sido feita pelo tribunal e afastou auditor. Figueiredo afirmou à CPI que o estudo foi feito por ele, por conta própria, e apresentado em um grupo técnico do tribunal apenas para gerar discussão, no dia 31 de maio, mas que não avançou por impossibilidade de “haver um conluio para deliberadamente supernotificar os casos de óbitos de covid-19”, segundo o auditor.

O auditor disse à CPI que enviou no dia 6 de junho o documento ao pai, o militar da reserva Ricardo Marques, em uma conversa informal, e que o pai o compartilhou com o presidente — os dois têm uma relação de amizade. No dia seguinte, Bolsonaro apareceu com o documento, que passou a ser compartilhado com um cabeçalho remetendo-o ao TCU. Figueiredo disse que seu pai lhe informou que encaminhou o documento apenas ao chefe do Executivo, e sem qualquer alteração, da forma como o filho lhe havia enviado.

"Ideias toscas"

Questionado, o auditor disse que não saberia dizer quem fez a alteração do documento, mas os senadores apontaram que, como foi apresentado pelo presidente Bolsonaro, o mandatário pode ter incorrido em crime de falsificação. “Esse presidente é capaz de mandar falsificar um documento para defender essas suas ideias toscas, que estão colocando o Brasil na situação que nos envergonha em nível mundial”, disse Humberto Costa (PT-PE) durante a sessão.

O vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que o depoimento confirma que “o presidente da República incorreu no crime contra a fé pública”. “Consta no artigo 297 do Código Penal, que diz: ‘Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro’”, afirmou. A senadora Simone Tebet (MDB-MS), que não é membro da comissão, mas atua de forma significativa com as apurações e nos depoimentos, disse que “pouco importa” se o presidente fez o documento ou mandou fazer.

“Ele tornou público um documento sabidamente manipulado, falsificado. Isso é crime comum e crime de responsabilidade”, afirmou. Segundo ela, o presidente cometeu crime previsto no artigo 299 do Código Penal, que se trata do crime de falsidade ideológica: “Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”. O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) também pontuou que o chefe do Executivo cometeu crime de falsificação, previsto no artigo 297.

Integrante da base do governo na comissão, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) defendeu o presidente afirmando que o documento foi divulgado pelo presidente na íntegra, com a alteração apenas no “título”, referindo-se ao cabeçalho. “Não estou dizendo que esse fato não seja um fato a ser apurado. Não estou dizendo. Como também não estou dizendo que a divulgação de informações preliminares, num ambiente como esse, também não seja objeto de reflexão e análise, porque tudo isso é importante que seja analisado.

Braga Netto rebate acusações da CPI da Covid contra militares

Durante audiência na Câmara, ministro da Defesa voltou a condenar declarações do presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), sobre o envolvimento de membros das Forças Armadas em negociações suspeitas no Ministério da Saúde 

O ministro da Defesa, Braga Netto, rebateu, nesta terça-feira (17/8), durante audiência na Câmara, as acusações feitas na CPI da Covid sobre o envolvimento de vários militares em negociações suspeitas para compra de vacinas contra o novo coronavírus no Ministério da Saúde. O general voltou a condenar declarações feitas pelo presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), sobre participação "do lado podre das Forças Armadas com falcatrua dentro do governo".

Braga Netto abordou o assunto durante audiência conjunta de três comissões da Câmara — Fiscalização Financeira e Controle; Relações Exteriores e Defesa Nacional; Trabalho, Administração e Serviço Público. O ministro foi convidado a prestar esclarecimentos sobre fatos, declarações e notas oficiais do Ministério da Defesa que foram interpretados por parlamentares como ataques ao estado democrático de direito.

Durante a audiência na Câmara, os deputados fizeram questionamentos sobre vários temas, inclusive em relação à nota oficial que foi divulgada pelo Ministério da Defesa e pelos três comandantes militares, em 7 de julho, para rebater as declarações do presidente da CPI, feitas naquele mesmo dia.

A nota da cúpula militar classificou a fala de Omar Aziz como "vil e leviana" e terminou com a seguinte afirmação: "As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro".

O comunicado foi considerado desproporcional e intimidatório por parlamentares de diversos partidos, incluindo o presidente da CPI. Na ocasião, o senador afirmou que respeita as Forças Armadas e que não fez qualquer tipo de generalização.

Durante a audiência na Câmara, Braga Netto, sem citar o nome do senador, disse que a fala sobre o envolvimento de militares em irregularidades no Ministério da Saúde foi um ato "desrespeitoso e insusto". O general também questionou a consistência das acusações da CPI contra os membros das Forças Armadas.

