1ª Leitura Gn 3,9-15 | Salmo: Sl 129| 2ª Leitura: 2Cor 4,13-18-5,1| Evangelho: Mc 3,20-35
| MACAPÁ (AP) | Por Dom Pedro José Conti
Certa vez, o Diabo saiu para passear com um amigo. Na frente deles, viram um homem que se baixava e recolhia alguma coisa do chão.
– O que aquele homem encontrou? – perguntou o amigo.
– Um pedaço de verdade – respondeu o Diabo.
– E você não está triste por causa disso?
– Não – respondeu o Diabo – vou deixar que, com aquilo que ele encontrou, invente uma nova religião.
Já estamos novamente no Tempo Comum da Liturgia e voltamos a ler trechos do evangelho de Marcos. Na página deste domingo, aparecem muitos personagens, além de Jesus e dos discípulos, alguns visíveis e outros, digamos, “invisíveis”, mas não menos importantes: Belzebu e o Espírito Santo. Ao redor de Jesus se reúne a multidão e ele fica tão ocupado que nem tem tempo para comer. Assim, preocupados, ou talvez interessados, chegam os parentes e os mestres da Lei. São esses últimos que espalham a acusação de que Jesus está agindo pelo poder de Belzebu, o príncipe dos demônios. Jesus responde com uma parábola que apresenta um raciocínio óbvio. Se os membros de um reino, ou de uma família, dividem-se uns contra os outros, aquele reino, ou aquela família, não sobreviverá. Qualquer divisão é sinal de fraqueza, nunca de força. Nesta altura, Jesus contrapõe-se ao “espírito mau”, pelo qual diziam que ele estava possuído, o “espírito bom”: o Espírito Santo. O pecado que não pode ser perdoado é, portanto, a incapacidade de reconhecer o bem que estava acontecendo, o amor de Deus Pai que Jesus tornava visível, e sustentar o contrário, como se o bem fosse um mal. Quem afirma que Deus é mau, ou que é causa do mal, está blasfemando. No final do trecho, reaparecem os familiares de Jesus, aqueles que queriam agarrá-lo. Não sabemos se era mesmo para protegê-lo da multidão e dos mestres da Lei ou, quem sabe, para tirar algum proveito daquele inesperado sucesso. Por isso, Jesus corta logo qualquer interesse escuso. Ele está começando a formar uma nova família, não mais unida pelos laços do sangue, mas pelo compromisso a cumprir “a vontade de Deus”, vontade essa que não é de divisão, lucro ou poder, mas de comunhão, fraternidade e serviço.
Volto a refletir sobre o pecado que, disse Jesus, não pode ser perdoado. Com certeza, nós não blasfemamos diretamente contra Deus, nem pensamos nisso. No entanto, tem uma maneira mais sutil, não sei se menos grave, de cair neste pecado: falar mal do bem que os outros fazem. Ou seja: pensar que o bem mesmo seja somente e exclusivamente aquele que é feito pelos nossos, os que pensam como nós, que são do mesmo partido, da mesma religião, do mesmo grupo. Todos os outros nunca fazem nada de bom, sempre fazem tudo errado. Nesse caso, conscientemente ou não, alimentamos as divisões, os preconceitos, as exclusões. Cresce o desprezo, a não escuta do outro, o não querer ver. Como é difícil reconhecer o bem que os outros fazem ou que fazem de maneira diferente da nossa! Quanto bem, talvez, deixa de ser feito, de acontecer, porque não sabemos unir as forças, recusamos colaborar com quem tem outra crença ou mesmo nenhuma!
Hoje, a humanidade e o planeta vivem momentos dramáticos. Nunca iremos resolver, ou ao menos amenizar, a questão da fome de milhões de seres humanos se não juntarmos as forças e todos os países fazerem algo em prol disso. Igualmente a questão ecológica exige a disposição de todos para diminuir os consumos, a poluição, a produção de lixo, o uso indiscriminado da água potável. Neste momento, o bem importante é a sobrevivência de todos e não somente de alguns, é a responsabilidade com as futuras gerações a longo prazo e não a busca de uma saída temporária, superficial e insustentável. A maneira de agir e de falar de Jesus não se encaixava naquela dos mestres da Lei. Por consequência, eles julgaram que o que ele fazia só podia ser algo mau, errado, obra de satanás. Isso em nome da religião deles. Ainda hoje fanatismos, fundamentalismos e intolerâncias nos cegam. Assim, vida digna para todos, vida de paz e alegria, ficam para depois. O diabo agradece.
Fonte: Diocese de Macapá