Política

Congresso deve votar projetos na área ambiental após recesso; críticos veem riscos à preservação





Entre os projetos na pauta estão o da regularização fundiária, o que altera as regras de licenciamento ambiental e o que dificulta a marcação de terras indígenas.

Congresso Nacional pode analisar a partir de agosto, na volta do recesso parlamentar, uma série de projetos relacionados à área ambiental. Especialistas e parlamentares, no entanto, apontam riscos à preservação. 

Entre essas propostas estão o projeto da regularização fundiária; o que altera as regras de licenciamento ambiental; e o que dificulta a marcação de terras indígenas e flexibiliza o uso das terras. 

Críticos desses projetos afirmam que a chamada bancada ruralista, interessada nas mudanças, aproveita o contexto da pandemia para tentar aprovar as propostas. 

O projeto da regularização fundiária, em análise na Câmara, amplia o tamanho de imóveis rurais que podem ser regularizados por sensoriamento remoto, isto é, sem vistoria presencial. Críticos afirmam que o texto abre brechas para, na prática, legalizar a grilagem. 

A proposta que dificulta a demarcação de terras indígenas, também em análise na Câmara, já passou pela Comissão de Constituição e Justiça e foi alvo de muitos protestos

No Senado, os parlamentares analisam um projeto que flexibiliza as regras do licenciamento ambiental. O projeto já foi aprovado pela Câmara. Criticado por ambientalistas, o texto dispensa o licenciamento para uma série de atividades econômicas e cria a licença por adesão e compromisso, uma autodeclaração do responsável. 

Nove ex-ministros do Meio Ambiente emitiram carta criticando as alterações. Segundo eles, as alterações fragilizam a aplicação da Política Nacional de Meio Ambiente e prejudicam o desenvolvimento sustentável do país.

Parlamentares da bancada ambientalista reclamam da velocidade com que os projetos têm sido analisados. 

Para o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, parlamentares defensores do agronegócio aproveitam o momento de pandemia para votar demandas do setor. 

"Os deputados entendem que, se não passar isso [os projetos] agora, existe um grande risco de isso não ser votado no ano que vem, que é ano eleitoral, ou em outro governo mais amigável com a questão ambiental. Para eles, a hora é agora", disse o deputado. 

Coordenador da Frente Parlamentar de Agropecuária (FPA), o deputado Sérgio Souza (MDB-PR), por outro lado, afirma que o projeto da regularização fundiária colocará "um milhão de famílias de pequenos e médios produtores rurais na legalidade". 

Ele também diz que as propostas não retiram direitos dos indígenas. E afirma que a proposta sobre o licenciamento ambiental "reduz o custo do investimento", o que, segundo ele será vantajoso para o contribuinte. 

"Nós defendemos e queremos continuar defendendo o meio ambiente. Sem um ambiente adequado, não há produção agropecuária", diz. 

Autor do projeto de regularização fundiária e integrante da bancada ruralista, o deputado José Silva (SD-MG) afirma que o texto não coloca em risco comunidades tradicionais, quilombolas e ribeirinhos, mas, sim, preserva essas áreas. 

"Para mim, é um direito consolidado. Comunidades tradicionais, quilombolas e ribeirinhos são intocáveis. Eu sei o que representam essas áreas para quem nasceu lá", afirmou. 

Algumas dessas propostas estavam paradas no Congresso havia anos, e especialistas criticam a velocidade com que os textos passaram a ser discutidos justamente em meio à pandemia, que dificulta o debate público. 

"A única urgência de votar esse tipo de projeto agora é justamente para se aproveitar do cenário da pandemia e evitar debate público mais qualificado”, diz Brenda Brito, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). 

  

Regularização fundiária 

Sob relatoria do deputado Bosco Saraiva (Solidariedade-AM), o projeto da regularização fundiária retoma pontos de uma medida provisória enviada pelo governo no ano passado que não chegou a ser votada no Congresso e perdeu a validade. 

O texto muda alguns pontos em relação à proposta do governo, mas uma das principais críticas de ambientalistas é ao treecho que amplia o tamanho de imóveis que podem ser regularizados por meio de autodeclaração dos próprios ocupantes, sem a necessidade de vistoria prévia das autoridades no local. 

"O que se possibilita é que o Incra verifique os requisitos por meio de documentos e de tecnologias como o sensoriamento remoto", diz Bosco no parecer. 

O relatório também estabelece que as regras de regularização fundiária valerão para ocupações em terras da União feitas antes de 22 julho de 2008. 

Um dos pontos mais "graves" do relatório, de acordo com especialistas, é um dispositivo que cria brechas para a venda de terra pública ocupada após esse marco temporal, desde que por licitação. Segundo especialistas, o dispositivo seria mais uma brecha para o estímulo à grilagem. 

“É um grande erro colocar esse projeto em votação, até porque ele não adiciona medidas concretas de combate à grilagem e ao desmatamento, podendo até gerar estímulo pra mais ocupação de terra pública”, diz Brenda Brito, do Imazon. 

Em outra frente, a base aliada do governo tenta apoio para flexibilizar ainda mais a proposta, ampliando o marco temporal de ocupações e o tamanho das propriedades que podem ser regularizadas por autodeclaração dos donos. 

Vegetação na área indígena São Marcos (RR) — Foto: Divulgação/SECOM/SEPLAN

Vegetação na área indígena São Marcos (RR) — Foto: Divulgação/SECOM/SEPLAN  

Área indígena São Marcos 

No retorno aos trabalhos, os deputados também devem analisar um projeto que exclui a área urbana da sede do município de Pacaraima (RR) da área indígena São Marcos. A urgência da proposta já foi aprovada. 

Segundo o relator, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), a sede municipal representa 0,2% de área da terra indígena. 

Já a deputada indígena Joenia Wapichana (Rede-RR) argumenta que a alteração é inconstitucional, "relativiza o direito à terra" e "tem potencial" para inviabilizar outras demarcações de terras indígenas, criando precedente de "fragilização" das garantias. A parlamentar também reclama que as comunidades afetadas não foram ouvidas na discussão. 

Parque Nacional do Iguaçu

Como mostrou o Jornal Nacional, os deputados também aprovaram urgência de um projeto que pretende reabrir uma estrada no Parque Nacional do Iguaçu, um dos parques mais visitados do Brasil. 

Ambientalistas afirmam que o impacto negativo da reabertura da chamada Estrada do Colono, fechada há 20 anos, será "imenso", já que o parque abriga uma das maiores áreas restantes de Mata Atlântica e também espécies ameaçadas de extinção, como a onça-pintada. 

No Senado, tramita o projeto que trata do licenciamento ambiental. Segundo o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), ainda não há data prevista para a votação. 

Crítico da proposta, o senador Paulo Paim (PT-RS) defende que o projeto passe por comissões temáticas, a fim de ampliar o debate público com especialistas, antes de ser votado no plenário. 

Paim é contra o trecho que retira o poder de veto de comunidades indígenas sobre o licenciamento ambiental. De acordo com o texto, a decisão caberá ao órgão ambiental

"Se com a fiscalização que existe hoje já temos ataques ao meio ambiente, calcule o que acontecerá sem uma análise profunda”, disse.

Fonte: G1