"Os militares são forjados na lealdade, na verdade, na probidade e na responsabilidade, desde os bancos escolares. Labutam com respeito à hierarquia e dedicam anos de suas vidas aos exclusivos serviços à Pátria, inclusive com prejuízos a suas próprias famílias. Por essas sólidas razões, não consideramos correto que sejam feitos pré-julgamentos se referindo à participação de militares em supostas falcatruas, de forma generalizada e apenas com base em suspeitas e ilações, sem a necessária comprovação material e sem a observância do devido processo legal. Essa atitude vai de encontro a preceitos do estado democrático de direito que tanto prezamos e defendemos", disse Braga Netto aos deputados.

O ministro da Defesa disse também que as Forças Armadas não admitem e não compactuam com qualquer tipo de irregularidade. "Possíveis desvios de conduta individuais ou coletivos são energicamente punidos pelos regulamentos militares e pelo Código Penal Militar e, quando pertinente, pela legislação comum. Independente das acusações e dos acusados, assegurar a ampla defesa, e não considerar ninguém culpado até o trânsito em julgado, faz parte dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal, à qual todos nós devemos obediência", disse Braga Netto.

O ministro negou ainda que a nota oficial de 7 de julho tenha tido a intenção de intimidar os membros da CPI. "Na comunicação oficial realizada, não defendemos pessoas, não afrontamos autoridades ou instituições. Pontuamos a necessidade de respeito à honra das Forças Armadas e a sua história de relevantes serviços prestados. Defendemos um procedimento impessoal subordinado às regras vigentes e justo. Não houve ameaça, em momento algum, a mensagem não teve por objetivo desrespeitar o Senado ou os senadores, e nem mesmo a ele se referiu", declarou o titular da Defesa.

Desgaste institucional

Ele também reclamou do tratamento que vem sendo dado pela CPI às corporações militares. "Apesar de todo o histórico de serviços prestados, as Forças Armadas têm sido agredidas com insinuações generalizadas, acarretando desnecessário desgaste institucional. Esclareço que na emissão de resposta não se tratou de decisão precipitada, ao contrário, houve uma consulta às Forças, os comandantes foram chamados, e, por intermédio desses comandantes, levaram-se em conta o cenário atual, as consequências danosas advindas da injustiça cometida e o pré-julgamento, onde a parte se confunde com o todo, onde as suposições são transformadas em verdade, e onde as instituições seculares são citadas de maneira injusta, sendo maculadas em sua reputação junto à sociedade brasileira", disse Braga Netto.

O general acrescentou que tem "a obrigação moral de reagir ante tal injustiça, dando respostas oportunas e compatíveis, além de permitir que os integrantes das Forças continuem a ser bem informados". Além disso, o ministro afirmou que "o silêncio significaria uma concordância imperdoável" e que "é isso que a tropa espera de alguém que ocupa a minha posição e também dos comandantes militares".

Segundo o general, "o ministro da Defesa, como representante no nível político, e os comandantes, como gestores de suas respectivas Forças e atores responsáveis pelo respeito às tradições e à história da Marinha, do Exército e da Força Aérea não podem ficar inertes diante de falas que ferem a honra daqueles que labutam diuturnamente em todos os rincões do proveito exclusivo do país". Braga Netto afirmou também ter conversado por telefone com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), um dia após a divugação da nota da cúpula militar, e que deu os devidos esclarecimentos, encerrando o caso.

CPI defende punição de Bolsonaro por falsificação de documento público

A CPI da Covid ouviu, nesta terça-feira (16), o auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques acusado de produzir um relatório falso em nome do órgão com o número de mortos na pandemia abaixo do divulgado pelo Ministério da Saúde em 2020. No depoimento, Alexandre disse que não emitiu um documento, mas um texto que, posteriormente, foi formatado como documento. O arquivo foi explorado pelo presidente Jair Bolsonaro que o apresentou com timbre to TCU. Os senadores defenderam, então, enquadrar o presidente  pelos crimes de falsificação de documento e responsabilidade. 

“Nós não temos dúvida, a partir do seu depoimento, que o Senhor Presidente da República incorreu no crime contra a fé pública, constante no art. 297 do Código Penal, que diz: Falsificar no todo ou em parte documento público, disse o vice-presidente da Comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), 

A senadora Simone Tebet (MDB-MS), endossou a fala do senador Randolfe. “Pouco importa se o senhor Presidente da República fez documento ou mandou fazer o documento. Na realidade, ele tornou público um documento sabidamente manipulado, falsificado. Isso é crime comum e crime de responsabilidade”, disse.

“Quem é o governante do país que é capaz de mandar falsificar um documento pra poder justificar as suas posições? Isso é um crime. É um criminoso o governante que faz isso, não tem nenhum respeito pela sua população, não tem nenhuma empatia, não tem nenhuma capacidade de estabelecer a compreensão do sofrimento das pessoas”, reforçou o senador Humberto Costa (PT-PE).

O depoimento desta terça-feira foi curto, mas os senadores consideram que foi essencial para responsabilizar o presidente Jair Bolsonaro na disseminação de informações falsas. " Ele  [Bolsonaro] é capaz de mandar falsificar um documento pra defender essas suas ideias toscas, que estão colocando o Brasil na situação que nos envergonha em nível mundial", concluiu o senador Humberto Costa.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), considerou que o depoimento estava completo ainda no momento dos questionamentos do relator. "Quero pedir que retire meu nome da lista de inscritos [...] porque o depoimento já foi concluído, sob ponto de vista do que é necessário", disse.

Depoimento 

O servidor reiterou uma denúncia feita por ele a Justiça e revelada pelo jornal 'O Globo' durante o final de semana: que o documento atribuído a ele teria sido alterado dentro do Palácio do Planalto antes de ser entregue ao presidente da República, que passou a veicular a informação falsa.

Alexandre também explicou como o relatório foi parar na mão do poder Executivo - acredita-se que seu pai, que foi contemporâneo de Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) teria feito a ponte entre ambos.

Habeas Corpus 

O depoente possui um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que o autoriza a ficar em silêncio caso o questionamento dos senadores possa incriminá-lo.  O senador Omar Aziz (PSD-AM), reforçou que o habeas corpus não o impede de falar a verdade.

Indignado com Bolsonaro

O depoente disse que achou irresponsável da parte do presidente Jair Bolsonaro ter colocado o nome do TCU veiculado ao relatório. "Totalmente irresponsável", classificou Alexandre. Ele afirmou que ficou "indignado" com a atitude do presidente.

Relações com Bolsonaro

O auditor disse que não possui nenhum tipo de relação com a família do presidente Bolsonaro, mas seu pai, sim. O coronel da reserva Ricardo Silva Marques foi colega do presidente Jair Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), os dois também serviram juntos ao Exército.

O coronel Ricardo Silva foi indicado por Bolsonaro para ocupar um cargo na Petrobras. De acordo com o depoente, ele está lá  até hoje.  Alexandre  também afirmou que  foi indicado para a diretoria do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) em 2019, mas o TCU não autorizou sua cessão.

Bolsonaro cometeu crime

Para o vice-presidente da CPI da Covid, Randolfe Rodrigues, o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime contra a fé pública, ao falsificar documento público, conforme se constata do depoimento do auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques. O crime está previsto no Código Penal e prevê pena de dois a seis anos e multa. No caso de a falsificação ser feita por um servidor público – e o presidente Jair Bolsonaro é um servidor público – a pena é agravada e pode chegar a nove anos.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) emendou depois que, ainda que não tenha sido o próprio presidente quem falsificou o documento, ele teria incorrido em crime de responsabilidade.

O auditor do TCU disse que seu estudo que apontava para uma possível supernotificação de mortes sobre a covid-19 era um trabalho particular, e não oficial do TCU. Que foi mencionado pelo presidente como se fosse oficial e compartilhado nas redes sociais com um falso timbre do tribunal.

As falas de Randolfe fizeram eco a um posicionamento do presidente Omar Aziz, pouco antes. 

Entenda a história 

O depoimento de Alexandre foi tomado como um "Plano B" pelos senadores para esta reunião. Inicialmente eles planejavam ouvir o ex-secretário de Saúde do Distrito Federal, Francisco Araújo Filho. Como ele está no Amazonas com autorização da Justiça, a CPI teve de adiar seu depoimento - e chamar Alexandre em seu lugar.

O relatório de Alexandre Marques foi mencionado pelo presidente Jair Bolsonaro para embasar declarações de que os estados estariam aumentando o número de mortos anunciados para garantir o repasse de recursos federais. Alexandre fizera um rascunho de um levantamento nessa direção, que acabou sendo utilizado como se fosse um documento oficial do TCU. Por conta da sua ação, o servidor responde a processo disciplinar.

Fonte: Correio Braziliense e Congresso em Foco